A noite é de São João. A história tece com a força da própria vida

Mês de junho! A última apresentação em vida de Luiz Gonzaga foi realizado em 6 de junho de 1989, no Teatro Guararapes do Centro de Convenções de Recife. Na oportunidade já cansado e muito doente Luiz Gonzaga chorou e pediu "prá não deixar o forró morrer".

Lembrei que estive em Exu, no período junino. Não vi os olhos raros que enxergam além dos que veem. Na terra onde nasceu Luiz Gonzaga, a mensagem não se fez ouvir.


Joquinha Gonzaga, neto de Januário e sobrinho do Luiz Gonzaga, lamenta a injustiça de em plena noite de São João não haver em Exu, Pernambuco, um forró pra lembrar o inventor do Baião, aquele que um dia deixou o seu pé de serra e embrenhou-se pelos emaranhados da busca e do sonho e que foi o começo de uma grande empreitada e de uma desafiadora lição de vida e vivência.

Mas a vida é realizada nos extremos. O  amor e o ódio. O real e o fantástico, a dor e o prazer, a amizade e a covardia, o breu da incerteza e a luminosidade da esperança, o medo e a ousadia, o erro e a redenção, o pecado e o perdão, a fé e a crendice, a tristeza e a festa.

Na Serra do Araripe, divisa com o Ceará, o passado ainda está presente, e o presente simboliza o futuro. Luiz Gonzaga vive!

Na fazenda Araripe um dos mais valiosos símbolos da obra e vida de Luiz Gonzaga, a família Alencar guarda construções que marcaram a vida de Luiz Gonzaga. A casa onde morou os pais do Rei do Baião, Januário e Santana, a igreja de São João Batista, a residência do Barão de Exu...a terra, o fogo, o ar e água tudo ali lembra Luiz Gonzaga.

Na Chácara Frei Damião, distante 26 km do Crato-Ceará, próximo a Exu, "Seu Cosme e dona Maria Cavalcante de Souza" entregam-se a essencia da alma e faz da noite junina um sentimento mais humano.

A família, amigos e vizinhos, medem palmo a palmo a vastidão do imaginário popular e desvendam a perfeição dos sonhos e anseios, a fé e as várias conquistas.

Na casa da família Cavalcante Souza havia mesa fartura de pamonha feita com manteiga da terra. A buchada e a cachaça, a galinha de capoeira. O milho, a rapadura e a fogueira, a manifestação plena da essencia humana e grandiosidade da noite de junho.

No alpendre da casa escuto a professora Antonia Ladislau de Sousa, no balançar da rede, contar fatos que são ao mesmo tempo belos e misteriosamente encantados. Professora Antonia me faz compreender as figuras humanas mais humanas, a criaturas belas, mais belas, a natureza das pegas de bois, as origens de Cocaci, os Inhamuns-Ceará.

Professora Antonia ao falar, os olhos faíscam de astros a escuridão da noite humana e se faz perceber entre vaga lumes e querubins a essência que reluz do que havia se perdido e ali encontrava as respostas para a própria razão de sonhar e viver.

Seu Cosme acompanhado de seu Zé Lira me levou ao sitio Salva Vidas. Nome sugestivo quando vi o povo a rezar a Novena de joelhos. Havia ali a Capela São Francisco e escutei histórias de muitos que vieram ao mundo pelas mãos da parteira do local.

Tudo isto me fez lembrar da profecia do professor, danado e cantador, quase vidente, Aderaldo Luciano quando diz que o Nordeste continuaria existindo caso Luiz Gonzaga não tivesse aterrissado nestas paisagens há mais de cem anos.

O Nordeste teria e seria o mesmo complexo de gentes e regiões. Comportaria os mesmos cenários de pedras e areias, plantas e rios, mares e florestas, caatingas e sertões.

Luiz Gonzaga, mais que ninguém, brindou-nos com uma moldura indelével, uma corrente sonora diferente, recheada de suspiros, ritmos coronários, estalidos metálicos. Luiz Gonzaga plantou a sanfona entre nós, estampou a zabumba em nossos corpos, trancafiou-nos dentro de um triângulo e imortalizou-nos no registro de sua voz.

Vi em Exu, Chácara Frei Damião, Sitio Salva Vidas, Crato, Vi galos anunciando o dia, sabiás acalentando as horas, acauãs premeditando as tristezas, assuns-pretos assobiando as dores, vens-vens prenunciando amores.

