DIA DO MEIO AMBIENTE DESTACA AUMENTO DE DESERTIFICAÇÃO

Há mais de 40 anos, o ambientalista Nereu Rios dedica sua vida em tempo integral a coletar sementes por onde passa, gerar mudas e, finalmente, contemplar as árvores que fornecerão mais matéria-prima para que o ciclo recomece. Mas nos últimos anos, essa rotina tem mudado desde que o pesquisador de campo percebeu que multiplicar algumas espécies começou a ficar mais difícil.

“No Mato Grosso do Sul, há uns dez anos tenho coletado amostras de pau-ferro [Libidibia ferrea] que dá a vagem, mas não dá a semente”, diz. Nascido em Dourados (MS) e atualmente vivendo em Campo Grande (MS), Nereu se divide entre as mudas do viveiro em que trabalha e os caminhos que percorre por todo o Cerrado para acompanhar de perto a diversidade fruto de seu trabalho. Junto com a mudança das plantas, ele também percebe a mudança no cenário.

“Passando por Olhos D´Água, próximo de Alexânia (GO), eu estava mostrando para o meu filho uns ipês-roxos [Handroanthus impetiginosus] que a gente coletava há uns oito anos e que agora eles estão morrendo, porque virou monocultura margeando a estrada e quando eles pulverizam o milharal sai matando tudo”, destaca.

O pesquisador do Instituto de Pesquisa Ambiental da Amazônia (IPAM), André Andrade, explica que para produzir semente, a planta precisa de muita energia, que adquire pela fotossíntese e exige muita água e luz solar, mas com a mudança climática, o ciclo natural sofre um distúrbio. “O que acontece com a mudança climática é que quando a gente tem períodos de estiagem muito grande, combinado com um ano de El Niño, como no final de 2023, tem muito sol, mas falta água, então, a planta para a fotossíntese que precisa, senão ela morre rápido, e como isso não consegue produzir a energia para gerar sementes”, explica.

A advertência também foi reforçada pela Organização das Nações Unidas (ONU), que trouxe como tema para este 5 de junho, Dia Mundial do Meio Ambiente, o enfrentamento à desertificação e o desenvolvimento da resiliência à seca, alinhados com a declarada Década da Restauração de Ecossistemas. No centro da campanha está a frase: “Não podemos retroceder no tempo, mas podemos restaurar florestas, restabelecer os recursos hídricos e trazer o solo de volta. Nós somos a geração que pode fazer as pazes com a terra”. 

DESERTIFICAÇÃO-De acordo com o Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente (PNUMA), bilhões de hectares de terra estão degradados em todo o planeta, o que causa desertificação e mais seca. A organização alerta ainda que isso já afeta metade da população mundial, especialmente comunidades rurais e pequenos agricultores, o que põe em risco metade do Produto Interno Bruto (PIB) global e pode gerar insegurança alimentar em todo o planeta.

Andrade explica que a restauração de ecossistemas é tão importante porque tem se mostrado a solução mais rápida e efetiva para equilibrar tanto o ciclo da água, quanto o ciclo do carbono e evitar que o planeta aqueça ainda mais e que piorem as consequências, como secas e chuvas extremas.

“A restauração de grandes áreas é uma estratégia que a gente consegue fazer agora, em 20, 30 anos é possível investir pesado nisso, para que no futuro a gente alcance a transição de energia, porque existe um limite para o carbono que as florestas conseguem armazenar, existe um limite que a gente vai conseguir segurar essas mudanças a partir da vegetação nativa”, conclui.

Missão de vida-Nereu Rios conhece o Cerrado desde jovem, se criou no campo em uma família de moveleiros e nas proximidades do então chamado arco do desmatamento, mas o convívio com a terra o fez admirar mais uma bela árvore florida do que a madeira tombada. E nessa “missão de vida”, como ele mesmo diz, aprendeu na prática que as escolhas de cada pessoa afetam o clima, a vegetação e até os insetos, que em um ambiente desequilibrado viram pragas.

