Luiz Gonzaga aprendeu que para concretizar os sonhos era preciso primeiro aprender a caminhar, correr, dançar e voar

"Quem deseja aprender a voar, deve primeiro aprender a caminhar, a correr, a escalar e a dançar. Não se aprende a voar voando". Não sei o porquê mas pensei nesta frase para argumentar o pioneirismo de Luiz Gonzaga e seus parceiros musicais em defesa do meio ambiente, numa época que não se defendia a ecologia.

Agora o Rei do Baião, Luiz Gonzaga ganha o título maior no Ensino Superior. A Universidade Federal Rural de Pernambuco (UFRPE) concedeu ao cantor e compositor Luiz Gonzaga o título de Doutor Honoris Causa (in memoriam), maior honraria das instituições de ensino.

Este título, nestes tempos de inversões dos valores educacionais e culturais, onde prolifera nos meios de comunicação péssima educação, gritaria, letras que incentivam desunião, invejas,  falta de amor; o título traz a oportunidade de valorizar o aprendizado e vontade própria de ser vencedor de um cidadão que não nasceu em berço de ouro e venceu todo tipo de preconceito.

Todo brasileiro sabe da condição de semi analfabeto de Luiz Gonzaga, mas cidadão que sempre sonhou em aprender e propagar o quanto é importante estudar na vida e ter um diploma universitário. O título concedido pela UFRPE é merecido e simboliza a valorização da leitura e do aprendizado. Luiz Gonzaga teve a coragem de sonhar quando tudo era proibido!

A ideia de conceder o título a Luiz Gonzaga veio do professor e pesquisador da UFRPE Severino Mendes Júnior. Ele argumento que Luiz Gonzaga foi um autêntico defensor do meio ambiente. O professor afirmou durante entrevista que pela afinidade das letras de Gonzaga com os estudos da UFRPE ele merecia o título máximo de Doutor Honoris Causa.

A proposta foi formalizada e aprovada, por meio da Resolução nº 158/2012, pelo Conselho Universitário da UFRPE. Na justificativa, a reitora da UFRPE e presidente do Conselho, Maria José de Sena, afirma que o cantor e compositor é um “autêntico representante da cultura nordestina, cujas canções envolvem ecologia e meio ambiente, enaltecendo a fauna da caatinga e referenciando a conservação da natureza”.

O Título de Doutor Honoris Causa é concedido a personalidades que tenham se distinguido pela sabedoria ou pela atuação frente a artes, ciências, filosofia, letras ou das relações com a sociedade. O título de doutor universitário proporciona a Luiz Gonzaga o mote de nós todos cantar e incentivar nossos jovens a estudarem e buscar o diploma que vai garantir liberdade. A educação é a única forma de libertação.

Afinal, o estudo de Luiz Gonzaga foi sua sanfona. E os josés, severinas e João, Antonio que não sabem tocar sanfona para ganhar o pão de cada dia?
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Raimundo Aniceto, tocador da Banda Cabaçal do Crato tá doente, tá sem tocar, sem dançar, sem pular, tá sem alegria

Numa conversa com o amigo escritor, professor Aderaldo Luciano, ouvi a promessa que será colocado em um poema certeza que Deus era um tocador de pife e foi soprando nele, num pife feito de taboca, que deu vida ao Homem com seu sopro fiel. 

Nesta madrugada não me saiu da "cabeça" o sentimento da falta de respeito que é tratado nossos mestres da Cultura. 

A Banda Cabaçal dos Irmãos Aniceto do Crato, Ceará tem no tempo uma vereda de espinho e esperança, brilho das estrelas que não mudam de lugar, a peleja entre a fome e a fartura. Este ano a Banda completa 201 anos de Fundação.

Em 2015 a Banda perdeu o mais antigo dos integrantes, Antonio Aniceto, o responsável por abrir o caminho para os mais novos. A

Banda já está na terceira geração, com os filhos de Adriano, Cícero e Jeová, filhos de Antônio e João, netos de José Aniceto e ousam em desafiar a "industria capitalista avassaladora". Valorizam a história e a tradição. 

