RESISTIR CONTRA A IMPLANTAÇÃO DE USINAS NUCLEARES É DEFENDER A VIDA NO PLANETA TERRA, DIZ PROFESSOR HEITOR SCALAMBRINI

Não existe uma fonte de energia que só tenha vantagens. Não há energia sem controvérsia, mas a nuclear, pelo poder destruidor que tem sobre a vida, quando ocorre um acidente severo com vazamento de radiação, não deve ser utilizada para produzir eletricidade, pelo principio da prevenção, da precaução. Não somos deuses, e não podemos garantir que não haverá este tipo de acidente,  enm minimizá-lo. Por mais sofisticada que seja a tecnologia utilizada para diminuir este risco.

NÃO EXISTE RISCO ZERO DE OCORRER UM ACIDENTE EM UMA USINA NUCLEAR.

Com o desastre de Fukushima, o principal argumento dos insanos caiu por terra. De que em uma usina nuclear NUNCA ocorreria um acidente severo, apesar de já ter ocoridos acidentes em Three Mile Island (1979) e Tchernobyl (1986) . E hoje, 8 anos depois do desatre no Japão,  os defensores desta tecnologia continuam na mesma direção, de minimizar um acidente nuclear, agora justificando pela nova tecnologia de reatores a serem adotadas, chamada de geração 3 (EPR-Evolutionnary Pressurized Reactor). 

A França saiu antes nesta tecnologia, e iniciou a construção de um reator de geração 3 em Flamanville (Normandia). A construção demorou três vezes mais do que o tempo previsto que era de 7 anos, e os preços aumentaram exponencialmente. A central que deveria custar 3,5 bilhões de euros, chegou a 12,4 bilhões de euros (1 euro=4,5 reais). Façam suas contas quanto custaria então 6 usinas, se tal tecnologia for adotada. E se perguntem o que poderia ser realizado com esta fortuna, em se tratando de projetos com energia solar fotovoltaica e energia eólica, novos protagonistas, e menos agressivas ao meio ambiente?.

Aqui os defensores das usinas falam que cada usina custará em torno de 5 bilhões de dólares multiplicado por 6 usinas=30 bilhões de dólares (o dólar a R$ 4,00), resultando em  120 bilhões de reais até 2050. Bem mais dos benefícios econômicos quantificados para o Estado e município de Itacuruba propagadeados pelos vendedores de ilusão,  800 milhões de reais de ICMS, e 150 milhões de reais de ISS. 

Se levar em conta os valores investidos na usina de Flamanville na França, 12 bilhões de euros cada uma, então seria 72 bilhões de euros as seis. O euro a R$ 4,5, ou seja, 324 bilhões de reais. Imaginem o que poderia ser feito com toda esta dinheirama em prol de pernambuco, do Nordeste, do Brasil.

Se defende a construção de usinas nucleares no país, justificando-as com o que está ocorrendo em diversas partes do mundo, com a necessidade da nucleoeletricidade para garantir o crescimento econômico e o desenvolvimento regional, para evitar apagões, etc, etc. Na verdade é um jogo de interesses de grupos que se beneficiariam caso estes projetos se concretizem, em detrimento dos interesses nacionais, do povo brasileiro. Nem tudo é dito claramente, explicitado a sociedade, quando o assunto é energia nuclear. 

Há um grande desconhecimento das pessoas, as poucas informações existentes são manipuladas, com setores da mídia, jornalistas, blogueiros circulando informações que mais parecem “releases”  fornecidos pelos interessados, do que um jornalismo ético, no minimo escutando ambas posições: a favor e contra.

 Se alardeia falsamente que a indústria nuclear está em plena efervescência e florescente no mundo. 

¬¬Toma-se como exemplo, os Estados Unidos da América, país que menos respeita a natureza e o mais poluidor do mundo, juntamente com a China. O EUA declinou de assinar o protocolo de Kyoto, não se comprometendo a reduzir suas emissões de CO2 (o principal gás de efeito estufa – GEE), não subscreveu o acordo de Paris, além de dificultar nos fóruns internacionais, propostas para combater o aquecimento global. Com certeza, este país não é exemplo, modelo para ninguém no que concerne suas escolhas energéticas e a defesa do meio ambiente.

Por outro lado, tenta-se desqualificar a decisão da Alemanha que abdicou da instalação de novos reatores nucleares, e até 2022 vai desativar os já existentes em seu território. Chega-se a especular/cogitar  que tal decisão poderá se revista no futuro próximo. Não são citados outros paises que também abandonaram a construção de novos reatores, como a Itália, Suiça, Bélgica, Austria, etc, etc.