“Sei que tem o bicho que come a seiva na vagem do pau-ferro e não deixa a semente se desenvolver, mas não é só ele o problema. O angelim-amargo [Andira anthelmia] faz uns quatro anos que eu não consigo coletar e tinha muito, assim como a guavira [Campomanesia adamantium], ano passado deu pouca. As coisas que produziam todos os anos, agora produzem ano sim, ano não, às vezes ficam dois três anos sem produzir”, explica. (Fonte Agencia Brasil)


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JOQUINHA GONZAGA PARTICIPA DO V SEMINÁRIO INTERNACIONAL BACIA CULTURAL SOCIODIVERSA DA CHAPADA DO ARARIPE

De 05 a 08 de junho, a Fundação Casa Grande, em Nova Olinda-CE, será palco para o V Seminário Internacional Bacia Cultural Sociobiodiversa da Chapada do Araripe – Patrimônio Mundial dá Humanidade. Reunindo especialistas, pesquisadores, gestores públicos, líderes políticos, universidades, acadêmicos e entusiastas do Brasil e de outras partes do mundo, nesta edição, o evento enfatiza a importância da gestão participativa dos territórios culturais, com foco no projeto museus orgânicos. As gravuras rupestres do Sítio Lajedo Preto do Sertão do Araripe pernambucano marcam a identidade visual desta edição.

Para o gerente de cultura do Sesc Ceará, Alemberg Quindins, o Seminário representa uma oportunidade importante para a troca de conhecimento em apoio ao tema. “Neste encontro, abordaremos a relevância da gestão colaborativa do patrimônio cultural e sua sociobiodiversidade, com destaque para as ações de conservação e progresso executadas no projeto Museus Orgânicos aqui no Ceará e Pernambuco. Teremos quatro dias imersos em uma programação dinâmica, incluindo painéis, debates e apresentações culturais, além da participação dos mestres da cultura popular desses museus vivos”, destaca.

Em fevereiro deste ano, a Chapada do Araripe entrou oficialmente na lista indicativa brasileira de bens que tem potencialidade para o reconhecimento como Patrimônio Mundial pela Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (Unesco). A inscrição na lista é a etapa primordial e obrigatória para qualquer bem, seja cultural ou natural, iniciar um processo de reconhecimento como Patrimônio Mundial. A Chapada concorre com a proposta de um bem misto (natural e cultural).

Sobre a inclusão na lista e a realização de mais uma edição do Seminário, o presidente do Sistema Fecomércio Ceará, Luiz Gastão Bittencourt, parabeniza o esforço conjunto em torno desse processo. “Receber o reconhecimento como Patrimônio Mundial Misto terá impacto significativo em diversas aspectos. Ganharemos com a preservação do meio ambiente, da cultura, das tradições locais, do folclore e da gastronomia, não tenho dúvidas que essa conquista será um grande marco para todas as regiões abraçadas pela Chapada”, pontuou.

A Ministra da Cultura do Brasil, Margareth Menezes realiza a abertura do evento na quarta-feira, dia 5, às 10h da manhã. Também participam do momento a diretora regional do Senac Ceará, Débora Sombra; a secretária de Cultura do Ceará, Luísa Cela; a secretária de Turismo do Ceará, Yrwana Albuquerque; a secretária do Meio Ambiente e Mudanças Climáticas do Ceará, Vilma Freire; a diretora do Memorial do Homem Kariri, Anna Beatriz; o reitor da Universidade Federal do Ceará (UFC), Custódio Almeida; o reitor da Universidade Regional do Cariri (URCA), Kleber Oliveira; e o vice-reitor da Universidade Federal do Piauí (UFPI), Viriato Campelo.

Na manhã de quarta-feira, às 11h, acontece a Conferência sobre Gestão Participativa do Território Cultural. O evento contará com a presença de Conceição Lopes, Coordenadora do Centro de Estudos em Arqueologia, Artes e Ciência do Patrimônio da Universidade de Coimbra, Portugal e Consultora Científica do Dossiê para tornar a Chapada do Araripe Patrimônio da Humanidade; Alemberg Quindins, Gestor Cultural e fundador da Fundação Casa Grande Memorial do Homem Kariri; além de Fabiano Piúba, Secretário de Formação Artística, Livro e Leitura do Ministério da Cultura.