Mais uma fez a dor qual espinho massacrando a pele, a ferir os sentimentos mais nobres traz uma situação de desconforto: Seu Raimundo Aniceto, 86 anos sofreu um AVC, perdeu a voz. O braço está paralisado, já não toca! Por telefone a filha de Raimundo, a Socorro Aniceto conta com voz baixinha: a situação carece de muita preocupação.

Raimundo Aniceto é Mestre da Cultura, oficialmente reconhecido pelo Governo do Estado do Ceará. É Patrimônio da Cultura mais Brasileira.

A história conta que tudo começou com o índio kariri José Lourenço da Silva, que com suas cabaças resolveu criar um grupo musical surgida em 1815. Toda a família se envolveu no trabalho, e a tradição foi passada por três gerações.

Os irmãos Aniceto lançaram três discos: o primeiro em 1978, patrocinado pelo Ministério da Educação e Cultura; o segundo em 1999, produzido pela Cariri Discos em parceria com a Equatorial Produções; e o último em 2004, intitulado “Forró no Cariri”. Também lançaram um DVD, gravado em 2008, no Theatro José de Alencar, registrando a histórica apresentação da Banda Cabaçal em conjunto com a Orquestra de Câmara Eleazar de Carvalho.

O nome da banda vem do tempo de José Lourenço, o Aniceto. Na época, a zabumba era feita da cabaça da roça. A terra natal dos Irmãos Aniceto é o Crato, mas a cultura da família já é conhecida em todo o Brasil e até na Europa. O grupo resiste...

A professora Elídia Clara Aguiar Veríssimo, da Universidade Estadual do Ceará (Uece), que em 2002 defendeu tese de mestrado sobre o som produzido pelo quinteto explica que os componentes da Banda se diferenciam das demais bandas cabaçais do Cariri pela temática de suas músicas. Usam os sons e o comportamento observado na natureza.

"Aí nascem os baiões e forrós que ninguém mais produz, trazendo o cotidiano da roça para o palco”, avaliou Elídia. Também fazem parte do repertório situações vividas por alguns integrantes. É o caso da música da Luta do Severino Brabo. Mestre Raimundo contou que esse personagem realmente existiu e fez parte de sua infância. O tal homem assustava a todos andando com dois facões na cintura e tentando arrumar briga por onde passava.

“Eu ficava olhando, aprendi alguns movimentos com ele e coloquei isso na banda”. Nesse caso, impressiona o som emitido pelas facas que acompanham a música.

Seu Raimundo era o responsável pela coreografia, ele dançava, pulava e arriscava até um salto mortal na apresentação. Na foto ele está com o então ministro da Cultura, Gilberto Gil.


Apesar da solidão e olhar triste Seu Raimundo em nome da Banda Cabaçal Irmãos Anicetos já recebeu a Honra do Mérito Cultural, concedido pelos relevantes serviços prestados a cultura.

A pesquisa de Elídia também mostra que, apesar de não possuírem formação acadêmica em música, os Aniceto têm ouvido para sons que músicos profissionais não têm. O mesmo ocorre com a habilidade em tocar seus instrumentos musicais.

Por tudo isto nesta madrugada eu penso com mais Fé: Deus dai-me forças e tende compaixão de nós neste vale de lágrimas! Não deixe o som do Pife parar!



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Por Aderaldo Luciano: Rádio nas ondas da Amplitude Modulada (Am). A verdadeira comunicação

Recebi texto do amigo paraibano, morador universal, professor, doutor em ciência da literatura. Transcrevo: 
"Durante todo o tempo em que me entendo por gente vi surgir e consolidar-se dentro de mim o amor e o respeito pelo rádio. Ainda criança, meu irmão Cacuruta presenteou-me com um rádio Semp à válvula. Curioso menino da Rua do Bode retirei a caixa e vislumbrei aquele coração cheio de elementos que me pareciam uma usina com suas torres e luzes. Apagando as lâmpadas e ficando no escuro aquilo resplandecia e tomava conta de toda minha imaginação. Tornei-me notívago, navegando no dial, buscando emissores de longe, locutores que me falariam de cidades e acontecimentos que eu planejava vivenciar.

