Morre aos 92 anos, Nyedja do Nascimento Silva, a primeira mulher a estudar Agronomia no Estado da Paraíba e a primeira professora da antiga Escola de Agronomia do Nordeste (hoje, Centro de Ciências Agrárias)

Morre aos 92 anos, Nyedja do Nascimento Silva,  a primeira mulher a estudar Agronomia no Estado da Paraíba e a primeira professora do referido curso, na antiga Escola de Agronomia do Nordeste (hoje, Centro de Ciências Agrárias). Datado de 1936, Engenharia Agrônoma é o curso mais antigo da UFPB.

O ano era de 1945. Os cursos superiores na Paraíba eram escassos. O acesso à carreira acadêmica era restrito a homens, brancos e vindos de famílias nobres. Os negros, na época, livres há apenas 57 anos, e as mulheres, relegadas ao papel de dona-de-casa, esbarravam nos obstáculos sociais do Brasil da primeira metade do Século XX, para chegar à universidade. 

Foi nesse cenário hostil que Nyedja Nascimento, negra e pobre, conseguiu ser a primeira mulher a chegar a uma universidade na Paraíba e se tornar, posteriormente, a primeira professora do curso de Agronomia, o mais antigo da UFPB.

Aos 92 anos de idade,  a paraibana de João Pessoa ostentou o título de primeira engenheira agrônoma da Paraíba e segunda do Nordeste, conforme levantamento do Centro de Ciências Agrárias da UFPB em Areia, Paraíba. 

Ao completar 90 anos em 2015, Nyedja lembrou. “Eu queria ser enfermeira, mas como não tinha curso aqui e eu não tinha dinheiro para estudar fora, escolhi Agronomia, porque era o único daqui, da Paraíba. Meu irmão tinha acabado de concluir os estudos e conhecia o curso e, principalmente, porque eu queria muito me formar. Fui a primeira mulher do curso, da escola [de agronomia] e posteriormente a primeira professora de Agronomia”, comentou.

Fundada em 1936, a Escola de Agronomia do Nordeste foi a primeira instituição de nível superior da Paraíba. O curso de Agronomia é considerado o mais antigo da UFPB, tendo em vista que os demais cursos só viriam a aparecer em 1955, com a fundação do Campus de João Pessoa. Nos primeiros anos do curso, muitos estudantes de João Pessoa sem condições financeiras de irem estudar em grandes centros, como Rio de Janeiro, acabaram buscando a Engenharia Agrônoma para alcançar o grau superior. Foi o caso de Nyedja, vinda de uma família modesta de João Pessoa.

“Minha família era pobre. Meu pai era porteiro. Minha mãe morreu quando eu tinha três anos. Na minha cabeça, eu entendia que só conseguiria chegar a algum lugar na vida estudando muito. Minhas irmãs não se interessavam [por estudos] e se dedicavam a trabalhar em casa. Minha madrasta também ajudava, não deixando que eu fizesse os trabalhos domésticos. Como tinha esse tempo livre e o objetivo de me formar, aproveitei para estudar”, comenta.

A história de vida de Nyedja Nascimento se confunde com a própria história do curso de Engenharia Agrônoma da UFPB. Foi na antiga Escola de Agronomia do Nordeste que ela alcançou a tão sonhada formatura, em 1949, e onde conheceu aquele que viria a ser seu marido. Com seu colega de turma, Manoel Felix da Silva, Nyedja Nascimento começou um namoro, que terminou em casamento, em 1951, e que, no futuro, resultaria em três filhos.

Juntamente com Manoel Felix, a engenheira agrônoma começou a trabalhar na docência do curso no qual se formou, em meados de 1954. Ambos foram chamados para integrarem o corpo docente como assistentes dos professores do curso. Cerca de dois anos depois, Nyedja foi incorporada como professora titular de Agronomia e entrava para a história do curso pela segunda vez, agora como a primeira professora.

“Eu me lembro de que a segunda mulher a estudar Agronomia na escola de Areia foi minha aluna. Sou engenheira agrônoma, mas minha vocação sempre foi ensinar. Foi como professora que eu descobri a minha vocação. Fui professora até o último dia da minha carreira, até me aposentar. Gostava das aulas de campo com os alunos, mas gostava mesmo era da sala de aula”, explicou.

Para se tornar a primeira mulher negra a alcançar um nível superior, Nyedja relembra que precisou superar o preconceito, tanto por ser negra, quanto por ser mulher. Ele conta que alguns moradores de Areia, mais especificamente os ligados às famílias mais tradicionais, a tratavam como a “nega da escola”.

“Até algumas pessoas que eram parentes tinham essa postura na época. Embora isso fosse uma minoria. Eu sempre me dei muito bem com meus colegas professores e com suas esposas. Como eu passava a maior parte do tempo estudando, não ia muito para cidade, isso acabava não me afetando em nada. Sempre tive orgulho do que sou: afrodescendente. Sou negra, assim como meu pai era. Tenho o maior orgulho dele”, ressaltou.

Ainda que vivesse em uma época onde as mulheres e os negros não tinham visibilidade, Nyedja Nascimento declara que contava com o apoio dos colegas de classe e professores. “Costumava viajar com meus colegas de turma, todos homens, para aulas de campo. Nunca passei por uma situação em que ficasse constrangida ou fosse assediada. Sempre me dei muito bem com eles e suas respectivas esposas. Eles me respeitavam, sabiam que ali eu não era só uma mulher, era uma mulher e uma colega de sala”, concluiu.

Por precaução médica, Nyedja Nascimento não visitava mais o Centro de Ciências Agrárias da UFPB, a antiga Escola de Agronomia do Nordeste, o lugar onde deixou de ser só a filha do porteiro do antigo prédio da Recebedoria de Rendas em João Pessoa, para entrar na história como primeira mulher negra na Paraíba a aprender e ensinar em nível superior.

Foto:  Site CCA/UFPB
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