Enfim, compreendi que a história vem se tecendo com a força da própria vida. E por isto, disse o cantador Virgilio Siqueira: daí não ser possível guardar na própria alma a transbordante força de uma causa. Daí não ser possível retornar, afinal, a gente nem sabe ao certo se de fato partiu algum dia...

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Legião Urbana é uma tapa na cara de nossa geração que permitiu que o mundo piorasse nos valores, nos preconceitos

Valter Hugo Mãe talvez seja o mais importante escritor de língua portuguesa da atualidade. Ele é animado por um sentimento de profundo humanismo ao abordar as situações mais dramáticas de nosso tempo nas ficções Desumanização, Apocalipse dos trabalhadores, Homens imprudentemente poéticos ou O paraíso são os outros. Neste último, por exemplo, ele polemiza com a célebre frase do filósofo francês Jean-Paul Sartre: “O inferno são os outros”.

Em Desumanização, Valter já confrontava Sartre. Lá, a personagem de outra menina diz: “O inferno não são os outros, pequena Halla. Eles são o paraíso, porque um homem sozinho é apenas um animal. A humanidade começa nos que te rodeiam, e não exatamente em ti”.

Valter veio ao Brasil para uma maratona de palestras, debates e homenagens. A principal delas é a participação na Fliaraxá. Ele aproveita para lançar três livros, pela Coleção Azul, da editora Globo: O nosso reino, romance de estreia; Contos de cães e maus lobos, e As mais belas coisas do mundo.

Ele sempre diz as palavras essenciais. Valter tem uma conexão inesperada com Brasília: ele é fã da Legião Urbana e se comove profundamente quando ouve a canção Tempo Perdido: “Legião Urbana, para mim, é uma acusação”, diz Valter em entrevista ao Correio, por e-mail. “Um tapa na cara de nossa geração que, como poucas, permitiu que o mundo piorasse nos valores, nos preconceitos. Sim, comove demasiado”.

E, nesta entrevista, ele fala de Legião Urbana, de poesia, de humanismo, da polêmica com Sartre, do poder da leitura, da gentileza e da boa fé como resistência humana.

*Você já mencionou a importância que teve a Legião Urbana em sua vida. Mas peço a gentileza de contar essa linda história para os brasilienses. É verdade que você se comove sempre que escuta Tempo perdido? O que te toca na música e na poesia da Legião?
Na verdade, julgo que me toca a evidência de estar perto dos 48 anos e não ter conseguido salvar o mundo como acreditei ser possível quando tinha 18. Essa canção significa muito tempo passado, muita esperança repensada, a covardia e a absoluta normalidade. Alguma coisa me obrigou a ser normal. Eu preferia ter seguido acreditando num mundo de conquista terna, onde as pessoas mudariam de conduta à medida do conhecimento, da aprendizagem. Mas nós, as pessoas de quase 48 anos, já sabemos que isso não acontece. 

As pessoas raramente mudam de conduta depois de conhecerem como fazer melhor. E as pessoas raramente querem saber fazer melhor. Envelhecemos como quem exige o direito de não saber mais nada. Legião Urbana, para mim, é uma acusação. Um tapa na cara de nossa geração que, como poucas, permitiu que o mundo piorasse nos valores, nos preconceitos. Sim, comove demasiado. É uma bela canção acerca de termos entregue o ouro a quem conseguiu nos convencer que era prova de amizade.

**Você começou escrevendo poesia e, quando passou para a ficção, impregnou as narrativas de força poética. Qual a relevância da poesia em sua formação de escritor e o poder que ela ainda tem de tocar as pessoas?
A poesia é um sentimento. Não significa menos do que isso. Quem não se abeira dela não sente por completo, como se nunca experimentasse a alegria ou a tristeza, a ansiedade ou a frustração. Serve para que nos completemos no conhecimento de nós mesmos e do mundo. É instrumento de revelação. Sem o poder da palavra poética estamos algo diminutos na construção de nosso pensamento, de nossa identidade. Sigo convencido de que é na poesia que reside a maior força de que sou capaz. É meu tremendismo.

***Em O paraíso são os outros, você polemiza com o filósofo Jean-Paul Sartre, autor da célebre frase: “O inferno são os outros”. Você acha que, mesmo em um mundo tão movido por uma agenda do ódio, o paraíso ainda são os outros?
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Penso, sim. Somos justificados pela existência dos outros. Sem eles, não ascenderíamos acima da condição de bicho. É a alteridade que burila a humanidade. A relação e a expectativa da relação vão dirimindo argumentos para que, como seria bom, nos depuremos. O problema está em que melhorar o mundo inteiro é um ofício praticamente impossível, mas piorar o mundo inteiro é fácil, está ao alcance de qualquer imbecil.