Durante o dia me via rodeado pelas rádios locais, pelas ondas que vinham de Campina Grande e suas três rádios AM: Caturité, Cariri e Borborema. Nomes fortes, direto de nossas raízes. O tempo e os homens insanos mudaram os nomes das rádios Cariri e Borborema que, em um período de tempo, aquela chamou-se Rádio Sociedade, e esta, hoje, Rádio Clube. A loucura dos homens se traduz nesses assaltos. Foi na programação das rádios campinenses que aprendi a viver a brasilidade. Retalhos do Sertão, Bom dia Nordeste (com Zé Bezerra) cuja abertura era um jingle sensacional de João Gonçalves, o Rei da Cacofonia, as Sentinelas RB, os Filmes do Dia e Jogo Duro com Humberto de Campos (figura imponente do time Estudantes), esses todos na Borborema.

Na Cariri encontrei ao meio-dia Genival Lacerda com o forró de Seu Vavá. Encontrei também a estreia de Capilé que era a grande promessa artística da terra, cantando ao vivo, violão certo, voz correta e boa comunicação. A Caturité pela manhã trazia Antonio Cardoso Show, aquele que organizava caravanas de cantores para os bailes nas redondezas. Depois dos programas esportivos vinha o Postal Sonoro com belas "páginas musicais". Foi nesse programa que escutei pela primeira vez dobrados militares da Banda do 14º R.I. Mas entendi o gosto musical de nosso povo com extensa programação com Carlos Alexandre, José Ribeiro, Evaldo Braga, Elino Julião, Genival Santos.

Vi nascer as rádios de Guarabira: Cultura e Rural. A Cultura quando surgiu trazia em sua fase experimental uma trilha sonora cheia de novidades. Também testemunhei em Bananeiras a Rádio Integração do Brejo. Todavia na adolescência passei a acompanhar a programação das rádios do Recife: Rádio Clube, Jornal do Comércio, Tamandaré, Olinda e Rádio Globo. Algumas vezes entrava a Rádio Capibaribe (Jovem Cap). Nesse tempo passei a sonhar com a possibilidade de ir morar na capital pernambucana, a matriz cultural do frevo, maracatu e ciranda. Acordava cedinho para ouvir Elias Lourenço. A Tamandaré trazia uma programação mais pop e um som aproximado ao som das FMs.

Paralelamente a essas escutas, ia descobrindo as emissoras de ondas curtas internacionais que transmitiam em português. Assim entrava pelo meu ouvido a Voz da América (EUA), a Paz e Progresso (Russa), a Rádio China Internacional, a Rádio Netherland (Holanda), a Deutsch Welle (Alemanha), a Rádio França Internacional, a rádio da Albania (direto de Tirana) e a BBC. As ondas curtas eram um grande oceano de novidades sonoras. A Voz dos Andes me falava de irmãos americanos falando espanhol. Agora, a noite era o grande passeio pela faixa AM quando acompanhava as rádios do Rio de Janeiro e em especial a Rádio Globo. E como a Globo tinha uma programação sem retoques. A partir das 23 horas era uma viagem com o Panorama Esportivo, O Seu Redator Chefe e Adelzom Alves.

A Rádio Sociedade da Bahia, a Rádio Capital de São Paulo, a Rádio Tupi do Rio foram minhas companheiras durante as noites longas e frias de Areia, Paraíba. Aí, um dia, me vi do lado de dentro na Rádio Serrana de Araruna com os amigos Ney Vital Guedes, Pedro Freire e Ednaldo da Silva. Era um programa semanal chamado Suíte Nordestina. Ficamos um bom tempo no ar. Depois aportei na Rádio Cidade de Esperança. Ainda na Rádio Serrana de Ararura criei, junto com o saudosíssimo José Avelino, o programa Noite de Lua, um programa de saudade. Avelino nos ensinou muito sobre a música brasileira.

Para minha alegria, hoje estou na Rádio Globo do Rio, em um pequeno quadro semanal no programa Sa-ba-da-ba-dooo, com Mário Esteves, todos os sábados entre 5 e 9 horas da manhã. O nosso Cordel de Notícias também vai ao ar na Rádio Globo de São Paulo, ainda aos sábados com Rony Magrini, entre 6 e 9 da manhã. O rádio está vivo, a faixa AM está viva, querem matá-la no Brasil, mas ela ainda representa uma enorme atividade pelo interior dos Brasis. Amo o rádio, Sinto-me parte dele, Sou um guardião, embora tanta coisa ruim aconteça aos seus microfones. Mas uma coisa é o Rádio, a outra, seus donos e vozes".

