“Certo mesmo é um ditado do povo/
Pra cavalo velho, o remédio é capim novo…”
Quem não conhece os versos acima, que fazem parte do refrão de
um dos maiores sucessos e Luiz Gonzaga nos anos 1970? Capim novo, conhecida
nacionalmente pela inclusão na trilha da primeira versão da novela Saramandaia,
foi escrita pelo compositor cearense Zé Clementino (1936-2005).
A inspiração
para a letra é autobiográfica, revela o jornalista e professor universitário
Jurani Clementino no livro Zé Clementino: o ‘matuto’ que devolveu o trono ao
Rei, lançamento da editora da Universidade Estadual da Paraíba, por meio do
selo Latus. Com 240 páginas, o livro destaca Clementino como “um sensível
cronista da vida do Nordeste” e tem o objetivo de apresentar um “Zé Clementino
que é resultado das várias impressões, diversos olhares e pontos de vista”.
Por
meio de depoimentos de familiares, amigos próximos e reprodução de entrevistas,
o autor – primo distante do compositor – traça perfil de um parceiro de Gonzaga
que, ao contrário do conterrâneo Humberto Teixeira e outros como Zé Dantas e
Antonio Barros, nunca deixou sua terra natal: Várzea Alegre, homenageada no
hino que escreveu para a cidade e a música Contrastes de Várzea
Alegre, gravada pelo Rei do Baião, e assim analisada por Jurani no capítulo
“Desvelando os contrastes”: “Os contrastes demonstram ainda a capacidade
perceptiva e observacional do autor, que ao se referir aos fatos curiosos da
cidade, deixa claro a sua veia humorística, o seu poder irônico e sua poesia
singular”.
Para os fãs e estudiosos da obra do Rei do Baião, o livro é particularmente
revelador, pois conta como Clementino escreveu sucessos como Xote dos
cabeludos, o desabafo do cantor pernambucano diante das mudanças no
comportamento masculino nos anos 1960. “Era uma espécie de protesto a uma moda
que fazia a cabeça dos homens ‘modernos’”, lembra Jurani, citando um trecho emblemático
da letra, gravada em 1967: “Cabra do cabelo grande, cinturinha de pilão/ Calça
justa bem cintada, costeletas bem fechadas, salto alto, fivelão/ Cabra que usa
pulseira, no pescoço um medalhão/ Cabra com esse jeitinho no sertão do meu
Padim/ Cabra assim não tem vez, não”.
No livro, Jurani também reproduz entrevista de Clementino ao Diário do
Nordeste nos anos 1970, quando ele detalha como funcionava sua parceria
musical: “As composições que Luiz Gonzaga gravou foram encaminhadas com melodia e letra. O Rei do Baião dava uma ajeitada, impunha o
seu estilo. E a música passava a ser dos dois. Aceitava essa situação, queria a
parceria”, explica o compositor.
No capítulo “O esquecimento de um Zé”, Jurani muda o tom expositivo e
tece críticas aos que narram a vida do cantor sem citar o compositor cearense:
“É impressionante a forma quase desrespeitosa como a memória de Clementino é
tratada por grande parte dos biógrafos de Luiz Gonzaga”. Por outro lado, ele
ressalta o trabalho de uma sobrinha de Clementino, a professora Ana Emília,
fundamental na catalogação da obra do tio, que dizia desconhecer a quantidade
de músicas que havia escrito.
“Muitas vezes, a professora teve que recorrer a
Zé Clementino para saber o que significava determinada palavra, verso, uma vez que o áudio estava
praticamente incompreensível”, narra Jurani. Ana Emília, ao final do trabalho,
conseguiu quantificar as músicas de Clementino, gravadas por Gonzaga (Sou do
banco, O jumento é nosso irmão) e outros grandes artistas nordestinos como
Sirano, Dominguinhos, Trio Nordestino, Messias Holanda e Genival Lacerda.
No fim do livro, o autor reproduz os discos de Gonzaga que incluem músicas de
Clementino, entre eles Óia eu aqui de novo, O sanfoneiro do povo de Deus,
Sertão 70 e Capim novo, e ainda contabiliza: “Até março de 2005, foram gravadas
41 músicas, que somadas as 20 regravações, totalizam 61 interpretações,
distribuídas entre 32 intérpretes do cancioneiro popular a nível nacional e
regional”. Zé Clementino: o ‘matuto’ que devolveu o trono ao Rei é um livro
indicado não só para pesquisadores da música brasileira, mas para aqueles que
desejam conhecer mais sobre a vida e obra do autor de versos que até hoje
habitam a memória do povo nordestino.
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De Jurani Clementino
. Latus Editora e Editora da Universidade Estadual da Paraíba, 240 páginas.
Encomendas pelo telefone (83) 3315-3300.
Fonte: O Estado de Minas/Carlos Marcelo
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