OURICURI: CICLO DE OFICINAS DE SABERES MUSICAIS CULTURA POPULAR DO SERTÃO DO ARARIPE

O Campus Ouricuri do Instituto Federal do Sertão Pernambucano (IFSertãoPE) está com inscrições abertas para o projeto "Ciclo de Oficinas de Saberes Musicais: Cultura Popular do Sertão do Araripe". A proposta oferecerá aulas gratuitas de pífano e oficinas de construção do instrumento, com o objetivo de valorizar a cultura local e promover o ensino da música tradicional da região.

As inscrições já foram iniciadas e podem ser realizadas até o dia 5 de agosto de 2025, tanto presencialmente no Campus Ouricuri quanto online, por meio de formulário eletrônico (https://forms.gle/j6ZbqU9J983tXBDa6). Podem participar estudantes matriculados em escolas públicas municipais e estaduais de Ouricuri, além de discentes do Campus Ouricuri do IFSertãoPE, com idade entre 13 e 21 anos.

Serão oferecidas 35 vagas no total, sendo 5 reservadas exclusivamente para alunos do IFSertãoPE e as outras 30, para estudantes da rede pública municipal e estadual. A seleção dará prioridade a candidatos com renda familiar per capita de até 1 salário-mínimo. Os interessados devem apresentar documentos como cópia de RG ou certidão de nascimento, CPF, comprovante de residência, declaração escolar e comprovação de renda, conforme especificado nos anexos do edital nº 13/2025.

As aulas presenciais terão início no dia 22 de agosto, sendo realizadas às sextas-feiras, nos turnos da manhã e tarde, no Campus Ouricuri. O curso terá duração de 4 meses, com carga horária total de 32 horas. Aos estudantes matriculados será fornecida ajuda de custo de 4 (quatro) parcelas no valor de R$200,00 (duzentos reais) cada, condicionada à frequência mínima de 75% das atividades.

O resultado final do processo seletivo será divulgado no dia 18 de agosto, no site do IFSertãoPE. Para outras informações ou esclarecimento de dúvidas, os interessados podem entrar em contato pelos e-mails: mayra.carmeli@ifsertao-pe.edu.br ou judson.alves@ifsertao-pe.edu.br. O edital com todos os detalhes do projeto está disponível para consulta no site do IFSertãoPE.

 

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55 MISSA DO VAQUEIRO DE SERRITA

Foi realizada no último domingo (27) a 55 Missa do Vaqueiro de Serrita Pernambuco. O Grupo Amigos do Gonzagão participaram do evento que celebra um dos mais marcantes momentos de fé e valorização da cultura.

Compreender que a história vem se tecendo com a força da própria vida. E por isto, disse o cantador, escritor Virgilio Siqueira, daí não ser possível guardar na própria alma a transbordante força de uma causa. 

“Tengo lengotengo lengotengo lengotengo … O vaqueiro nordestino/morre sem deixar tostão/o seu nome é esquecido/ nas quebradas do Sertão ...Os versos ecoam pelo lugar, realçados pelo trote dos animais e o balançar natural dos chocalhos trazidos pelos vaqueiros. É música. É arte.

A música, a Morte do Vaqueiro, composta por Nelson Barbalho, ainda ecoa nos sertões brasileiros: Raimundo Jacó, um vaqueiro habilidoso na arte de aboiar. Reza a lenda que seu canto atraía o gado, mas atraía também a inveja de seus colegas de profissão, fato que culminou em sua morte numa emboscada. O fiel companheiro do vaqueiro na aboiada, um cachorro, velou o corpo do dono dia e noite, até morrer de fome e sede.

Cada arte emociona o ser humano e maneira diferente! Literatura, pintura e escultura nos prendem por um viés racional, já a música nos fisga pelo lado emocional. Ao ouvir música penetramos no mundo das emoções, viajamos sem fronteiras.

A viagem mais uma vez é o destino Serrita, Pernambuco, sítio Lages, ali um primo de Luiz Gonzaga, Rei do Baião, no ano de 1951, Raimundo Jacó, homem simples, sertanejo autêntico, tendo por roupa gibão, chapéu de couro tombou assassinado.

Realizada anualmente sempre no mês de julho, a Missa do Vaqueiro de Serrita tem em suas origens uma história que foi consagrada na voz de Luiz Gonzaga, criada com os amigos Padre João Câncio e Pedro Bandeira, violeiro.