****Você acredita que os livros ainda têm lugar no mundo mediatizado pelas relações virtuais? Em que medida os livros escolhem os leitores e entregam mais a uns do que a outros, como afirma no conto O rapaz que habitava livros?
Vão ter sempre lugar. Não acredito que seja um conhecimento de que a humanidade possa abdicar. Claro que enfrentamos um tempo de criação de gigantes rebanhos, padronizações agudas que desvirtuam as pessoas de cidadania e as reduz ao consumo. No entanto, sempre haverá resiliência. Há muita gente que se recusa a compactuar com a fácil manipulação das massas e, na verdade, não considero que as massas sejam estúpidas. Podem ser lentas e tender para a covardia, mas no seu íntimo sabem perfeitamente o que é certo e o que é errado. As elites precisam ser melhores, ter outro brio, e servir de diapasão para inspirar a movimentação benigna das comunidades em geral.

*****As suas narrativas abordam, muitas vezes, situações dramáticas do nosso tempo, mas sempre com um olhar humanista. Você acredita que a literatura ainda é capaz ser um espaço de resistência do humanismo em um mundo cada vez mais mecanizado e pós-humano?
Eu não poderia escrever de outro modo, minhas convicções são quem sou. Uso os livros para aprender. Descubro que escrevo para ser capaz de decidir melhor. É exatamente a questão da cidadania de que falava acima. Escrevo livros sobre o que me agride e preciso de entender. Talvez seja um cidadão mais consciente depois de os escrever. Isso significa que, a ser chamado à opinião ou ao voto, que é um pouco a mesma coisa, estarei mais bem preparado para decidir em que acredito, o que, de boa fé, desejo para a sociedade. Interessa-me profundamente a questão da boa fé. Manter a boa fé, por maior agressão ou desilusão. Ela é a resiliência mais profunda e mais bela.

******Machado de Assis é o homenageado do festival literário do qual você participará em Minas Gerais. Qual o seu olhar sobre Machado e como viu a polêmica entre Machado e Eça de Queiroz?
Polêmica nenhuma diminui Machado ou Eça, apenas aumenta. São dois escritores estruturais. Nossas literaturas são instruídas pelo que descobriram, pelo que entenderam. Machado é brilhante na criação de narradores que não merecem confiança. São ardilosos, espíritos paradoxais e com grande habilidade retórica, sempre denunciando falhas no senso comum. Ele joga com nossa percepção. Inverte o jogo constantemente, mostra como, exatamente iguais às pessoas, as personagens são também inclassificáveis, oblíquas constantemente, para usar um termo seu.

*******Nelson Rodrigues dizia que os humanos estão se maquinizando e as máquinas estão se humanizando. O amor é a única força capaz de resistir à maquinização humana em tempos de globalização e de desumanização?
O afeto e a paz foram sempre os sinais de humanidade. Através deles aferimos a qualidade de cada pessoa. Foi assim, é assim, vai ser assim. O amor para com as pessoas próximas, aquelas que simbolizam toda a gente nas nossas vidas. A paz com as outras pessoas. As que nem sabemos que existem, que são estatísticas. Seremos humanos se lhes oferecermos nossa cordialidade e promessa de tempos gentis. O tempo gentil, a paz.

********Você já declarou que o Brasil é o melhor que Portugal criou. O que lhe interessa e lhe sensibiliza no Brasil?
Preciso de esclarecer que essa ideia é do filósofo português, que viveu longamente no Brasil, Agostinho da Silva. Cresci impressionado com a cultura brasileira, fascinado com sua música e literatura, com sua televisão, cinema e pintura. Não tive escolha. O Brasil estava na arte, entre a arte de que mais gostei sempre. Através desse fascínio eu cheguei ao país, visitando pelas ideias e, depois, concretamente, encontrando um povo de festa fácil, abraço abundante, num esforço trememdo para criar redenção, não sucumbir à pobreza ou à violência. 