No dia 06, acontece a palestra “Atuação das Organizações Sociais no Fortalecimento do Patrimônio Cultural da Chapada do Araripe”. O painel contará com a presença da diretora presidente do Dragão do Mar, Raquel Gadelha e do diretor presidente do Instituto Mirante de Cultura e Arte, Tiago Santana. A mediação ficará por conta da Secretária de Cultura do Ceará, Luísa Cela.

Já na sexta-feira, dia 07, a partir das 10h, Sabrina Veras, diretora de programação social do Sesc Ceará; Rudimar Constâncio, gerente regional de cultura do Sesc Pernambuco; e Hildegarda Sampaio, coordenadora regional de cultura do Sesc Piauí, vão conduzir a palestra “Sesc: Programas Sociais e Iniciativas para Fortalecer a Cultura”. No sábado, dia 08 marcando o encerramento, os participantes vão conferir a apresentação musical do sanfoneiro, cantor e compositor Joquinha Gonzaga.

Serviço-V Seminário Internacional Bacia Cultural Sociobiodiversa da Chapada do Araripe – Patrimônio Dá Humanidade

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ZÉ MARCOLINO VIVE

Zé Marcolino era poeta, carpinteiro, barbeiro e vaqueiro. O maior sonho dele, porém, era ser parceiro de Luiz Gonzaga. Só o “Rei do Baião” poderia levar muito além as suas canções que já animavam bailes e festas na região de Várzea Paraíba, distrito de São Tomé, onde hoje está localizado o município de Sumé. 

Para alcançar o sonho e ter seu talento reconhecido além do Cariri, José Marcolino Alves escrevia cartas para Gonzaga, sem nunca ter obtido qualquer resposta. Depois de um primeiro encontro casual marcado pelo desinteresse do Velho Lua, Zé Marcolino conseguiu não apenas ser gravado por seu ídolo, mas foi levado com ele para morar no Rio de Janeiro, produzir um álbum juntos e viajar em turnê pelo país. Dessa ligação, surgiu uma obra que até hoje ilustra o imaginário da identidade sertaneja nordestina.

É para reverenciar o cancioneiro de Zé Marcolino, imortalizado em interpretações próprias e de tantos outros cantores, que o 7º Festival de Música da Paraíba homenageia o autor de ‘Numa sala de reboco’, ‘Serrote Agudo’, ‘Quero Chá’, ‘Pássaro carão’, ‘Matuto aperreado’, dentre outros. As inscrições para o festival serão abertas na próxima terça-feira (dia 6) e seguem até o dia 6 de março, com as duas primeiras eliminatórias sendo realizadas na cidade de Sumé, onde serão apresentadas as 30 músicas selecionadas. A final está marcada para o dia 8 de junho, em João Pessoa, onde serão distribuídos mais de R$ 30 mil em premiações no evento promovido pelo Governo do Estado por meio da Empresa Paraibana de Comunicação (EPC), Fundação Espaço Cultural (Funesc) e Secretaria de Comunicação (Secom). Tudo para reverenciar o nome que virou sinônimo de São João.

Onde tem uma sanfona, um triângulo e uma zabumba, tem um cantador que, em algum momento, vai se lembrar de ‘Numa Sala de Reboco’. Mas para chegar em um de seus maiores sucessos, Gonzaga pediu para Zé Marcolino apresentar algumas outras canções. A primeira foi ‘Sertão do Piancó’, uma resposta à música gravada por Jackson do Pandeiro sobre o Sertão do Moxotó. Assim que terminou, Luiz Gonzaga perguntou quantas ele lhe daria pra levar consigo, e Marcolino mostrou ainda ‘Pássaro carão’ e ‘Serrote Agudo’. Luiz Gonzaga levou mais que as músicas, levou Marcolino para o Rio de Janeiro.

