BIOMA CAATINGA PODE SER SEVERAMENTE IMPACTADA POR MUDANÇAS CLIMÁTICAS

A seca, junto ao aumento da temperatura, vem se destacando como uma das grandes vilãs das mudanças climáticas no Brasil. Estudos recentes têm demonstrado que o aquecimento e a redução da pluviosidade previstos para as regiões Norte, Nordeste e Centro-Oeste já estão causando impactos como o aumento da frequência de secas na Amazônia, fenômeno que vem trazendo consequências para a fauna mesmo em regiões quase intocadas da maior floresta tropical úmida do planeta.

Diante deste cenário, é compreensível que as preocupações de cientistas e ambientalistas se voltem para a Amazônia e outras florestas úmidas destas regiões. Mas este foco também tem um efeito adverso: ele deixa de lado a fauna e a flora de biomas naturalmente mais áridos, como a Caatinga.

“Existia uma visão de que porque esses organismos evoluíram num clima seco, quase desértico, eles estão adaptados às mudanças climáticas”, diz Mario Moura, ecólogo e pesquisador da Universidade Federal de Campinas.

Moura é o primeiro autor de um estudo já reportado pelo ((o))eco no ano passado, demonstrando que essa suposição passa longe da verdade. Seus resultados sugerem que, até 2060, 40% da Caatinga vai passar por um processo de homogeneização em suas comunidades de plantas – isto é, de perda de diversidade entre regiões, tornando todas mais parecidas biologicamente. A pesquisa também prevê que 99% do território do bioma deve perder espécies localmente, e que plantas lenhosas, como árvores, serão mais afetadas.

“E essa perda também é muito mais pronunciada sobre as espécies que são raras, ou seja, aquelas que já tem uma distribuição geográfica um pouco mais restrita”, Moura acrescenta.

Um resultado surpreendente, e que levanta sérias preocupações em relação ao futuro dos organismos que habitam a Caatinga.

“O que se está mostrando é que eles estão à beira do colapso já,” diz Moura.

Moura não está sozinho em sua conclusão. Um estudo publicado este ano na revista Journal of Arid Environments estima que mudanças climáticas devem reduzir a área de distribuição geográfica de espécies de répteis psamófilos – animais especializados em viver em terreno arenoso – que habitam diferentes ambientes secos e abertos na América do Sul.

“Nós estudamos 10 espécies que ocorrem ao longo do que a gente conhece como o Diagonal de Formações Abertas (DFA), que engloba o bioma Caatinga, o Cerrado e o Chaco,” diz Thaís Guedes, coordenadora do estudo e pesquisadora na Universidade Estadual de Campinas.

Guedes e seus colaboradores colocaram à prova a mesma suposição explorada por Moura. “Será que mesmo essas espécies que estão enterradas num ambiente árido vão ser impactadas?”

Os cientistas basearam seu estudo numa modelagem de distribuição de espécies – modelos matemáticos que preveem quais regiões um organismo pode potencialmente habitar, baseado nas condições climáticas e ambientais dos habitats onde sabemos que ele vive. Essa ferramenta ajuda pesquisadores a identificar áreas adequadas para a ocorrência de animais e plantas em locais fora de sua distribuição conhecida, mas é também útil para entender como diferentes espécies ocuparão o espaço geográfico em cenários climáticos futuros.

O estudo estimou quais áreas dentro do DFA teriam condições climáticas para abrigar cada uma das dez espécies analisadas nos futuros de 2040 e 2060, levando em conta cenários de desenvolvimento socioeconômico otimistas e pessimistas – isto é, com mais ou menos emissões de carbono e outros gases de efeito estufa. O resultado foi bem claro.

“Elas vão ser impactadas, e muito impactadas”, diz Guedes.

A previsão é que mudanças no clima reduzam a área de distribuição de seis dos dez répteis analisados. Dois deles – as cobras Phalotris matogrossensis e Rodriguesophis iglesiasi – seriam completamente extintos no cenário otimista previsto para 2060. Outro lagarto, Vanzosaura savanicola, perderá 100% de sua área de distribuição atual no cenário pessimista de 2040 e em ambos os cenários de 2060, ganhando uma área mínima (equivalente a 1,7-6,3% da atual) de distribuição potencial em outras localidades.

Em contrapartida, uma única outra cobra, Philodryas psammophidea, ganhará área total habitável em todos os cenários previstos. Segundo Guedes, P. psammophidea é a única beneficiada em todos os casos por ser uma espécie generalista, e sua resposta às mudanças no clima está longe de ser a regra, especialmente quando consideramos a quantidade de especialistas de habitat analisadas no estudo.

