CANÇÕES DA TERRA, DO MAR E DO AR TOCAM A ALMA DOS OUVINTES

Depois de mais de quatro décadas de pesquisas, o professor Marcos Ferreira Santos, da Faculdade de Educação da USP, acaba de lançar quatro discos e dois áudio-books com músicas e poemas das mais diferentes origens étnicas. Os álbuns Arkheophonias (em dois volumes), Amantras e Arkheovox e o áudio-book Koe’ti – Mitopoéticas (também em dois volumes) reúnem, além de obras compostas pelo professor, sons e textos que ele compilou em comunidades tradicionais e povos originários, principalmente entre os quéchuas, aymaras e mapuches, na região andina, mas também em outros continentes.

As canções apresentadas nos discos são entoadas em pelo menos 20 idiomas, como quéchua, guarani, árabe, mongol, mandarim, hindi, basco, húngaro e tâmil, entre outros. Além disso, elas cobrem um amplo espectro de ritmos, desde o huayno andino e o ghazal indiano até o nawwari libanês, o apala nigeriano e o ditiritambo grego, passando por trovas medievais latinas, mantras védicos, milongas argentinas e cirandas praieiras.

Quanto aos instrumentos utilizados para executar essas músicas, a variedade também é imensa. Estão presentes nos discos e nos e-books instrumentos de sopro como tarkas bolivianas e dizis chinesas, as cordas do morin khur mongol (leia mais no texto abaixo) e do cuatro venezoelano e a percussão dos atabaques yorubás, tablas indianas, udus peruanos, djembês senegaleses e darbakis marroquinos, entre vários outros.

Foram muitas as vivências do professor com povos originários e comunidades tradicionais, em que sempre fez a compilação de narrativas míticas, canções e instrumentos autóctones com seus mitos de origem, em diálogo com outras tradições. Ao lado de Ailton Krenak, Marcos Terena e outros líderes indígenas, circulou entre várias aldeias e povos, em especial, os kaingangs, os guaranis mbyá e os nhandevas, em São Paulo e no Rio Grande do Sul, os pataxós, na Bahia, e os ashaninkas, no Acre e no Peru. Depois, ao longo da Cordilheira dos Andes, conviveu com quéchuas e aymaras (Bolívia e Peru), chiriguanos (Bolívia) e mapuches (sul do Chile e Patagônia argentina), entre outras culturas.

O professor investiu anos de convivência também com comunidades tradicionais instaladas no Brasil, como grupos sufis em São Paulo, os nihonji e uchinanchu (São Paulo, Cotia e Ibiúna), taoístas e chineses (bairro de Água Rasa e Brás, em São Paulo), bhaktas de vaishnavas (Rio de Janeiro, Minas Gerais e interior de São Paulo), rastafari (Jundiaí), quilombolas (Guaratinguetá, Tietê, interior do Rio de Janeiro e Minas Gerais) e gaúchos de Rio Grande, Pelotas e Jaguarão, na divisa com o Uruguai.

“A ancestralidade tem um princípio de reciprocidade que faz com que nunca se converta o outro em ‘objeto de pesquisa’, mas pessoas irmanadas por um café, uma chicha ou uma cuia de chimarrão sobre a mesa da amizade, entre seus sonhos, frustrações, dores, dominação sociopolítica, esperança e utopias”, afirma o professor.

“Esse processo nunca cabe nos prazos de agências de financiamento e, por isso, a pesquisa básica em mitologia diretamente com os povos originários e comunidades tradicionais pode levar uma vida inteira.” 

Para o professor, o registro em formato audiovisual decorre da necessidade de ter essa investigação preservada, assim como o diálogo criativo e poético que se estabeleceu com as comunidades e pessoas que colaboraram com ele ao longo dos anos. 

“No âmbito dessa área de investigação e intervenção, não adianta muito e nem é suficiente tão somente o registro escrito, acadêmico ou não. A pesquisa mítica em sua forma original está intimamente ligada ao canto, à dança e aos instrumentos musicais. Portanto, ter esse material sonoro registrado era parte fundamental do processo de investigação e criação, de releitura simbólica e diálogo intercultural”, afirma. “Para tratar apenas de uma canção mais emblemática, talvez fosse necessário um livro inteiro. Ouvi-la talvez seja suficiente para que a tradição se cumpra na alma do ouvinte”, completa.

