JOSÉ RAMOS TINHORÃO: PESQUISADOR CONSOLIDOU OS ESTUDOS DE MÚSICA NO BRASIL

“Nós passamos 11 anos falando sobre tudo: música, cinema, viagens, gastronomia, literatura, putaria, política, sobre a vida, a morte, saúde, sobre tudo. Até que o fascismo nos afastou, infelizmente. Depois veio a pandemia. Mas eu ainda esperava reencontrá-lo para retomar nossas conversas.” Assim relata, saudosamente, Aline Pereyra, amiga de José Ramos Tinhorão, por ocasião de sua morte em 3 de agosto de 2021.

Esse jornalista de origem, que se tornou um dos principais historiadores da música popular no Brasil, tinha muitos outros interesses e trabalhos para além de sua faceta mais conhecida. A música foi sua principal paixão e objeto de estudo. Mas foi além, abordando literatura, dança, economia, tecnologia, religião e tudo o mais que lhe permitisse olhar a realidade musical como parte de um contexto mais amplo. E, pelo que seus amigos contam, essa amplitude se espraiava pela vida.Jorge Henrique Bastos editou um de seus livros, Crítica Cheia de Graça, e foi um dos que compartilharam os outros deleites de Tinhorão. Durante o tempo em que morou em Portugal, Bastos recebia seu amigo todos os 

anos. Lá, degustavam sempre uma nova pedida para completar o repertório gastronômico do pesquisador. Quando perguntado sobre quais eram os traços mais marcantes de Tinhorão, Bastos responde: “A ironia ferina, o lado libertino e dionisíaco – amava um vinho, gostava de um bom prato e não recusava uma cachaça –, a agudez do pensamento e a facilidade no tratamento, por parte de alguém que sabia que produzira uma obra colossal e mesmo assim era esnobado pela academia”.

Aliás, essa tensão com o universo acadêmico foi uma das tônicas de sua vida. Uma das frases muito ouvidas por quem conviveu com Tinhorão revela como ele via os pesquisadores universitários: “Comem Tinhorão e arrotam Mário de Andrade”.

O historiador e professor da Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas (FFLCH) da USP José Geraldo Vinci de Moraes viveu na pele a resistência de Tinhorão com a universidade. Em várias ocasiões, pôde perceber o ar de desconfiança do pesquisador em relação a esse meio.

 “Ele dizia que não era lido pela universidade, que o viam de uma maneira muito preconceituosa. Isso é uma meia verdade”, diz Moraes, lembrando como ele até se orgulhava desse suposto desprezo universitário. E completa: “Eu digo que é meia verdade, e não é justo com ele nem com a universidade, porque, na verdade, não era contra ele. Não é que a universidade não ligava para o Tinhorão. A universidade não ligava para o tema, para esse objeto”, referindo-se à música popular urbana.

Mas Moraes lembra que, depois – a partir dos anos 80, em áreas como a literatura e a comunicação e, dos anos 90, na história – a universidade passou a dar a devida importância para música popular e, consequentemente, para Tinhorão e outros pesquisadores do tema. 

“Ele era muito rigoroso com o texto, com as fontes. Do ponto de vista historiográfico, ele era incrível nesse sentido. Para mim, as maiores contribuições dele foram as questões ligadas à dimensão social e cultural da música”, diz o professor. Ele destaca os trabalhos feitos em torno da modinha e do fado, entre outros temas tratados por Tinhorão. E cita o livro Música Popular: os Sons que Vêm da Rua como o ponto de virada de sua obra. 

“Ali, ele dá um ordenamento àquela tematização envolvendo as bandas, os cantores de rua, os cafés, os pregões, os chopes berrantes etc., tudo aquilo que estava disperso nos outros autores e mesmo nas primeiras obras dele. Mas, nesse livro, de 1976, ele sai do universo estrito da crítica e do colecionismo e passa a fazer um trabalho de historiador de fato. Nesse livro, ele tematizou, deu ordenamento – não fica mais numa dispersão fragmentária – e apontou caminhos. Até hoje, as pessoas continuam pesquisando o que ele apresentou ali”, resume Moraes.

José Ramos não nasceu “Tinhorão”. Esse complemento ele ganhou de seu chefe de redação, Pompeu de Souza, em 1953. No Diário Carioca, notou que sua matéria sobre o Natal estava assinada com essa alcunha. Ao questionar, recebeu uma risada como resposta: “Tinhorão, você é um idiota. J. Ramos é nome de ladrão de galinha, tem um monte na lista telefônica e Tinhorão vai ser só você”. 

