SEVERINA BRANCA: O SILÊNCIO DA NOITE É QUE TEM SIDO TESTEMUNHA DAS MINHAS AMARGURAS

Com chão de poesia e terra batida sobre versos e tragos líricos, uma região nos rincões do sertão entre Pernambuco e Paraíba exala sentimento rimado. “Diz a lenda que quem bebe da água do Rio Pajeú vira poeta”, dizem. É a onipresença da poesia nas cidades de Ouro Velho e Prata, na Paraíba, e em São José do Egito, em Pernambuco, que mostra o documentário O Silêncio da Noite É que Tem Sido Testemunha das Minhas Amarguras, de Petrôneo Lorena.

Em tempos de tantas tragédias, um filme como este chega a ser um bálsamo para os corações machucados ou endurecidos pelas incontáveis tragédias que o país vem passando nos últimos tempos. Afinal, não é todo dia que se tem notícia de uma cidade onde a vida exala poesia popular. E isso não é apenas modo de falar: nas ruas, feiras, casas, nos mercados e em cada bar da região, o sentimento brota em forma de verso falado ou cantado.

“Aqui é o eixo, aqui é o terreno e quando você nasce numa aldeia, você vive, voa e espaceia, mas sempre dá retorno à sua aldeia. Aqui, o Pajeú, foi um foco de poesia, é chão de poesia. As plantas aqui é [sic] poeta, até a terra tem o cheiro da poesia e aqui é um micróbio pesado. Aí não tem como se desgarrar. Esse nome não pode ser perdido. São José do Egito é valoroso”, declara o poeta João Badalo em uma das muitas mesas de bar que servem de cenário para o filme.

O longo verso que dá nome ao filme faz alusão a uma das figuras centrais da cidade de São José do Egito: Severina Branca, a “Eleonor Rigby do Nordeste”, foi quem deu o mote ao poema de Didi Patriota. Musa e prostituta, poetisa e boêmia, Severina encantava os poetas da região e e era tema frequente dos versos falados e cantados por lá. “O título refere-se também à dor e à alegria de ser poeta; da cumplicidade da madrugada na criação desses versos num sertão conservador e da utilidade social que a poesia traz a essas pessoas”, declara o diretor Petrônio Lorena.

Hoje uma senhora com o corpo marcado pelas agruras da vida, Severina guarda na memória cada estrofe feita pelos homens que marcaram sua existência. E, mesmo durona e debochada, se emociona ao ouvir os versos de Patriota:

“Quando moça fui muito desejada

Das mulheres julguei a mais feliz

Mas o tempo cruel, velho juiz

Sentencia qualquer sonho de fada

A beleza foi sendo apagada

Cada um foi falso às suas juras

E eu peço a Deus lá nas alturas

Que me mostre na vida algum sentido

Que o silêncio da noite é quem tem sido

Testemunha das minhas amarguras”

Tão emblemática para a poesia daquelas bandas, Severina Branca é descrita – com imensa ternura poética em uma locução em off – como uma mulher à frente de seu tempo: “Severina Branca é uma figura gêmea, clonada com Eleanor Rigby. Enquanto Eleonor foi nascer em Liverpool, perto de John Lennon, Severina Branca nasceu em São José do Egito e teve o mesmo dinâmico modo de ser, como uma rapariga maravilhosamente liberta, linda, uma mulher autêntica, totalmente fora de preconceitos. Todos os prefeitos novos daquela terra do Pajeú passaram suas inocências pro coração de Severina Branca. É das que levam cachorro cheio de rabugem, arrastando e tomando cana pelos bares de todos os cantos. Eu sei que Severina fez um mote: ‘O Silêncio da noite é que tem sido testemunha das minhas amarguras’.”

Muito além de “apenas” musa, Severina também é autora de muitos versos, como o que relembra quando foi ignorada por um antigo grande amor. Ao declamar as linhas abaixo em um bar cheio de poetas, toma uma dose de cachaça e exclama saudosa: “Eita, nossa vida de prazer!”

“Pedi esmola a Abraãozinho

Este não me deu ouvido

Quem outrora me adorava

Não ouve mais meu gemido

Passa por mim torce a cara

Fingindo desconhecido”

Não é à toa que o ato de memorizar é chamado de “saber de coeur”, do francês, saber com o coração. É exatamente isso que os moradores de São José do Egito fazem: quem não faz verso, conhece de coeur as rimas dos grandes poetas e glosadores locais e declama nos bares, nas casas, nas festas, em todo e qualquer lugar. Tudo na região é motivo para dizer poesia, como afirma o jovem Antônio Marinho: “Nas rodas de conversa de São José sempre sai uma história de repente. Você vai engraxar o sapato aqui em São José e o engraxate lhe diz uma poesia. Aí você diz uma coisa pra brincar com ele e ele diz ‘Oxente, tá feito a poesia de não sei de quem’ e aí conta uma história e diz um verso. Se fala de tudo também, de futebol, de putaria, mas a poesia está sempre presente, é impressionante”.