A história de coragem se transformou num mito do Sertão e três anos após o trágico fim, sua vida foi imortalizada pelo canto de Luiz Gonzaga, A morte do vaqueiro. O Rei do Baião, que era primo de Jacó, transformou “A Morte do Vaqueiro” numa das mais conhecidas e emocionantes canções brasileiras. 

Luiz Gonzaga queria mais. Dessa forma, ele se juntou a João Câncio dos Santos, na época padre que ao ver a pobreza e as injustiças sociais cometidas contra os sertanejos passou a pregar a palavra de Deus vestido de gibão, para fazer do caso do vaqueiro Raimundo Jacó o mote para o ofício do trabalho e para a celebração da coragem.

Assim, em 1970, o Sítio Lajes, em Serrita, onde o corpo de Raimundo Jacó foi encontrado, recebe a primeira Missa do Vaqueiro. De acordo com a tradição, o início da celebração é dado com uma procissão dos vaqueiros a cavalo, que levam, em honras a memória do vaqueiro, oferendas, como chapéu de couro, gibao, queijo, farinha e rapadura, ao altar de pedra rústica em formato de ferradura. 

A missa, uma verdadeira romaria de renovação da fé, acontece sempre ao ar livre. A Missa do Vaqueiro enche os olhos e coração de alegria e reflexões. O poeta cantador de viola, Pedro Bandeira, falecido em agosto de 2020, era conhecido como o príncipe dos poetas populares do Nordeste, morreu aos 82 anos e se fez  presente em todas as missas, nas últimas venceu o peso da idade e iluminava com uma mágica leveza rimas e versos nos improvisos da inteligência.

Pedro Bandeira é autor de centenas de músicas, entre elas a  “Graça Alcançada”, que veio a ser gravada por mais de 20 intérpretes e pode ser considerada o hino dos romeiros e das romarias em Juazeiro do Norte.  

Vaqueiros e suas mãos calejadas, rostos enrugados pelo sol iluminam almas. Em Serrita ouvimos sanfonas tocando alto o forró e o baião. Corpo e espírito ali em comunhão. A música do Quinteto Violado, composto por Janduhy Filizola é fonte de emoção. A presença de Jesus Cristo está no pão, cuscuz, rapadura e queijo repartidos/divididos na liturgia da palavras.

Emoção! Forte Emoção é o sentimento na Missa do Vaqueiro ao ouvir sanfona e violeiros:

“Quarta, quinta e sexta-feira sábado terceiro domingo de julho/Carro de boi e poeira cerca, aveloz, pedregulho Só quando o domingo passa É que volta os viajantes aos seu locais primitivos/Deixa no caminho torto/ o chão de um vaqueiro morto úmido com lágrimas dos vivos".

E aqui um assunto místico: quando o gado passa diante do mourão onde se matou uma rês, ou está esticado um couro, é comum o gado bater as patas dianteiras no chão e chorar o "sentimento pelo irmão morto". O boi derrama lágrimas e dá mugidos em tons graves e agudos, como só acontece nos sertões do Nordeste!

Assim eu escutei e aqui reproduzo...

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O HOMEM É BOM

 Artigo: o homem é bom. "Não vou deixar de olhar para este mundo cão e dizer em alto berro: o homem e a mulher são boas e adoráveis criaturas" Confira texto de José Sarney.

Não é falta de assunto. O Brasil está vivendo uma tempestade de crises. E a humanidade está se agredindo com a demonstração de uma violência devastadora que nos fere a alma no testemunho do que acontece em Gaza, na Ucrânia, na Líbia e em outros conflitos menores, além do terrorismo desumano que espreita em qualquer lugar, fazendo vítimas no mundo inteiro.

Mas não é disso que vou tratar: é justamente do lado bom da humanidade, que está nos pequenos gestos, nos desinteressados afetos e carinhos puros dos namorados, dos casais e dos heróis que dão a vida pelos outros, nas missões de caridade espalhadas pelo mundo inteiro, salvando a vida de mães, pais, filhos e órfãos.

Escrevo com a alma cheia de reconhecimento da bondade humana, da pureza de alguns gestos que nos comovem e nos levam a meditar sobre o coração de homens e mulheres. 