Essa história é contada em detalhes na autobiografia Vida, Versos e Viola (Fundarpe, 1990). “Para Zé Marcolino, a glória seria ser gravado por Lua. Tanto que ele cedeu as parcerias em músicas que já estavam prontas antes de conhecer Gonzagão. Ele não procurava fama. Era por satisfação própria”, defende o jornalista e crítico musical paraibano radicado no Recife, José Teles. “Se não fosse gravada por Gonzaga, a música de Marcolino já teria sido esquecida. O mesmo teria acontecido com a música de outros autores gravados por Lua. Gonzagão foi um grande curador da música nordestina”, acrescenta o especialista. Com a parceria formada, Luiz Gonzaga grava pela RCA, em 1962, o LP Véio Macho. Das 12 faixas, metade era assinada por Marcolino.

“Marcolino fazia uma música atávica. Com muito da poesia oral daquela região rica em repentistas, glosadores, e sabia criar grandes melodias para suas letras”, define José Teles. O único álbum a registrar essas características do paraibano em sua própria voz foi gravado pela Rozenblit, em 1983, no LP Sala de Reboco, em que Zé Marcolino foi acompanhado pelo Quinteto Violado, de Pernambuco. Um dos fundadores do grupo e único paraibano do quinteto pernambucano, Marcelo Melo já se encontrava com Zé Marcolino durante viagens pelo interior.

“Gonzaga dizia que Marcolino tinha uma voz muito grave, que não dava pra cantar. E a gente achava que não. Ele era um cara que tinha aquelas melodias que normalmente tem os cantadores e repentistas, mas embora ele tocasse muito pouco, tinha uma musicalidade vocal muito boa e muito característica do Sertão, do sertanejo. Ele não tinha conhecimento musical. Fazia a coisa intuitivamente, mas com muita certeza e era muito afinado, ele era um cara muito preciso na afinação”, define o campinense Marcelo Melo, responsável pelos vocais, violão e viola do Quinteto Violado. 

A parceria entre o grupo e Marcolino ficou registrada também na participação de ambos no programa Som Brasil, comandado por Rolando Boldrin, na Rede Globo.

Além de suas características artísticas, Zé Marcolino era conhecido por ser um imbatível contador de causos. “Ele tinha um jeito de contar as histórias e fazer com um humor bem típico sertanejo, aquela coisa que você conta com muita seriedade e a gente, quando vê, está morrendo de rir do jeito que ele fala. Ele guardava as características do comportamento, do imaginário sertanejo, com a qualidade que Gonzaga também tinha”, conta Melo. A parceria de Marcolino e Gonzaga, porém, não durou tanto assim. Depois de participar da divulgação do disco Véio Macho, em uma longa turnê que partiu do Sul do país, Zé Marcolino se aproveitou quando eles estavam no Crato realizando o último show para pegar um ônibus com destino a Campina Grande e não voltou mais ao Rio.

Depois de tantos anos tentando ser parceiro de Gonzaga, esse é o traço na biografia de Zé Marcolino que mais intriga José Teles. “O fato de ele ter tido a chance de se fixar no Rio apadrinhado por Luiz Gonzaga, e decidir voltar pro Sertão da Paraíba, onde morou até a morte. Dizem que houve um desentendimento no Rio entre ele e Gonzaga, mas não sei se é verdade”, especula o crítico. Teles aponta, porém, que esse desejo já estava expressado no xote ‘Matuto Aperreado’, gravado por Gonzaga. “Fico doido com tanta fala de gente / e a zuada de automóvel a me assustar / se na rua vou fazer um cruzamento / tenho medo, eu num posso atravessar / desse jeito, eu sou franco em dizer / mas um dia eu aqui não posso mais ficar”.

Por força de uma sina trágica, Zé Marcolino viria a morrer justamente em um acidente de carro, em 1987, quando uma vaca cruzou a pista no município de Carnaíba (PE). Uma perda sentida na cultura popular nordestina, que teima em não ter o legado de Marcolino apagado. “Ele e muitos autores do passado correm o perigo do esquecimento porque as editoras que autorizam a liberação das músicas que estão no seu catálogo cobram muito caro, e isso inviabiliza as regravações”, explica Teles. Na memória de quem conviveu com Zé Marcolino ou foi influenciado por sua obra, o que resiste são os elementos que criou no imaginário que representa a identidade sertaneja nordestina.