O professor pontua suas influências, entre elas o instrumentista indiano Pandit Ravi Shankar (1921-2012), o argentino Jorge Milchberg (1928), fundador do grupo parisiense Los Inkas/Urubamba, o chileno Guamary/Arak Pacha (1980) e o brasileiro Elomar Figueira Mello (1937). Lembra também que há gravações históricas de shows ao vivo nos anos 80 e conversas musicais – característica do seu “estilo didático”, sob a influência do mestre Ariano Suassuna (1927-2014) – da década de 2010 a 2020, além de produções no estúdio no seu sítio na Serra da Cuesta, na região de Botucatu, no interior paulista, onde está radicado desde 2014. 

“Curiosamente, a mesma Serra da Cuesta de Rio Bonito (hoje o município de Bofete), onde Antonio Candido fez pesquisas para a sua tese de doutoramento em 1954”, aponta, acrescentando que Candido também se dedicou a recompilar canções tradicionais, como é o caso de Canção de Siruiz, trecho da obra Grande Sertão: Veredas, de Guimarães Rosa. “Eu apenas sigo a mesma linhagem caipira e caiçara com os pés nas raízes do chão e do mar e um canto ao vento.”

A trajetória do professor Marcos Santos como folclorista começou em 1979, muito antes da vida acadêmica, que, segundo ele, foi tardia. “O envolvimento com os protestos contra o golpe militar brasileiro e chileno e a adesão à União das Nações Indígenas (1980) e ao Círculo de Integração Social dos Países Latino-Americanos me levaram a uma atuação político-social intensa, articulando cultura, música e mitologia”, afirma, comentando que vem daí sua parceria com dom Pedro Casaldáliga, Pedro Tierra e Martin Coplas na Missa da Terra Sem Males, peça apresentada em 1982 no Teatro da Universidade Católica (Tuca), em São Paulo, e os primeiros LPs lançados em 1985 e 1986. Naquela época, conta, adotava o pseudônimo de “Arauco, el Brujo” como forma de despistar os mecanismos de repressão em função de sua proximidade com as comunidades mapuches.

Entre 1994 e 1998, Santos atuou na divisão de Desenvolvimento Cultural do Instituto Butantan, em São Paulo, com o objetivo não apenas de incrementar os cursos de divulgação científica para a comunidade, mas também fazer do instituto um polo de criação artístico-cultural. “Essa temática presente em minha atuação como investigador e como folclorista, através da arte-educação, se complementou com a atuação docente nos cursos de Pedagogia e de  Licenciatura na Faculdade de Educação da USP, que tiveram como pontos altos a criação do Laboratório Experimental de Arte-Educação e Cultura (Lab_Arte), em 2004) e a criação da disciplina de Cultura e Educação Afroameríndia, em 2019”, relata.

“Todos ainda estranham – ainda que já ocorram há mais de 20 anos na USP – minhas aulas com improvisação musical com tambores, flautas, cortejos nos corredores, dança étnica nos gramados e estacionamentos, saraus nos saguões, argila, xilogravura, mosaicos, pintura em tecido, ainda que abordando Políticas Públicas de Educação, além dos meus antigos cursos de Mitologia na graduação e na pós-graduação”, diz. É por isso, explica, que todos os seus projetos de pesquisa, orientações de iniciação científica, mestrado, doutorado e pós-doutoramento (mais de 50 teses), bem como os cursos de graduação e pós-graduação, orbitam até hoje sobre três pilares: mitologia, música e iniciação.

