ADÍLIA, A SIMPLICIDADE DE UMA EX-CANGACEIRA

ADÍLIA, A SIMPLICIDADE DE UMA EX-CANGACEIRA. Eu a conheci. Adília era assim, bem assim, tão simples como uma casa de barro, tão humilde como uma roupa de chita, tão doce como uma cocada de frade, tão amiga como uma sertaneja. 

No Alto de João Paulo, ao lado da cidade de Poço Redondo, defronte sua singela moradia, um retrato para a saudosa posteridade. Morena trigueira, silenciosa como brisa do entardecer, palavras ditas como se as folhagens estivessem dialogando. Eu conheci Adília, fui seu amigo, e ela era assim mesmo. E quanta diferença daquela meninota que um dia havia se apaixonado por um cangaceiro e com ele bandeado por tão perigosos caminhos.

 Mas ela foi, pois apaixonada por Canário, um dos mais feiosos e afamados do mundo do cangaço, geralmente servindo ao subgrupo de Zé Sereno. Ela foi por amor, mas logo depois desamou. Passou a não suportar as violências, as brutalidades e arrogâncias. Passou a não suportar o jardim das paixões transformado em dolorosos espinhos. 

Ainda assim teve dois filhos neste terrível mundo. Somente depois de 38, com o fim do cangaço e a morte de Canário, ela pôde retornar ao seio da família Mulatinho, seu seio familiar no Alto de João Paulo. Em Adília uma imensa diferença de algumas ex-cangaceiras. Jamais procurou fama nem luxo, jamais contou inverdades ou acrescentou fatos que heroicizasse seu percurso no cangaço. Adília jamais colocou anéis dourados de fama nem cuspiu pétalas douradas no que dizia. Verdadeira, íntegra, apenas sendo o que era. 

Nada além disso. E nada mudou com o tempo. Já chegando à velhice, e a mesma Adília vivendo como uma sertaneja qualquer, como apenas mais uma moradora do Alto de João Paulo, logo após o riachinho Jacaré. Ali a ex-cangaceira, a ex-companheira de Canário, mas principalmente a mulher que além-cangaço travou luta renhida pela sobrevivência. A foto abaixo demonstra isso. Nela não se avista o dourado nem a riqueza, arma nem paramentos. Nela se avista Adília, a mulher sertaneja. Apenas.

Rangel Alves da Costa-Escritor e Advogado 

Nenhum comentário

← Postagem mais recente Postagem mais antiga → Página inicial

0 comentários:

Postar um comentário