“Ele era um camarada que retratava dentro da sua poesia a ambiência, a ecologia, o comportamento brincalhão satírico do homem nordestino com muita qualidade. Marcolino se inspirava também nos elementos da natureza, nos cantos dos pássaros, no comportamento do fura-barreira, do pássaro que fica em cima da estaca, fazendo a tapia para o menino que atira nele com a baliadeira. Ele tinha essas características, o pássaro carão, que dá sinais à natureza através do seu canto. Tenho por Marcolino um respeito muito grande à obra dele por essa qualidade fantástica que ele tinha”, finaliza Marcelo Melo.

Texto r Joel Cavalcanti* publicado originalmente na edição impressa de 04 de fevereiro de 2024.

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DESERTIFICAÇÃO NA CAATINGA PREOCUPA ESPECIALISTAS

Bioma que só existe no Brasil, a Caatinga está em risco. Especialistas temem a desertificação, um processo já iniciado em decorrência de questões naturais agravadas pela ação humana. O assunto foi tema de uma audiência pública na Comissão de Meio Ambiente do Senado, por requerimento da senadora Teresa Leitão (PT-PE).

Com a participação de senadores, estudiosos e militantes da causa ambiental no país, a conclusão a que se chegou é de que a desertificação da caatinga é resultado do uso inadequado do solo e dos recursos hídricos, além do desmatamento e das mudanças climáticas. 

"Ela é presente no agreste e no sertão pernambucanos, que contam com uma centena de municípios, 135 para ser mais precisa, e que hoje sofrem com o risco da desertificação. A Região Nordeste do nosso país vem sendo afetada com o fenômeno da desertificação, que, entre outros fatores, decorre do desmatamento dessas áreas, quando sabemos, mais do que nunca, o quanto a vegetação consiste em fator protetivo para evitar danos ambientais", contextualizou a senadora Teresa Leitão.

Principal bioma do semiárido brasileiro - que, aliás, é o bioma semiárido mais biodiverso do mundo -, a Caatinga ocupa uma área 11% do território nacional. É o ecossistema mais desmatado do país, principalmente pela pecuária e agricultura de subsistência, segundo o Instituto Nacional do Semiárido.

O representante do Ministério do Meio Ambiente e Mudança do Clima, Alexandre Henrique Pires, informou que o segundo Plano Brasileiro de Combate à Desertificação está em elaboração. "A elaboração do plano é uma estratégia de pensar, nos próximos 20 anos, que medidas e iniciativas nós devemos tratar para conservar a nossa Caatinga e a nossa biodiversidade, recuperar aquilo que foi degradado. Ao mesmo tempo, pensarmos em estratégias também de combate à desertificação."

FONTE: Com informações da Rádio Senado e do Ministério do Meio Ambiente. 

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UM POÇO DANTAS DE ENCANTAMENTOS

Poço Dantas emerge do fundo da minha infância como uma vibração sonora e imagética. Soa distante e no mais íntimo de mim, vindo associada à memória de momentos em que esse nome mexeu com a minha imaginação de menino, em Santa Cruz.
Eu sabia que era um lugar; que não ficava longe, mas a sonoridade da pronúncia me levava à fronteira de um território encantado; a um mundo que mais valia imaginar do que demarcar com o materialismo do tato e ou com passos de conquista.
A legenda Poço Dantas ficou, em mim, ligada à imagem serena e carismática do professor Luiz Correia, que sempre se aproximava das rodas de conversa na bodega do meu avô, Antônio Floresta, com a sua obsessiva inquietação, de espírito e sotaque bem sertanejos, defendendo, como à sua vida, o seu ideal de educação para o nosso meio onde campeava a carência e a desinformação.
De lá vinham estórias de encantamentos como uma, muitas vezes repetida por Seu Otílio do Desterro, em que “em noites de chuva, nas ribanceiras da Serra da Seriema, cinco carneiros de ouro, encarreados um atrás do outro, atravessavam a escuridão deixando um clarão dourado” – acredito eu que nas vidas e na eternidade daqueles momentos...
Até na origem da sua denominação há um mistério e uma mística poética, quando a única pista é o que reza a tradição oral, que traz a narrativa de que nos primórdios da colonização da região, teria ficado um poço conhecido pela presença de antas – que depois não foram mais vistas – nas suas margens.
Por muito tempo curiosos e visitantes trataram a versão popular como inverossímil, por considerarem não ser a Caatinga habitat dessa espécie animal. Hoje, sabe-se que havia sim, antas no Semiárido nordestino; o que mantém viva, a voz do povo, nesse imbróglio.
Há nos arredores de Poço Dantas uma energia pulsante, como que emanada de um tesouro telúrico esparramado a céu aberto, na pele sanguínea do chão, na flora, nos seres, nos ares e nos ventos que trazem e assentam a música de todos os tempos.
Lá, as botijas não precisam mais terem almas como mensageiras e sonhos noturnos como canal da informação privilegiada. Os auspícios sagrados estão esvoaçando, à luz do dia, e reluzindo na Serra da Seriema, nos morros que circundam a região, nas estradas, no cemitério, no adro da igreja, na praça, no semblante das pessoas, no Memorial Sertanejo, no idealismo de Luzia Barbosa.

