Ariano Suassuna morre aos 87 anos



O escritor paraibano Ariano Suassuna morreu nesta quarta-feira, aos 87 anos. Ele estava internado no Real Hospital Português, em Recife, Pernambuco, desde segunda-feira, depois de sofrer um acidente vascular cerebral hemorrágico. O autor passou por uma cirurgia de emergência, acabou entrando em coma e não resistiu. Integrante da Academia Brasileira de Letras, Suassuna teve seis filhos e 15 netos. Defensor da cultura popular brasileira, era um dos maiores dramaturgos do país, além de autor de romances e poemas.


Nascido em 16 de junho de 1927 em Nossa Senhora das Neves, hoje João Pessoa, capital da Paraíba, Ariano Vilar Suassuna era filho de João Suassuna, então governador de seu estado natal. Com o fim do mandato, um ano depois, toda a família se mudou para o interior.

O contador de histórias do sertão tinha apenas 3 anos quando um fato trágico marcou sua infância. No desenrolar da Revolução de 1930, um pistoleiro de aluguel assassinou seu pai com um tiro pelas costas, numa rua do Rio de Janeiro.


O assassinato foi motivado por boatos que apontavam o patriarca da família Suassuna como mandante da morte de João Pessoa, seu sucessor no governo, fato que serviu de estopim para a revolução. Um ambiente assim, com dívidas de sangue e rivalidade entre famílias, cobrava dos órfãos a vingança. Mas, um dia antes de ser assassinado, João Suassuna deixou uma carta aos nove filhos pedindo que eles não se tornassem assassinos por sua causa.

Ariano Suassuna obedeceu. Em vez disso, dizia estar perto de perdoar os criminosos que mataram seu pai. A mãe e viúva também ajudou, ao dizer que o pistoleiro responsável pelo crime já havia morrido (era mentira). Com a tragédia, a família mudou-se para a pequena cidade de Taperoá, no interior da Paraíba. E Ariano herdou a biblioteca do pai, onde encontrou livros importantes para sua formação. Um dos mais importantes, sem dúvida, foi “Os sertões”, de Euclides da Cunha. A obra lhe apresentou um dos personagens que mais marcaram sua vida: Antônio Conselheiro, profeta e líder de Canudos.


Em 1942, Suassuna foi para Recife concluir o ensino básico. Anos depois, na faculdade de Direito, ajudou a fundar o Teatro do Estudante de Pernambuco. Em 1947, encenou sua primeira peça: “Uma mulher vestida de sol”. Nove anos depois, levaria aos palcos seu texto mais conhecido, “Auto da Compadecida”, que ganharia adaptações na TV e no cinema.


Por causa do teatro, deixou o Direito de lado seis anos após ter se formado. O romance surgiu mais tarde em sua vida. Em 1971, Ariano Suassuna lançou seu “Romance d’a pedra do reino e o príncipe do sangue vai-e-volta”, com nome comprido como seus cordéis tão adorados e pensado para ser uma trilogia. Com o livro, o escritor avança em relação à literatura regionalista dos anos 1930, representada por João Guimarães Rosa e José Lins do Rego. Mais tarde, Ariano Suassuna diria que “A pedra do reino” era, de certa forma, uma tentativa de trazer seu pai de volta à vida.


Havia quem acusasse o escritor de lutar contra moinhos de vento: o escritor se apresentava como um defensor da cultura popular brasileira, contra a invasão da indústria cultural norte-americana. Falava mal de Madonna e Michael Jackson. Não à toa, quando foi secretário de Cultura do governo Miguel Arraes, nos anos 1990, tornou-se um ferrenho opositor do maracatu eletrônico e do manguebeat. Ele se recusava, por exemplo, a chamar Chico Science, o vocalista da Nação Zumbi, pelo nome artístico. Dizia “Chico Ciência”.


A defesa da cultura nacional, que muitas vezes lhe rendeu o rótulo de xenófobo, já vinha no sangue e no nome da família. Na onda nacionalista depois da Independência, em 1822, vários brasileiros adotaram nomes indígenas. Seu bisavô Raimundo Sales Cavalcanti de Albuquerque escolheu Suassuna, de origem tupi, e nome de um riacho da região onde a família vivia. Nos anos 1970, fazendo jus ao nacionalismo da linhagem, Ariano fundou o Movimento Armorial, que defendia a criação de uma cultura erudita com bases na cultura popular — e toda a sua obra orbita em torno desse ideal.