Mas como definir essa extensa e rigorosa pesquisa? O professor usa as palavras do poeta e professor da Universidade Federal do Pará (UFPA) João de Jesus Paes Loureiro, no prefácio do livro Koe’ti – Mitopoéticas: “Marcos Ferreira Santos apresenta uma ‘cordilheira poética translinguística’; pois o material decorrente desses anos de investigação abarca também não apenas uma pletora de instrumentos e ritmos, como também de línguas em suas manifestações de origem e recriações que, fiéis aos espírito da língua e sua estrutura mítica em sua pragmática linguageira, não há como fazer traduções. Por isso, o trânsito entre português, espanhol, inglês, francês, árabe, mongol, tamil, mandarim, bengali, basco (euskera), grego, nihongo, latim, húngaro, hindi, alemão, uchinanguchi, quéchua, mapugundun e guarani”.

Marcos Santos adianta que prepara outro livro, Cantiga Leiga Para Um Rio Seco e Outras Mitologias, em três volumes, em fase final de edição. Outros álbuns previstos são: Dança com Minotauro, em parceria com Fabiana Rubira, explorando o universo das narrações de histórias as paisagens sonoras de registros míticos, e Killa Taki – Lunário, com canções, instrumentos e registros míticos relacionados ao culto lunar e crepuscular entre povos orientais e afro-ameríndios.

Os álbuns Arkheophonias (volumes 1 e 2), Amantras e Arkheovox e o áudio-book Koe’ti – Mitopoéticas (volumes 1 e 2), do professor Marcos Ferreira Santos, estão disponíveis gratuitamente no spotify, no canal do Youtube, no onerpm e nas demais plataformas musicais (Deezer, Amazon Music, Tiktok, Pandora, Shazam e Itunes, entre outras).

Para a composição dos álbuns Arkheophonias, Amantras e Arkheovox e do áudio-book Koe’ti – Mitopoéticas foi utilizado grande número de instrumentos. 

“São muitos instrumentos e muito ‘diferentes’ dos usuais, e cada um tem uma característica própria sonora, organológica e de matriz mítica que se articula com sua sonoridade. Portanto, a interpretação não é apenas ‘técnica’, mas deve estar articulada com o contexto da paisagem sonora, o que propicia também diálogos com outras tradições, desde que não haja conflitos entre as paisagens”, afirma o professor Marcos Ferreira Santos. Ele afirma que, “diferente dos ‘modismos de liquidificador’ (misturar tudo e ver como é que fica), sobretudo nas atuais vogas de world music, aqui as experimentações sonoras são decorrentes de largos anos de investigação e nunca são gratuitas”.

O professor dá como exemplo o morin khuur, uma espécie de violoncelo de duas cordas com corpo em madeira quadrado ou trapezoidal, cujo braço termina numa cabeça de cavalo esculpida. Por isso, morin khuur, em mongol, é, literalmente, cabeça de cavalo. 

“Durante a tentativa de Temujin (conhecido pelo título de Genghis Khan, ‘o grande unificador’) de unificar as tribos nômades mongóis, um de seus guerreiros tinha uma saudade incontida de sua mulher. Rogou a Tengri (senhor andrógino dos céus) que o ajudasse. Durante seu sono, um cavalo apareceu para o guerreiro e o levou até sua esposa. Antes do amanhecer, o cavalo o trazia de volta ao campo de batalha, voando, e assim conseguia manter-se fiel a Temujin e também à sua esposa. Até que uma outra mulher invejosa descobriu a artimanha do guerreiro e sacrificou o cavalo para que os dois amantes não mais se encontrassem”, conta o professor. Segundo ele, foi daí que nasceu o morin khuur, com suas duas cordas inseparáveis sendo tocadas juntas e o cavalo encimando o braço do instrumento, numa sonoridade que sempre faz com que os dois amantes se encontrem novamente.

 “É impossível interpretar o instrumento sem ter sua narrativa de origem sempre presente na constituição melódica da canção, seu arranjo e sua função simbólica na paisagem sonora que se está constituindo”, complementa.

Outro exemplo que o professor dá é a txalaparta basca de percussão. “São duas grossas madeiras dispostas de maneira longitudinal sobre dois cavaletes e com proteção de tecido ou lã de ovelha. As madeiras são sempre provenientes da prensa de maçã para produzir a tradicional cerveja de maçã, a sidra. Quando já não estão em boas condições de uso, são convertidas em txalaparta, que são percutidas por dois baquetes de madeira também, geralmente, em duplas”, informa. Segundo ele, o som obtido é absolutamente original e ligado diretamente ao mito de Mari, a deusa primordial do universo basco em Euskal Herria. 

