GESTORES ESTADUAIS DE CULTURA TORCEM POR MUDANÇA DE POSTURA DO GOVERNO FEDERAL

Considerada pelo governo do presidente Jair Bolsonaro (sem partido) como uma área estratégica no ponto de vista ideológico e como mecanismo de propagação de ideias conservadoras, a Cultura teve, ao longo do ano e meio do mandato do presidente, uma das gestões mais polêmicas e instáveis do governo.

 Inicialmente, já perdeu o status de ministério, passando a ser uma Secretaria Especial que, atualmente, faz parte do Ministério do Turismo. Em dezoito meses, Bolsonaro já nomeou cinco secretários distintos, o último, que inicia as atividades nesta semana, é o ator Mário Frias. Ele assume a gestão com a responsabilidade de coordenar e fomentar a cultura do País em meio à pandemia de coronavírus (Covid-19), fator que praticamente inviabilizou atividades culturais e sufocou o setor.  

A expectativa dos gestores de Cultura em Pernambuco é de mudança de postura do Governo Federal. Até aqui, todas as quatro gestões já finalizadas - sendo a mais recente a da atriz Regina Duarte - foram marcadas pela falta de diálogo, de acordo com o secretário de Cultura de Pernambuco, Gilberto Freyre Neto. 

“Nós, como parte do Fórum Nacional dos Secretários e Dirigentes da Cultura, nunca fomos recebidos, nunca houve diálogo. Essa condução nos deixa, como Estado, acéfalos naquilo que significa ser reconhecido como parte da cultura brasileira, em toda a sua diversidade.  A ausência do reconhecimento dessa riqueza pelo Governo Federal nos coloca numa situação muito delicada, porque não há indicativos daquilo que vai caber a cada Estado da federação, no sentido de saber se serão protagonistas das próprias ações ou se terão órgãos no auxílio da condução das políticas”, avalia Freyre.

Marcelo Canuto, presidente da Fundação do Patrimônio Artístico de Pernambuco (Fundarpe) considera que o governo Bolsonaro “neutralizou a execução da política cultural do país ao extinguir o Ministério da Cultura, e substituí-lo pela Secretaria de Cultura”. Isso somado à troca constante de dirigentes, para ele, indica a “falta de interesse e instabilidade no comando da pasta” e inviabiliza o planejamento de políticas e gera a redução de recursos. “Diversas políticas foram desmontadas ou descontinuadas. Em Pernambuco, por exemplo, podemos citar  a suspensão do aporte recebido via Fundo Setorial do Audiovisual, da Ancine, que chegou a incrementar com R$ 15 milhões o edital do Funcultura do Audiovisual”, afirma Canuto. 

Para a escritora e secretária da Mulher do Recife, Cida Pedrosa, "a gestão de Mário Frias é natimorta".

 "Ele não tem representatividade da categoria. A única coisa que podemos esperar dele é que ele faça o presidente assinar a Aldir Blanc. É impossível esperar alguma coisa de bom do governo Bolsonaro. É um governo que tem aproximação com o fascismo e dificilmente fará algo importante para a cultura. São autoritários e não aceitam a arte como processo de transformação e trabalham com um projeto de censura", avalia. Ainda de acordo com ela, Frias enfrentará o descrédito com o qual os setores culturais olham a gestão bolsonarista. "O maior desafio dele é o fato da cadeia de cultura estar completamente desacreditada desse governo e com o que ele vem fazendo com a categoria", afirma. 

Freyre frisa que “faz votos” para que Mário Frias “tenha a capacidade de conversar e transmitir o que ele imagina que seja coerente para a retomada da relação do Governo Federal com estados e municípios, dentro do Sistema Nacional de Cultura”. O desejo do secretário pernambucano é que a gestão do ator seja “um ponto de inflexão ao modelo de gestão que nos está sendo exposto pelo governo Bolsonaro, que é a da ausência completa de relacionamento”. 

Para Canuto, Frias deve “de imediato” conhecer a estrutura que compõe a gestão pública nacional da cultura.  “Apesar de toda instabilidade, importantes instituições que eram ligadas ao MinC, permanecem sob a gestão da Secretaria de Cultura e são essenciais na condução das políticas, sejam voltadas diretamente para os trabalhadores na cultura, sejam em sua interface com as gestões estaduais e municipais. Possibilitar o pleno funcionamento destas instituições, para que cumpram com suas funções que já estão determinadas e se constituem em políticas de estado, já será uma grande contribuição”, destaca Canuto. 

Assim como Freyre, Marcelo Canuto considera essencial e urgente a retomada do diálogo do Governo Federal com os estados e municípios, “sobretudo em virtude da situação que estamos vivenciando neste momento”. 

“Temos, por um lado, estados com grande dificuldade de executar as ações planejadas na área da cultura, por conta da queda brusca sofrida na arrecadação, resultado da parada das atividades econômicas, decorrentes da pandemia. Por outro lado, temos a expectativa da execução da Lei Aldir Blanc, que distribuirá R$ 3 bilhões para ações emergenciais, em estados e municípios, para minimizar os efeitos da pandemia sobre os trabalhadores da Cultura. Esperamos que o novo secretário seja capaz de conduzir da melhor forma esse processo que, se exitoso, como esperamos e trabalhamos para que seja, poderá significar a retomada de uma política de cultura nacional mais integrada e descentralizada”, enfatiza. 

Freyre acredita que o fato da Secretaria Especial de Cultura, aparentemente, ficar em definitivo sob o Ministério do Turismo é um fato que pode ser aproveitado. “Isso, por um lado, pode nos gerar uma oportunidade  de aumentar o diálogo do setor Cultura com o setor Turismo, coisa que a tradição dos últimos anos tinha afastado. Se houver diálogo, poderá ser uma boa oportunidade”, explica. (Folha Pernambuco)
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