Maurício Cordeiro Ferreira. 

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BEATA MARIA DE ARAUJO E O MILAGRE DO PADRE CÍCERO

Celebrando o aniversário da Beata Maria de Araújo, protagonista do “Milagre de Juazeiro”, o Centro Cultural do Cariri Sérvulo Esmeraldo – equipamento da Secretaria da Cultura do Estado do Ceará, gerido em parceria com o Instituto Mirante de Cultura e Arte integra a programação da 1ª Semana Maria de Araújo, que acontece de 20 a 24 de maio, junto do Instituto Beata Maria de Araújo e o Movimento Pró-memória da Beata Maria de Araújo.

Em 22 de outubro de 1930, o túmulo da Beata Maria de Araújo foi violado e até hoje não há uma resposta oficial sobre a ordem do mandato de abertura ou onde encontram-se seus restos mortais. Nessa perspectiva, no dia 23 de maio, o Centro Cultural recebe a exibição e roda de conversa: “Onde estão os restos mortais da Beata?”, com Álisson Flor e a equipe da produtora Candieiros, na Sala de Formação 01, às 18h.

Apresentando o monólogo “Maria de Araújo e o milagre de Juazeiro Do Norte”, Rafa Moraes confronta temas como racismo, sexismo, intolerância e perseguição religiosa e política, culminando no desfecho trágico da beata, que mesmo após sua morte, foi brutalmente violentada. A atividade acontece no dia 25, às 19h, no Bosque.

Beata Maria de Araújo

Maria Magdalena do Espírito Santo de Araújo nasceu na antiga Joaseiro, em 24 de maio, o ano exato de seu nascimento permanece uma incógnita para os pesquisadores. Cresceu em meio às oficinas de trabalho e salas de oração, construindo vida debaixo do silêncio da oficialidade. Artesã, costurava bonecas de pano e ensinava o ofício para outras crianças do povoado, lugar que também trabalhava como doceira, lavadeira e chegou até a contar tijolos em uma olaria.

Aos 22 anos, passou a exercer os hábitos de freira após um retiro espiritual realizado por Padre Cícero Romão Batista e Padre Vicente Sóter. Ali a mulher entregou-se à andança missionária. Em 1889, durante uma missa celebrada pelo Padre Cícero, a Beata recebeu hóstias que se transformavam em sangue na boca, tornando-se o pilar que une até hoje Juazeiro do Norte com a fé. Nas semanas que seguiram, chegaram de forma espontânea milhares de peregrinos e, em 7 de julho de 1889, o lugar era terra para um mar de fiéis, sendo o primeiro marco das romarias.

Maria de Araújo faleceu em 17 de janeiro de 1914, após 20 anos de clausura por imposição da Igreja Católica. Seu túmulo, localizado na Capela do Perpétuo Socorro em Juazeiro, foi violado e destruído, sendo que seus restos mortais foram roubados, permanecendo até hoje desconhecida a localização de seu corpo.