“Mari, ama lur, em euskara, é mãe-terra. A senhora natureza protetora das árvores, frutos, dos casarios nas montanhas, que, por vezes, se vê como bola de fogo atravessando os céus à noite, com uma foice à mão, ou como ave que cruza e descruza os caminhos, senhora da vida e da morte, animando o som das madeiras nos bosques de Biskaya, que se presentifica na txalaparta.” (Fonte: Claudia Costa-Jornal USP)

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COVID-19: BAHIA CHEGA A 80% DE OCUPAÇÃO DE LEITOS DE UTI E GOVERNADOR ANUNCIA AMPLIAÇÃO DO TOQUE DE RECOLHER

O governador da Bahia, Rui Costa, afirmou neste domingo (21) que a Bahia alcançou a marca de 80% de ocupação dos leitos de UTI e que, por isso, o toque de recolher em vigor desde sexta-feira (19) será ampliado a partir de segunda-feira (22). A medida prorrogou ainda o toque de recolher até 28 de fevereiro (antes era até 25) e será publicada em edição extra do Diário Oficial.

"Infelizmente, alcançamos a marca de 80% de ocupação dos leitos de UTI na #Bahia e a consequência será a ampliação do horário do toque de recolher. A partir desta segunda, dia 22, a restrição será das 20h às 5h", afirmou.

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JOSÉ FRANCISCO, O ZEZINHO LOCUTOR. *TEXTO ADERALDO LUCIANO

Relutei em escrever aqui sobre a morte do meu padrinho Zezinho Locutor, na última sexta-feira, dia 19. Porque, ao chamá-lo de padrinho, eu seria obrigado a mexer em uma caixa de dores escondidas muito profundamente em terras sob meus pés e que se movem para qualquer lugar por onde vou. Eu seria obrigado a quebrar uma regra de irmandade. Ao mesmo tempo não poderei ficar calado e omitir minha emoção intensa diante desse fato. SÓ POR HOJE e várias pessoas entenderão.

Zezinho foi a primeira pessoa que, diante do meu quadro terrível de mendicância existencial, lá bem longe no passado, me disse que tudo podia ser diferente. Que eu poderia dominar as forças que me sustentavam na escuridão e que a Vida podia ser melhor do que aquela viagem dormente a qual eu me entregava diariamente. Ele me fez apenas um convite. Desesperado, eu aceitei. E, por ele, eu voltei até aqui. Encostei nele, todos os dias, nas minhas crises de abstinência. Recaí várias vezes, mas a mão de Zezinho estava sempre estendida.

Chegara do Recife, pintor de paredes, para embelezar os casarões coloniais de Areia. Trabalhava cantando. Voz gravíssima profunda, quem passava ouvia as velhas canções de Nelson Gonçalves, Trio Irakitan, Altemar Dutra, Orlando Silva, Lupicínio Rodrigues, Cartola e outros da geração de ouro de nossa música popular. Desceu da escada e entrou para o mundo da locução nos serviços de som da cidade. Fundou a difusora areense. Amava o microfone. O rádio era nossa matéria.

Em algum ano desses, fui visitar Areia e participar do Festival de Artes junto com Babilak Bah, artista do som, da performance, amigo das Almas Vivas e dos Orixás. Durante um café da manhã em Zé Nunes, no Beco da Facada, apresentei os dois. Conversamos longamente e diante da história de Zezinho ficamos convencidos e nos empenhamos em construir alguma coisa sobre aquela experiência. Mas Zezinho partiu na sexta-feira. 