Fonte: Aderaldo Luciano-professor. Pós-doutorando.
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Irmãs Nordestinas guardam até os dias de hoje a sanfona branca, um presente de Luiz Gonzaga

Maria de Lourdes Batista e Socorro. As Irmãs Nordestinas nos ano 70 conheceram Luiz Gonzaga, Rei do Baião e este ao contemplar a desenvoltura de uma interpretação de um choro sentenciou: "Vou lhe presentear com uma sanfona branca".

Elas contam que não foi executado um choro fácil. "Escolhi um difícil e Luiz Gonzaga logo disse que menina para fazer a sanfona falar, tocar bonito".  Tudo isto numa sanfona de 80 baixos.

A palavra do Rei foi cumprida em 1984 quando Maria de Lourdes esteve em Exu e ganhou das mãos de Luiz Gonzaga, a sanfona branca. "E ainda ganhei um disco autografado", revela a sanfoneira "Lourdinha" como é conhecida em Petrolina.

As Irmãs Nordestinas nasceram em São José do Egito, Pernambuco.  Não foi por acaso que Luiz Gonzaga viu logo  a agilidade e habilidade, talento e ousadia ao puxar a sanfona de 80 baixos, pois Lourdinha é filha do melhor sanfoneiro de São José de Egito, Pedro Bentinho, homenageado com Medalha de Honra ao Mério-Centenário de São José do Egito.

As Irmãs Nordestinas ainda fazem shows. "Sempre faço apresentações é só chamar que a gente faz a sanfona roncar neste Nordeste afora"
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João do Vale: o Poeta do Povo, autor da música Carcará, Estrela Miúda, Peba na Pimenta e Pisa na Fulô

João do Vale é o autor da música Carcará, imortalizada na voz de Maria Betanea. 

As poesias de João do Vale são entoadas por esse Brasil afora e a maioria não imagina a autoria das músicas. João do Vale é mais um típico caso de grande artista brasileiro totalmente desvalorizado, pobre, semi-analfabeto, preto e nordestino, uma combinação infelizmente cruel para quem nasce nessas terras.

Na voz de Luiz Gonzaga é da autoria de João do Vale os baiões Meninas do Grotão, Fogo do Paraná, de Terezina a São Luiz.

João do Vale  veio ao mundo como o quinto filho de um casal de camponeses pobres e que se tornou, com suas mais de 200 músicas, um dos mais talentosos compositores da música brasileira.

João Batista Vale nasceu na cidade de Pedreiras, Rua da Golada, no Estado do Maranhão. Negro e pobre sofreu todo tipo de discriminação. Hoje João do Vale", através do trabalho do crítico carioca Marcio Paschoal, além de imortalizado na voz dos grandes cantores de Luiz Gonzaga a Chico Buarque, Clara Nunes e Maria Betanea,  Caetano Veloso a Fagner, ele está também na biografia Pisa na Fulô, mas não maltrata o Carcará - Vida e Obra do compositor João do Vale, o Poeta do Povo.

João do Vale se tornou compositor para ajudar os pais na lida com os outros irmãos, vendia bombons e doces feitos pela mãe. Apesar do trabalho, estudava com prazer na escola primária do lugar até um incidente tirá-lo dos estudos.

"Na época em que cursava o primário, foi nomeado um coletor novo para Pedreiras. Ele levou um filho em idade escolar. Na escola tinha uns trezentos alunos, mas escolheram logo eu para dar lugar ao filho do homem. E eu senti, é claro! Resolvi nunca mais ir estudar", relembrava ele.

Depois disso, a família se mudou para São Luís e o menino, de apenas 14 anos, fugiu de lá para Teresina junto com um circo. Tinha o sonho de morar no Sul e ter uma vida melhor. Foi ajudante de caminhão no Nordeste e, ao conseguir chegar no Rio de Janeiro, arranjou serviço também como ajudante - dessa vez de pedreiro.

