GILBERTO GIL: LUIZ GONZAGA E DOMINGUINHOS. A SANFONA E OS REINADOS

 No ano de 2012, EU, NEY VITAL, DURANTE AS HOMENAGENS DOS CEM ANOS DE LUIZ GONZAGA ESTIVE EM EXU, NUMA CONVERSA COM GILBERTO GIL. Bem antes, durante o período que Gilberto Gil foi MINISTRO DA CULTURA, e eu estava exercendo o cargo de SECRETÁRIO TURISMO E CULTURA DA CIDADE DE AREIA PARAIBA e sendo um dos membros da COMISSÃO DO FORUM TURISMO DO BREJO PARAIBANO e coordernador do FESTIVAL NACIONAL DA CACHAÇA E RAPADURA e também FESTIVAL DE MÚSICA DA CIDADE DE AREIA, tive oportunidades de ouvir GILBERTO GIL.

O baiano contou que viu Luiz Gonzaga pela primeira vez quando tinha dez anos. Naquela época, ainda menino, saiu de Ituaçu, no centro-sul da Bahia, onde cresceu, para fazer o ginásio em Salvador. Era início dos anos 1950, auge do baião. "Ele foi fazer um show, com Catamilho (zabumba) e Salário Mínimo (triângulo), na Praça da Sé. E eu vi aquela coisa, que parecia uma epifania, uma coisa descida do céu", relembrou.

Quando decidiu apostar na carreira musical, Gilberto GIL achou que era hora de quebrar com a ditadura estética da Bossa Nova e misturá-la com o rock e o baião, aquele ritmo que estava guardado na memória desde a infância. "Luiz Gonzaga tornou-se um mestre, uma referência, depois tornou-se um amigo também. Ficou amigo do meu pai, e toda vez que ia para Vitória da Conquista [BA], ia à minha casa, tomava um café. Ele ficou assim, uma pessoa queridíssima, de casa. Eu costumo dizer que sou da família", explicou.

No Sertão nordestino, GilbertoGIL  é mesmo de casa. É figura certa nas festas de São João, quando recheia o repertório de forró. "Há alguns anos que eu venho fazendo Araripina e Sertânia [em Pernambuco], Mossoró [no Rio Grande do Norte], Juazeiro e Senhor do Bonfim [na Bahia]. E, no São João, os lugares são parecidos, com barracas de comidas típicas, bebidas, bandas de todos os tipos, mais tradicionais ou transformáticas. Hoje, eu fiz Bob Marley também. É que eu vivo nessa ponte, entre tradição e inovação, eu gosto disso."

Gilberto Gil exaltou a personalidade forte e carismática do velho Lua, que contribuiu para revelar um Nordeste ainda desconhecido, naquela época, ao Sul e Sudeste do país. "Ele tinha aquela coisa cívica, política, estadista, tocando para presidentes que fizeram projeto de eletrificação do Brasil, parecia 'Tempos modernos', uma coisa chapliniana. Luiz Gonzaga é muito interessante. Tem as músicas, extraordinárias, as mais jocosas, como 'Respeita Januário', aquela narrativa, ele chegando [em Exu], os OITO BAIXOS, o linguajar que ele revelou, esse modo nordestino de falar, a essência do nordestino. Gonzaga representa isso", comentou.

O baiano brincou dizendo que Gonzagão foi o Elvis Presley brasileiro. "Ele saía por aí, com uma indumentária, uma formação musical extraordinária, um power trio", falou, aos risos. Na época de ouro da rádio brasileira, os músicos tocavam com traje fino, mas Luiz Gonzaga queria assumir, mais forte ainda, a imagem do nordestino. A partir de 1947, colocou um chapéu de couro na cabeça, à moda dos cangaceiros. Era época de lançamento da música "Asa Branca", composta em parceria com Humberto Teixeira.

Os empresários não gostaram da ideia, mas Lua era teimoso e, no fim, das contas, trocou o paletó, a gravata e o sapato engraxado pelo gibão e sandália de couro, típicos dos vaqueiros. Ainda na empreitada de valorizar o Nordeste, o sanfoneiro inventou o trio pé de serra para acompanhá-lo nas apresentações: o triângulo para lembrar as bandas de pífano; a zambumba, os pipocos dos fogos de artifício. Isso que era o baião, segundo especialistas: a mistura de sonoridades dispersas no ambiente sertanejo que Gonzagão teve a genialidade de dar harmonia e melodia.

Para Gilberto Gil, Gonzagão foi decisivo para a música popular brasileira, ao dar de presente o baião, além de outros ritmos, como xaxado e xamego, que mais tarde estariam todos dentro do grande gênero forró. Quando surgiu, o samba-canção carioca estava caindo e o país, sendo invadido por músicas estrangeiras. "Então, ele teve essa premonição extraordinária, de entender o pop brasileiro. Quando se contar a história da música brasileira, lá no futuro, ele [Luiz Gonzaga] vai estar ali, entre os grandes inventores, como João Gilberto", destacou.

A invenção do mestre ficou de legado para muitos admiradores e seguidores, como o sanfoneiro DOMINGUINHOS. Dominguinhos teve a herança do Gonzaga, que ele incorporou, através das canções, dos estilos, o gosto pelo xote, xaxado. Mas Dominguinhos foi além, em uma direção que Gonzaga não pôde, não teve tempo: ele foi na direção do início de Gonzaga, o instrumentista, da época das boates do Mangue, no Rio de Janeiro, quando ele tocava tango, choro, polca, foxtrot, tocava tudo, repertório internacional, tudo na sanfona", falou Gil.

O cantor lembrou de uma passagem decisiva na carreira de Gonzagão, que o fez mudar de direção artística. "Segundo a lenda, O CEARENSE Armando Falcão foi lá [no Mangue], em uma apresentação dele [de Luiz Gonzaga], e disse: 'oh, rapaz, por que é que você não canta as coisas lá do Norte?' Então ai ele compenetrou-se. Em três a quatro dias, apareceu com outro repertório, então conheceu Humberto Teixeira, depois Zé Dantas, aí aconteceu aquela música que o BRASIL E O MUNDO TODO CONHECE", disse Gil, referindo-se a "Dança da moda".

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