Liguei pra Babilak. E choramos juntos. Aquela manhã nunca será esquecida. Zezinho, com seus ensinamentos, libertou-me do desespero. São quase 30 anos de nossa primeira conversa. Tenho que dizer para meus amigos que você, meu querido padrinho, ensinou-me que tudo se resume a viver apenas 24 horas por dia, tomando cuidado a cada segundo e minuto para não desviar o olhar e alimentar o monstro que carrego dentro de mim. Vivo, Zezinho, SÓ POR HOJE. Muito obrigado. Descanse em paz. (Texto: Aderaldo Luciano-professor mestre e doutor em Ciência da Literatura)

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AFONSO CONSELHEIRO, MINHA PEDRA COMPLETA 73 ANOS

Nas margens do lado direito do Rio São Francisco, Juazeiro-Bahia, terra de João Gilberto e Ivete Sangalo, a figura de José Afonso da Cunha Martins não passa despercebido. Trata-se do ator e artesão e os seus inúmeros apelidos: Afonso Conselheiro, Minha Pedra.

Nascido em Patamuté-Bahia em 19 de fevereiro de 1948, Afonso Conselheiro completou 73 anos. Diz que adotou o Rio São Francisco e a cultura gonzagueano como filhos. O ator que vive em Juazeiro desde 1965, diz que um dos momentos mais produtivos de sua vida foi a gravação da novela da Rede Globo "Senhora do Destino". A novela está em exibição "Vale a Pena Ver de Novo" nos finais da tarde e Afonso contracena com atrizes Renata Sorah, Carolina Dickman e Suzana Vieira e o saudoso José Wilker.

"Diante da dificuldade em dar sustento a seus filhos pequenos, a jovem nordestina Maria do Carmo Ferreira da Silva deixa a pequena Belém de São Francisco, no interior de Pernambuco, disposta a encontrar na cidade grande uma forma mais digna de criar seus rebentos. Quando chega ao Rio de Janeiro, a retirante encontra uma cidade à beira do caos. Era dezembro de 1968 e o governo do país decretara o Ato Institucional número cinco, o AI-5. A história da novela parte desse fato", diz Conselheiro.

Afonso todo ano participa da Romaria de Canudos onde encarna as vestes de Antonio Conselheiro. "Não perco este momento de fé e resistência cultural. Antonio Conselheiro era um visionário", finaliza Afonso.

Confira texto de Valternilo Pimentel:

Estamos sempre divulgando gente boa e desta vez, focalizaremos o artesão José Afonso da Cunha Martins, mais conhecido por “Matusalém", apelido que ganhou quando participou da  novela Senhora do Destino. Afonso achava um pouco constrangedor perguntar o nome das pessoas e então passou a chamá-las de "Minha pedra", apelido que também incorporou. Ele também é conhecido como Afonso Conselheiro (devido a sua extensa barba, cabelos compridos e por representar Antônio Conselheiro grande revolucionário de Canudos-Bahia). Afonso é natural de  Patamuté, mais precisamente da Fazenda Boa Esperança, no interior de  Curaçá.

O artesanato é uma técnica manual utilizada para produzir objetos feitos a partir de matéria-prima natural. Normalmente Afonso faz seu artesanato em lata dentro de sua própria casa ou em uma pequena oficina. A partir da Revolução Industrial, que iniciou na Inglaterra, o artesanato foi fortemente desvalorizado, deixou de ser tão importante, já que neste período capitalista o trabalho foi dividido colocando determinadas pessoas para realizarem funções específicas, essas deixaram de participar de todo o processo de fabricação. 

Além disso, os artesãos eram submetidos às péssimas condições de trabalho e baixa remuneração. Hoje, o artesanato voltou a ter prestígio e importância. Continua a buscar elementos naturais para desenvolver suas peças originadas do barro, couro, pedra, folhas e ramos secos entre outros. Em todas as regiões é possível encontrar artesanatos diversificados originados a partir da natureza típica do local e de técnicas específicas.

O artesanato é reconhecido em áreas como bijuterias, bordados, cerâmica, vidro, gesso, mosaicos, pinturas, velas, sabonetes, saches, caixas variadas, reciclagem, metais, brinquedos, arranjos, apliques, além de várias técnicas distintas utilizadas para a fabricação de peças.