Trabalhava e dormia na construção; à noite percorria as Rádios na esperança de se aproximar de algum artista. O primeiro a que teve acesso foi Zé Gonzaga, que a princípio não quis ouvir suas músicas. A resistência durou pouco. O cantor ficou encantado pelas composições de João do Vale e gravou Cesário Pinto, que fez sucesso no Nordeste.

Luís Vieira foi o segundo que João procurou; conseguiu que Marlene gravasse Estrela Miúda (de autoria dos dois). Embora não tenha sido fácil, o início da carreira de João do Vale foi rápido. Apenas um ano após chegar no Rio de Janeiro, suas músicas já começaram a ser gravadas. Quando, em 1952, foi receber os direitos autorais da venda de suas composições pela primeira vez, surpreendeu-se com a quantia: 200 cruzeiros. Uma fortuna para quem suava na construção por 5 cruzeiros mensais.

"Tudo o que nasce de João do Vale tem verdade e tem chão", disse Clara Nunes, cantora que recheia a já grande lista dos que gravaram composições do maranhense.

 Com sua simpatia e humanidade, o músico conviveu com uma centena de personalidades de destaque como artistas, políticos e escritores. Maria Bethanea gravou Carcará.

João teve três derrames cerebrais e morreu em 1996 aos 63 anos. Ele era de uma simplicidade contrastante com a época e o meio em que viveu. A biografia escrita por Marcio Paschoal, de 295 páginas, é um apanhado de mais de 40 fotos, cópias de contratos de edição e de partituras originais, discografia, musicografia e depoimentos dos artistas.

Fonte: Jornal do Commercio/Livro Marcio Pascolal
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Adeus a Antonio da Mulatinha. Agricultor, tocador de pandeiro, vendedor de cordel

Chorei! A morte esta danada "Caetana" sempre me faz chorar! 

Chorei pela falta do último abraço, a distância não permitiu: resta a lembrança do cantador, embolador Antonio da Mulatinha.

 Nascido no municipio de Esperança-Paraíba, Antonio Patrício aos 22 de outubro de 1927, irmão do também genial Dedé da Mulatinha (José Patrício) e outros nove irmãos

O motivo do sentimento é que durante quase 10 anos frenquentava a feira de Campina Grande, Paraíba e lá ainda jovem eu encontrava o vendedor de cordel Antonio da Mulatinha. Com ele aprendi os mais bonitos pensamentos, palavras e ações a favor da cultura brasileira.

Antonio da Mulatinha aprendeu apenas as primeiras letras do ABC. No entanto, estas lhe foram suficientes para ganhar o mundo e a fama, e em especial, a cultura.

Começou a cantar coco em 1940 e em 45 já publicava seu primeiro cordel: “A Viagem Sagrada”, seguindo-se outros oitenta e tantos títulos.

Campina Grande foi o lugar escolhido para viver, o bairro de Santo Antonio. Gravou dezenas de disco vinil-Lps.

Pai de dez filhos. Realizou centenas de viagens pelo Brasil afora  com seu irmão Dedé. Em 2014, Toinho da Mulatinha com então 89 anos foi homenageado pelo Museu de Arte Popular (MAPP) da Universidade Estadual da Paraíba (UEPB), pelos seus mais de 60 anos de atuação na cultura, como cordelista e embolador de coco. No dia do evento, Toinho falou sobre sua vida e trabalho artístico.

Os seus versos, por muitos já fora elogiado. Eis aqui um pequeno exemplo da sua versatilidade:

“Em Sodoma tão falada/
Passei uma hora só/
Lá vi a mulher de Ló/
Numa pedra transformada/
Dei uma talagada/
Com caldo de mocotó/
E saí batendo o pó/
Adiante vi Simeão/
Tomando café com pão/
Na barraca de Jacó”.