“Pensava-se comumente que essas espécies, por serem adaptadas a solos mais áridos […] na Caatinga, no Cerrado e no Chaco, estariam mais adaptadas a temperaturas mais altas. E a gente refutou essa ideia”, diz Júlia Oliveira, mestre em Biodiversidade, Ambiente e Saúde pela Universidade Estadual do Maranhão e primeira autora do estudo.

Os autores alertam ainda que a gravidade da situação vai além dessas estimativas de mudanças de distribuição. Ainda que os modelos prevejam que alguns répteis ganhem novas áreas habitáveis em determinados cenários, no mundo real, não existe garantia de que eles consigam chegar até esses novos habitats em potencial.

Numa terra de biomas fragmentados, é possível que barreiras antrópicas (cidades, plantações, estradas e outras) e geográficas simplesmente impeçam o deslocamento ou o estabelecimento das espécies, condenando-as a declínios mais severos que aqueles estimados inicialmente pelo estudo.

O preocupante futuro da Caatinga-Às preocupações de Oliveira, Guedes e colaboradores somam-se ainda as tendências reveladas pelo estudo de Moura. “O trabalho do Mário Moura com a vegetação, é muito importante também, […] porque a vegetação contribui para a saúde do solo,” diz Oliveira. Além de condições climáticas ideais, os répteis estudados por ela dependem de um solo com uma composição particular de areia, argila e silte.

“Está tudo relacionado,” Oliveira conclui.

E se o impacto sobre a flora da Caatinga torna ainda mais incerto o futuro da fauna do bioma, o inverso também é verdade. Além de investigar o futuro das plantas, Moura também é o primeiro autor de um estudo similar que avalia como mudanças climáticas podem impactar os mamíferos da Caatinga, publicado na revista Global Change Biology em 2023.

Moura e colaboradores utilizaram, em seus dois estudos, um tipo de modelagem muito parecida com aquele empregado por Oliveira e Guedes. Seu foco, no entanto, era nos futuros de 2060 e 2100 – mais uma vez levando em conta cenários de maior e menor emissão de gases estufa. Mas ao invés de avaliar ganhos e perdas na distribuição de cada espécie analisada – 100 espécies de mamíferos e mais de 3.000 espécies de plantas –, Moura se preocupou em entender que proporção do bioma sofreria alguma perda de espécies. Ele também calculou um índice conhecido como diversidade beta – que mede a diversidade entre diferentes áreas do bioma – para entender se, tal como as plantas, a comunidade de mamíferos também passaria por uma homogeneização na Caatinga.

Confir na integra reportagem de Bernardo Araujo é ecólogo, conservacionista e comunicador científico Jornal USP

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CHUVAS ESCANCARAM QUE ESTE ATUAL MODELO ECONÔMICO NÃO SERVE

Texto: Francisco Figueiredo Francisco de Figueiredo Monteiro, estudante de economia, comunicador digital e divulgador científico.

Estamos vivendo uma nova realidade, a da crise climática, e ainda não sabemos exatamente como ela funciona e nem quanto ela custará aos cofres públicos. Tudo indica que eventos climáticos extremos aumentarão sua ocorrência e sua intensidade de forma exponencial, e precisamos de cidades adaptadas a isso, de hábitos e costumes adaptados a isso e de uma economia adaptada a isso. Se nosso modelo econômico restringe os gastos que são necessários com adaptação das cidades e com respostas a desastres, esse modelo não é compatível com a realidade que vivemos. 

Para que futuros eventos climáticos extremos não causem o dano que as chuvas no Rio Grande do Sul causaram, o Brasil precisa de um grande plano de adaptação climática, que deve ser executado o mais rápido possível. Este plano custa caro, e talvez o teto de gastos impeça sua execução. Como expliquei em outra coluna publicada, intitulada “política econômica do governo não condiz com política climática”, alguns gastos do governo têm regras próprias de crescimento, e a soma do crescimento do gasto primário tem que ser igual a 70% do crescimento da receita. Acontece que nestes gastos com regras próprias de crescimento estão incluídos, por exemplo, saúde e educação, que crescem 100% do crescimento da receita, e aposentadoria, que cresce conforme cresce o salário mínimo e o número de aposentados. 

Estes gastos somados representam grande parte do orçamento primário do governo, e como eles crescem mais que os 70% do crescimento da receita permitidos, eles acabam achatando os outros gastos, que precisam dividir espaço com, por exemplo, o novo PAC, que representará grande parcela dos gastos com investimento nos próximos anos. No PAC é previsto cerca de 20 bilhões de reais para adaptação das cidades, sendo, de acordo com uma análise do instituto Talanoa, uma parcela de R$ 8,3 bilhões dos investimentos para  urbanização de favelas e redução de riscos de desastres em territórios ditos periféricos, e outra  parcela de R$ 10,5 bilhões destinada a prevenção de riscos e desastres, principalmente para obras de drenagem e contenção de encostas. Entretanto, não há plano de adaptação emergencial em curso. 