Memória e Patrimônio

Questionando esquecimentos como o da Beata Maria de Araújo, que foi colocada como coadjuvante do “milagre” que tornou Juazeiro do Norte em “Terra da Fé”, a professora Vitória Gomes facilitará o minicurso “Por que nos querem esquecidas? Memórias de mulheres em disputas e resistências”, de 14 a 17 de maio.

O curso discute noções de memória e patrimônio a partir da perspectiva de gênero e descolonização, estimulando os participantes a refletirem sobre as dimensões do território caririense, abordando desigualdades, falta de representatividade, silenciamento e invisibilização.

Vitória Gomes, professora na Universidade Federal do Cariri e pesquisadora, é doutora em Ciência da Informação, com a tese “Patrimônios e Matrimônios: Intersecções entre (de)colonialidades, raça, gênero e memória”, e desenvolve pesquisas sobre culturas e patrimônios desde a graduação.

Centro Cultural do Cariri

Inaugurado no dia 1º de abril de 2022, o Centro Cultural do Cariri é um espaço para a discussão e promoção da arte, ciência e tecnologia, aliadas à tradição cultural e à contemporaneidade, estando aberto aos processos de experimentação e intercâmbio.

Instalado na cidade de Crato, Ceará, é conceituado com um Centro Cultural Parque e sua infraestrutura atende, especialmente, a Região do Cariri Cearense composta por 29 municípios. Com mais de 50 mil metros quadrados de área, conta com espaços expositivos, residências artísticas, rádio escola, salas de formação, palco para espetáculos e projeções de cinema e ateliê de artes e ofícios.

A área externa concentra os espaços esportivos e de lazer, na perspectiva de esporte de participação e educacional, através de areninha, pistas de skate e quadras de areias, além da expressiva área verde e do equipamento voltado especificamente para o público infantil, a brinquedopraça. Em processo de estruturação, estão o teatro escola, as salas de aula e ensaio, o café, o restaurante escola e o planetário. Toda programação é gratuita.

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CANUDO ECOLÓGICO DE BABAÇU MUDA DE COR SE BEBIDA ESTIVER VENCIDA

Os plásticos sintéticos estão entre os maiores vilões do meio ambiente. Principal base para a produção de recipientes, o material pode levar cerca de 500 anos para se decompor na natureza. Em busca de alternativas, pesquisadores da Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras de Ribeirão Preto (FFCLRP) da USP desenvolvem soluções ecológicas biodegradáveis às embalagens e canudos, utilizando resíduos agroindustriais e produtos naturais que carregam propriedades antimicrobianas e antioxidantes.

Para além de simplesmente substituir o plástico, geralmente baseado em substâncias derivadas do petróleo, o enfoque do grupo da USP, liderado pela professora Delia Rita Tapia Blácido do Departamento de Química da FFCLRP,  é o que chamam de “embalagens ativas”, pois aprimoram a utilidade para o consumidor com características agregadas, como poderes antioxidantes e antimicrobianos obtidos de compostos como a quitosana, a própolis verde e os resíduos de uva e jabuticaba.

Responsável pela produção e orientação de diferentes estudos com matéria-prima natural, encontrada principalmente em resíduos agrícolas, a professora Delia Blácido conta que o interesse é utilizar esses recursos para transformar os resíduos que, quando descartados, também podem contaminar o meio ambiente, encontrando soluções criativas que agregam mais valor ao produto final.

“A ideia é gerar materiais que tenham uma atividade e protejam o alimento sem o uso excessivo de aditivos sintéticos, como antibióticos ou antioxidantes que podem ser prejudiciais para a saúde”, ressalta a professora. Como exemplos, apresenta dois projetos de mestrado mais recentes sob sua orientação nessa linha de pesquisa: o desenvolvimento de uma embalagem feita a partir do amido de batata adicionado de extrato de própolis obtido por extração alcalina, de Ivone Yanira Iquiapaza, e de canudos que utilizam o mesocarpo (polpa) do fruto da palmeira de babaçu, realizado por Luís Fernando Zitei Baptista. (Jornal da USP)

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