Admiro muito que num desafio tão grande, com tanta ditadura, inflação, corrupção, homicídio, ainda estejamos no país do Carnaval, essa alegria intensa, incontrolável, que arrebata o mundo inteiro. Eu, que sou tímido, não tenho jeito para Carnaval, mas admiro como sendo a festa mais avassaladora do mundo inteiro. Nada se lhe compara em esforço e beleza, em profunda liberdade e catarse. Abençoado Heitor Villa-Lobos que soube classificar o Carnaval para esse instante de irresistível comunhão entre todos, de todas as classes, de todas as sensibilidades. Esse é o Brasil que ausculto, aquele que resiste de sorriso franco, pé de dança, como melhor arma contra toda a opressão, contra toda a tristeza.
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Correios: Selo Marca Centenário de Nascimento De Nelson Gonçalves

Na próxima sexta-feira (21), os Correios lançarão a emissão comemorativa em homenagem ao centenário de nascimento do renomado cantor brasileiro Nelson Gonçalves. Em São Paulo, o selo será apresentado no Bar do Nelson, em Santa Cecília, a partir de 21h. Também haverá eventos nas cidades do Rio de Janeiro e Santana do Livramento (RS).

Considerado o maior intérprete do Brasil, dono de uma voz única, Nelson Gonçalves vendeu mais de 80 milhões de discos e conquistou o título de “O Rei do Rádio” nos anos 40. Antônio Gonçalves Sobral foi seu nome de registro, depois alterado em cartório pelo artista: “Ele decidiu mudar para Antônio Nelson Gonçalves”, diz Margareth Gonçalves, filha do cantor. 

Nascido em Santana do Livramento, no Rio Grande do Sul, mudou-se para São Paulo ainda criança. O jovem franzino e um pouco gago, conhecido como “metralha”, trabalhou como jornaleiro, mecânico, engraxate e lutador, mas tinha na música sua grande paixão. Foi aluno do maestro Bellardi, que o aconselhou a se dedicar ao estilo popular.

No final da década de 1930, foi para o Rio de Janeiro para participar de testes nas principais emissoras de rádio da época. Sem conquistar espaço, escutou até de Ary Barroso que devia “retornar a São Paulo para desenvolver-se em alguma outra profissão”. 

Foi na capital paulista que, a partir de outros contatos e muita insistência, recebeu o primeiro convite para gravar a valsa “Se eu pudesse um dia”, de Orlando Monella e Oswaldo França. Esse foi o começo de sua carreira, com a gravação do primeiro disco, em 1941, um 78 RPM contendo o samba “Sinto-me bem”, de Ataúlfo Alves. 

Mais tarde, fechou contrato com a gravadora RCA Victor e com a rádio Mayrink Veiga. Único brasileiro a ser agraciado com o Prêmio Nipper, ao lado de Elvis Presley, por ter permanecido durante 5 décadas na mesma gravadora. Suas interpretações permanecem vivas na memória de seus fãs.

Alguns números da carreira de Nelson Gonçalves (1919-1998): 50 anos de dedicação à música; 81 milhões de cópias vendidas; 2.740 canções gravadas em 183 discos em 78 rpm, 128 LPs e 300 compactos; conquistou 38 discos de ouro e 20 de platina.

Nelson Gonçalves e Luiz Gonzaga entraram juntos na RCA e regravaram a composição Asa Branca.

Na última década de vida, foram lançados mais de 20 CDs com suas interpretações. O último, “É Cedo”, rendeu-lhe o Disco de Ouro, por ter vendido mais de 100 mil cópias em 3 meses, marca atingida por poucos artistas de sua época.

Margareth se emociona ao comentar sobre o selo: “tenho grande orgulho do meu pai. Sou grata à vida por ter me colocado ao seu lado, trabalhando por mais de uma década como sua empresária. Agradeço muito aos Correios por ter programado essa homenagem”. 

Sua irmã, Lilian Gonçalves, destaca a importância da obra do cantor para o país: “o Brasil precisa olhar para sua história e lustrar a memória dos seus grandes nomes, que fazem a cultura brasileira, especialmente a música, que tem reconhecimento internacional. Basta lembrar a frase de Frank Sinatra: ‘a mais bela voz do mundo é de um brasileiro, e ele se chama Nelson Gonçalves’!”
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Petrolina: Jorge de Altinho agita São João 2019 e o domingo (16) terá Elba Ramalho, Maciel Melo e Geraldo Azevedo

Milhares de pessoas foram ao Pátio de Eventos Ana das Carrancas, ontem sábado (15), para aproveitar a segunda noite do ‘Melhor São João do Brasil’, promovido pela Prefeitura de Petrolina. Durante as cinco apresentações da noite, os petrolineses e turistas cantaram, dançaram e entraram no clima das interpretações de Jorge de Altinho, uma das principais atrações da noite.