O resultado é terrível: O Talanoa analisou também o orçamento climático de 2024, e concluiu que seu valor é de 13,4 bilhões de reais, sendo 10 bilhões da emissão dos “títulos verdes”, que representam dívida em dólar para o Brasil. O programa de gestão de riscos a desastres, onde estão as principais verbas para adaptação das cidades, conta com apenas 1,9 bilhões de reais. 

Ficamos constantemente presos ao debate do financiamento climático internacional, para que países desenvolvidos deem dinheiro para a adaptação de países em desenvolvimento. Porém, a UNEP alerta que as necessidades financeiras de países em desenvolvimento para adaptação climática são de 10 a 18 vezes maiores do que os fluxos das finanças públicas internacionais disponibilizadas atualmente. Me parece estranho pensarem ser mais racional depender de doações, fundos internacionais e dívidas em dólar para adaptar as cidades do que pensar uma mudança no modelo econômico. Encaramos o modelo neoliberal de austeridade fiscal como quase uma lei natural da sociedade, algo biológico do ser humano, de modo que escolhemos por ele em troca de vidas humanas.

Não pode ser normal que crises como a do Rio Grande do Sul sejam resolvidas pela sociedade civil através de doações materiais e financeiras. O Pix não é um instrumento de política econômica, não é política de contenção de crises e não podemos depender de caridade da sociedade civil e nem da filantropia de entidades e governos internacionais para nos prevenir de ou responder a desastres. 

Para isso, é preciso primeiro reconhecer que estamos em crise. As mudanças climáticas não podem mais ser interpretadas como um simples problema que no futuro nos causará alguns danos. Ela já mostra seu potencial destrutivo, e causará diariamente óbitos ao redor do mundo. O reconhecimento dessa crise significa, talvez, a expansão dos gastos do governo além do teto, assim como foi feito na época da crise da COVID-19, pois épocas de crise exigem medidas excepcionais. Foi essa a linha que Marina Silva seguiu ao propor exceções fiscais para conter os danos de eventos climáticos extremos. 

O passivo ambiental presente é o passivo fiscal futuro. Ou seja: não fazer nada agora, esperar um evento extremo ocorrer para só então gastar dinheiro remediando uma crise que poderia ser prevenida, aumenta tanto os custos humanos quanto os financeiros. Mesmo que a vida humana seja completamente descartada, que só os gastos financeiros sejam contabilizados (como faz o modelo neoliberal de austeridade fiscal), a decisão de não gastar o suficiente com adaptação às mudanças climáticas hoje para cumprir o teto de gastos é irracional e inconsequente, já que o gasto futuro com a resposta à desastres será um múltiplo do gasto que seria despendido com adaptação. 

Ignorar relatórios que apontam a fragilidade dos territórios a extremos climáticos, alterar o código ambiental que mantém a resiliência dos territórios e reduzir verba para a defesa civil é a fórmula da potencialização do desastre climático, e foi exatamente o que o governo do Rio Grande do Sul fez. E é, também, em certa medida, o que o governo federal vem fazendo com suas diversas contradições na pauta ambiental. Enquanto se lamenta o desastre em um estado, se leiloam poços de petróleo em muitos outros. Será que agora a pauta climática será tratada transversalmente pelo governo federal? Será que os governos estaduais e municipais entenderão que sua população pode estar correndo risco? Eu, infelizmente, acredito que não. 

Precisamos de um modelo econômico que comporte os gastos demandados pela realidade das mudanças climáticas, que não dependa de doações para sanar esses problemas. Para adaptar as cidades à crise climática precisamos, antes de tudo, adaptar a economia à crise climática. Enquanto essa mudança não acontece, é reconfortante ver a capacidade de mobilização da sociedade e o volume de doações destinadas ao Sul. 

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SEM FORÇAS O RIO SÃO FRANCISCO JÁ NÃO BATE NO MEIO DO MAR

Com farta cabeleira preta, olhos esbugalhados e boca aberta mostrando dentes enormes, a carranca decora as proas dos barcos que navegam pelas águas do rio São Francisco. Para barqueiros e pescadores da região, a figura antropomórfica (mistura de traços humanos e animalescos) tem o significado de proteção, assustando maus espíritos, animais perigosos, tempestades, naufrágios, e trazendo sorte. Apesar de esteticamente divergir quanto ao padrãozinho de beleza imposto, ela foi escolhida para ser modelo da campanha 'Eu Viro Carranca para defender o Velho Chico', realizada pelo Comitê da Bacia Hidrográfica do Rio São Francisco (CBHSF). 