Mas não foi Pompeu de Souza que o inventou. O nome, que se refere a um tipo de planta tóxica, foi dado pelo secretário de redação, Everardo Guilhon. Como conta Elizabeth Lorenzotti em seu livro Tinhorão, o Legendário, ao ver o rapaz de cabeça baixa, perguntou: “Mas quem é esse cara mesmo? Zé Ramos? Zé Jardim?”. E, escolhendo o vegetal que marcaria para sempre seu interlocutor, definiu: “Zé Tinhorão”.

Aliás, essa reportagem que lhe rendeu o apelido-sobrenome demonstra bem, já no início dos anos 50, sua marca pessoal. Tendo como referência de formação o marxismo, ali é possível verificar sua inclinação de buscar os fatos dentro de contextos mais amplos e com um olhar claramente voltado aos desfavorecidos. 

Vamos a um pequeno trecho:“Conversando com as crianças de vários bairros, a reportagem do Diário Carioca pôde apurar também – e talvez nisso os etnólogos não tenham pensado – que a integridade do mito de Papai Noel no RJ está sujeita a certas posturas municipais. Conforme a versão das crianças de certas vilas pobres do Botafogo e do Morro de Humaitá, ele chegaria de charrete, muito de noite… abrindo a porta deixada sem ferrolho pelas pessoas adultas.”

Essa preocupação com os mais pobres revela o caminho que percorreu como pesquisador. O historiador Eduardo Pontim, membro do Instituto Glória ao Samba, ressalta que “Tinhorão foi um voraz defensor de músicos e criadores do povo brasileiro, principalmente os dotados de profundo talento e marginalizados pelo grande público e por boa parte da imprensa de então”.

Sua interpretação da cultura recorre a conceito muito importante dentro do marxismo: as classes sociais. O compositor e escritor Fábio Carvalho escreveu uma crônica sobre um de seus encontros com Tinhorão, no habitual Bar do Raí, como ficou conhecida a atual lanchonete Amélia, na Vila Buarque, em São Paulo. Ele reproduz as explicações do pesquisador, motivadas pela discussão sobre seu livro História Social da Música Popular Brasileira, lançado em 1990:

– Então, veja bem, a cultura nos países capitalistas se constitui em culturas de classes: cultura da classe dominante e cultura da classe dominada. A cultura da elite é a cultura oficial da sociedade capitalista, é a cultura imposta. Isso porque dispõe de estruturas que garantem a sua hegemonia, como escolas, auditórios, teatros, conservatórios e meios de comunicação, além de financiamento público e privado. Além disso, em países como o Brasil, a própria cultura dominante é também dominada, pois faz parte dos negócios comerciais dos países que dominam o nosso mercado. Neste caso, a cultura dos pobres é submetida a uma dupla dominação.

Fábio, então, ao ouvir de Tinhorão que a classe média não produz cultura, restringindo-se a consumir ou apropriar-se das culturas da classe dominante ou da cultura dos pobres, pergunta-lhe sobre a Bossa Nova. Não seria uma produção própria da classe média?

– Ih, rapaz, se os caras estivessem vivos eu mandaria você perguntar pro Alfredo José da Silva, porque ele adotou o nome artístico de Johnny Alf… Ou pro Farnésio Dutra e Silva, o Dick Farney… Ou o William Blanco, que virou Billy Blanco…

Essa postura rendeu-lhe a distância de muitos artistas que estiveram no alvo de suas críticas. Bossa Nova e Tropicalismo mais do que todos. Ao mesmo tempo, ele surpreendia os leitores que esperavam de antemão sua acidez. Numa reportagem da Folha de São Paulo de 1999, tratando de um artista muito popular na ocasião, o agora deputado Tiririca, Tinhorão defende: “Tiririca é um artista muito talentoso e engraçado. Sua música vem de uma tradição de arte chula e rasteira que remonta à Grécia antiga. Na música brasileira, esse tipo de música existe há muito tempo. Os lundus tinham letras chulas e o povão sempre gostou de safadeza. Quem não gosta disso é a classe média, que sempre rejeitou a arte popular”.