Sou testemunho de alguns desses gestos que marcaram a minha vida. Certa vez, perto do Natal, fui visitar os enfermos de UTI levando uma palavra de conforto aos doentes. Sempre o fiz no anonimato. No Hospital Sarah de Brasília, parei ao lado do leito de uma menina que estava em seus últimos suspiros. Tinha me aproximado dela ao perceber seu estado. Tive um gesto de carinho com ela e perguntei-lhe o que desejava de presente de Natal. Ela me respondeu com dificuldade: "Meu pai tinha uma carroça em que trabalhava para dar de comer para minha mãe e meus irmãos. Caiu numa ribanceira, e o jumento morreu. Peço que dê um jumento para ele." 

Na época, publiquei na Folha de S.Paulo, na coluna que ali escrevia, uma crônica sobre este fato, e até hoje o rememoro com a certeza de como o ser humano é bom: um jumento para o pai foi o pedido que ela fez à beira da morte!

Pois recebi agora um presente muito diferente, mas que também mostra a bondade mais pura: um amigo meu de Sucupira do Norte, a mais simples das pessoas, trouxe, em meio ao drama que está passando, com seu pai internado no Hospital Aldenora Bello, um presente para mim: uma galinha, um pouco de mel de tiúba e cascas de jatobá, me dizendo que esse era um remédio para minha velhice ser prolongada. Que coisa admirável. Esse talvez seja o presente melhor que recebi nos últimos anos. O mel é ouro, o frango é prata, o jatobá, diamante. 

Cristo tem uma pregação sobre presentes quando conta da viúva pobre que depositou no cofre das esmolas duas moedas pequenas, de pouco valor. Os ricos depositavam grandes dádivas. Jesus diz a seus discípulos: "Esta viúva deu mais do que todos os outros." E acrescentou: "Ela doou aquilo que tem para viver, na sua pobreza".

Realmente, nem todos os presentes suntuosos demonstram generosidade. O mais conhecido deles é aquele que os gregos relatam em sua mitologia, pelo que até hoje se diz quando um presente é ruim: "Isso foi um presente de grego." O fato se refere ao cerco de Troia, que durava 10 anos. Então, os inimigos mandaram de presente um cavalo de madeira muito bonito e grande à cidade. À noite, depois que o cavalo passou pelo portão, de dentro saíram muitos soldados que abriram todas as portas da cidade e por elas entrou o Exército grego. Esses presentes são da maldade.

Mas há, sim, muitos presentes generosos que mostram que os homens são bons. A Princesa Isabel, aquela que libertou os nossos escravos e assinou a Lei Áurea, deu um grande presente, este de Rei, à Nossa Senhora Aparecida: uma coroa que está até hoje sobre Sua cabeça: uma bela coroa de ouro e brilhantes. Certamente, essa prova de fé e reverência não era caridade, mas homenagem e devoção. Era aquilo de que Cristo falou, de excesso em sua fortuna.

Mas o presente de uma atitude, de uma vontade, e não algo material, recebi do meu bisneto Antônio, que mora em Fortaleza. Ele tinha cinco anos quando esse fato aconteceu. Era seu aniversário, e sua mãe, minha adorável neta Ana Thereza, criatura bela de alma e também fisicamente bela, fez uma festinha para o filho e perguntou-lhe o que queria ganhar de presente naquele dia em que completaria seis anos, já sabendo ler e escrever. Antônio respondeu: "Mamãe, eu peço a Nossa Senhora para mandar baixar o preço das passagens aéreas para São Luís pra gente viajar pra lá e ver meu biso (bisavô)".

Fiquei derramado em felicidade quando minha neta logo telefonou contando seu pedido. É que ela, quando o filho pedia para ir a São Luís, onde hoje moramos, respondia sempre que o preço alto das passagens aéreas impedia muitas viagens para cá.

Eu, com esses gestos de bondade e pureza, não vou pedir para baixar o preço das passagens, mas vou tomar meu chá de jatobá e, na minha idade, não vou deixar de olhar para este mundo cão e dizer em alto berro: o homem e a mulher são boas e adoráveis criaturas!

JOSÉ SARNEY — ex-presidente da República, escritor e imortal da Academia Brasileira de Letras

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NEY VITAL SACODE O FORRÓ EM VALORIZARIZAÇÃO DA CULTURA GONZAGUEANA

Defesa do Meio Ambiente. Valorização da Cultura Brasileira. "Ney Vital sacode o forró com bom jornalismo’. Este é o tema do projeto idealizado pelo jornalista, técnico em agroecologia,  Ney Vital, colaborador da REDEGN e membro da Membro da Rede Brasileira de Jornalismo que iniciou no inicio de dezembro de 2024, o programa Nas Asas da Asa Branca-Viva Luiz Gonzaga e seus Amigos, transmitido pela Rádio Educadora do Cariri-fm 102.1.