A cantora Fabiana Santiago deu às boas vindas ao público que fez questão de chegar cedo. Com figurino típico do período junino e potência vocal, a cantora recepcionou o público com muito forró. 

Em seguida veio o pernambucano, Jorge de Altinho mostra a valorização do forró cada vez mais atual e contemporaneo.  Abrindo o show com o sucesso 'Confidência', composição sua e de Petrucio Amorim, Jorge de Altinho iniciou sua participação no São João de Petrolina. 

De volta ao São João de Petrolina, o cantor Devinho Novaes subiu ao palco logo depois das 21h30. Trazendo seu novo repertório para o público do Vale do São Francisco, o artista fez o povo cantar os novos sucessos da sofrência, sem esquecer o repertório que o projetou a partir do ano de 2017.

 O quarto a subir ao palco é também a revelação do momento no cenário musical do forró. Pela primeira vez na grade das atrações principais do São João de Petrolina, o cantor Vitor Fernandes trouxe para o público da festa o ritmo que ele intitula de “piseiro”.

Vitor fez milhares de pessoas cantarem em corro um dos sucessos mais escutados do momento: “Bebe, vem me procurar”. Ao longo do show, o artista fez questão de manter contanto com o público. “É muito gratificante porque é um show em casa. Eu sou petrolinense e estou muito feliz de poder apresentar meu trabalho ao público da região. Eu sempre sonhei e esse momento chegou”, destaca.

Quem ficou com a responsabilidade de fechar a noite foi a banda Magnifícos que levou para os apaixonados pelo forró um repertório com muitas canções antigas e um mix de sucessos da atualidade. 

O ‘Melhor São João do Brasil’ segue neste domingo (16), a partir das 19h, com apresentações de Elba Ramalho; Geraldo Azevedo; César Menotti & Fabiano; Maciel Melo; Solteirões do Forró e Elisson Castro.

Ascom Prefeitura de Petrolina Fotos: Alexandre Justino e Jonas Santos
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Como Euclides da Cunha criou o mito do sertão em sua obra-prima e Lamentarei se o tom da homenagem na Flip 2019 for somente apologista

Euclides da Cunha será o homenageado da Flip 2019. Nada mais justo. No ensaio Euclides da Cunha: Revelador da Realidade Brasileira, Gilberto Freyre já o referia como um dos escritores brasileiros de maior influência sobre o nosso povo, e que chamava atenção dos estrangeiros para a cultura em geral e para as letras em particular, de um ainda obscuro Brasil. 

Mesmo não havendo nascido no sertão de que trata em sua obra, Euclides foi quem mais contribuiu para codificar o que lhe pareceu sertão, guiando leitores e gerações futuras a buscarem o modelo estabelecido de semiárido habitado por bárbaros, num processo semelhante ao dos orientalistas em relação ao Oriente.

 Da mesma maneira que o Oriente é corrigido e penalizado por estar fora dos limites da Europa e América do Norte, o sertão do Nordeste brasileiro sofre processo semelhante por se encontrar fora dos limites da sociedade do Sul e Sudeste. É igualmente “sertanizado” por acadêmicos e cientistas, tornando-se propriedade de um conhecimento nem sempre verdadeiro.  

A partir do genocídio praticado contra os conselheiristas de Canudos – recuso a denominação de jagunços –, retratado com parcialidade pelo geógrafo, engenheiro, militar e jornalista, se evidenciam as incompatibilidades entre os vários sertões. As sociedades heterogêneas possuem valores culturais, econômicos e religiosos desiguais. 

Os sertanejos são tratados como menores, raças submetidas a um “poder civilizatório” que se apresenta benigno e altruísta, mas que traz apenas mais miséria, destruição e morte. Acontece a guerra, uma coisa horrível de se testemunhar, um choque implacável, irremediável, como tem sido o embate de todos os dias, no Brasil.

Nos primeiros tempos de nossa história, tudo o que não fosse litoral era sertão, independente de condições climáticas, relevo, cobertura vegetal, presença ou não de rios, tipo de solo. Assim, o Estado de São Paulo para além da Capitania de São Vicente era todo sertão, como também o eram Goiás, Mato Grosso, Minas Gerais e Rio de Janeiro, e até Paraná e Rio Grande do Sul. 