Ele seguia surpreendendo mesmo os que foram mais alvejados por suas críticas. Se Caetano Veloso não costumava receber afagos do pesquisador, houve pelo menos um momento de exceção. Como recorda o compositor e pesquisador Celso Luiz Prudente, certa vez Tinhorão pediu-lhe pessoalmente para transmitir ao músico baiano um elogio:

– Prudente, como você é muito próximo do Caetano Veloso, caso você o veja, diga a ele que Cajuína eu gostei, que é uma música maravilhosa.

A composição a que o pesquisador se referiu na ocasião foi feita em memória ao poeta e letrista Torquato Neto. “Isso mostra o humanismo do Tinhorão. Por mais que ele tenha sido marcado por uma crítica contumaz à Bossa Nova e ao Tropicalismo, sabendo que eu e o Caetano sempre tivemos um grau de amizade muito significativa, pediu que eu falasse que Cajuína foi uma música que ele gostou”, pondera Prudente.

Sua erudição, somada ao gosto pela polêmica, rigor investigativo e destreza impressionante na escrita, criou uma espécie de lenda. O professor José Geraldo Vinci de Moraes, ao reler sua obra, também considera importante amenizar essa imagem imponente. “Percebo que, a partir de certo momento, ele se torna repetitivo nos temas, nos exemplos. E vários capítulos vão sendo reaproveitados quase integralmente em outros livros. Tudo bem ele fazer isso. Na universidade também se faz. Mas isso tira um pouco daquela aura fundadora e sempre criativa dele. Ou seja, ele é um sujeito como qualquer um de nós. E, diante das demandas, ele repete. Quer dizer, cada obra dele não é fundadora, como ele queria marcar. Cada obra vai se desdobrando.”

Outra lacuna que Moraes enxerga na obra de Tinhorão é a falta de análise musical propriamente dita. “Ele conhecia os elementos musicológicos, mas esse esforço de tratar da linguagem musical faz um pouco de falta na obra dele”, reflete o historiador.

VIVER E MORRER PARA A CULTURA: José Ramos nasceu em Santos (SP), em 1928. Na década de 1930, mudou-se com a família para Jundiaí, Bragança Paulista e Rio de Janeiro, onde se fixou, formou-se em Direito e Jornalismo, trabalhou e fez boa parte de sua carreira como jornalista, crítico e historiador. Em São Paulo, para onde se mudou em 1968, emprestou sua lenda à famosa quitinete na Rua Maria Antonia. Num espaço de cerca de 30 metros quadrados, acomodou um acervo gigante.

Segundo Eduardo Pontim, eram “mais de 30 mil partituras, cerca de 10 mil fotografias, aproximadamente 7 mil livros, cerca de 12 mil fonogramas de 76 e 78 RPM, 4 mil LPs e muito mais. Com tanto material em sua casa, a falta de espaço era natural, o que levou Tinhorão a viver sem fogão nem geladeira e a dormir num colchão de ar”.

Esse acervo foi comprado pelo Instituto Moreira Salles em 2001. E, dos parcos 31 metros quadrados em que se acumulavam, os materiais de Tinhorão foram retirados da quitinete em várias viagens de caminhão.

Vivendo de refeições de boteco a fim de que em sua residência coubesse tudo isso, alimentou mais ainda sua figura legendária. “Todos esses esforços e privações eram feitos para que ele pudesse documentar a música popular brasileira da maneira mais fiel e verdadeira possível, numa prova de devoção e paixão pelo que fazia”, constata o historiador Eduardo Pontim.

Ainda em São Paulo, fez uma breve concessão à universidade, concluindo seu mestrado em História Social na USP em 1999, sob orientação do professor Jônatas Batista Neto. A dissertação, intitulada A Imprensa Carnavalesca no Brasil, também virou livro. Foi um dos mais de 20 lançados em sua vida.

Como foi dito, tantas foram suas paixões e interesses. Mas a música, de todas, foi a que mais o marcou. Quando, da última vez, as vozes amigas se uniram para entoar O nosso amor morreu, parte dos versos da canção Rosa Maria, não era aniversário de Tinhorão. Sim, porque seus aniversários eram um acontecimento musical ao seu gosto: na calçada do bar, todos juntos, sem distinção. Desta vez, as vozes, as palmas e o surdo iam marcando uma homenagem diferente. Mas igualmente sonora e popular.(Jornal da USP-Gustavo Xavier)

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PETROLINA: FALTA DE EDUCAÇÃO AMBIENTAL PREJUDICA UM DOS MAIS BELOS PONTOS TURÍSTICOS NAS MARGENS DO RIO SÃO FRANCISCO

A falta de conscientização ambiental sobretudo no cuidado com o lixo descartado define uma das ações negativas presentes no Mirante do Urubu, localizado cerca de 20 km de Petrolina. 