"Eu, no entanto, desenvolvi o reaproveitamento de latas de cervejas e refrigerantes para a fabricação de canecas, chapéus, toalhas, camisetas e outras peças que podem ser utilizadas no lar, uso a precisão e traço nas mãos, em cada peça fabricada vejo naquela arte, uma parte do meu corpo que me conduz a felicidade de poder compartilhar com quem adquire o meu produto a um reconhecimento também pelo trabalho realizado, e a busca de mais outras obras, pois a vida do artista precisa de sensibilidade para perceber que muitas vezes a realização de uma pessoa pode estar marcada na peça criada e seus apliques podendo transmitir lembranças e até mesmo conquistando a ingenuidade de uma criança ao ver sua foto plotada na peça. Me sinto gratificado” conclui emocionado.

Antigo morador de Juazeiro na década de 60 e no esplendor da juventude estudou no Colégio Rui Barbosa, Colégio Dom Bosco e Colégio Estadual em Petrolina-Pe. Em 1969 resolve viajar à São Paulo onde trabalha como Operador de Caldeira, na Laborfarma como embalador, foi informante no Instituto de Energia Atômica na USP-Cidade Universitária, ajudante de mecânico na Água Funda. 

Retornando a Juazeiro no ano de 1975, onde trabalhou em banca de revista  de Moailton Lopes e depois numa loja de discos com Moanilton Mesquita Lopes, em Senhor do Bonfim, sendo que um dia montou uma loja de discos de sua propriedade e de seu irmão. Logo depois retorna à Fazenda Boa Esperança onde torna-se criador de ovinos com seu pai. Neste período começa a criar cabelo e barba, sendo convidado por Gildemar Sena para fazer o papel de Antônio Conselheiro nos 100 anos do massacre de Canudos ocorrido em 1997 e, até hoje é o convidado a exercer esta representação de “ Conselheiro” herdando, portanto, o apelido.

Afonso Conselheiro também foi um carnavalesco fervoroso, lembra que em 1960 entusiasmado com o carnaval de rua juntou-se com colegas e faziam a diversão nas ruas e ainda não tinha despertado o carnaval nos clubes. Anos mais tarde, a convite de amigos frequentadores dos clubes Sociais, resolve acompanhá-los tanto na Sociedade Apolo Juazeirense e 28 de Setembro durante à noite e a Sociedade Artífices Juazeirense durante as matinês.

O seu Bloco de Carnaval foi “ Os Pirados” constituído de homens e mulheres que tinham como vestimenta uma mortalha azul com a logomarca de um negro com cabelo Black Power e barba em cor branca, com cerca de 30 componentes alguns com instrumentos de percussão e muito samba. A concentração era no Largo Dois de Julho; recorda-se de algumas pessoas que deram o sustentáculo do Bloco como: Expedito Alves, os irmãos Durval (In Memorian ) Bernadeth de Dona Almerinda, Pinguim, “Seu Lobo”, Pinduca, Josias Gomes, Professor Arimatéia, Carlinhos de “Rachosa”, Zé Mucine, Hildelbrando,Tavares (In memorian ) Carlinhos meu irmão, “Biba”, e toda sua família, enfim nosso bloco era muito unido. Com o decorrer dos anos os jovens tiveram que procurar seu próprio rumo para ter sua independência, culminando com sua dissolução e deixando muitas saudades.

Afonso decide, não participar mais de bloco percussivo e passa brincar seu próprio carnaval. Em 2000, por ter seu visual exótico de Antônio conselheiro, recebe convite do Presidente do Grupo Cultural “Comando Virgulino“, Crisóstomo Lima (Zó),  tornando-se figura de destaque da agremiação. Diz muito feliz “foi um grande orgulho poder interpretar o beato Antonio Conselheiro durante o Carnaval de Juazeiro e em breve voltarei a homenageá-lo. Ele foi um grande homem do sertão" finaliza.

AFONSO ATOR: Sua barba branca e cabelos esvoaçados resultaram no convite para participar da novela Senhora do Destino da Rede Globo. Inicialmente, Afonso integrou oficina de interpretação, fez testes e sendo aprovado, ganha o papel de Matusalém, rendendo-lhe o apelido e o carisma dos fãs espalhados por todo Brasil.

