O CANTO JOVEM DE LUIZ GONZAGA

Luiz Gonzaga plantou a sanfona entre nós, estampou a zabumba em nossos corpos, trancafiou-nos dentro de um triângulo e imortalizou-nos no registro de sua voz.

Dentro do seu matulão convivemos, bichos e coisas, aves e paisagens. Pela manhã, do seu chapéu, saltaram galos anunciando o dia, sabiás acalentando as horas, acauãs premeditando as tristezas, assuns-pretos assobiando as dores, vens-vens prenunciando amores.


O seu peito abrigava o canto dolente e retorno dos vaqueiros mortos e a pabulagem dos boiadeiros vivos. As ladainhas e os benditos aninhavam-se por ali buscando eternidade. 

Porque ainda estamos em tempos forrozais, vou recontar esse momento. Enquanto descia de Santa Teresa com Beto Quirino, Chico Salles Araujo e Ivamberto Albuquerque, eu imaginava o disco gonzagueano no qual o Rei do Baião encantara para a eternidade suas versões para canções completamente estranhas ao seu repertório tradicional. 

O Canto Jovem de Luiz Gonzaga veio e vem, de certa forma, contrapor-se ao discurso segregador. Procurando um melisma que também beirasse o dissonante, a sanfona e a voz do bardo encaixaram-se com certa delicadeza, mastigando mansamente as notas quase deslocadas da bossa nova e do tropicalismo. 

Não queiram arranjos sertanejos, rascantes, severos. Há um diálogo com o que se chamava, na época, de novo, de jovem. Gonzaga teve coragem, enfrentou. A célebre Caminho de Pedra, de Tom e Vinícius, é um ponto a se prestar bem atenção. Em Asa Branca, com alguma novidade no arranjo, a participação de Gonzaguinha marcará o reencontro de pai e filho. 

Seguem-se os Nelson Mota, Dori Caymmi, Antonio Carlos e Jocafi, Capinan e Edu Lobo, presentes. Note-se a fotografia de capa tendo como cenário o Edifício Avenida Central, no Largo da Carioca. Note-se, ainda, a pose e o figurino atualizado à cidade e à moda bossanovidadosa. As faixas:

01 Chuculatera (Jocafi – Antônio Carlos)
02 Procissão (Gilberto Gil)
03 Morena (Gonzaguinha)
04 Cirandeiro (Capinan – Edu Lobo)
05 Caminho de Pedra (Tom Jobim – Vinicius de Moraes)
06 Asa Branca (Luiz Gonzaga – Humberto Teixeira)
07 Vida ruim (Catulo de Paula)
08 O milagre (Nonato Buzar)
09 No dia que eu vim me embora (Caetano Veloso – Gilberto Gil)
10 Fica mal com Deus (Geraldo Vandré)
11 O cantador (Nelson Motta – Dori Caymmi)
12 Bicho, eu vou voltar (Humberto Teixeira)

Fonte: Aderaldo Luciano-Professor doutor em ciência da literatura
Nenhum comentário

← Postagem mais recente Postagem mais antiga → Página inicial

0 comentários:

Postar um comentário