A reportagem do BLOG NEY VITAL registrou neste final de semana o acúmulo de sacos plásticos, garrafas, louças quebradas, fraldas descartadas nas margens do Rio São Francisco.

Imagens traduzem o completo descaso e falta de empoderamento de informação cultural sobre a importância de se preservar e valorizar as belezas naturais locais.

Desde 2014, o Mirante do Serrote do Urubu é citado na Elaboração do Inventário e Hierarquização dos atrativos naturais com potencial Turístico do Polo do Vale do São Francisco. O Mirante do Serrote do Urubu situa-se a 376 metros de altitude em relação ao nível do mar, a aproximadamente 140 metros de altura, e distante aproximadamente 1 km da comunidade do Serrote, cuja principal atividade econômica é a agricultura. 

De fácil acesso, possui uma visão privilegiada do Rio São Francisco e de algumas ilhas, da vegetação da Caatinga e observação do por do sol. "É um atrativo que deveria ser bem cuidado pelos visitantes e também uma presença do poder público local, afinal é essencial a preservação deste local. Chamo a atenção dos setores público e privado, além da sociedade, para que cuidemos para que essas áreas se tornem mais agradáveis e bem cuidadas", declarou um dos visitantes.

O Mirante é um local aberto e não possui nenhum controle em relação à visitação e não há infraestrutura no local.

Em uma rede social consta um comentário: o mirante tem bastante potencial turístico, porém encontra-se sem nenhuma estrutura para recebimento de turistas. O lugar sobrevive apenas por sua bela paisagem da caatinga.

SERROTE: O lugar é uma formação rochosa elevada que dá nome à comunidade e fica próximo das margens do Rio São Francisco, um pouco antes do Balneário de Pedrinhas. Está situado a cerca de 20 km do centro de Petrolina (PE) e seu topo alcança 400m de altitude.

A rota a ser seguida para chegar ao Serrote do Urubu é a via conhecida como Estrada das Pedrinhas. Ao chegar no distrito que identifica o ponto turístico, basta acessar o lugarejo Salu, uma estrada de cascalho à direita e seguir por mais 1 km.

Ao terminar o caminho, estacione e comece uma trilha pelas redondezas para apreciar a vista. Você pode também se aproximar da margem e molhar os pés no Velho Chico, mas cuidado com a correnteza que é bastante forte.

NOTA PREFEITURA: A Prefeitura de Petrolina esclarece que, nos próximos dias, um fiscal visitará o local para avaliar o que pode ser feito de imediato na área. Vale ressaltar que todo cidadão tem o papel fundamental de zelar pelos espaços públicos do município. (Redação e Fotos Ney Vital)

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I SIMPÓSIO INTERNACIONAL SOBRE CULTURAS E LITERATURAS POPULARES ACONTECE EM DEZEMBRO

O I Simpósio Internacional sobre Culturas e Literaturas Populares prorroga o período para proposição de Grupos de Trabalho (GT’s), até o dia 31 de agosto. 

O evento acontece de 6 a 9 de dezembro em formato virtual, com transmissão pelos canais da URCA e do Ipesc, na Plataforma YouTube. As inscrições podem ser realizadas através do siseventos.urca.br.

O evento é uma realização da Universidade Regional do Cariri (URCA), através do do Instituto de Pesquisa José Marrocos (Ipesc), em parceria com diversas instituições, como a Universidade Estadual do Ceará (UECE), Universidade Vale do Acaraú (UVA), Universidade Federal do Cariri (UFCA), Universidade de Integração Internacional da Lusofonia Afro-Brasileira (UNILAB) e a Secretaria de Cultura do Estado do Ceará. 

O simpósio contará com mesas redondas, grupos trabalhos, conferências, oficinas, depoimentos de mestres, exposições e apresentações de vídeos, além de pesquisadores e estudiosos do Brasil e outros países.

O simpósio tem seis eixos e oito mesas redondas. As abordagens estarão relacionadas a Saberes, vivências e ancestralidades: as artes do sagrado; Fazeres da artesania na teia da tradição; Poéticas populares do corpo e da voz: cantigas, performances e brincadeiras; Narrativas: oral, impressa e cibernética; Cultura popular na formação humana, no cotidiano escolar e nas universidades; e Patrimonialização da Chapada do Araripe, Araripe Geopark e Museus Orgânicos – iniciativas de salvaguarda do patrimônio natural e cultural.

