O Ídolo Negro, compositor e cantor Evaldo Braga ganha livro

Em 1969, o jovem que passara infância e adolescência na Funabem começou a sua trajetória de grande astro da canção. Até morrer, em 1973, aos 27 anos, num acidente automobilístico, ele gravaria dois LPs e seis compactos: um total de 38 músicas, das quais nada menos que 15 seriam sucessos nacionais.

Canções como “Sorria, sorria”, “A cruz que carrego” e “Tudo fizeram para me derrotar”, pérolas de um romantismo torturado, vingativo e ressentido, fizeram de Evaldo Braga, um ex-cozinheiro e ex-engraxate, o Ídolo Negro do Brasil. Mas, tão repentinamente quanto apareceu, o cantor se foi, e teve a sua passagem pela história da MPB eliminada — uma injustiça que o jornalista e escritor Gonçalo Junior, 49, tenta reverter com “Eu não sou lixo — A trágica vida do cantor Evaldo Braga”, lançamento de estreia da Editora Noir, de André Hernandez.

— Em primeiro lugar, o que me chamou a atenção foi a tragédia. Depois, a brevidade de sua vida. E, por fim, o talento dele, em vários sentidos. O que justifica o livro é que Evaldo Braga foi um fenômeno, um cometa que passou sem deixar rastros — explica Gonçalo, para quem o cantor conseguiu ser bem mais do que um mero imitador de Agnaldo Timóteo (como parte da crítica o classificava). — Ele e Agnaldo usufruíram de uma megaestrutura de gravadora, dos melhores músicos e técnicos. Mas Evaldo tinha uma sofisticação brega, o negócio do Timóteo é a quantidade de versões que gravava. A cada LP dele, das 12 músicas, oito eram versões.

Compositor de boa parte de suas canções (junto de parceiros como Carmen Lúcia — filha do amigo Roberto Muniz e portadora de síndrome de Down — e Pantera — misteriosa presidente do Fã-Clube de Roberto Carlos, que morreu sem que sequer as pessoas próximas soubessem seu nome verdadeiro), Evaldo Braga sempre deixou nas letras pistas de sua história de vida. O autor e intérprete de “Eu não sou lixo” passou anos atormentado pela história, contada a ele, mas nunca confirmada, de que sua mãe era uma prostituta que o teria abandonado, recém-nascido, em uma lixeira. Perto do fim da vida, mais angustiado ainda com a ideia, ele bebia cada vez mais.

— Foi isso que o levou à fama e à morte. Evaldo queria ser conhecido para que a mãe o procurasse e o descobrisse — conta o escritor. — Todas as suas músicas contam historinhas e têm componentes autobiográficos. Elas batem naquilo que todo mundo quer esconder: na frustração, na traição... “Eu não sou lixo” e “Sorria, sorria” são agressivas, uma espécie de punk brega. A letra de “Sorria” é de uma crueldade sem tamanho, uma vingança.

Artista que só recentemente teve um registro em vídeo recuperado (uma aparição no programa do Chacrinha, na TV Tupi, em 1972), Evaldo Braga lutou muito para chegar ao estrelato. Segundo Gonçalo, ele era “um cara hábil”, que aprendeu na Funabem a cozinhar e que depois, mesmo tendo galgado postos em empresas como a Varig e a General Electric, decidiu trabalhar como engraxate só para poder fazer contatos artísticos. E Evaldo ainda foi um dos cantores que, numa época na qual dos negros era esperado que fizessem samba, investiram na soul music e no rock. Tudo isso é contado em “Eu não sou lixo”, livro ainda recheado de perfis de artistas que prosperaram na mesma cena musical que Evaldo Braga.

Fonte: Silvio Essinger-Jornal O Globo
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