Por: Valterlino Pimentel (Pinguim)

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CRESCE NÚMERO DE ÁREAS DE PRODUÇÃO DE AGRICULTURA ORGÂNICA NO BRASIL

Um estudo do Organis, entidade de promoção do setor de orgânicos no Brasi confirma um crescimento nacional de consumos de produtos orgânicos aproximado de 30% em relação a 2019.

Segundo o diretor da pesquisa Cobi Cruz, mais um dado observado nos últimos meses chama atenção.

 “Em 2020, a região que mais cresceu em número de áreas de produção cadastradas no Ministério da Agricultura foi o Nordeste, com 36% de incremento”, apontou, destacando o investimento de políticas públicas. E são as feirinhas de rua as grandes escoadoras, no momento, desse tipo de mercadoria. “O grande varejo cresceu pouco mais de 5% no ano passado, porque as pessoas começaram a procurar outros canais”, defende. 

Segundo a pesquisa, a compra de produtos orgânicos está relacionada ao frescor dos alimentos, pois grande parte das mercadorias mencionadas pelos entrevistados foram frutas, legumes e verduras. Ela também indicou as feiras e supermercados como os locais preferidos para a compra de produtos orgânicos, porém o consumo se esbarra não só nos preços, mas também na dificuldade de achar esses produtos e ainda a falta de diversidade deles.

O estudo conclui que há o reconhecimento de valor no produto orgânico, independentemente de ser ou não consumidor. Apesar do preço dos produtos ser o maior obstáculo, tanto para os que já consomem orgânicos, passarem a comprar mais, tanto para aqueles que não compram nenhum tipo de orgânicos, 67% dos consumidores e 26% dos não consumidores estão dispostos a aumentar suas compras nos próximos seis meses.

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DUNAS VEM AUMENTANDO EM RODELAS, BAHIA

Resultado de anos de degradação associada às mais diversas intervenções humanas, milhares de quilômetros de vegetação nativa em Rodelas, interior da Bahia, vem sendo engolida pelo avanço das dunas, uma fina camada de areia que se desenvolve principalmente pela ação dos ventos, formando montes ou montanhas de diversas formas e tamanhos.

Com mais de 400 hectares, o local é conhecido como deserto de Surubabel, situado na beira do lago da barragem de Itaparica. De acordo com o artigo “O deserto do Surubabel na Bahia”, publicado pelos autores Arlicélio de Queiroz Paiva, Quintino Reis Araújo, Eduardo Gross e Liovando Marciano da Costa, com o passar dos anos, esse local serviu como área de pastoreio excessivo, principalmente de caprinos, e sofreu um desmatamento acentuado, com a retirada de lenha para atender às necessidades da população.

Atualmente, a área é reivindicada pela comunidade indígena Tuxá como compensação pelo deslocamento do seu território original em 1988 devido à construção da usina hidrelétrica Luiz Gonzaga, também conhecida como Lago de Itaparica, com uma área inundada de 150 quilômetros e superfície de 83.400 hectares dos estados da Bahia e de Pernambuco. 

Os indíos Tuxá ocupavam diversas ilhas e em especial a Ilha da Viúva, no Rio São Francisco, seu território agrícola. A Ilha da Viúva também foi submersa e de acordo com o cacique Anselmo Tuxá até hoje não receberam na totalidade as terras de compensação.

“É uma luta árdua a que temos travado todos estes anos. Sem direito a esta terra a gente sequer pode cuidar para preservar a vegetação; e vamos acompanhando o avanço das dunas que embora forme uma paisagem belíssima, vai enterrando a vegetação nativa”, lamentou o Cacique.

Na Caatinga, único bioma exclusivamente brasileiro, aproximadamente 126.336 km² já são áreas desertas ou em fase de desertificação. Um levantamento feito pelo Laboratório de Análise e Processamento de Imagens de Satélite (Lapis), realizado no período de 2013 a 2017, apontou que cerca de 13% do território do Semiárido brasileiro está desertificado.