Cada um dos eixos repercute em outros temas geradores que estarão representados em oito mesas redondas com temas como: A religiosidade popular e as artes do sagrado, Vivenciando a cultura popular tradicional: saberes, ofícios e os tesouros vivos”; Patrimônio cultural imaterial e estratégias de salvaguarda: os casos da Literatura de Cordel, da Festa do Pau da Bandeira de Santo Antônio de Barbalha e da Xilogravura.

Também entram nos debates temas como a Cantoria e cultura popular, cultura hip hop e demais culturas de rua; Cultura afro-brasileira, quilombos e capoeira; Escritas, narrativas e diálogos culturais: circularidades, movências e hibridações; Cultura e literatura popular na educação;  e  Povos Originários e Arqueologia Social Inclusiva. (Fonte: Urca)

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BRASIL, COLAPSO AMBIENTAL: DADOS INÉDITOS REVELAM QUE O FOGO ESTÁ DESTRUINDO OS BIOMAS BRASILEIROS

Um alerta para a humanidade: esta semana, o Painel de Cientistas da ONU para Mudanças Climáticas divulgou um relatório preocupante sobre o que fizemos com o nosso planeta e as consequências que já estamos enfrentando.

Vamos viver essas consequências em escala ainda maior durante séculos, dizem os cientistas. Eles avaliaram 14 mil estudos e é evidente a responsabilidade das ações humanas no aquecimento do planeta.

Ontem domingo (15), o Fantástico estreia uma série sobre a devastação do meio ambiente no Brasil. O que ainda pode ser feito? Como está o ar que a gente respira e a qualidade das águas?

No primeiro episódio, os repórteres Sônia Bridi e Paulo Zero mostram dados inéditos que revelam como o fogo está destruindo os biomas brasileiros.

Hoje, a concentração de CO2 no planeta é quase 50% maior do que há um século e meio. A temperatura média já subiu 1.1ºC - pode parecer pouco, mas é esse um grau a mais que intensifica furacões e faz grandes áreas do planeta serem consumidas pelo fogo, até nos lugares onde o solo deveria estar congelado.

Pela primeira vez, as projeções do clima detalham o que vai acontecer em cada região do planeta em cada cenário. No Brasil, as previsões são de queda da produção agropecuária e de aceleração do processo de desertificação da caatinga, por exemplo. A Amazônia é especialmente vulnerável e pode colapsar em um mundo quatro graus mais quente.

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MORRE SEU BILINO, MESTRE TOCADOR E AFINADOR DE SANFONA DE 8 BAIXOS

“As pessoas não morrem, ficam encantadas… a gente morre é para provar que viveu...O homem nasceu para aprender tanto quanto a vida lhe permita”. A frase é do escritor João Guimarães Rosa. 

Através da produtora cultural Marlla Teixeira, lá de Exu, Pernambuco, terra de Luiz Gonzaga, recebi a notícia que Seu Bilino, tocador de sanfona de 8 Baixos, desencarnou em Barbalha Ceará. "Seu Bilino partiu. Morreu. Fez a Viagem para o Sertão da Eternidade", neste sábado 14 de agosto.

Andar pelos sertões sempre me proporciona encontros, amizades, trocas de saberes! Novos conhecimentos. Entre Exu e Serrita encontrei certa vez, o "Mestre Bilino". Antônio Felizardo Alves, bom proseador e afinador de sanfona de 8 Baixos. Seu Bilino também tocava sanfona de 120 baixos. Mas era apaixonado mesmo pela arte de tocar a sanfona de 8 Baixos. Fazia questão de frisar: Sou afinador de sanfona, dos 8 aos 120 baixos.

Seu Bilino começou a tocar ainda era menino, em 1958, quando seu pai comprou uma sanfona de 8 Baixos pra ele. Naquela época os forrozeiros tocavam nos casamentos, nos aniversários. “Ele, meu pai comprou uma sanfona pra eu tocar pra ganhar um dinheirinho. Nessa época o povo tocava à noite toda”, afirmando, que veio de uma família de  músicos.