São da autoria de Antonio da Mulatinha os seguintes títulos: Morte de Rosil Cavalcanti, Almanaque pernambucano brasileiro para o ano de 1957, Campina Grande, a viola e as belezas do nordeste, O casamento de Bernardo com Maria do Saguím ou o rapaz que casou-se e correu com medo da mulher, A Paixão de Cristo, As missões de Frei Damião em Bom Jardim e a tempestade em Limoeiro, As missões de Frei Damião em Soledade e os castigos de um amancebado, O povo chora com pena do frade Frei Damião, O desastre de ônibus que atropelou uma procissão e matou vinte e três pessoas em Currais Novos, A História do desastre da Lagoa do Parque Solon de Lucena em João Pessoa, entre outros.

Abraço meu amigo...deixaste este vale de sofrimentos!
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Dominguinhos: uma imensidão de ritmo, hamonia e melodias, saudade, paixões e amores, sol, lua, solidão e silêncio

"Que saudade matadeira eu sinto no meu peito. Faço tudo para esquecer, mas não tem jeito." Este é um dos muitos versos que Dominguinhos cantou e tocou com sua sanfona, transformando-a em um instrumento da saudade, sentimento que persiste no coração de todos nós que convivemos com o cantor, compositor e instrumentista desde sua morte em 23 de julho de 2013.

Hoje 12 de fevereiro se fisicamente estivesse entre nós Dominguinhos completaria 75 anos.

Hoje convidado que fui para participar de Programas de Rádio na região do Vale do São Francisco destaquei a genialidade, simplicidade, humildade do mestre Dominguinhos. Em especial a gratidão que o discípulo tinha por Luiz Gonzaga.

Destaquei dois filmes que fala sobre vida e obra de Dominguinhos: primeiro o documentário "O milagre de Santa Luzia" (2008), de Sergio Roizenblit, no qual o instrumentista viaja pelo Brasil para mostrar as diferentes formas regionais de se tocar sanfona e os principais sanfoneiros do país.

E aquele que mais me toca: O longa metragem webserie "+Dominghinhos". Neste filme é mostrado “Um Dominguinhos que pouca gente conhece: jazzista, improvisador, seu refinamento musical, sua universalidade.

Assim era Dominguinhos. Grande, muito grande. Simples, muito simples.

Aos 6 anos, José Domingos de Morais, O Dominguinhos ganhou a primeira sanfona do pai, o mestre Chicão. Aos 8, já se apresentava com os irmãos, Morais e Valdomiro, em feiras livres e portas de hotel de Garanhuns (PE), onde nasceu em 12 fevereiro de 1941.

Dominguinhos foi nome dado por Luiz Gonzaga, com quem gravou, em 1957, Moça de Feira. “O menino chegou de um ambiente diferente e começou a viver num mundo glamourizado. Mas foi sempre na dele, sempre com esse jeitão sertanejo”, diz Gilberto Gil no primeiro episódio da web série +Dominguinhos.

A riqueza dessa história levou os músicos Mariana Aydar, Duani e Eduardo Nazarian a se associar à produtora bigBonsai para pesquisar e promover encontros entre o sanfoneiro e parceiros, antigos e jovens que tocam e contam histórias vividas nos palcos da vida.

Em uma delas, Gil lembra do tour do álbum Refazenda (1975), em que viajaram juntos mais de 20 mil quilômetros. Em certo momento, Dominguinhos pergunta: “Isso é reggae, é?”. Quando o amigo responde que sim, ele rebate: “Que reggae nada, isso aí é um xotezinho sem-vergonha”.

"Seu Domingos" é grande demais para um filme. Se o Rei do Baião levou o sertão nas costas para que um País inteiro conhecesse, Dominguinhos fez com que cada homem, nascido no canto que fosse, encontrasse o sertão que havia no próprio peito.

Antes de começar a luta contra o câncer que o submeteria a uma injustiça do destino vivida em um quarto do Hospital Sírio Libanês, convalescendo na dor física e da alma que sofria sob desavenças de familiares, Domingos recebeu uma equipe de jovens cineastas. Estavam ali para colocar a água do Rio São Francisco em uma garrafa. Ou, se fosse preciso, em duas.

Ao lado de Djavan, Domingos chorou. Estava visivelmente abatido pela doença, mais magro do que em outras cenas, e parecia sentir as próprias notas em dobro. Ali, foi dureza. Havia as vozes de Djavan e de Mayra Andrade na belíssima toada Retrato da Vida, mais o violão de Yamandú Costa e o bandolim de Hamilton de Holanda.