O objetivo é dar visibilidade aos problemas enfrentados pelo rio de mais de 2.800 km de extensão, que nasce na Serra da Canastra, em Minas Gerais, e deságua no Oceano Atlântico, na divisa entre Alagoas e Sergipe. Ou pelo menos costumava desaguar, como nos ensinou o saudoso Gonzagão, nos versos da música Riacho do Navio: “O rio São Francisco vai bater no ‘mêi’ do mar”. 

É que, com o passar dos anos, a dinâmica do Velho Chico tem mudado: “Com a chegada das grandes hidrelétricas, sua vazão passou a ser controlada, havendo modificação da hidrodinâmica natural. O São Francisco hoje não avança mais ao mar, pois não tem mais força. O que ocorre é o oposto: o mar avança no rio. Infelizmente, parte do Baixo São Francisco está com a água salgada”. Quem explica é Maciel Oliveira, presidente do CBHSF. 

Em abril do ano passado, representantes do Comitê e da sociedade civil foram até Brasília para cobrar ações de proteção e anunciar a criação da Frente Parlamentar em Defesa do São Francisco. Entre eles, discursando para dezenas de políticos, estava Maciel. 

Crítico da transposição, o alagoano de 40 anos afirma que o Comitê sempre foi contrário ao conceito do projeto, principalmente na ausência de ouvir a população afetada e envolvida com a obra. Durante o último governo, segundo ele, a situação ficou pior: "Nesses quatro anos, a transposição foi tocada absolutamente às escuras. O Comitê gestor da transposição, criado anteriormente para acompanhar e definir critérios, nunca se reuniu, nem discutiu. Ou seja, ficamos alheios a qualquer informação".


No Dia Nacional de Defesa do São Francisco, e às vésperas do Dia Mundial do Meio Ambiente, que será na segunda-feira (5), Maciel Oliveira convoca toda a sociedade a também virar carranca para proteger o Velho Chico: "O momento é de uma grande pactuação pela revitalização do nosso rio. São mais de 500 cidades lançando esgoto no Velho Chico, são expansões agrícolas sem controle. Todos precisam ver que o São Francisco é fonte de vida para mais de 18 milhões de pessoas que habitam em sua bacia".Qual a importância do rio São Francisco para o Nordeste? O Rio São Francisco é de extrema importância para o abastecimento de água do Nordeste, sendo considerado um dos fatores essenciais para o seu desenvolvimento. Por localizar-se no semiárido nordestino, o Velho Chico é a principal fonte de água da região.O Brasil é um país privilegiado em termos de recursos hídricos, mas isso não quer dizer que essa água se distribua de maneira igualitária. É como a natureza trabalha. Enquanto a Região Norte tem praticamente 65% dessa disponibilidade, no Nordeste temos apenas 3%. Há essa disparidade e, nesse contexto, o São Francisco é determinante e está sob enorme pressão de demandas para usos múltiplos.Poderia traçar um breve panorama histórico do que ocorreu com o rio, ao longo desses anos? Ao longo dos anos, o Velho Chico passou por muitos processos antrópicos (resultado da ação humana). Com a chegada das grandes hidrelétricas, sua vazão passou a ser controlada, havendo modificação da sua hidrodinâmica natural. O São Francisco hoje não avança mais ao mar, porque não tem mais força. O que ocorre é o oposto: o mar avança no rio. Infelizmente, parte do Baixo São Francisco está com a água salgada. As cidades próximas à foz passam por sérios problemas de salinização das suas águas. 

 Na Bahia, onde começa e onde termina o Velho Chico? O Estado da Bahia é um dos principais privilegiados com o Velho Chico. Após a divisa com Minas Gerais, até Paulo Afonso, mais de 115 municípios baianos compõem a Bacia do Rio São Francisco, com as regiões fisiográficas do médio e submédio São Francisco.Quais os usos feitos do rio, por parte da população? Além da geração de energia, o rio é usado para irrigação, pesca artesanal, turismo, navegação, consumo humano, entre outros. E os usos são conflitantes, então há a necessidade de um planejamento rigoroso e uma concertação de interesses para se antecipar aos conflitos pelo uso da água.Qual a missão do Comitê da Bacia Hidrográfica do São Francisco (CBHSF)? Há quanto tempo existe? Como surgiu? Quem participa? 

