A PARAÍBA NÃO CUIDA DE SEUS EMBOLADORES DE COCO

A Paraíba não cuida de seus emboladores de coco. A Paraíba não guarda os seus coquistas. Quando vim morar no Rio de Janeiro, em meados dos anos 80, vim também em busca das manifestações culturais do povo.

O Rio é um território onde abunda o povo em artes. No Largo da Carioca ouvi pela primeira vez duas mulheres coquistas num desafio malcriado, eram Lindalva e Terezinha que, ao som do pandeiro, cantavam coco e hipnotizavam a roda que as escutava. Nenhuma delas nasceu na Paraíba, mas quando se separaram, são irmãs, Terezinha foi cantar com Roque José pras bandas de Brasília e Lindalva radicou-se em Santa Rita e passou a cantar com Lavandeira do Norte, natural de Ingá. 

Mas a Paraíba não quer saber deles, aliás o coco de embolada talvez seja a última manifestação cultural na qual o gestor público de cultura pensa. Claro que quando os emboladores se apresentam, naquelas performances incluindo a plateia, todos se apaixonam. No entanto vivem sem qualquer fomento público para sua arte. Lindalva escolheu a Paraíba, Lavandeira nasceu na Paraíba. A Paraíba não os escolheu. A Paraíba não cuida deles.

Zé Batista apareceu várias e várias vezes na feira de Areia, a triste e acabrunhada cidade onde nasci. Espadaúdo, voz imensa, bom repente, boa língua, proseador e dono de simpatia, jogava versos como quem brinca. Os versos brotavam, mas geralmente chegava em Areia sem parceiro. Encontrou nosso amigo Salvador do Pandeiro, jovem e talentoso, mas ainda se iniciando nos versos. Zé Batista trazia a herança do seu pai Manoel Batista. Este para mim foi o maior embolador paraibano. Seus versos traziam a negritude, com motes, de puxar ou de fechar, originais que só ele os sabia construir. Manoel Batista e Zé Batista nunca foram cuidados pela Paraíba, nunca foram respeitados em seu ofício, nunca lhes foi respeitada a dignidade, tampouco a arte que perpetuavam. Esse disco cuja capa reproduzo na ilustração é um marco na embolada. Outros lembrarão de Geraldo Mousinho e Cachimbinho. Estes formam um outro capítulo. Por enquanto quero apenas afirmar que a Paraíba, e Areia, a cidade fatídica onde nasci, não cuidam de seus emboladores de coco. Não guardam seus coquistas. (*Aderaldo Luciano-professor doutor em Ciência da Literatura)
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