O próprio Euclides descreve diferente o sertão dos primórdios da nossa colonização: “Constituiu-se, dessa maneira favorecida, a extensa zona de criação de gado que já no alvorecer do século 18 ao das raias setentrionais de Minas e Goiás, ao Piauí, aos extremos do Maranhão e Ceará pelo ocidente e norte, e às serranias das lavras baianas, a leste. Povoara-se e crescera autônoma e forte, mas obscura, desadorada dos cronistas do tempo, de todo esquecida não já pela metrópole longínqua senão pelos próprios governadores e vice-reis. 

Não produzia impostos ou rendas que interessassem ao egoísmo da coroa. Refletia, entretanto, contraposta à turbulência do litoral e às aventuras das minas, ‘o quase único aspecto tranquilo da nossa cultura’. À parte os contingentes de povoadores pernambucanos e baianos, a maioria dos criadores opulentos que ali se formaram, vinha do sul, constituída pela mesma gente entusiasta e enérgica das bandeiras.” 

As migrações e entrelaçamentos dos sertanejos se fazia intensa, de sul a norte e de norte a sul, a ponto de um decreto real do século 18 proibir que os do norte buscassem as terras do sul, onde havia mais promessas de riqueza. “Paulista” não se referia apenas aos naturais de São Paulo, sendo uma denominação genérica para sertanejos de Goiás, Mato Grosso, Minas e outras regiões. Interessa investigar quando e de que maneira o devaneio sobre o que é sertão o transforma em paisagem semiárida, hostil, com o sol inclemente, confundido com o que se estabeleceu ser o Nordeste. Gilberto Freyre recusa essa imagem de deserto. Para ele, o lugar também é uma terra de fartura, de águas abundantes, onde, como no poema de Carlos Pena Filho, “nunca deixa de haver uma mancha d’água, um avanço de mar, um rio, um riacho, o esverdeado de uma lagoa...”

Não sei ainda quais convidados irão debater Os Sertões, mas espero que haja alguns escritores nordestinos, conselheiristas e intelectuais que enxergam os erros de Euclides, a antropologia e a sociologia impregnadas de cientificismo, consonante com a época em que o livro foi escrito. Teorias de inspiração europeia e americana, racistas, supremacistas, cientificistas, que defendem a eugenia e são contrárias ao hibridismo, atribuindo ao cruzamento das raças formadoras do Brasil todos os nossos males. 

Riobaldo, personagem narrador do Grande Sertão: Veredas, pergunta ao escutador: “Como vou contar e o senhor sentir em meu estado? O senhor sobrenasceu lá? O senhor mordeu aquilo?” A pergunta não precisaria ser feita ao carioca Euclides da Cunha, nem a qualquer intelectual que se aventurasse a escrever sobre o episódio de Canudos, desde que mantivesse isenção e imparcialidade.

 Por mais que tenha estudado a geografia, a história, a cartografia, a formação do lugar e do homem sertanejo, Euclides olha de fora, se dói de fora, denuncia de fora e, na hora do julgamento final, toma um partido: “Não tive o intuito de defender os sertanejos, porque este livro não é um livro de defesa; é, infelizmente, de ataque”. Diferente de Guimarães falando através de Riobaldo Tatarana: “O sertão me produziu, depois me engoliu, depois me cuspiu do quente da boca... O senhor crê minha narração?”

Euclides nunca se avistou com o Conselheiro, nunca entrevistou-o em conversa de homens pisando mundos diferentes. Do beato, viu o resultado do exame realizado pelo médico Nina Rodrigues, partidário da pseudociência da frenologia, que defendia que a estrutura do crânio determinava o caráter das pessoas e sua capacidade mental. Responsável por equívocos e crimes, o exame frenológico foi realizado na cabeça do beato, concluindo-se pela normalidade do mesmo, o que só expõe a barbárie e o abuso da ciência da época.

Na nota preliminar à primeira edição de Os Sertões, Euclides assume postura sobre o lugar e os personagens da sua epopeia:

"Intentamos esboçar, palidamente embora, ante o olhar de futuros historiadores, os traços atuais mais expressivos das sub-raças sertanejas do Brasil, e fazemo-lo porque a sua instabilidade de complexo de fatores múltiplos e diversamente combinados, aliada às vicissitudes históricas e deplorável situação mental em que jazem, as tornam talvez efêmeras, destinadas a próximo desaparecimento ante as exigências crescentes da civilização e a concorrência material intensiva das correntes migratórias que começam a invadir nossa terra.”