Em 1989, o sertanejo foi eleito para a cadeira de número 32 da Academia Brasileira de Letras, cujo patrono era Araújo Porto-Alegre. Sexto ocupante da cadeira, Suassuna nunca foi um imortal de frequentar os eventos da instituição. Era uma espécie de filho pródigo da ABL.


Fonte: O Globo/Rádio Jornal Recife PE
Nenhum comentário

Serrita: Começa nesta quinta-feira 24, a tradicional Missa do Vaqueiro



Vaqueiros de todas as partes do Brasil se reunirão em Serrita, no Sertão pernambucano, entre os dias 24 e 27 de julho para celebrar a 44ª edição da tradicional Missa do Vaqueiro, maior evento cultural dos Sertões, em homenagem a Raimundo Jacó, um vaqueiro habilidoso na arte de aboiar que virou letra de uma música de Luiz Gonzaga. 


Além da missa, o público vai participar de vaquejadas, pegas de boi, exposição de artesanatos e shows de artistas Joquinha Gonzaga, Flávio Leandro, Gabriel Diniz, Josildo Sá, Quinteto Violado, Dorgival Dantas, Sela Rasgada, violeiros Pedro Bandeira e Gonzaga Neto, e o Coral Aboios. 


Este ano será a primeira vez que a Missa será realizada após a regulamentação da profissão do vaqueiro, aprovada em 25 de setembro de 2013. O evento é promovido pela Fundação Padre João Câncio, em parceria com a prefeitura de Serrita e a Associação dos Vaqueiros de Pega de Boi na Caatinga do Alto Sertão de Pernambuco (Apega).
Nenhum comentário

Compositor cearense tem vida retratada em Livro de Jurani Clementino

“Certo mesmo é um ditado do povo/ Pra cavalo velho, o remédio é capim novo…”

Quem não conhece os versos acima, que fazem parte do refrão de um dos maiores sucessos e Luiz Gonzaga nos anos 1970? Capim novo, conhecida nacionalmente pela inclusão na trilha da primeira versão da novela Saramandaia, foi escrita pelo compositor cearense Zé Clementino (1936-2005).


A inspiração para a letra é autobiográfica, revela o jornalista e professor universitário Jurani Clementino no livro Zé Clementino: o ‘matuto’ que devolveu o trono ao Rei, lançamento da editora da Universidade Estadual da Paraíba, por meio do selo Latus. Com 240 páginas, o livro destaca Clementino como “um sensível cronista da vida do Nordeste” e tem o objetivo de apresentar um “Zé Clementino que é resultado das várias impressões, diversos olhares e pontos de vista”.

Por meio de depoimentos de familiares, amigos próximos e reprodução de entrevistas, o autor – primo distante do compositor – traça perfil de um parceiro de Gonzaga que, ao contrário do conterrâneo Humberto Teixeira e outros como Zé Dantas e Antonio Barros, nunca deixou sua terra natal: Várzea Alegre, homenageada no hino que escreveu para a cidade e a música Contrastes de Várzea Alegre, gravada pelo Rei do Baião, e assim analisada por Jurani no capítulo “Desvelando os contrastes”: “Os contrastes demonstram ainda a capacidade perceptiva e observacional do autor, que ao se referir aos fatos curiosos da cidade, deixa claro a sua veia humorística, o seu poder irônico e sua poesia singular”.

Para os fãs e estudiosos da obra do Rei do Baião, o livro é particularmente revelador, pois conta como Clementino escreveu sucessos como Xote dos cabeludos, o desabafo do cantor pernambucano diante das mudanças no comportamento masculino nos anos 1960. “Era uma espécie de protesto a uma moda que fazia a cabeça dos homens ‘modernos’”, lembra Jurani, citando um trecho emblemático da letra, gravada em 1967: “Cabra do cabelo grande, cinturinha de pilão/ Calça justa bem cintada, costeletas bem fechadas, salto alto, fivelão/ Cabra que usa pulseira, no pescoço um medalhão/ Cabra com esse jeitinho no sertão do meu Padim/ Cabra assim não tem vez, não”.

