Um pequeno habitante da Caatinga acaba de ganhar destaque mundial: trata-se do Athyreus arretado, uma nova espécie de besouro da família Geotrupidae (grupo popularmente conhecido como "besouros escavadores") descrita recentemente por pesquisadores do Centro de Conservação e Manejo de Fauna da Caatinga (Cemafauna) da Universidade Federal do Vale do São Francisco (Univasf). O achado foi publicado na revista científica Zootaxa e amplia o conhecimento sobre a biodiversidade única do semiárido brasileiro.
O nome curioso da espécie, Athyreus arretado, é uma homenagem a uma expressão típica do Nordeste usada para destacar algo impressionante, belo ou espetacular. O apelido não poderia ser mais adequado, já que o besouro se diferencia por características marcantes na sua morfologia, como o chifre localizado na parte frontal do pronoto (a "placa" que cobre a parte superior do tórax) e a presença de carenas (estruturas em forma de cristas) que desenham um padrão semelhante à letra "J" em seu corpo. Medindo cerca de 2,3 centímetros de comprimento, o besouro apresenta coloração marrom-avermelhada no dorso e tonalidade alaranjada na parte inferior. Segundo os pesquisadores, os exemplares observados foram atraídos pela luz de lanternas e voavam próximos ao solo, a apenas 60 cm de altura.
O novo inseto foi encontrado na Ecorregião das Dunas do São Francisco, no município de Casa Nova/BA. Essa área de paleodunas (antigas dunas de areia hoje cobertas por vegetação da Caatinga) é considerada prioritária para a conservação da fauna e flora, justamente pela alta ocorrência de espécies endêmicas (que só existem ali). De acordo com o estudo, este é o primeiro besouro da família Geotrupidae descrito para a região e apenas o segundo registro de uma nova espécie de Coleoptera (ordem dos besouros) nas dunas do Submédio São Francisco.
Para o pesquisador Gabriel Luiz Celante, que assina a descrição da nova espécie, a descoberta é uma prova do quanto a Caatinga ainda tem a revelar. "A descoberta do Athyreus arretado mostra o quanto ainda temos a conhecer sobre a biodiversidade da Caatinga. Esse besouro foi encontrado em uma região pouco estudada e isso reforça que o bioma guarda espécies únicas que precisam ser registradas e preservadas. Nosso trabalho não é apenas dar nome a um ser vivo até então desconhecido pela ciência , mas também chamar atenção para a importância da conservação desse ecossistema que é exclusivamente brasileiro", destaca.
Já o professor Dr. Benoit Jean Bernard Jahyny, coordenador do Laboratório de Mirmecologia do Cemafauna, ressalta a relevância do estudo como parte de um esforço maior de preservação. "Cada nova espécie descrita é uma peça que se encaixa no grande quebra-cabeça da vida. O Athyreus arretado evidencia a riqueza natural na Caatinga e o papel fundamental da pesquisa científica realizada no sertão. Trabalhos como este reforçam o compromisso da Univasf e do Cemafauna em gerar conhecimento aplicado à conservação e em valorizar o patrimônio natural que temos no semiárido", afirma.
A coordenadora do Cemafauna, professora Dra. Patrícia Nicola, destaca que a descoberta também demonstra a importância da ciência aplicada à realidade local. "O Athyreus arretado é mais um exemplo de como a Caatinga ainda guarda segredos extraordinários. Cada espécie registrada fortalece nosso compromisso em conservar a fauna e em mostrar à sociedade que proteger esse bioma é essencial não apenas para o equilíbrio ambiental, mas também para o futuro das comunidades que vivem no semiárido", ressalta. Patrícia ainda destaca que a descoberta "reforça a relevância ecológica da Caatinga, bioma que apesar de ser o maior conjunto de florestas sazonais secas da América do Sul, ainda é pouco estudado em termos de diversidade de insetos. O achado contribui para o mapeamento da biodiversidade e alerta para a necessidade de conservar esse ecossistema, frequentemente ameaçado por desmatamento, queimadas e avanço agrícola."
A pesquisa é assinada por Gabriel Luiz Celante, Adhan Gabriel Carvalho e o professor Dr. Benoit Jean Bernard Jahyny, do Laboratório de Mirmecologia da Univasf, e por Kaylla Brisley Silva Araújo e Paula Batista dos Santos, do Museu de Fauna da Caatinga/Univasf. O material coletado integra o acervo científico do Cemafauna, mais especificamente na Coleção Científica de Entomologia do Museu de Fauna da Caatinga, que atua há mais de uma década na conservação da fauna silvestre da Caatinga. O artigo está disponível no site da Revista Zootaxa: https://mapress.com/zt/article/view/zootaxa.5512.3.4
Texto: Jaquelyne Costa
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