Seu Domingos tirou a água dos olhos e pediu a Djavan um favor com uma humildade de estraçalhar os técnicos do estúdio. "Se você tivesse trazido seu violão, eu ia pedir pra tocar uma música pra mim".

O São Francisco transbordou e os produtores, amparados perceberam que Dominguinhos precisava de mais. O que seria um filme ganhou formato de websérie e o nome de Domingos +. Dividida em oito capítulos.

No filme Um pião gira no chão de terra até que aparecem os primeiros ruídos. Um boiadeiro canta, uma ave bate as asas. O pião retorna. É uma imensidão de sol e silêncio que abrem o documentário sobre Dominguinhos. Uma solidão que ficou com ele até o final da vida, estivesse na festa dos vitoriosos que levam prêmios Grammy para casa e na colheita do feijão com o pai, nas terras de Garanhuns.

Quando a música aparece, ela vem em turbilhão. Um Dominguinhos de cabeça baixa, de pé, à frente de um grupo, tocando sua sanfona como se estivesse em transe. De olhos fechados, transpassa dedos uns sobre os outros como se tivessem vida própria, como se nem dos comandos do cérebro precisassem.

É o próprio músico quem narra sua história. Seu Domingos fala do pai que já tocava na roça, lembra de sua sanfoninha de 8 baixos e do primeiro grupo que formou com dois irmãos no Nordeste, quando tinha 8 anos. Conta das brincadeiras e dos passatempos. "Eu não matava nem passarinho, por pena." A mãe, alagoana filha de índios como o pai, teve 16 filhos, muitos dos quais "iam morrendo" e sendo enterrados em caixõezinhos que o pai já construía como um especialista.

Seu Luiz, Luiz Gonzaga, já era rei quando viu o menino pelos anos de 1946, 1947. Como fazia quando apostava em um pirralho com jeito de gente, deu a ele 300 mil réis e sua bênção. "Passamos três ou quatro meses com esse dinheiro", lembra Domingos. Logo, é Domingos, pouco tempo depois de aposentar o apelido Nenê, quem está acompanhando o próprio Gonzaga. "O caminho de todo sanfoneiro era Luiz Gonzaga, não tinha outro." Dominguinhos o segue no sucesso, e aparece em programas de TV desafiando o mestre nas mãos e nos pés, com um duelo de xaxado.

O sanfoneiro chega ao Rio de Janeiro de Garanhuns depois de uma saga de 11 dias na carroça de um caminhão.

A história segue na voz do sanfoneiro e nas imagens de encontros em estúdios, alguns dos quais aproveitados de registros para a da websérie feita antes do documentário. Nana Caymmi não consegue cantar afinada Contrato de Separação. Em frente a um Dominguinhos debilitado, ela chora sem se conter, mas segue em frente.

Dominguinhos, estudado em escolas de jazz, esmiuçado por músicos eruditos, jamais estudou partitura. Tentou fazer isso, mas abandonou as aulas "porque os livros não tinha figurinhas." 

Já consagrado, fora da sombra do Rei do Baião, foi com Gal Costa fazer shows pelo país por dois anos, acompanhado por Toninho Horta na guitarra e Robertinho Silva na bateria. "Eu já estava me sentindo um sanfoneiro pop, já estava com o cabelão black." Quando chegou 1978, veio morar em São Paulo e sentiu aflorar a solidão do sertão que havia em seu peito. Dominguinhos era um solitário, como ele mesmo diz.

Seus olhos se enchiam de água depressa, sobretudo depois que ele começou seu tratamento contra o câncer. Em uma noite, deixou o quarto do hospital com seu chapéu de vaqueiro, apertou o botão do elevador e fez o nome do pai.

Momento de emoção no filme quando Dominguinhos chega ao teatro no qual a Orquestra Jazz Sinfônica o esperava e sentou-se para tocar De Volta pro Aconchego. Quando sentiu os arranjos sinfônicos atravessando seu peito, não se conteve e chorou uma lágrima graúda, como se soubesse que, ali, era a hora de se despedir.

Levantou a cabeça, tirou o chapéu e chorou...
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