No livro, Jurani também reproduz entrevista de Clementino ao Diário do Nordeste nos anos 1970, quando ele detalha como funcionava sua parceria musical: “As composições que Luiz Gonzaga gravou foram encaminhadas com melodia e letra. O Rei do Baião dava uma ajeitada, impunha o seu estilo. E a música passava a ser dos dois. Aceitava essa situação, queria a parceria”, explica o compositor.

No capítulo “O esquecimento de um Zé”, Jurani muda o tom expositivo e tece críticas aos que narram a vida do cantor sem citar o compositor cearense: “É impressionante a forma quase desrespeitosa como a memória de Clementino é tratada por grande parte dos biógrafos de Luiz Gonzaga”. Por outro lado, ele ressalta o trabalho de uma sobrinha de Clementino, a professora Ana Emília, fundamental na catalogação da obra do tio, que dizia desconhecer a quantidade de músicas que havia escrito.

 “Muitas vezes, a professora teve que recorrer a Zé Clementino para saber o que significava determinada palavra, verso, uma vez que o áudio estava praticamente incompreensível”, narra Jurani. Ana Emília, ao final do trabalho, conseguiu quantificar as músicas de Clementino, gravadas por Gonzaga (Sou do banco, O jumento é nosso irmão) e outros grandes artistas nordestinos como Sirano, Dominguinhos, Trio Nordestino, Messias Holanda e Genival Lacerda.

No fim do livro, o autor reproduz os discos de Gonzaga que incluem músicas de Clementino, entre eles Óia eu aqui de novo, O sanfoneiro do povo de Deus, Sertão 70 e Capim novo, e ainda contabiliza: “Até março de 2005, foram gravadas 41 músicas, que somadas as 20 regravações, totalizam 61 interpretações, distribuídas entre 32 intérpretes do cancioneiro popular a nível nacional e regional”. Zé Clementino: o ‘matuto’ que devolveu o trono ao Rei é um livro indicado não só para pesquisadores da música brasileira, mas para aqueles que desejam conhecer mais sobre a vida e obra do autor de versos que até hoje habitam a memória do povo nordestino.
.
De Jurani Clementino
. Latus Editora e Editora da Universidade Estadual da Paraíba, 240 páginas. Encomendas pelo telefone (83) 3315-3300.


Fonte: O Estado de Minas/Carlos Marcelo
Nenhum comentário

Saudade: Há um ano silenciava a voz sanfona de Dominguinhos



Há exatamente um ano, Pernambuco perdia um de seus músicos mais ilustres: o mestre sanfoneiro Dominguinhos. Nesta quarta-feira (23), a Rádio Jornal e o Estado prestam homenagens ao garanhuense que ficou famoso nacionalmente ao expandir e reinventar o legado deixado por seu “padrinho”, o pernambucano de Exu, Luiz Gonzaga.

Missas e homenagens marcam 01 ano da ausência física de Dominguinhos

Fonte: Radio Jornal
Nenhum comentário

José Neumane Pinto: Dominguinhos um principe nascido em forma matuto flor


Trecho de Tenho sede, de Dominguinhos e Anastácia: “Traga-me um copo d’água, tenho sede / e essa sede pode me matar. / Minha garganta pede um pouco d’água / e os meus olhos pedem o teu olhar”.

"O sertanejo é antes de tudo um forte”, sapecou Euclides da Cunha em “Os sertões”. Os desavisados reconhecerão na definição o protótipo do cangaceiro, do cabra macho, do matuto destemido que não leva desaforo para casa. Ledo engano. Como o próprio Euclides deixou claro, essa força não reside na coragem, na valentia ou no destemor, mas repousa na improvável força interior contida no termo euclidiano Hércules-Quasímodo.

O sanfoneiro, compositor e cantor Dominguinhos encarnou o lado sensível, belo e pungente dessa força, contrapondo-o à valentia da cabroeira que dormia ao relento e lutava contra as tropas da lei e da ordem. Lampião era o sertanejo-mandacaru. Dominguinhos, o matuto-flor: a flor que brota do cacto com a beleza protegida pela agressividade bélica dos espinhos.