A França, símbolo mundial no uso da eletricidade nuclear, aos seus eleitores na última campanha presidencial, diminuir ao longo dos próximos anos o uso da energia nuclear em seu território, substituindo-a por fontes renováveis de energia. Portanto, os indecisos sobre a questão nuclear devem procurar as informações em diferentes fontes sobre o que ocorre no mundo pós Fukushima.

No Japão, hoje ocorre uma verdadeira queda de braço entre o primeiro ministro, que insiste na reativação dos reatores e a população. Recente pesquisa de opinião mostra que mais de 70% da população japonesa é contrária ao uso da energia nuclear. Neste caso destaco o posicionamento do primeiro ministro quando da catástrofe de Fukushima Sr. Naoto Kan (8/6/2010 a 2/9/2011) Hoje é um ativista antinuclear, como pode ser constatado no artigo que publicou no  Le Monde Diplomatique, em agosto de 2019, com o título “O dia em que o Japão quase desapareceu”.

A falácia de que a energia nuclear é essencial para atender as necessidades energéticas do nosso pais é um argumento que vem sendo utilizado desde a ditadura militar. Na época, para justificar o acordo Brasil-Alemanha em 1975, se previa a instalação de 8 reatores nucleares, e se afirmava peremptoriamente, ser imprescindível esta fonte para ofertar mais energia para o crescimento do “gigante adormecido”. Somente uma foi construída, Angra II, iniciando sua operação em setembro de 1981. Quanto as 7 usinas restantes, realmente elas não fizeram falta, e o Brasil não entrou em colapso, conforme se apregoava.

Como informação importante. Em 2018 a produção nuclear (Angra 1+Angra 2) foi de 15.674 GWh (1GWh= 1 milhão kWh), comparada com a produção total no Brasil de 636.375 GWh, representou menos de 2,5% de toda energia gerada. 
Já em relação a potência instalada, as duas Angras somam 1.990 MW, enquanto a potência total foi de 163.441 MW. Ou seja, a nuclear representou 1,2% da potência total instalada. Os números mostram a insignificância da contribuição da energia nuclear na matriz elétrica brasileira. E mesmo com Angra 3 e outras 6 usinas instaladas até 2050, continuará sendo desprezível a contribuição desta fonte energética. E ainda afirmam que precisamos das usinas para impedir apagões! 

Por outro lado, afirmar que a instalação de uma usina nuclear no sertão brasileiro é “uma oportunidade única que poderá ser o ponto de partida de um grande processo de desenvolvimento regional”, trata de uma promessa vaga, “mofada”, destituída de fundamento. E só quem acredita, em papai Noel, mula sem cabeça, saci pererê, coelhinho da páscoa, e tantos outros personagens do imaginário popular, crê nesta afirmativa. 

A instalação de uma usina nuclear, produz menos empregos locais que as indústrias da tecnologia eólica, solar, conforme o relatório sobre empregabilidade das indústrias energéticas da Organização Internacional do Trabalho (OIT) e do Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD). Portanto, é um desrespeito ao já sofrido sertanejo alimentar o sonho de que investimentos de bilhões de reais na construção de usinas nucleares, contribuirá para a melhoria de sua vida.

O povo nordestino já foi enganado, ludibriado, inúmeras vezes com propostas deste naipe, superlativas, megalomaníacas, e não vai se deixar iludir mais uma vez.

A produção de energia elétrica a partir da geração nuclear não é ecologicamente benéfica quando se analisa o ciclo do combustível nuclear, desde a mineração, a fabricação do elemento combustível, ao tratamento dos rejeitos radioativos (lixo) e seu armazenamento. Levando em conta também a fase do “descomissionamento” (desmonte) destas estruturas industriais, custam caro (praticamente o mesmo valor de construí-las) e gastam muita energia, contribuindo para a emissão de gases de efeito estufa. A energia nuclear é suja, e não renovável.

Outras questões defendidas pelos grupos de interesse da energia nuclear são indefensáveis em um debate sério sobre o tema. Lamentável que ao invés de debates preferem “trabalhar” com falsas notícias, e  mentirosos, maledicentes e capciosos argumentos.

Os “especialistas” governamentais e não governamentais, os “lobbies” como o da Associação Brasileira para o Desenvolvimento de Atividades Nucleares (ABDAN), amparados pela mídia corporativa, e pseudo jornalistas, ajudam a propagar as “boas novas”, as benesses que a energia nuclear  trará a nação. Só que as tais vantagens  não refletirão na melhoria da vida das pessoas. 

Ao contrário, o custo da energia elétrica ao consumidor final aumentará, os riscos de acidentes severos com a liberação de materiais radioativos para a atmosfera crescerá proporcionalmente ao número de usinas construídas, além de deixar para as gerações futuras os rejeitos destes reatores, o conhecido lixo atômico.

