"Perdemos um dos maiores sanfoneiros que já existiu, Dominguinhos", diz Zé Ramalho

Zé Ramalho foi um dos últimos a saber de sua própria morte. No ano passado, dias depois de ele ter sido submetido a um cateterismo, espalhou-se na internet o boato de que ele tinha morrido. Na ocasião, o cantor e compositor paraibano, que estava prestes a se apresentar em Salvador, usou seu perfil em redes sociais para desmentir as fofocas. Hoje, ele diz não guardar mágoas do episódio e cita Zé Limeira, o poeta do absurdo, para ironizar o ocorrido: "Ano passado eu morri, mas esse ano eu não morro".
'Não sei o que é sentir o medo da morte', afirma músico após boato de que ele teria morrido - WILTON JUNIOR/AGENCIA ESTADO/AE
'Não sei o que é sentir o medo da morte', afirma músico após boato de que ele teria morrido
Em 2014, quando Zé Ramalho completa 65 anos, sendo 40 de carreira, o plano imediato é de seguir com a turnê de seu disco mais recente, Sinais dos Tempos (2012). Mas também há outros projetos, como o de um show com Fagner e o de um disco dedicado à obra de Marinês e sua Gente, "artista contemporânea de Luiz Gonzaga e Jackson do Pandeiro mais importante da música nordestina".

Na primeira entrevista após sua "morte", Zé Ramalho fala dos 40 anos da gravação de um de seus discos mais cultuados, Paêbirú, e de projetos futuros, elogia músicos da geração atual, como o violonista Yamandu Costa, e critica o governo Dilma e as manifestações contra a Copa do Mundo no Brasil. Para ele, a seleção de Felipão, "apesar de boa, não será campeã".
Você vinha numa toada de interpretar e de fazer versões para canções de grandes nomes da música. Lançou os discos cantando Bob Dylan, Jackson do Pandeiro e Beatles, depois veio Sinais dos Tempos. O que te motivou a lançar um disco de inéditas?
Zé Ramalho - A pressão e cobrança dos fãs por um disco de inéditas era grande. A desconfiança e dúvida idem, vindas através de e-mails, recados no meu site e redes sociais em geral. Além disso, eu mesmo achava que depois dessa "toada" realmente merecia me dedicar a um projeto de inéditas. E foi o que me moveu, pois reuni todas as ideias que estavam anotadas, pedaços de canções inacabadas e letras que estavam rabiscadas em vários papéis.

Quais os planos para 2014?
Zé Ramalho - Há uma possibilidade, que não é certa, de realizar um projeto com Raimundo Fagner. A Sony Music tem nos procurado para a gravação de um show intimista, ao vivo. Isso ainda está em andamento. Quanto a composições inéditas, não seria esse o caso. Esse show seria de sucessos individuais de cada um dos artistas, cantados pelos dois ao mesmo tempo. Vamos ver no que vai dar…

Há algum músico consagrado com quem você gostaria de trabalhar? Em relação a novos músicos, há alguém no cenário brasileiro que chama sua atenção?
Zé Ramalho - Um cantor ou compositor consagrado, não tenho. O Fagner já preencheria essa resposta. Quanto aos novos músicos, há uma renovação permanente. O Yamandu Costa, por exemplo, é um fenômeno de habilidade. Não é comum aparecerem músicos dessa qualidade. Perdemos um dos maiores sanfoneiros que já existiu, Dominguinhos, que fazia parte dessa seleta dimensão musical. Armandinho é outro fenômeno. Mais dois dos maiores músicos do nosso país e talvez do mundo, com quem tive o privilégio de conviver e a felicidade de tê-los tocando para mim, foram Hermeto Pascoal e Egberto Gismonti.

Como você vê a música brasileira hoje?
Zé Ramalho - A minha geração, que surgiu no final dos anos 70, e a que me antecedeu são de altíssima qualidade, há um padrão das arquiteturas musicais, em todos os estilos, principalmente no que se chamou MPB. Não vejo uma sequência de geração com a mesma qualidade. Os próprios mercados sertanejo, de pagode e de música baiana transformaram-se em desesperados autores à procura de um espaço para tocar suas músicas malfeitas e com letras chinfrins. Estou falando isso porque você me perguntou, não ando dizendo essas coisas de graça.

Em 2014, você completa 65 anos e 40 anos de carreira. Há algum projeto comemorativo?
Zé Ramalho - Em 1974 realizei o disco Paêbirú; em 1975, toquei com Alceu Valença na sua banda e o ajudei a galgar o seu início de carreira; e, em 1977, estreei o meu disco Avôhai, que considero a data mais pessoal para falar de carreira individual. Até lá, até 2017, pretendo realizar um show celebrativo, com os sucessos e todas as fases da minha carreira.

Em junho, você criticou de maneira dura boatos veiculados na internet e na imprensa sobre seu estado de saúde. Chegaram a dizer que você tinha morrido. Ainda guarda mágoas daquele episódio? E o que de fato aconteceu? Como está sua saúde hoje?
Zé Ramalho - Eu não guardo mágoa. Isso é um fenômeno dos tempos em que vivemos. Ridículo é a pessoa ler uma notícia desse tipo e não checar com a fonte verídica! Ora, quando deram esta notícia de que eu tinha morrido, eu estava fazendo show em Salvador. Estava em uma turnê pelo estado da Bahia e vi a aflição dos empresários de locais onde eu iria me apresentar para desmentir e confirmar a minha presença. Cito aqui o grande poeta do absurdo, Zé Limeira, que disse: "Ano passado eu morri, mas esse ano eu não morro". Hoje estou completamente recuperado, gozando de saúde plena, fazendo minha turnê e planejando todos esses eventos dos quais falamos.

Fonte: Lucas Nobile - Jornal Estado de São Paulo
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