 “Os impactos provocados pelo processo de desertificação na Caatinga são enormes. Esse fenômeno aumenta o carreamento de sedimentos para dentro da calha principal do rio, trazendo graves efeitos já bem conhecidos ao Velho Chico”, afirma o professor da Universidade Federal do Vale do São Francisco, Renato Garcia.

De acordo com estudos, as áreas de ocorrência de desertificação no Brasil estão enquadradas, principalmente, no polígono das secas no Nordeste Brasileiro. As regiões de Gilbués (PI), Cabrobó (PE), Irauçuba (CE) e Seridó (RN) foram decretadas como núcleos de desertificação após praticamente atingirem um grau irreversível. 

Em 2007, a Fundação Grupo Esquel Brasil foi designada para exercer a função de agência implementadora do Plano Nacional de Combate à Desertificação (PNCD), prevendo criar o quinto núcleo de combate à desertificação em Rodelas. No entanto até hoje não foi efetivado.

 “Assim como outros povos indígenas, cada um com sua luta, aqui os Tuxá continuam na expectativa pelo direito ao acesso às terras para cultivar. Negar esse direito aos indígenas é negar suas tradições e, por isso, o Comitê tem se empenhado em garantir aos povos o acesso a água para seus múltiplos usos, assim como foi feita a obra que hoje é realidade na comunidade de Serrote dos Campos, onde os Pankarás já tem seu sistema de abastecimento de água financiado pelo CBHSF, funcionando”, completou o coordenador da Câmara Consultiva Regional do Submédio São Francisco, Julianeli Lima.

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SÃO DOMINGUINHOS DE GARANHUNS UMA BÚSSOLA AUTORIZADA PELO REI DO BAIÃO

POR OCASIÃO DOS 80 ANOS DE DOMINGUINHOS. As mãos de Dominguinhos foram abençoadas para além da música. Sempre prontas para o abraço, na sanfona, no povo, nos amigos, nos que o procuraram. Os sonhos e a busca de cada um sanfoneirinho descem à Terra e nele se encontraram. Foi a confluência para o modelo.

Dominguinhos é o arquétipo, nosso melhor desenhado acabamento. Assim como um livro na estante, a sanfona assentada em um canto não passa de um instrumento. No colo de Nenén foi outra coisa. Era como testemunhar Baco fartando-se de vinho, Comadre Fulozinha em desabalada carreira meio à flora baloiçante, Jesus açoitando os vendilhões, é Buda iluminado e sóbrio, um touro solto na imensidão da caatinga, uma sereia arrebatando marinheiros, foliões soltos na buraqueira do frevo, Sorriso sambando na Sapucaí, o Santíssimo Sacramento no Domingo da Ressurreição, um magote de cigano ao redor da mais antiga fogueira. Dominguinhos, nossa bússola, autorizada pelo Rei. 

Ai, meus amigos, a sanfona é a companheira dos meus "ais". A sanfona é mesmo meu pulmão, meu coração, meu estômago, minhas vísceras. Quando ela se abre, é minha respiração que vai junto. Quando se fecha, é meu suspiro. A sanfona sabe de todas as minhas saudades, revira todas as minhas lembranças, desce ao poço profundo do meu passado e traz-me milhões de presentes.

É, a sanfona é a rainha do meu salão de miudezas. É a lâmpada a clarear meu terreiro, é o sol a festejar os meus dias. Quando chove, a sanfona é meu abrigo. À noite escura, é ela a lua escondida por trás da escuridão. Meus ouvidos são a passarela por onde ela desfila soberana. Minha pele sofre quando a escuta bem baixinho nos agudos suaves. Meus olhos se fecham, enquanto meu peito vibra nas prolongadas notas graves. Me desculpe, Deus, mas meus santos todos tocam sanfona, sem piedade. Tem dois santos no altar-mor de minha catedral: São Luiz Gonzaga do Nascimento e São Dominguinhos de Garanhuns. Essa da foto pertenceu ao segundo, já que o primeiro é Primeiro mesmo. Toca, sanfona sofrida, sanfona querida. (Texto: professor Aderaldo Luciano-mestre e doutor em Ciência da Literatura-UFRJ)

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