O CBHSF tem como missão descentralizar o poder de decisão, integrar as ações públicas e privadas e promover a participação de todos os setores da sociedade. O objetivo é implementar a política de recursos hídricos em toda a bacia, estabelecendo regras de conduta locais e gerenciando  os conflitos e os interesses locais. Foi criado por decreto presidencial, em 05 de junho de 2001, após uma grande mobilização social das instituições da bacia. Ao longo dos seus mais de 20 anos, o Comitê presta um serviço à sociedade como forma de gestão e participação social. Fazem parte do comitê organizações da sociedade civil, usuários da água de diversos setores, instituições técnicas e de ensino e pesquisa, os povos e comunidades tradicionais, além da representação dos poderes públicos, nas esferas municipal, estadual e federal.Quais as ações mais importantes já realizadas pelo Comitê? Desde 2010, já elaboramos 116 planos municipais de saneamento básico (47 apenas no estado da Bahia), fizemos obras de abastecimento de água para povos e comunidades tradicionais em toda a bacia. Aproximadamente, R$ 35 milhões foram investidos de 2012 a 2022, no estado da Bahia, com recursos oriundos da cobrança pelo uso dos recursos hídricos. Temos mais obras e projetos importantes em andamento.Este ano, uma comissão foi para Brasília, para o lançamento da edição de 10 anos da campanha ‘Eu Viro Carranca para Defender o Velho Chico’. Poderia falar um pouco sobre a campanha e como foi o lançamento pontual na capital do Brasil? Quais foram os encaminhamentos? Realizamos o lançamento no salão nobre do Congresso Nacional. A intenção foi mostrar e conclamar os políticos a se inteirar sobre os problemas do Velho Chico. Chamamos atenção para o fato de que o Dia Nacional em Defesa do Rio São Francisco e a campanha irão se realizar em um novo contexto institucional, resultante das eleições realizadas em 2022 para renovação dos governos. Diante disso, o CBHSF reafirmou seu papel histórico de completo distanciamento da política partidária, sem, no entanto, deixar de lado a necessidade de continuar atuando intensamente em todos os espaços da política institucional, em defesa dos princípios e das legítimas demandas referentes à boa gestão das águas no Brasil. 

Apelamos, ainda, à Ministra do Meio Ambiente, Marina Silva, como demanda principal da comunidade brasileira das águas, que dê à temática das águas o lugar mínimo que lhe é devido na estrutura da política ambiental oficial brasileira. Entre eles, a criação da Secretaria Nacional de Águas na estrutura do Ministério do Meio Ambiente. Também apelamos ao governo federal para a consolidação do Sistema Nacional dos Recursos Hídricos, através da criação de novos comitês interestaduais de bacias hidrográficas; da universalização da cobrança pelo uso das águas em todas as bacias hidrográficas de domínio federal; a universalização da implantação de sistemas de monitoramento da quantidade e da qualidade das águas em todo o território nacional.Vamos falar de transposição. Em que pé está? O Comitê sempre foi contrário ao conceito do projeto da transposição, principalmente na ausência de ouvir a população afetada e envolvida com a obra. A transposição já está em operação, principalmente no eixo Leste, onde leva água para a região de Campina Grande, Paraíba.Em relação a abastecimento, o que dá para dimensionar de bom ou ruim? Em relação ao abastecimento temos conhecimento que o projeto trouxe melhorias em Pernambuco e AlagoasDo ponto de vista dos recursos, há dinheiro para manter as obras de transposição? O grande problema é a operação, ou seja, a gestão da transposição daqui pra frente. Quem vai pagar a conta? Os estados beneficiados ainda não estão pagando.Como foi tocada a transposição nos últimos quatro anos? Absolutamente às escuras. O Comitê gestor da transposição, criado anteriormente para acompanhar e definir critérios, nesse último governo nunca se reuniu, nem discutiu. Ou seja, ficamos alheios a qualquer informação.Quais as perspectivas para os próximos anos? Temos perspectivas positivas em participar do processo de diálogo. Já cobramos que os Conselhos Gestores da Transposição e Revitalização sejam imediatamente retomados. Acreditamos que possamos ter mais envolvimento da participação social nos processos de decisão.Como as atuais gestões - estadual e nacional - têm lidado com a questão da preservação do São Francisco? No âmbito estadual, já tivemos reuniões com o secretário de Meio Ambiente da Bahia, Eduardo Sodré, a fim de estreitar laços com o CBHSF. O secretário mostrou-se muito interessado na articulação e afirmou que irá contribuir com a gestão e preservação da Bacia. Já no âmbito federal, estamos em articulação com os diversos ministérios e já retomamos diálogos importantes.Atualmente, quais as maiores ameaças ao rio? As maiores ameaças são a falta de gestão e planejamento. Todos querem água do Velho Chico, pensam em grandes projetos, sem pensar em sua recuperação. O momento é de uma grande pactuação pela revitalização do rio São Francisco. 

