Era uma certa vez...a carimbamba cantava assim

Em algum ano da década de 70, talvez início de 80, essa data flutua e se move no turbilhão de fatos de minha pré-adolescência, eu ouvi com o coração que a terra há de sentir algum dia, próximo ou longínquo que seja, em alguma estação de rádio do Crato ou do Juazeiro do Ceará, a canção fatal que determinaria minha vida: Amanhã Eu Vou, de Beduíno e Luiz Gonzaga. Não tardou muito para eu ver Elba Ramalho num desses festivais de inverno, de Areia ou de Campina Grande, também foge-me, mas era Elba, tão linda e tão senhora de si, cantando a mesma canção.

Estranhava-me a história desse pássaro chamado de carimbamba do qual nunca ouvira falar, sequer ouvira seu canto que grassava na noite a onomatopeia "amanhã eu vou". Com os parcos recursos de pesquisa da época saí em busca dessa ave. E encontrei em seu Carneiro, um poeta que morava na única casa do final da Rua do Bode e a primeira do que chamou-se mais tarde a Rua Nova, entrando por um pedaço do sítio de Pedro Perazzo, encontrei nele a luz. A carimbamba era o mesmo bacurau, é o mesmo curiango. Esse eu conhecia. Um pássaro cuja mola no pescoço o fazia dar um giro de 360º,

Mas acreditem, nunca associei o canto do bacurau a "amanhã eu vou". Foi Luiz Gonzaga quem ensinou-me a voz, a língua e a canção do pássaro. E, junto com isso, destrinçou-me a lenda de Rosa Bela, a encantada donzela a adentrar a lagoa fria, hipnotizada pela canção atravessada no peito da ave mágica. A canção apresentou-me também o elemento vegetal, a taboa, com a qual sempre brincávamos nos escondendo por dentro dela no açude de Seu Juju, e o elemental Caboclo d'Água, aquele responsável por carregar tantos amigos para o reino paralelo da morte nas profundezas.

Fonte: Aderaldo Luciano-professor. Doutor em Ciência da Literatura.
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