O programa agora é apresentados todos dos domingos das 10hs ao meio dia.

A Rádio Educadora do Cariri completou este ano 66 anos de fundação-Comunicando a Esperança. A proposta é série de reportagens sobre agroecologia e a valorização da cultura gonzagueana.

“Todos os domingos percorremos a região da Chapada do Araripe, Exu, Bodocó, Parnamirim, Nova Olinda, Santana do Cariri, Caririaçu, Barbalha, Crato e Juazeiro do Norte do Padre Cícero, mostrando ao vivo a riqueza musical e do meio ambiente, que é do cariri e da região Nordeste. Vamos mostrar a exemplo de Valdi Geraldo, o Neguim do Forró, poetas e compositores parceiros de Luiz Gonzaga. O rádio valoriza força cultural a partir da sanfona de Luiz Gonzaga“, explica Ney Vital.

Nas Asas da Asa Branca segue uma trilogia amparada na cultura, cidadania e informação. “É o roteiro usado para contar a história da música brasileira a partir da voz e sanfona de Luiz Gonzaga, seus amigos e seguidores”, diz Ney Vital.

O programa é um projeto que teve início em 1990, numa rádio localizada em Araruna, Paraíba (Estado-natal de Ney). “Em agosto de 1989 Luiz Gonzaga, o  Rei do Baião, fez a passagem, partiu para o sertão da eternidade e então, naquela oportunidade, o hoje professor doutor em Ciência da literatura, Aderaldo Luciano, fez o convite para participar de um programa de rádio. E até hoje continuo neste bom combate”.

Ney considera o programa “o encontro da família brasileira”. Ele não promove rituais regionalistas, a mesquinhez saudosista dos que não se encontram com a arte e cultura, a não ser na lembrança. Ao contrário, o programa evoluiu para a tecnologia digital e forma de espaço reservado à cultura mais brasileira, universal, autêntica, descortinando um mar e , cariri sertões de ritmos variados e escancarando a infinita capacidade criadora dos que fazem arte no Brasil.

É o conteúdo dessa autêntica expressão nacional que faz romper as barreiras regionais, esmagando as falsificações e deturpações do que costuma se fazer passar como patrimônio cultural brasileiro. Também por este motivo no programa o sucesso pré-fabricado não toca e o modismo de mau gosto passa longe.

“Existe uma desordem, inversão de valores no jornalismo e na qualidade das músicas apresentadas no rádio”, avalia Ney Vital que recebeu o Título de Cidadão de Exu, Terra de Luiz Gonzaga, título Amigo Gonzagueano Orgulho de Caruaru, e Troféu Luiz Gonzaga do Espaço Cultural Asa Branca de Caruaru e o Troféu Viva Dominguinhos-Amizade Sincera em Garanhuns.

Bagagem profissional-Ney Vital usa a credibilidade e experiência de 30 anos atuando no rádio e TV. Nas afiliadas da Rede Globo (TV Grande Rio e São Francisco), foi um dos produtores do Globo Rural, onde exibiu reportagens sobre Missa do Vaqueiro de Serrita e festa de aniversário de Luiz Gonzaga e dos 500 anos do Rio São Francisco, além de dezenas de reportagens pautadas no meio ambiente do semiárido e ecologia.

Membro da Rede Brasileira de Jornalismo, Ney Vital é formado em Jornalismo na Paraíba e com Pós-Graduação em Ensino de Comunicação Social pela Uneb/Universidade Federal do Rio Grande do Norte. 

“Nas Asas da Asa Branca, ao abrir as portas à mais genuína música brasileira, cria um ambiente de amor e orgulho pela nossa gente, uma disseminação de admiração e confiança em nosso povo, experimentada por quem o sintoniza a RADIO EDUCADORA em todas as regiões do Brasil, dos confins do Nordeste aos nossos pampas, do Atlântico capixaba ao noroeste mato-grossense”, frisa.

"Ney Vital usa a memória ativa e a improvisação feita de informalidade marcando o estilo dos diálogos e entrevistas do programa. Tudo é profundo. Puro sentimento. O programa flui como uma inteligência relâmpago, certeira e  hospitaleira", diz o ouvinte Arnaldo Carvalho.

 “O programa incentiva o ouvinte a buscar qualidade de vida, defender as riquezas culturais e patrimônios musicais. É um diálogo danado de arretado. As novas ferramentas da comunicação permitem ficarmos cada vez mais próximos das pessoas, através desse mundo mágico e transformador que é a sintonia via rádio”, finaliza o jornalista Ney Vital.

