Onaldo Queiroga: Essa saudade sem fim. Esse sertão sem Luiz Gonzaga

Essa saudade sem fim, esse Sertão sem Luiz. O filho de Januário há vinte e cinco anos partiu. Só resta agora a sanfona, chapéu de couro e gibão. Zabumba toca tristonho e o triângulo responde sentido. Essa saudade tamanha. Fogueira queima em brasa sentida e balões vagueiam perdidos no ar. O rei menino há vinte e cinco anos se foi. Só resta agora a sanfona, chapéu de couro e gibão.

Em cada rosto sofrido te vejo, ainda, todos os dias. Te vejo na face dos retirantes, na caminhada em meio as juremas e marmeleiros ressequidos, na travessia do riacho seco, na chuva que não vem, na asa branca voando em busca d’água, na vaca magra soluçando saudade, na triste partida de Patativa do Assaré. Te vejo no Cenário da estiagem desoladora, no sol que castiga, no desaparecer das águas, no gemido da terra, no gado morrendo de sede, no fogo que impera, no sertanejo que chora, no céu aberto dos voos das Acauãs.
Onaldo Queiroga é Juiz. Escritor. onaldoqueiroga.com.br

Mas também te vejo: no cheiro de chuva embrenhado no mato, no inverno amanhecendo com a passarada, no mugido do gado no curral, na água corrente enchendo os córregos, riachos, rios e açudes, na colheita do milho e do algodão, no eco das cantorias, dos aboios e das novenas. Te vejo: na romaria do padre Cícero Romão Batista, na légua tirana e na Feira de Caruaru do Mestre Vitalino.

É Gonzaga, te escuto no chorar do Assum Preto, do carão, da acauã e da sabiá. Te ouço no soluçar do gado magro tangido pelo aboio triste do seu vaqueiro. Te sinto penetrar em minha alma em versos que afloram da peleja dos repentistas, poetas que nos lamentos e nos gemidos de suas violas descrevem aquele que em vida tão bem insculpiu musicalmente o Sertão e o Nordeste. Te ouço na voz de João Cláudio Moreno o poeta de Piripiri/PI, que em voz te incorpora.

Te vejo no palco, num acústico show de Pinto do Acordeom. Te escuto nos sons das sanfonas de Joquinha Gonzaga, de Waldonys, de Flávio José e no fole de Zé Calixto. Partistes para a abóbada celeste no dia 02.08.1989. Tua obra musical repousará eternamente nos umbrais da cultura brasileira. Teus restos mortais repousam no Parque Aza Branca, sob os espelhos das águas do Itamaragy e do bafejo noturno do vento “Cantarino”.

Luiz, tu és eterno. Tu sempre estarás no Nordeste, nas noites de São João, nos foguetes, na sua animação, nas suas crenças, no fole gemendo, na fogueira, no balão anunciando aos céus que é festa no Sertão, no cangaço do Lampião, na chapada do Araripe com sua floresta e seus encantos. Luiz sempre que existir Sertão, um pé de bode, uma sala de chão batido, uma morena faceira para arrastar as alpargatas num samba que se renova, jamais tu será esquecido. Viva Luiz.


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