Seu Bilino dizia que não era tocador profissional. Sua profissão mesmo era afinador de sanfona: “Meu ramo mesmo é ser afinador de acordeon, quando o fole se acaba eu também recupero”, diz ele.

Seu Bilino era fabuloso. Viveu no sertão místico disparando linguagem dos sanfoneiros para disfarçar sua genialidade, simplicidade sertaneja e grandiosidade humana. Seu Bilino tinhas sonhos plantados em notas musicais teclados em sua sanfona.

O sanfoneiro, pesquisador Leo Rugero, aponta que a "Sanfona de 8 Baixos, Pé de Bode ou Fole de 8 Baixos, como também é chamado é um instrumento fundamental para a música nordestina e brasileira. No nordeste do Brasil, ele adquiriu características de afinação próprias que o tornaram diferente. Portanto, no nordeste ele desenvolveu um sotaque próprio, que é representativo de nossa cultura. Representa, além de uma tradição musical, um saber único".

Atualmente, a arte do tocador de sanfona de 8 baixos está ameaçada, porque seus instrumentistas não encontram mais espaço merecido nas programações de Rádio e Televisão. O Tocador de 8 Baixos é capaz de agregar uma comunidade e produzir cultura, representá-la e difundi-la, contribuindo para o fortalecimento de nossa própria identidade.

Em 2013, Seu Bilino, contou para a jornalista Maria Peixoto, portal da Cultura de Pernambuco que teve dois mestres, um foi seu pai, que lhe ensinou duas coisas, uma é que “a música é pra ser tocada com carinho e amor, bem e sempre feliz”. A outra é que tem músicas que devem ser guardadas pra momentos especiais. “Meu pai dizia ‘Num toque essa música atoa não. Toque num momento especial, que você fica feliz e eu também fico”, ensina.

O outro mestre de Bilino foi Severino Januário, irmão de Luiz Gonzaga.  “Eu tocava com Severino Januário, eu considero ele meu mestre. Eu toco as músicas dele, tem gente que até chora. Hoje eu estou tocando as letras dele por causa dele. É um xote tão bom de dançar que todo mundo arrupeia os cabelos”, brinca Bilino.

Ele só fica triste com a falta de reconhecimento do seu mestre “Severino dos 8 Baixos não era mostrado na televisão. O homem tocava um 8 Baixos daquele jeito e num era mostrado. Eu fiquei meio triste, andei um tempo sem tocar”, conta o tocador que também não tem a atenção dos holofotes, apesar de seu talento merecido.

O vínculo com a família de Luiz Gonzaga começou desde cedo, Seu Bilino conta que seu pai só afinava o instrumento com Seu Januário: “Ele trazia o 8 Baixos dele porque ele era mestre, aí quando a sanfona dele quebrava.  Ele vinha pra aqui”. E, Bilino, criança, vinha dentro de um caçoá, de Serrita, sua cidade, para Exu.

Em vida Seu Bilino teve consciência de que estava cada vez mais raro achar pelas bandas do Araripe um tocador de 8 Baixos, “Daqui a uns 50, 100 anos quem tocar 8 Baixos vai ser chefe majoritário do mundo inteiro”, Bilino sente prazer quando consegue passar seu conhecimento a alguém “A coisa que  eu acho mais feliz no mundo é eu dar aula pra uma criança, de 8 Baixos, porque de acordeon tá cheio já de tocador”

“Eu não posso abandonar essa carreira até o fim da minha vida. Eu estou feliz desse jeito, porque dinheiro num é tudo na vida não. Eu sou um cara da roça, do mato, eu tenho um sitiozinho que eu plantei, tem 16 pés de coco. As filhas vem do meio do mundo passear. Eu acho bom estar no meio da terra aqui escutando Luiz Gonzaga tocar, chega um amigo, conversa comigo, chega outro”, conta o humilde tocador do fole típico do Sertão que hoje se tornou preciosidade.

Descanse em Paz, amigo sanfoneiro Seu Bilino.

*Texto: Ney Vital-Jornalista. Apresentador do Programa Rádio Nas Asas da Asa Branca-Viva Luiz Gonzaga e Seus Amigos.


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MESTRE ESPEDITO SELEIRO RECEBE CERTIFICAÇÃO DE REGISTRO DE MARCA E PROTEGE AS SUAS CRIAÇÕES ARTÍSTICAS

 “Sou mestre no meu ofício de colorir o couro, fazer meus arabescos, corações e trabalhar as peças”. Ressaltando seu trabalho, foi com essa mensagem que o mestre da Cultura e artesão cearense Espedito Seleiro comemorou em seu perfil no Instagram o recebimento do certificado de registro de marca do Instituto Nacional da Propriedade Industrial (Inpi).