Todos precisam pensar na mesma causa. São mais de 500 cidades lançando esgoto no Velho Chico, são expansões agrícolas sem controle. Todos precisam ver que o rio é fonte de vida para mais de 18 milhões de pessoas que habitam em sua bacia.O Velho Chico vai morrer? Não podemos pensar na morte do São Francisco, enquanto houver pessoas e instituições abnegadas em defesa do rio e de seu povo.Existe um programa de fiscalização, do qual o Comitê faz parte, realizado em cidades banhadas pelo São Francisco. Fale um pouco sobre esse programa e os benefícios para o rio. Contando com a participação de ONGs e diversos órgãos públicos, de todas as esferas, o programa FPI - Fiscalização Preventiva Integrada - é o maior programa de integração, educação e defesa do rio em todo o Brasil. A FPI é  um grande exemplo de organização. Iniciou-se em 2002, através da iniciativa do Ministério Público da Bahia (MP-BA) e do CREA e hoje está nos principais estados da bacia (Minas Gerais, Bahia, Sergipe, Alagoas e Pernambuco). O Comitê apoia, participa e financia a iniciativa, que traz resultados positivos de recuperação do Velho Chico e de melhoria da qualidade de vida da nossa população.

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LULA CONCEDE ENTREVISTA EDIÇÃO ESPECIAL DO PROGRAMA BOM DIA, PRESIDENTE

O presidente da República, Luiz Inácio Lula da Silva, dialoga com emissoras de rádios nesta terça-feira, 7 de maio, em uma edição especial do programa "Bom dia, Ministro", transmitida ao vivo pela Empresa Brasil de Comunicação (EBC) a partir das 9 horas.

 O "Bom dia, Presidente" contará com a participação das rádios Nacional da Amazônia; Nova Brasil (SP); Banda B (PR); Verdinha (CE); Itatiaia (MG); Gaúcha (RS) e Centro América (MT), com perguntas apresentadas diretamente a Lula, moderadas pela jornalista Karine Melo.

 Lula tratará, entre outros assuntos, sobre as ações do Governo Federal — , em parceria com o governo estadual e os municípios — para o socorro e assistência à população gaúcha, afetada pelas fortes tempestades nos últimos dias.

 REFERÊNCIA — O programa Bom Dia, Ministro foi criado no primeiro mandato do presidente Lula e é uma produção da Secretaria de Comunicação Social da Presidência da República em parceria com a EBC. Esse ano já foram realizadas 38 edições com a participação de 27 ministros entrevistados ao vivo por rádios de todas as regiões do país.

 AO VIVO — O "Bom Dia, Ministro" pode ser acompanhado pela TV (aberta ou via satélite) e pela internet, no YouTube, Facebook, TikTok e Instagram do CanalGov. Para as rádios, o sinal de transmissão é oferecido pela Rede Nacional de Rádio (RNR), pelo mesmo canal de "A Voz do Brasil".

 PARTICIPE — Comunicadores e jornalistas de rádio de todo o país interessados em participar do "Bom Dia, Ministro" podem encaminhar mensagens para o telefone (61) 99222.1282 (WhatsApp) informando o nome da rádio, município e estado de origem, para serem incluídos na lista de veículos interessados em participar do programa.

 Fonte: Secretaria de Comunicação Social da Presidência da República

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ABASTECER ESCOLAS COM AGRICULTURA LOCAL E FAMILIAR É ALTERNATIVA PARA TRANSIÇÃO AGROECOLÓGICA

Em resposta à crise do atual modelo agroindustrial dominante, que produz em larga escala para consumo em massa, o abastecimento de alimentação escolar com produtos frescos e orgânicos oriundos da agricultura local e familiar é uma promessa para uma transição ecológica para novos modelos de produção, os chamados Sistemas Agroalimentares Alternativos (SAA) que causam menor impacto ambiental.

 Essa foi a constatação de uma pesquisa da Escola Superior de Agricultura Luiz de Queiroz (Esalq) da USP, feita em parceria com a Université Paris 8 Vicennes-Saint-Denis (França), que analisou duas leis, uma brasileira e outra francesa, de incentivo ao abastecimento sustentável de escolas em várias regiões de São Paulo e Paris.

Os SAA surgiram nos anos 2000 a partir de reivindicações de movimentos sociais. Segundo a pesquisa, o termo agrupa diferentes iniciativas que se caracterizam por práticas agrícolas de comercialização e de consumo que buscam soluções frente aos problemas causados pelo sistema agroindustrial vigente.