Desde cedo ungido príncipe da música regional nordestina que o Rei Gonzaga fundou e sustentou com o rebuliço mágico dos 180 baixos de sua sanfona, o garoto de Garanhuns, Pernambuco, cruzou as veredas da vida sem trocar de patente nem de coroa: sempre foi menino, sempre foi príncipe. Consciente da majestade de seu Lua, legitimada pela dimensão universal de sua herança, a grandeza dele, caudatária da simplicidade, o tornou herdeiro perpétuo, impedindo-o de subir ao trono com o desaparecimento físico do criador do forró.

Não se confunda, contudo, essa simplicidade com complexo de inferioridade ou desconhecimento do próprio potencial que levou Gonzaga a lhe transferir sanfona, cetro, reinado e gibão. Nada disso: mantendo-se na infância, ele preservou o segredo da beleza e da variedade da obra que o fundador trouxe das brenhas para transformar no ponto de contato e de solidariedade dos deserdados da seca no bulício das metrópoles.
 
Em Dominguinhos comungavam a humildade dos mansos de espírito e a altivez dos gênios que reconhecem seu valor ao identificá-lo não nas glórias da fama, mas na consciência da fidelidade a sua grei, que a retribui com um amor mudo, sincero e pleno, que vai além do aplauso fácil. Este reconhecimento passou, é claro, pela unção real, mas se confirmou em todos os contatos que o artista manteve com seu público, gente com quem partilhava as mesmas origens e com quem se comunicava pela mudez de cúmplices egressos dos mesmos roçados nos quais a necessidade e a escassez tornam a solidariedade gênero de primeira necessidade. Esse povo aprendeu a linguagem das pausas longas e o reconhecimento da labuta na textura áspera da pele da palma da mão acostumada com a soleira que ofusca e a aridez do solo de pouca água.
 
Se o Rei do Baião fez de Asa Branca, com a letra do urbano Humberto Teixeira, o hino da diáspora nordestina pelo mundo afora, o príncipe da sanfona compôs em Lamento Sertanejo, com a letra-síntese de Gilberto Gil, negro e interiorano qual Gonzaga, a saga do retirante aculturado.

 “Quando o verde dos teus olhos se espalhar na plantação, / eu te asseguro, não chore não, viu, / eu voltarei, viu, pro meu sertão”:  Gonzaga e Teixeira cantaram o mito da volta do homem à terra, bastando que caia a chuva do céu. “Por ser de lá, / na certa por isso mesmo, / não gosto de cama mole, / não sei comer sem torresmo. / Eu quase não falo, / eu quase não sei de nada. /  Sou como rês desgarrada / nessa multidão boiada caminhando a esmo“ – na melodia de Dominguinhos Gil decretou a saga de um Ulisses-Quasímodo que não retorna a Penélope, mas faz do desassossego solitário o jeito de ficar onde estiver, construindo Ítaca em si mesmo.

A Odisseia do cantor do vale do Araripe, nos confins onde Pernambuco acaba no Ceará, foi registrada no percurso do peixe em Riacho do Navio, com letra do parceiro Zé Dantas, partindo do Atlântico na direção do paraíso idílico perdido nas margens do riacho da Brígida, contra a correnteza. Essa busca do cordão umbilical enterrado na porteira do curral avoengo se expressa na utopia do desterrado: “Pra ver o meu brejinho, / fazer umas caçada, / ver as ‘pegá’ de boi, / andar nas vaquejada, / dormir ao som do chocalho / e acordar com a passarada, / sem rádio e sem notícia / das terra civilizada”.

A Ilíada do sanfoneiro da “Suíça nordestina” mantém o desterrado no desterro, universo transportado de Garanhuns para os guetos nordestinos nas metrópoles – o Brás em São Paulo, o Campo de São Cristóvão no Rio…

Nesses lugares, o cavalo de madeira transporta o retirante para os ambientes urbanos, tornando-o uma espécie de extra-terrestre adaptado aos hábitos e à cultura da Troia que desconhecia. O retirante pede água, busca o amor e vai ficando: a obra de Dominguinhos é a consciência de que todo lugar é sertão e o sertão é aqui mesmo, reconhecido nas manchas de suor tornadas mapas da solidão que virou ritual de encontro. 