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PAULO VANDERLEY: 12 ANOS DE SAUDADES DE DOMINGUINHOS

Vinte e três de julho de 2025, é o dia que marca os doze anos da morte do instrumentista e cantor Dominguinhos. Um dos principais nomes da música brasileira. José Domingos de Morais, o Dominguinhos, nasceu em Garanhuns, em 12 de fevereiro de 1941, e morreu no ano de 2013.

Exímio sanfoneiro, ele teve como mestres nomes como Luiz Gonzaga e Orlando Silveira. Em sua formação musical, recebeu influências do baião, da bossa-nova, do choro, do forró, do xote e do jazz. O pai, Mestre Chicão, era um conhecido sanfoneiro e afinador de sanfonas e sua mãe era conhecida como Dona Mariinha, ambos alagoanos.

Confira texto de autoria do pesquisador e amigo de Dominguinhos, Paulo Vanderley

Hoje faz 12 anos que seu Domingos nos deixou. Foi num 23 de julho, em 2013. Esses dias andei lembrando muito, e hoje acordei com a memória daquela viagem nossa pra Natal, só nós dois, pro Forró da Lua do querido Marcos Lopes. Que noite bonita! O povo cantando junto, Dominguinhos tocando "De Volta pro Aconchego", parecia oração no ouvido da gente. Noite longa, terminamos perto das 3 da manhã, fila pra tirar retrato, e ele com aquela mansidão atendendo todo mundo. Dormimos pouco, tomamos café rapidinho e, logo cedinho, fomos surpreendidos pela visita de Paulo Tito, mestre do forró com mais de 90 anos, voz grave, marcante. Tenho todos os discos dele, fã mesmo. Foi Gonzaga quem incentivou Paulo Tito a ir pro Rio nos anos 50, se juntar àquela turma boa que fez história. Achei fotos lindas desse encontro: Paulo Tito tocando violão com seu Domingos, junto com Anselmo Alves, Leide Câmara e Kyldemir Dantas, amigos queridos.

Saímos de Natal com o sol truando, Dominguinhos dirigindo e conversando. Só a gente, privilégio grande demais. Falamos muito da chegada dele ao Rio, dificuldades, encantos, amores vividos. Até o romance com Gal Costa entrou na conversa. Ele brincava dizendo que a mãe dela queria casamento e tudo. Foi curto, mas intenso, bonito de ouvir. Sobre outras histórias, ele não precisou nem dizer diretamente, deixou no ar aquele jeitinho dele que dava a entender que era pra guardar segredo. Então essas ficaram só comigo, bem quietinhas.

Mas o que ficou forte mesmo foi o conselho que ele recebeu de Luiz Gonzaga. Na estrada, ele me contou que, no começo, tinha receio de cantar, achava a voz grossa demais. Disse pra Gonzaga: "Seu Luiz, minha voz é muito grossa, se eu cantasse como o senhor...". Seu Luiz nem deixou terminar: "Dominguinhos, pra cantor não tem voz grossa nem fina. O cantor popular canta com a voz que Deus lhe deu. Você vai colocar sua voz dentro da sanfona e daí vai sair um Dominguinhos cantor."

Viajar com Dominguinhos pelas estradas era privilégio puro. Essas histórias ficaram guardadas comigo pra sempre. Anos depois, preparando meu livro sobre Luiz Gonzaga, encontrei exatamente essa história numa entrevista que Gonzaga deu à Dominique Dreyfus. Parecia que eu tava ouvindo seu Domingos contar outra vez. Claro que entrou no livro.

São 12 anos de saudades, mas ele continua muito vivo aqui em casa, na minha família. Trago essas lembranças tatuadas na alma, e no braço, a data do seu aniversário junto com a sua sanfona.

Paulo Vanderley-pesquisador e escritor. Funcionário Público Federal

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EM TEMPOS DE INTELIGENCIA ARTIFICIAL, BIBLIOTECAS SE TORNAM AINDA MAIS NECESSÁRIAS

Atualmente as inteligências artificiais dominam o debate público e científico. Os professores de escolas de ensino fundamental, médio e mesmo universitários desenvolvem estratégias cada vez mais elaboradas a fim de driblar o uso imponderado da IA nas atividades propostas em sala. A ideia basicamente é evitar que os alunos realizem suas tarefas por meio da IA generativa e passem a refletir nas atividades ao invés de apenas usar um prompt de comando e copiar e colar a resposta obtida.

