A PARAÍBA NÃO CUIDA DE SEUS TOCADORES DE SANFONA DE OITO BAIXOS

A Paraíba não cuida de seus tocadores de fole de oito baixos. A Paraíba não os respeita. Outro dia iniciei a busca por elementos biográficos de Zé do X, o tocador de fole pé-de-bode. A partir do cruzamento de dados fui estabelecendo um caminho para sua vida carioca. Zé do X, cujo nome verdadeiro ainda não descobri, nasceu, possivelmente na região de Guarabira, na Paraíba do Norte. 

Veio para o Rio de Janeiro, foi tocar no programa de rádio do Coronel Narcisinho, na antigo Rádio Guanabara. Com a repercussão do fole, gravou vários LPs e fazia a festa nas casas de shows e nos forrós cariocas. Foi um dos pioneiros tocando um instrumento quase impossível de se tocar. O enigma, o mistério, parece seguir o paraibano desde o nome artístico. Esse X coloca uma espécie de véu sobre sua personalidade, sobre sua ascendência, sobre sua trajetória. Tentamos desvendar, como um detetive, esse processo de invisibilidade. Conversamos com vários músicos, entre eles Leo Rugero, Luizinho Calixto, Perpétuo Borborema e Zé do Gato, mas ficamos onde estamos, parados, quase sem informação. Mas isso não lhe rouba o mérito de tocador paraibano, dono de alguma desenvoltura nas teclas e boa música. A Paraíba nunca lhe deu um X de atenção.

Na semana passada, assisti com muita sustança a transmissão da TV Nordestina, pelo YouTube, do show de comemoração do aniversário de Zé Calixto. O protagonista, no fole de 8 baixos, foi seu irmão Luizinho Calixto. Zé foi responsável por transportar o pé-de-bode para o andor dos instrumentos filosóficos. Em suas mãos, o fole dilui-se em imaterialidade, transfere-se em alma, substância fluídica, música que não se pode aprisionar. Zé Calixto é o pai de todos os tocadores. Afirmo isso pedindo permissão aos grandes tocadores, desde Gerson Filho a Abdias, desde Severino Januário a Truvinca, desde Negrão dos 8 baixos a Geraldo Correia. A família Calixto foi escolhida para ser a responsável pela salvaguarda do fole na Paraíba.

 O patriarca João de Deus era tocador. Zé, Bastinho e Luizinho encaminharam-se para os discos. A música fez morada entre o clã e estabeleceu-se como senhora na alma e no corpo de Zé Calixto. Vê-lo tocando causa-nos uma certa miragem, somos guiados para um outro território que não o dimensional, um lago imaginário, uma realidade paralela, um transe, uma viagem, boa e duradoura. Todavia, apesar da maestria e excelência, a Paraíba não cuida de Zé Calixto. A Paraíba não preserva Zé Calixto. A Paraíba parece que não ama Zé Calixto e ignora completamente Zé do X. Tragédia.
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