“No Nordeste brasileiro, vive até hoje uma cientista muito valente.” É assim que começa a história que narra a vida e as contribuições à ciência da pesquisadora Alzira Maria Paiva de Almeida. O livro Histórias para inspirar futuras cientistas (Edições Livres/Fundação Oswaldo Cruz), lançado este mês, conta a trajetória da pernambucana no controle da peste bubônica em Exu (Pernambuco). Além de Alzira, outras 12 pesquisadoras são apresentadas na publicação.
De autoria de Juliana Krapp e Mel Bonfim, a obra está disponível de graça na plataforma Porto Livre e no repositório Arca.
“Escrevemos este livro para contribuir com uma iniciativa maior chamada de Mais meninas e Mulheres na Ciência, já que as mulheres são a maioria da população mundial, mas apenas um terço dos cientistas no mundo”, disse Mel Bonfim no evento virtual de lançamento. A produção foi apresentada durante a Semana Nacional de Ciência e Tecnologia.
Como o próprio nome do livro explica, a ideia é inspirar crianças e adolescentes. “Tivemos oportunidade de conhecer melhor histórias de mulheres que construíram pesquisas e projetos de vida fabulosos. São pesquisadoras diferentes entre si, mas que têm pelo menos uma coisa em comum: dedicaram sua vida à ciência, a fazer descobertas, a descobrir vacinas, a desenvolver campos novos, mas também têm batalhado para tornar o Brasil um país menos desigual, um lugar melhor de se viver para todos e todas”, apontou Juliana no lançamento virtual.

Além de Alzira, o livro traz a paulistana Bertha Lutz que descreveu mais de 80 espécies de anfíbios. Do Rio de Janeiro, vem a pesquisadora Christina Morais que desenvolveu testes melhores e mais baratos para detectar a presença de pesticidas em alimentos. Foi Miriam Tendler, liderando um grupo no campus Fiocruz, que desenvolveu a primeira vacina brasileira para a esquistossomose. Esses são só alguns exemplos dos nomes homenageados. A obra narra as carreiras das cientistas, traz curiosidades e conta com ilustrações de Flávia Borges. O Histórias para inspirar futuras cientistas recebeu recursos do projeto Fiocruz 120 anos e contou com consultoria da Editora Rebuliço. O livro foi feito a partir de uma parceria entre o Instituto de Comunicação e Informação em Saúde (Icict) e a Vice-Presidência de Educação, Informação e Comunicação (VPEIC), ambos da Fiocruz.
HISTÓRIA: Alzira Maria Paiva de Almeida Nasceu na cidade pernambucana de Palmares, em 1943. Formou-se em Nutrição, fez doutorado na França e pesquisas nos Estados Unidos, no Peru e em Madagascar.Foi a primeira mulher a integrar a equipe do Plano Piloto de Peste, uma missão científica para enfrentar o aumento do número de casos da doença no Brasil.
Ingressou na Fiocruz em 1967, e, em 2019, recebeu o título de pesquisadora emérita. Apesar de já aposentada, prossegue atuando como pesquisadora. É coordenadora do Serviço de Referência Nacional em Peste, curadora da Coleção de Culturas de Yersinia pestis (Fiocruz-CYP) e referência nomundo todo nas pesquisas sobre a peste bubônica.
*No Nordeste brasileiro, vive até hoje uma
cientista muito valente. . Ela enfrentou nada menos que uma das doenças mais terríveis de todos os tempos. Você já ouviu falar da peste? No
século 14, matou quase um terço da população
da Europa. E não parou por aí. Em diferentes
épocas, deixou um rastro de destruição e medo
por onde se instalasse.
Foi o que aconteceu em Exu, uma cidadedo sertão pernambucano.
Os casos de peste bubônica, como é conhecida hoje,
só faziam aumentar. Era um sofrimento para os moradores!
As autoridades decidiram então enviar um grupo de cientistas para estudar o que estava acontecendo por lá. Mas, a bem da
verdade, quase ninguém queria embarcar naquela aventura científica...
O acesso a Exu era penoso: dias de estrada. A cidade não
tinha luz elétrica nem água encanada. E ainda havia o risco de se
contrair a peste.
Isso foi na década de 1960. Alzira era uma jovem recém-formada no curso de Nutricionistas, craque em lidar com microscópios
e experimentos de laboratório. Tinha espírito aventureiro e muita
vontade de ajudar a combater a miséria e o sofrimento da população brasileira. Ela ficou sabendo da expedição a Exu e quis participar.
Foi a única mulher entre 25 profissionais homens.
Mas, para explicar melhor o trabalho de Alzira, precisamos revelar um detalhe sobre a peste bubônica. É que, para a transmissão dessa doença tão temida, entram em ação dois bichos. Um
deles é bem pequenininho... Quero ver você adivinhar. É saltitante
e dá uma coceira danada...
Pois é, a pulga! Quem diria que um inseto tão minúsculo ajudaria a causar tamanho estrago? Bom, mas não é só ela que atua
nessa história de peste. O outro animal que entra em cena pode
ser ora repugnante, ora fofinho. São os bichos que a gente costuma chamar de “rato”.
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Você sabia que há muitos tipos diferentes de ratos? Na verdade, os cientistas preferem chamá-los de “roedores”.
Os simpáticos
Mickey Mouse e os porquinhos-da-índia são roedores. Mas a paca,
a cutia e a enorme capivara também são!
E existem várias outras espécies de roedores que vivem principalmente no mato e nas roças, e que servem de “hospedeiros”
para a peste.
Acontece assim. A bactéria da peste vive
dentro do corpo dos roedores — como uma
“hóspede” mesmo. A pulga, que se alimenta
de sangue, pica o animal. E, como vive
pulando e picando por aí, acaba levando
sangue infectado de um ser vivo para outro.
Na região de Exu, há uma grande variedade de roedores, típicos do sertão. O preá,
o mocó, o punaré, além de uns ratinhos chamados rato-de-cana,
rato-de-algodão, rato-de-capim, bico-de-lacre.
As pessoas podiam ser picadas pelas pulgas e contrair a doença, quando iam
para o mato ou as roças. Ou ser picadas em casa mesmo. As condições precárias de higiene e de moradia acabavam sendo um
convite para que os ratos passeassem pelas casas dos habitantes,
levando as pulgas em seus pelos.
O que os cientistas fizeram nessa cidadezinha, durante anos,
foi capturar e estudar os roedores e pulgas que disseminavam
a peste bubônica. Alzira ficava no laboratório, fazendo pesquisas
que foram fundamentais para acabar com a epidemia de peste
daquela época.
As descobertas científicas que ela fez em Exu deram base ao
Programa de Controle da Peste, essencial para que não tenhamos
mais casos da doença no país. Isso porque, infelizmente, a peste
não é coisa só do passado. Há aparições ocorrendo até hoje, em
alguns países. Ainda não há vacina para a doença!
Depois desses anos em Exu, Alzira estudou no exterior e trouxe
para o Brasil novas formas de fazer o diagnóstico da doença. Além
disso, criou uma coisa chamada “coleção de culturas do micróbio
da peste”. É como uma coleção como qualquer outra dessas que
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você conhece. Só que, em vez de figurinhas ou gibis, reúne matéria
orgânica em recipientes chamados “tubos de ensaio” e “placas de
Petri”, que lembram lentes de vidro. Lá dentro, podemos ver como
as bactérias se proliferam.
A coleção, criada por Alzira, ajuda
cientistas do mundo todo a saber mais sobre a peste — e, assim,
a salvar vidas.
(Fonte: Agencia Brasil)