Psicologia: A tecnologia agride o poder de concentração



O psicólogo Daniel Goleman se tornou um dos mais respeitados autores de autoajuda do mundo quando lançou, em meados dos anos 1990, o best-seller Inteligência emocional. Num tempo em que os testes de Q.I. eram moda, o livro afirmava que a capacidade de lidar bem com os sentimentos pode ser mais importante do que a inteligência. Depois de escrever outros livros em que expande e renova o conceito de inteligência emocional, Goleman volta a fazer sucesso nas prateleiras com Foco, em que defende a importância da concentração num mundo distraído.

ÉPOCA – A habilidade de manter a concentração é um tipo de inteligência emocional?
Daniel Goleman –
O foco é um aspecto fundamental da inteligência emocional. A habilidade de ficar focado nos nossos sentimentos, de entender por que nos sentimos de determinada maneira e de saber o que fazer com esses sentimentos é essencial para conquistarmos a inteligência emocional. E o mesmo acontece com as pessoas que fazem parte de nossa vida. Precisamos entender seus sentimentos, entender por que elas se sentem como se sentem e o que devemos fazer em relação a isso. Essa percepção do outro, que só é possível adquirir por meio do foco, também é fundamental para nossa inteligência emocional.

ÉPOCA – A falta de foco está tão difundida hoje quanto a falta de inteligência emocional nos anos 1990?
Goleman –
Acho que não existem números concretos que deem conta disso. O que temos são indicadores e percepções. Quando escrevi Inteligência emocional, nos anos 1990, estava baseado num número absurdo de pessoas jovens com diferentes sinais de problemas emocionais como depressão, violência e bullying. Tudo isso era um indicador de uma queda na inteligência emocional. Acho que hoje acontece a mesma coisa com a falta de foco. Hoje, todos nós, não apenas os jovens, nos sentimos invadidos por tecnologias digitais, por smartphones, e-mails. Todos esses recursos estão invadindo nosso espaço privado e degradando nossa habilidade de concentração.

ÉPOCA – Seu livro define três tipos de foco. Quais são eles?
Goleman –
O primeiro tipo é o foco em nós mesmos. O segundo é o foco nas pessoas que convivem conosco. O terceiro foco é o foco no mundo a nossa volta. É entender como você afeta o mundo e como ele o afeta.

ÉPOCA – Qual desses focos perdemos mais facilmente?
Goleman –
Acredito que esses três tipos de foco são muito fáceis de perder. Muitos líderes, por exemplo, perdem o segundo tipo de foco. Eles estão tão concentrados em cumprir metas, em obter lucro, que acabam esquecendo quanto suas decisões impactam a vida de quem trabalha para eles. E isso pode criar problemas sérios num ambiente de trabalho. Mas acredito que o foco em nós mesmos é o que tem gerado o maior desafio, principalmente para as crianças. Uma professora dos Estados Unidos me disse que as crianças levam seus celulares para a sala de aula e ficam trocando mensagens o tempo todo em vez de prestar atenção ao que o professor diz. Acho que esse tipo de perda de foco é o maior problema com que todos temos de lidar diariamente.

ÉPOCA – Quais são os sintomas mais comuns de falta de foco?
Goleman –
Se você é um estudante e perde o foco nos estudos, sua performance cairá. Se você perde o foco interno, em suas emoções, o resultado será uma série de emoções ruins. Se você perder o foco nas pessoas que estão a seu redor, terá relacionamentos ruins, problemáticos. E, se perdemos o foco no mundo, algo que acredito que muitos de nós tenhamos perdido, enfrentaremos problemas globais graves, como o aquecimento global.

ÉPOCA – Quando a falta de concentração deixa de ser algo banal e se torna um problema de verdade?
Goleman –
A perda de foco pode se tornar um problema sério quando se torna uma síndrome de deficit de atenção.  Muitas crianças são diagnosticadas com essa síndrome, quando na verdade elas não têm o problema. Muitos pais reclamam que seus filhos não conseguem prestar atenção à aula, mas isso não quer dizer que a criança necessariamente precise de um remédio. Fui visitar uma escola pública numa região pobre de Nova York em que todos os dias os estudantes fazem um exercício de atenção. Eles param o que estão fazendo e apenas prestam atenção na própria respiração por cinco minutos. Isso os deixa muito calmos e focados nos trabalhos escolares. Então, nem sempre é preciso remédio. Existem outras maneiras de controlar a falta de foco e atenção.

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