Apesar das denúncias feitas e registradas, da comoção diante do massacre, de afirmar que o sertanejo é antes de tudo um forte, Euclides se mantém firme, como observa Leopoldo M. Bernucci: “O narrador toma partido na defesa dos conselheiristas, mas a escolha final, a que determina verdadeiramente a decisão inexorável de combater o fanatismo religioso, a ‘selvatiqueza épica’, em uma palavra, os nossos ‘bárbaros patrícios’, recai nas mãos de um juiz implacável. E nem mesmo o esforço para construir uma frase imparcial e justa, que defina o seu duplo ataque, aos sertanejos e aos ‘singularíssimos civilizados’ nas Notas à 2ª Edição, consegue no final retraí-lo da sua cega fidelidade ideológica ao republicanismo progressivo.” 

Os Sertões prevaleceu como obra monumental pela sua linguagem, mesmo que Euclides tenha escrito “num estilo não só barroco – esplendidamente barroco – como perigosamente próximo do precioso, do pedante, do bombástico, do oratório, do retórico, do gongórico, sem afundar-se em nenhum desses perigos. Deixando-se apenas tocar por eles; roçando por vezes pelos seus excessos; salvando-se como um bailarino perito em saltos-mortais, de extremos de má eloquência que o teriam levado à desgraça literária e ao fracasso artístico”, como anotou Freyre.

Lamentarei se o tom da homenagem a Euclides da Cunha, na Flip, for somente apologista. Vou convencer-me de que a etiqueta com que rotularam os sertanejos continua valendo. 

O tempo passou, mas o modelo de violência da nossa sociedade permanece o de sempre, desde a colônia. A República defendida por Euclides nunca se consolidou. Nem mesmo a democracia. Soldados e conselheiristas se irmanam. Os que restam vivos, ao retornarem às cidades grandes, irão morar em morros ou periferias que receberão o nome de favelas, em memória às favelas de Canudos. A história se refaz e se complementa. 

Agora os “civilizados” tomam o lugar da sub raça, e passam também a ser exterminados. O sertão se desloca com os homens, sem a liderança social ou espiritual do Conselheiro. Seu novo lugar na periferia das cidades grandes representa um risco maior do que o Arraial de Canudos. A guerra se mantém: sistemática, predatória, manipulada. Irmãos contra irmãos. E os poderosos jogam com os mesmos princípios do início da colonização e sempre ganham.

*RONALDO CORREIA DE BRITO É AUTOR DE ‘DORA SEM VÉU’ (ALFAGUARA, 2018) Ronaldo Correia de Brito*, Especial para o Estado

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Pernambucana faz cordel para defender o forró e ironizar o sertanejo no São João

A campanha "Devolva Meu São João", encabeçada por artistas, músicos e sanfoneiros nordestinos, foi mote para a poeta e advogada pernambucana Mariana Teles, que aborda o tema com versos e rimas. 

Na poesia de cordel, Mariana reforça a reinvidicação de artistas que alegam ter perdido espaço nas grades dos festejos juninos para os cantores do sertanejo e ainda denuncia a descaracterização do São João na região.  

"Se quiser ouvir Marília/ No mesmo tom da sofrência/ É comprar com antecedência / Villa Mix de Brasília... / Mas no São João tem família / Que não desce até o chão / Vai pra ouvir Assisão", diz um trecho.   

A poeta nasceu em Tuparetama, no Sertão do Pajeú, mas mudou para o Recife. Mariana é filha do repentista Valdir Teles, de São José do Egito, e já lançou o livro O novo mar de poesia (2015). 

"Sou apologista do Nordeste e admiradora das artes. Em relação a essa polêmica, acredito que é preciso uma janela mais democrática na construção de festas que atendam os novos públicos, mas não deixe os artistas que militam o ano inteiro pela causa de fora", comenta. "Tem que ter nomes mais conhecidos, mas dando prioridade aos que carregam a bandeira do forró e da tradiçãoo junina", completa.  

