“Eu queria ter o dom de poder cantar/ igual aos pássaros que Deus fez pra viver/ livres para voar nesse azul sem dimensão./ Queria ter poder pra poder fazer/ você às vezes dizer sim ao invés do não/ pra fome, pra saúde, pra miséria, educação…”
São versos fortes extraídos da canção romântica popular brasileira escrita por Ivanildo Marques da Silva, o Conde Só Brega. Recifense, nascido na Mustardinha, assinalado desde o berço pela tríade da música: a melodia certa, a harmonia exata, o ritmo do coração, Conde é o oceano para onde correm os rios e riachos da sensibilidade. Cresceu se alimentando dos clássicos nordestinos veiculados pelo rádio. É herdeiro de nossa música mais rica e florescente. É o senhor de nossos sonhos de amor, sem se distanciar dos problemas sociais, das dores físicas causadas pelo salário desigual. Conde habita com sua voz e performance nossas casas, nossos lares, nossas ruas, levada e trazida pelas ondas internáuticas.
A música chamada de brega pelas elites econômicas, que em determinado momento se fundem com nossas elites culturais, foi responsável por sustentar gravadoras, executivo e cantores distanciados do povo. Elino Julião, Núbia Lafayette, Carlos André, Agnaldo Timóteo, Evaldo Braga, Carlos Alexandre, Ângela Maria venderam discos e canções por si e por toda a Bossa Nova, pelo Tropicalismo e pelo rock. A canção brega é a canção brasileira. A canção romântica é a canção brasileira. E Conde, hoje e agora, traz a Luz e o Som para dentro dessa tradição. Conde levou a canção ao alfaiate e lhe fez uma roupa sob medida. Levou, cobriu de seda e a produziu com a riqueza cosmética que lhe trouxe a alma para a superfície de sua pele.
Ouvindo o DVD Livre Para Voar, no streaming de música ou no YouTube, somos capturados pela estética viva de um universo que não se perdeu e que Conde revigorou. Sua performance nos traz a época de ouro dos cantores de rádio, junta-se ao que de melhor se produziu em termos de romantismo e aproveita os novos caminhos sem se entregar ao modismo fácil, à batida repetitiva, à letra pobre. Voz firme e bem colocada, instrumental disciplinado, cozinha bem temperada, direção de arte afinada, roteiro elaborado e bem realizado: é o que nos oferece esse valoroso senhor de seu ofício. Aos 67 anos, momento em que muitos decaíram, Conde sobe vertiginoso ao topo da iluminação. Desbrava o céu azul sem dimensão. (Fonte: Texto Aderaldo Luciano-doutor em Ciências da Literatura)
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