Com isso, o artista pode usar sua marca com exclusividade e fica protegido de possíveis cópias de terceiros de seu trabalho.

“O que foi protegido foi a marca para todos os produtos e serviços que ele desenvolve, o que garante uso exclusivo dela em artigos de couro, vestuário e na comercialização dos produtos em geral”, explica o advogado Bruno Figueiredo, atual responsável pelo caso.

Com isso, conforme explica o professor de Direitos Culturais da Universidade de Fortaleza, Humberto Cunha, há uma valorização das peças, e quem violar o uso de uma marca reconhecida como a do Mestre Espedito Seleiro estará sujeito a pagar indenização e até a responder criminalmente.

O registro de marca é realizado pelo Inpi, que visa garantir e proteger a propriedade intelectual devidamente cadastrada no órgão. O certificado permite ao autor a exclusividade e a propriedade de sua marca, resguardando-o, assim, de cópias e apropriações de obras por terceiros. O documento tem validade de dez anos e pode ser renovado a cada década.

Essa conquista vem de um “sonho” de muitos anos de Espedito Seleiro. Em entrevista o artesão relatou o alívio pelo recebimento do certificado. Ele buscou o registro junto ao Inpi para resguardar suas obras de reproduções indevidas por outras pessoas. “É uma coisa que a gente trabalha muito e às vezes não tem o reconhecimento aonde chega. Por exemplo, se eu faço um chapéu, aí vai ter outra pessoa que vai querer fazer igualzinho e não vai considerar quem criou o modelo”, comenta.

Além disso, encara como uma forma de deixar registrado para gerações futuras as origens de sua arte. “Procurei registrar também porque amanhã ou depois as pessoas vão saber quem criou a arte e quem a está mantendo, porque isso é uma coisa que é um sonho meu desde que sou criança, que eu comecei com meu avô e com meu pai”, alega.

Entre as suas obras mais copiadas estão sandálias e bolsas que seguem o seu estilo característico de arte em couro. “Eu não tô proibindo ninguém de fazer bolsa, sandália ou chapéu. Pode todo mundo fazer. Agora, o que eu não quero é que façam o estilo do desenho que eu criei e que traz uma característica minha”, ressalta o mestre da Cultura.

O artesão também relata que sentiu um impacto grande nas vendas de seus produtos durante a pandemia, com diminuição considerável no ritmo de aquisições por clientes. Entretanto, ele acredita que o fluxo está melhorando aos poucos. As peças mais procuradas, segundo Espedito Seleiro, são “sandálias da Maria Bonita”, o “chapéu de Lampião” e gibão.

Mesmo diante das dificuldades da pandemia, o artesão ressalta o gosto pelo seu trabalho: “Eu já passei por aperto muito pior. Já teve sufoco que eu vi a hora de fechar tudo e eu aguentei porque eu gosto do meu trabalho, adoro trabalhar com couro e é uma coisa que vem de família já há cinco gerações”, conclui. 

HISTÓRIA:  Espedito Seleiro produz calçados, bolsas, chapéus, carteiras, bancos, poltronas, além das selas, gibões e outros elementos da cultura vaqueira que estão sempre presentes. O artesanato é feito com couro de cabra, pelica e camurça compradas em diversas cidades do Nordeste. Suas peças são vendidas em outros estados e exportadas para outros países.

Alguns produtos se destacam como muito característicos do mestre artesão, como é o caso das sandálias de Lampião e de Maria Bonita. 

A confecção das sandálias foi inspirada por uma passagem da história do seu pai. Um dia, um cliente chegou com o desenho de uma sandália “quadrada” que encomendou do pai de Espedito. Alguns dias depois, quando voltou para pegar a encomenda, aprovou a sandália e revelou ser cangaceiro do bando do Capitão Virgulino. A sandália com o formato quadrado tinha uma função bem prática para o bando por despistar os rastros deixados pelos calçados nas areias do sertão. Anos depois, a pedido do músico Alemberg Quindins, idealizador da Fundação Casa Grande – Memorial do Homem Kariri, Espedito confeccionou uma sandália igual a de Lampião. Logo em seguida, criou também a sandália de Maria bonita.

