A triste agonia do Rio São Francisco

Um dos maiores rios da América do Sul, o São Francisco é o cenário de uma história quase apocalíptica de destruição ambiental. Os exemplos são tristes e inúmeros: salinização de solos, açudes com água salobra e surgimento e ampliação dos núcleos de desertificação associados a baixíssimos percentuais de cobertura vegetal das matas ciliares. Delas sobraram menos de 4%, e sua ausência amplia processos erosivos nas margens, provocando o assoreamento do rio e tornando-o inviável como hidrovia.

Ao longo da história da ocupação da Caatinga, não se perderam apenas espécies, mas também processos ecológicos e sociais. Foram-se, para sempre, o fenômeno da piracema e seus incríveis peixes migradores, e também as enchentes que regulavam a biota aquática antes do advento das barragens. Por séculos, as comunidades ribeirinhas conviveram com os ciclos naturais de enchentes do rio e, adaptadas a eles, construíram sua história.

Uma visão multidisciplinar, ainda em construção, sobre os fenômenos complexos da dinâmica do rio São Francisco, defronta-se com iniciativas técnicas e políticas insensatas, incompatíveis com um século XXI supostamente bem informado. Ao que parece, todo o saber disponível ainda é insuficiente para estancar a sangria das águas do rio São Francisco, e também acabar com a erosão biológica e genética de organismos únicos em todo o planeta.

A estiagem prolongada tem feito o Rio São Francisco perder força na divisa de Alagoas e Sergipe, permitindo que o mar avance sobre a água doce. O fenômeno é conhecido como salinização e, segundo pesquisadores da Universidade Federal de Alagoas (Ufal), está transformando o ecossistema da região e prejudicando a população ribeirinha.

É no trecho da Área de Preservação Ambiental (APA) da Foz do São Francisco, entre os municípios de Piaçabuçu (AL) e Brejo Grande (SE), que o fenômeno pode ser percebido com mais intensidade pelos quase 25 mil habitantes da região.

o pescador alagoano José Anjo percebe no dia a dia também foi apontado pelo oceanógrafo Paulo Peter, pesquisador da Ufal que analisa os impactos ambientais e sociais da salinização do Rio São Francisco. "É possível notar no estuário a morte da vegetação típica de água doce, substituição dos peixes de água doce pelos de água salgada e inviabilização da água para o consumo humano".

Para o pesquisador, a redução da vazão das águas do Rio São Francisco pela hidrelétrica de Sobradinho, na Bahia, agrava o problema. O volume de água liberado pela usina já superou 2.900 m³/s, mas nos últimos anos vem sendo reduzido gradativamente para prolongar a vida útil dos reservatórios.

a pedido da Companhia Hidrelétrica do São Francisco (Chesf) e autorizado pela Agência Nacional de Águas (ANA), a vazão passou para 550m³/s, a menor da história, segundo o Comitê da Bacia Hidrográfica do Rio São Francisco (CBHRS).

"Se a vazão do São Francisco permanecer como está, a situação será cada vez pior, tanto do ponto vista humano quanto ambiental", avalia Peter.

Fonte: Carolina Sanches e Waldson Costa-G1 Alagoas
Nenhum comentário

← Postagem mais recente Postagem mais antiga → Página inicial

0 comentários:

Postar um comentário