Confira a poesia de Mariana Teles:

Não é contra o sertanejo,
Maiara nem Maraísa
Mas no São João precisa
Tocar "lembrança de um beijo",
É contra a máfia que eu vejo
Ganhando licitação,
Usurpando a tradição, 
Vendendo a identidade 
Pelo forró de verdade,
"Devolva meu São João"

Imaginem Salvador
Pátria do axé brasileiro,
Colocando um violeiro
Num trio do parador,
Leo Santana e um cantador
Dividindo a percussão 
Vila Nova num cordão,
Sem tocar mais Preta Gil
Pelos ritmos do Brasil,
"Devolva meu São João"

Cultura é identidade!
É patrimônio de um povo,
E nenhum sucesso novo
Compra originalidade.
Não discuto a qualidade 
Mas discuto a tradição,
Quem quiser ouvir modão,
Ou a Festa da Patroa,
Vá pra terra da garoa.
"Devolva meu São João"

Se quiser ouvir Marília 
No mesmo tom da sofrência,
É comprar com antecedência 
Villa Mix de Brasília...
Mas no São João tem família,
Que não desce até o chão 
Vai pra ouvir Assisão,
Forró sem som de "breguismo"
Não dê lucro pra o modismo.
"Devolva meu São João"

Pela pátria nordestina!
Pelas nossas tradições!
Vamos romper os cordões 
De camarote em Campina,
São João é na concertina,
Não se divide em cordão 
Para quê segregação 
Numa festa popular?
Ninguém pode separar!
"Devolva meu São João"

E as próximas gerações,
O que irão conhecer?
Irão "curtir e beber"
Como ensina esses modões?
Que será das tradições,
Com o som de apelação?!
De Wesley Safadão
Que o forró não promove
É brega noventa e nove...
Só um por cento é São João

Durante a abertura oficial do ciclo junino da cidade de Caruaru, no dia 3 de junho, a cantora Elba Ramalho, um dos ícones do São João nordestino, criticou a programação de Campina Grande, na Paraíba, e reclamou do espaço tomado por artistas da música sertaneja nas grades juninas. 

"Falei com a Paraíba, reivindiquei porque o São João de lá está muito mais comprometido que o São João daqui. Eu não tenho nada contra nenhum artista, nada contra nenhum sertanejo. Tem espaço para tudo, no céu cabem para todos os artistas, ninguém atropela ninguém. Porém eu não toco na Festa de Barretos, Dominguinhos também não cantava. A festa é deles, é dos sertanejos, e eles têm bem esta coisa: essa área é nossa", disse ela, pouco antes de apresentação na Capital do Forró.

"Aí quando chega aqui no São João, em Campina Grande, não ter o Biliu de Campina, não ter Alcymar Monteiro, eu reclamei bastante, cara, não ter os trios. Quando chega o São João, se você não tem forró... Eu não quero ir a uma festa que não tenha forró", comparou, em apoio a campanha Devolva Nosso São João, encabeçada por Joquinha Gonzaga, sobrinho de Gonzagão, e Chambinho do Acordeon,conhecido nacionalmente após interpretar o Rei do Baião no filme Gonzaga: De pai para filho, de Breno Silveira.

Nas redes sociais, a manifestação conta com adesão de cantores, compositores e instrumentistas de vários estados do Nordeste. Eles compartilham textos, vídeos e imagens com os dizeres "Devolvam o nosso São João", "São João é do Nordeste" e "São João só é grande quando tem forró", entre outros. As declarações da artista paraibana, amplamente identificada com Pernambuco, tiveram grande repercussão e provocaram respostas da prefeitura campinense e de jornalistas do estado da Paraíba.

No fim de semana passado, nos bastidores da apresentação no São João da Capitá, Marilia Mendonça rebateu as críticas e negou que as portas de Barretos (Festa do Peão) e outros festivais estejam fechadas ao forró: "Isso é mentira. Talvez a porta não esteja aberta porque algo está fora do seu trabalho. Quem tá com trabalho legal tem portas abertas em todas as regiões do Brasil. O segredo é música boa. Não tem nada de um tomar o lugar do outro". No palco, a cantora defendeu que "vai ter sertanejo no São João, sim".
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Jorge de Altinho embala neste sábado a segunda noite do São João 2019 em Petrolina

A segunda noite de festa no São João de Petrolina, no Sertão de Pernambuco, continua neste sábado (15). 

O público no Pátio de Eventos Ana das Carrancas vai poder aproveitar os shows de Fabiana Santiago, Deivinho Novaes, Jorge de Altinho, Vitor Fernandes e Magníficos. Na abertura do evento, segundo a prefeitura, mais de 60 mil pessoas estiverem no local. O São João de Petrolina segue até o dia 23. A expectativa é que mais de 700 mil pessoas acompanhem os nove dias de festa.

Confira os horários de cada atração
Fabiana Santiago – 19h

Jorge de Altinho – 20h

Divinho Novaes – 21h30

Vitor Fernandes – 21h30

Magníficos – 1h30
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