A agroecologia, por exemplo, inclui a substituição do uso de agrotóxicos e adubos químicos por insumos naturais e orgânicos em suas produções, e os agricultores devem estar comprometidos com inúmeros procedimentos técnicos que vão desde a conservação do solo, manejo ecológico de pragas e doenças à destinação adequada de resíduos sólidos.

Além da questão agrícola, os SAA propõem a construção social de um mercado orgânico agroecológico, que privilegia agricultores locais e familiares em pequenas propriedades rurais próximas a grandes regiões metropolitanas, de forma a diminuir a distância entre quem produz e quem consome.

O estudo franco-brasileiro foi baseado na análise comparativa de duas leis promulgadas em 2009 que apoiam a agricultura alternativa, uma do Brasil e outra da França, países agroexportadores e cuja balança comercial tem se mantido equilibrada pelo setor agrícola. Um dos objetivos do estudo foi compreender em que medida as políticas públicas que incentivam o abastecimento sustentável das escolas, implementadas nas duas regiões metropolitanas, contribuem para a mudança do modelo agroindustrial para sistemas agroecológicos alternativos.

Ao analisar as duas leis, a engenheira agrônoma e autora da pesquisa, Morgane Isabelle Hélène Retière, avaliou que lei brasileira é mais avançada que a francesa, por trazer orientações mais claras e objetivas sobre a aquisição de produtos locais e orgânicos.

No Brasil, a Lei 11.947, que diz respeito ao programa de alimentação escolar, impõe, por exemplo, que no mínimo 30% dos recursos do Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação (FNDE), ligado ao Ministério da Educação, sejam destinados à compra direta da agricultura familiar.

Já na França, a Lei Grenelle 1 é mais genérica e sugere que no mínimo 20% das aquisições nas escolas sejam feitas de produtos orgânicos, bem como daqueles com baixo impacto ambiental, mas não especifica de que sistemas tais produtos provêm. Na lei francesa, a pesquisadora verificou também que a vinculação entre a alimentação escolar e a política alimentar governamental não aparece de forma tão clara quanto na lei brasileira.

Os textos da política alimentar francesa, ao contrário da lei brasileira, não recomendam explicitamente a redução do consumo de alimentos industrializados, embora se reconheça que os produtos possam conter teores excessivos de açúcar, sal e gordura.

Outra ressalva positiva feita pela pesquisadora em relação à lei brasileira foi a dispensa de licitação pública para a compra de alimentos da agricultura familiar, um processo que, em geral, é burocrático e demorado, tendo como um dos critérios o menor preço. Pela Lei 11.947, a aquisição dos alimentos pode ser realizada por chamada pública, procedimento administrativo mais rápido, utilizado para firmar parcerias com organizações da sociedade civil, como ONGs. “Na hora da aquisição dos produtos, ficam em primeiro plano outros critérios que não o preço, como a origem geográfica, a produção ecológica e a inclusão social”, diz.

Sobre a trajetória das duas leis, Morgane Retière diz que a brasileira teve origem em movimentos de combate à fome e à desigualdade social, no início nos anos de 1940, foi intensificada após a redemocratização do País e ganhou apoio institucional durante o governo do Partido dos Trabalhadores, em 2003.

Já a lei francesa foi criada a partir do controle de segurança sanitária dos alimentos, principalmente os de origem animal e, a partir dos anos 2000, passou a ter enfoque também no combate à má alimentação do ponto de vista nutricional, que culminou no aumento da obesidade populacional gerada pelo consumo de alimentos industrializados. Confira reportagem na integra Jornal da USP

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PROJETO FORRÓ PARA TODOS ACONTECE NESTE DOMINGO (5)

Os músicos Ivan Greg, Celso José e Jailson Costa, idealizadores do projeto Forró Para Todos, realizarão no próximo domingo, dia 05 de maio, um show inédito acompanhados por um mini trio que percorrerá o trajeto da Praça 21 de Setembro até a orla de Petrolina. A concentração do cortejo está marcada para as 17h.

Com o apoio dos grupos de dança Sertão Pé Quente, Forrozeiros PNZ e Forrozeiros Petrolina, o projeto inovador busca celebrar a cultura nordestina através da música e da dança, promovendo a inclusão de pessoas de todas as idades e origens no forró, um dos ritmos musicais mais autênticos do Brasil.

Para Ivan Greg, "realizar um evento e um projeto como o Forró Para Todos é valorizar e manter viva a tradição nordestina com o puro forró, a sanfona, a zabumba e o triângulo ecoando por onde passar. É assim, ocupando e ecoando nas ruas, que o forró vai reconquistando seu espaço merecido em nossa cultura".