“Seu” Espedito nasceu em 1939, registrado como Espedito Veloso de Carvalho, mas o ofício de seleiro, exercido desde cedo, o fez ser conhecido como Espedito Seleiro. Filho de vaqueiro, “seu” Espedito nasceu em Arneiroz, no Ceará, e aprendeu bem novo, aos oitos anos, com seu pai, o ofício de seleiro, confeccionando selas e outros equipamentos para vaqueiros, tropeiros e cangaceiros. Seu pai faleceu ainda novo, deixando dez filhos e algumas ferramentas de ofício. 

Espedito, o mais velho dos dez filhos, começou passou a sustentar toda a família, com a confecção de selas. Nessa época já viviam em Nova Olinda e a venda foi ficando cada vez mais difícil, por conta da queda do trabalho de vaqueiro, resultado da crise na pecuária vivida após a mais longa estiagem do século XX que assolou o Ceará por longos cinco anos, entre 1979 e 1984. 

Seu espedito começou a fazer a fazer outras peças em couro, como sandálias e bolsas e passou a usar cores. Tornou-se um investigador de pigmentos naturais e técnicas de tingimento de couro e assim, descobriu o angico que tinge de marrom, o urucum que traz o vermelho, a cinza da capimbeira que colore de branco. Com o tempo, criou uma estética própria que valoriza os desenhos e as cores, resultado da influência cigana, povo que admira e que, quando novo, o fascinava pelas vestimentas e adornos.

Um dia, Espedito se deu conta de que, com o falecimento do pai, o conhecimento que vinha sendo passado desde seu tataravô poderia morrer com o seu próprio falecimento. Decidiu, assim, ensinar o ofício aos seus irmãos, depois seus filhos e mais recentemente os netos. Mais tarde, fundou a Oficina Escola Espedito Seleiro que passa para os mais jovens além do ofício, a percepção de que esse saber-fazer é parte de uma cultura, de um modo de viver que está vivo, e pode seguir vivo dentro de cada um deles. Hoje, Espedito Seleiro é mestre da cultura, reconhecido oficialmente pelo Governo do Estado do Ceará e pelo Ministério da Cultura. Em 2017, recebeu o título de Notório Saber pela Universidade Estadual do Ceará (Uece).

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FILHOS DE ZAZE CANTAM PELO FIM DA INTOLERÂNCIA RELIGIOSA EM LIVE NESTE SÁBADO (14)

"No meu coração toca o xequerê / no meu coração bate o atabaque / no meu coração é o toque do agogô / dez anos do Filhos de Zaze com muito amor". Celebrando uma década de existência e o lançamento do primeiro álbum, o grupo baiano apresenta, neste sábado (14), uma live, a partir das 20h, no seu canal do YouTube.

No show virtual, gravado no terreiro Ilê Axé Ayráonyndanco, situado no bairro Quidé, em Juazeiro, Bahia, berço do grupo, o público vai poder conferir as quatro canções autorais do álbum que tem como lema "Os Filhos de Zaze cantam pelo fim da intolerância religiosa", e outras releituras que marcam a história no grupo nesses 10 anos de existência e resistência.

"Ter gravado nosso primeiro álbum foi muito gratificante, pois é um sinal que estamos resistindo, em meio a esse tempo difícil que estamos vivendo, ainda mais para nós que somos de matrizes africanas. Estamos recebendo muitos elogios de pessoas de outros estados e países, e isso é muito gratificante. O Zaze sempre se propôs a ir pra cima, quebrar preconceitos. Essa live vai ser um canto pelo fim da intolerância religiosa", disse José Rosa, presidente do Afoxé Filhos de Zaze. 

O disco do grupo está disponível nas principais plataformas de mídia e streaming.  A gravação de todo o material foi realizada no Estúdio Casinha Lab, em Juazeiro, Bahia, com o assessoramento do produtor musical Iago Guimarães e a produção executiva de Geraldo Júnior, à frente da Opará Produtora Cultural

O projeto é uma realização do grupo Afoxé Filhos de Zaze em parceria com a Opará Produtora Cultural e tem o apoio financeiro do Estado da Bahia, através da Secretaria de Cultura e do Centro de Culturas Populares e identitárias (CCPI) via Lei Aldir Blanc, direcionada pela Secretaria Especial da Cultura do Ministério do Turismo, Governo Federal.  (Ascom: Opará Produtora Cultural Fotos: James Jonathan)

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