Como cantou em Tenho sede, com letra de Anastácia, sua mulher e parceira de origem: “Traga-me um copo d’água, tenho sede / e essa sede pode me matar. / Minha garganta pede um pouco d’água / e os meus olhos pedem teu olhar”.

Fonte; Publicado na Pag.D03 do Caderno 2 do Estado de S. Paulo de quarta 24 de julho 2013

Nenhum comentário

Lembranças: Crônicas Na Grande Area- Armando Nogueira



 Fonte: Na Grande Area-Armando Nogueira

O preparador físico Toninho Oliveira, do Flamengo, fez um teste nesta fase de pré-temporada do time em Teresópolis: media o batimento cardíaco dos jogadores, sempre que tocavam na bola. O resultado mostrou que apenas um não ficava abalado: Romário. Com o craque, a coisa é diferente: quem se emociona é a bola. *****

Maracanã, enfeita de bandeiras tuas arquibancadas que hoje é dia de festa no futebol. Encomenda um céu repleto de estrelas. Convida a lua (de preferência, a lua cheia). Veste roupa de domingo nos teus gandulas. Põe pilha nova no radinho do geraldino. E, por favor, não esquece de regar a grama (de preferência, com água-de-cheiro).

Avisa à multidão que ninguém pode faltar. É despedida do Zico e estou sabendo, de fonte limpa, que, hoje à noite, ele vai repartir conosco a bela coleção de gols que fez nos seus vinte anos de Maracanã. Eu até já escolhi o meu: quero aquela obra-prima, o segundo gol do Brasil contra o Paraguai nas Eliminatórias do Mundial de 1986. Lembro-me como se fosse hoje. 

Zico recebe de Leandro um passe de meia distância já na linha média dos paraguaios. Um efeito imprevisto retarda a bola uma fração de segundo. Zico vai passar batido - pensei. Pois sim. Sem a mais leve hesitação, sem sequer baixar os olhos, ele cata a bola lá atrás com o peito do pé, dá dois passos e, na mesma cadência, acerta o canto esquerdo do goleiro paraguaio.

Passei uma semana vendo e revendo no teipe aquele instante mágico de um corpo em harmonioso movimento com o tempo e com o espaço. E a bola, coladinha no pé, parecia amarrada no cadarço da chuteira.
Um gol de enciclopédia.
Se o amável leitor aceita uma sugestão, dou-lhe esta: escolha um dos gols que Zico fez graças à sua arte singular de chutar bola parada.

Chutar a bola de falta à entrada da área é um talento que Deus lhe deu mas não de mão beijada, como imaginam os desavisados. Zico trabalhou seriamente, anos e anos, para alcançar a perfeição dos efeitos sublimes. À tardinha, quando terminava o treino, ele costumava ficar sozinho no campo do Flamengo - ele, uma barreira artificial, uma bola e uma camisa caprichosamente pendurada no canto superior das traves. A camisa era o alvo.

Zico passava horas sem fim, chutando rente à barreira e derrubando a camisa lá de cima das traves.

Chegava o domingo, na cobrança da falta, a bola já estava cansada de saber onde ela tinha que entrar.

Não tenho dúvida em dizer que tardará muito até que apareça alguém que domine como Zico o dom de cobrar falta ali da meia-lua.

Celebremos, querido torcedor, a última noite do maior artilheiro da história do Maracanã. Será uma despedida de apertar o coração. Se te der vontade de chorar, chora. Chora sem procurar esconder a pureza da tua emoção. Basta uma lágrima de amor para imortalizar o futebol de um supercraque.

Cantemos, Maracanã, teu filho ilustre, relembrando em comunhão os dribles mais vistosos, os passes mais ditosos, os gols mais luminosos desse fidalgo dos estádios que tem uma vida cheia de multidões.

Louvemos o poeta Zico que jogava futebol como se a bola fosse uma rosa entreaberta a seus pés.
Nenhum comentário

← Postagens mais recentes Postagens mais antigas → Página inicial