SERVIÇO: O que: Cortejo Forró Para Todos

Quando:  05 de maio  às 17 horas

Onde: Praça 21 de Setembro, Petrolina-PE

Entrada: evento gratuito 

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CABELOS BRANCOS: NÓS DA ESQUERDA ESTAMOS ACUADOS, DIZ FREI BETTO

Participei em Belo Horizonte, no início de abril, do 12º encontro nacional do Movimento Fé e Politica. Quase duas mil pessoas. Ao contrário dos encontros anteriores à pandemia, poucos jovens. A maioria de cabelos brancos ou tingidos. 

Minha geração envelhece. Chego este ano aos 80. Nossas ideias, propostas e utopias, também envelhecem?

      É muito preocupante constatar que as forças progressistas não logram renovar seus quadros. Para vice de Boulos, na disputa pela prefeitura de São Paulo, em outubro próximo, o PT precisou importar uma mulher filiada a outro partido: Marta Suplicy, que fará 80 anos em março de 2025.

      No Rio, o PT parece não ter quem indicar para possível vice na chapa do prefeito Eduardo Paes, candidato à reeleição. Tende a importar  Anielle Franco, do PSOL. 

      Tenho proferido conferências pelo Brasil afora e assessorado movimentos populares. Os cabelos brancos predominam na plateia. As poucas manifestações públicas convocadas pela esquerda reúnem número inexpressivo de pessoas e, em geral, a turma dos cabelos brancos.

      Nós, da esquerda, estamos acuados. Como diz a canção de Belchior, "minha dor é perceber / que apesar de termos feito / tudo, tudo, tudo, tudo que fizemos / ainda somos os mesmos e vivemos (...) como os nossos pais". "Nossos ídolos ainda são os mesmos". E não vemos que "o novo sempre vem". 

      A queda do Muro de Berlim abalou as nossas esperanças em um mundo onde todos teriam a sua existência dignamente assegurada. E o capitalismo, gato de sete fôlegos, inovou-se pelos avanços da ciência e da tecnologia e, sobretudo, do neoliberalismo. 

      Primeiro, a privatização do patrimônio público; em seguida, das instituições sociais, reduzidas a duas por Margaret Tchatcher: o Estado e a família. E, por fim, o cidadão foi despido de seu manto aristotélico e condenado a ser mero consumista, inclusive de si mesmo ao passar horas a se mirar no espelho narcísico das redes digitais. 

      Há uma progressiva despolitização da sociedade. A direita é como uma maré que sobe e ameaça afogar o que nos resta de democracia liberal. Basta dizer que um dos três programas de maior audiência da TV Globo e, portanto, de faturamento, é o BBB, que bem espelha os tempos em que vivemos: ali são explícitas as regras do sistema capitalista. O único objetivo é competir. Todos sabem que, ao final, apenas uma pessoa haverá de amealhar o pote de ouro. E a missão dos concorrentes é cada um fazer tudo para que seus pares sejam eliminados. É o que milhões de adolescentes aprendem ao perder horas assistindo àquele simulacro de "O anjo exterminador", de Buñuel.

      Na esquerda "ainda somos os mesmos". Não semeamos a safra de novos militantes com medo de que eles se destacassem e ocupassem as nossas instâncias de poder. Abandonamos as favelas, as zonas rurais de pobreza, os movimentos de bairros. E não aprendemos a atuar nas trincheiras digitais, monopolizadas pela direita como armas virtuais da ascensão neofascista. 

      Não sabemos como reagir diante do fundamentalismo religioso que mobiliza multidões, abastece urnas, elege inclusive bandidos notórios. Fundamentalismo que apaga as desigualdades sociais e as contradições de classe e ressalta que tudo se reduz à disputa entre Deus e o diabo. Todo sofrimento decorre do pecado. Eliminado o pecado, irrompe a prosperidade, que empodera e favorece o domínio: a confessionalização das instituições públicas; a deslaicização do Estado; a neocristandade que condena à fogueira da difamação e do cancelamento todos que não abraçam "a moral e os bons costumes" dos que clamam contra o aborto e homenageiam torturadores e milicianos assassinos.

      Precisamos fazer autocrítica, rever nossas ideias, ter a coragem de abrir espaços às novas gerações e reinventar o futuro. Nossos cabelos brancos denunciam o inverno que nos acomete. É hora de uma nova e florida primavera!

 Frei Betto é escritor, autor de "Diário de Fernando – nos cárceres da ditadura militar brasileira" (Rocco), entre outros livros. Livraria virtual: freibetto.org

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