Quero lembrar uma frase que já se tornou popular na internet: “a IA não é inimiga, nem amiga, é uma ferramenta”. Dito isso, este texto não se propõe a demonizar as ferramentas de inteligência artificial, mas sim lembrar de uma estratégia bastante antiga (mas que muitos se esquecem em tempos de imediatismo) e que pode ajudar professores e estudantes a driblar essas ferramentas: a biblioteca.

Ir até a biblioteca, consultar um bom livro e se apropriar do conhecimento ali escrito não tem preço, a assinatura da IA sim. Longe de estarem ultrapassadas, as bibliotecas ganham um papel ainda mais crucial na era da inteligência artificial, pois podem ser aliadas da integridade acadêmica. Mais do que nunca, esses espaços precisam ser reconhecidos como lugares de construção do conhecimento, onde professores e estudantes podem encontrar estratégias para contornar a dependência das inteligências artificiais e resgatar o protagonismo da pesquisa humana.

Ao invés de recorrer à IA para resolver tarefas de forma automática, estudantes orientados por bibliotecas bem estruturadas podem redescobrir o prazer da investigação, da leitura aprofundada e da construção argumentativa baseada em fontes confiáveis. O acesso a acervos físicos e digitais, a orientação de bibliotecários e o uso de bases de dados científicos oferecem um caminho mais sólido para quem quer se destacar academicamente de forma ética.

Ao lado dos professores, as bibliotecas também oferecem suporte essencial. Com o apoio de profissionais da informação, docentes podem desenhar atividades menos vulneráveis ao uso indevido da IA. É possível, inclusive, propor trabalhos que exigem pesquisa local, análise de fontes primárias, entrevistas, visitas a acervos, resumos anotados e fichamentos com critérios definidos. Tarefas que demandam envolvimento real, leitura ativa e reflexão crítica.

Além disso, bibliotecas podem funcionar como espaços de formação para lidar com os impactos da IA no ambiente educacional. Oficinas, rodas de conversa e projetos de letramento informacional ajudam a esclarecer não só os limites éticos do uso dessas ferramentas, mas também os riscos de dependência e superficialidade. Ao ensinar estudantes a diferenciar informação de qualidade de conteúdo automatizado, as bibliotecas se posicionam como núcleos de resistência à pauperização do saber.

Sempre vale a máxima: as bibliotecas não são apenas depósitos de livros, mas instituições comprometidas com a democratização do saber, com a organização da informação de forma sistemática e com a formação de cidadãos críticos. Em um cenário onde dados são abundantes, mas a curadoria é escassa, o trabalho dos bibliotecários se torna mais relevante do que nunca. Eles ajudam usuários a entender como a informação é produzida, quais interesses estão por trás de determinadas narrativas e como utilizar ferramentas tecnológicas de forma consciente e produtiva.

Não se trata de proibir o uso da IA, mas de mostrar que o conhecimento não nasce de atalhos. Ele exige processo, envolvimento, análise, comparação, tempo. Nesse sentido, a biblioteca ressurge como espaço de desaceleração consciente, onde o aprendizado acontece de forma mais profunda, reflexiva e significativa.

Em tempos de inteligência artificial, recorrer à biblioteca é um ato de resistência.

Por Luiz Ricardo de Barros Silva, mestrando da Escola de Comunicações e Artes da USP


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RAIOS IMPACTAM O CLIMA E MATAM MILHÕES DE ÁRVORES

Um raio nunca cai duas vezes no mesmo lugar, diz o ditado. Mas um novo estudo revela que o impacto nas florestas do planeta é muito mais avassalador do que se imaginava. Pesquisadores da Universidade Técnica de Munique (TUM), na Alemanha, desenvolveram um modelo inédito que estima que 320 milhões de árvores são mortas anualmente por raios em todo o mundo.

Este número surpreendente refere-se apenas às árvores atingidas pelo impacto direto da descarga elétrica, sem contar as milhões de outras perdidas em incêndios florestais que os próprios raios iniciam. A descoberta, publicada no Global Change Biology, sugere que o papel dos relâmpagos como uma força ecológica foi historicamente subestimado.

Até agora, os danos por raios eram difíceis de quantificar em escala global, com estudos focados apenas em florestas específicas. A equipe alemã, no entanto, adotou uma abordagem matemática, combinando dados de observação com padrões globais de raios para criar o primeiro panorama mundial do fenômeno.

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