É muita má fé não reconhecer que o Brasil tem um conjunto muito grande de opções energéticas renováveis adequadas as exigências atuais. Como também não reconhecer os efeitos sistêmicos entre as fontes hidráulicas, as eólicas, a solar, e as termoelétricas a biomassa, como melhores opções para a diversidade, complementaridade e sustentabilidade de nossa matriz elétrica.

Estamos hoje chocados, indignados, revoltados em relação ao crime ambiental que atingiu maior extensão até hoje no Brasil, em torno de 2.200 km da costa brasileira impactando o equivalente a mais de 25% da extensão de todo litoral brasileiro. Mentiras e mentiras do atual governo de extrema direita estão sendo difundidas. Todavia  a mentira foi logo desvendada, em relação a deixar de adotar medidas de precaução neste caso de dano de risco ambiental irreversível.

Agora para fazer pensar, imaginem igual conduta em um acidente envolvendo vazamento de radiação no rio São Francisco. Rio que percorre 5 estados nordestinos, e atende a mais de 500 municípios ao longo de sua bacia. Estamos falando de algo em torno a 20 milhões de pessoas impactadas. Sendo que esta região concentra 28% da população brasileira, e 15% do PIB (Produto Interno Bruto).

E ai que está toda a questão, e a pergunta que não quer calar. Vale o risco de instalar uma usina, sabendo que um acidente pode provocar uma tragédia sócio-econômica-ambiental de grandes proporções, incomparável a qualquer outro tipo de acidente conhecido? Sem dúvida, não existe nada de tão assustador do que um acidente com radiação liberada para o meio ambiente, atingindo toda forma de vida pela água, solo e ar.

Com a gravidade da situação econômica do país, e tendendo a piorar, segundo as últimas estimativas para o crescimento do PIB, não se pode, nem se deve aceitar mais este “presente de grego” do governo de extrema direita. Como já foi dito, se fosse bom o governo não instalaria no Nordeste as usinas nucleares.  Ele não gosta de nordestinos, e vice versa. Nós não gostamos do atual governo.
As perguntas que não querem calar são: 
“Por que então vamos correr este risco de um acidente nuclear com vazamento de radiação no rio São Francisco, se não precisamos para atender nossa demanda por energia elétrica, e que hoje o nuclear somente  contribui com 1,2% de toda potencia elétrica instalada no país, e gera 2,5% da energia consumida?”. 

“Por que recorrer a uma fonte de energia no minimo polêmica, com alto grau de periculosidade, se dispomos em abundância de outra fontes fornecidas pela natureza como Sol, vento, água e matéria orgânica (biomassa)?” 
“Por que recorrer a uma fonte que produz energia cara, e que vai provocar mais ainda o aumento da fatura para o consumidor final?”

“Por que deixar para as gerações futuras o problema que ainda hoje é insolúvel, o que fazer com os resíduos, criados nas usinas nucleares, com elementos químicos que  podem continuar emitindo altas doses de radiação por milhares de anos. Além das usinas gerarem artificialmente um isotopo do elemento químico chamado plutônio,  considerado o mais nocivo, o mais venenoso de tudo que existe no mundo?”

Mas o que está faltando ao nosso povo, neste momento, além das informações necessárias para formar a opinião, é sair do adoecimento mental que acometeu e viralizou. Precisa é de coragem, consciência da cidadania, para dizer claramente que não aceita usinas nucleares nem em Pernambuco, nem no Nordeste e nem no Brasil.

A Constituição, Legislação e Justiça, da Assembleia Legislativa de PE, é quem vai definir a admissibilidade da PEC 09/2019 que prevê a mudança do artigo 216 (que veda a instalação de usinas nucleares em território pernambucano). A mudança deste artigo proposto pela PEC, abrirá as portas do Estado para receber as 6 usinas. 

Senhores deputados e deputadas, reflitam, procurem mais informações, discutam, escutem os povos da região de Itacuruba. Pois esta decisão é de fundamental importância, talvez a mais importante que vocês tomarão.
Não ao nuclear, não aos meros interesses econômicos. Sim para a vida, e para o futuro do planeta Terra. 

Resistir contra a implantação de usinas nucleares é defender a vida no planeta Terra. 

Obrigado.
**Discurso proferido na reunião extraordinária da Comissão de Meio Ambiente e Sustentabilidade da ALEPE (21/10/2019). *Heitor Scalambrini Costa. Professor aposentado da UFPE, membro da Articulação Antinuclear Brasileira, e  da Articulação Sertão Antinuclear.

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