Os amores, desamores e as amarguras da vida na região tem virado versos há várias gerações. Debochadas ou rebuscadas, magoadas ou matreiras, felizes ou deprimidas, as rimas dos poetas e poetizas daqueles rincões vem se transformando com o passar do tempo, mas a tradição da poesia oral se mantém acesa e, mesmo renovada, continua reverenciando os antigos trovadores.

O Silêncio da Noite É que Tem Sido Testemunha das Minhas Amarguras é o segundo longa-metragem de Petrônio e foi finalista entre os dez melhores filmes da 40ª Mostra Internacional de Cinema de São Paulo, em 2016. É uma ode ao sentimento genuíno, à riqueza da cultura popular, mas, acima de tudo, uma celebração da cultura e do povo nordestino. De tão leve, seus 78 minutos voam como a pomba símbolo do hino sertanejo, Asa Branca, composta pela dupla Luiz Gonzaga e Humberto Teixeira.

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MEUS AVOS MARIA E SEVERINO, RITA E ANTONIO

"Nos últimos anos, a Avó estava se dando muito mal com o próprio corpo. Seu corpo de Ararinha cansada negava-se a segui-la.

- Ainda bem que a mente viaja sem passagem - dizia.

Eu estava longe...eu tinha viajado!

A Avó sentia que tinha chegado a hora de morrer. Antes de morrer, quis visitar a minha casa com corpo e tudo. Chegou de avião. Viajou entre as nuvens, entre as ondas, convencida que estava indo de barco; e quando o avião atravessou uma tempestade, achou que estava numa carruagem, aos pulos, sobre a estrada de pedras.

Ficou em casa um mês. No meio da noite despertava e queria jogar xadrez ou brigava com meu avô, que tinha morrido há quarenta anos...

No final, disse: - Agora já posso morrer. E regressou. Visitou a família toda, casa por casa, parente por parente, para que todos vissem que tinha regressado muito bem e que a viagem não tinha culpa. E então, uma semana depois de ter chegado, deitou-se e morreu...

Ás vezes, a Avó vem me Ver nos sonhos. Eu caminho na beira de um Rio e ela é peixe que me acompanha deslizando suave, suave, pelas águas".

Nós tínhamos a intimidade de parentes
de amigos noturnos
De fim de madrugada.
Nós éramos dois versos
Dividindo em duas pátrias:
O pajeú e o pampa,
E dentro
Da tristeza que me espanta
Pela chama da morte que arde,
Se faz sombra teu nome
Na cruz que ilumina a tarde.

Fonte: O Livro dos Abraços-Eduardo Galeano.

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O SILÊNCIO DA NOITE É QUE TEM SIDO TESTEMUNHA DAS MINHAS AMARGURAS

“Tá tudo bem, sim, eu não entendo muito dessas coisas não, mas por mim tá tudo bom”, dizia Severina Branca por telefone à Continente no final da noite de uma sexta, pouco antes de ela e o diretor Petrônio Lorena acompanharem a exibição de O silêncio da noite é que tem sido testemunha das minhas amarguras em São José do Egito. Antes de estrear no Recife, onde está em cartaz no Cinema do Museu, em Casa Forte, o documentário circulou pelo interior de Pernambuco: Arcoverde, Belo Jardim, Triunfo, a Serra Talhada natural do cineasta e Caruaru.

Severina é musa, estrela, protagonista e uma das poetas retratadas por Petrônio. A frase extensa que dá título a este que é o segundo longa dele, aliás, veio dela. “E tem a ver com aquele momento de contemplação da madrugada, quando a cantoria já terminou e os poetas, indo para casa, começam a pensar naqueles versos e em como eles fazem sentido”, conta o diretor. O silêncio da noite é que tem sido testemunha das minhas amarguras deve ser visto por todos aqueles que adoram poesia e cantoria e, também, por quem se interessa por narrativas documentais que fogem dos esquemas convencionais.

“A linha cronológica do filme é como se fosse um único sábado: começa com a feira e termina de madrugada”, explica Petrônio, que começou a viajar pelos sertões da Paraíba e de Pernambuco ainda em 2010. Foram sete viagens ao todo, as primeiras delas “sem grana nenhuma” e tampouco sem equipamento, pois o diretor queria pegar intimidade “e confiança” com aquelas figuras que viria a retratar. Jorge Filó, Bia e Antônio Marinho (filha e neto de Lourival Batista, o Louro do Pajeú), Graça Nascimento e Rildo de Deus, entre outros, são registrados em instantes preciosos e numa linguagem ora rebelde, ora transcendental. Um filme de Petrônio, afinal, não poderia ter uma composição imagética banal.

E tudo isso tem a ver, também, com a matéria principal sobre a qual ele se debruça: a criação. De onde surgem os versos, os motes, as glosas? De onde vem a chama que inspira os poetas e cantadores? Entre um gole e outro de cerveja, entre uma visita e outra a bares ou cabarés, entre festividades e conversas na porta de casa, O silêncio da noite… descortina essa vida de quem se encarrega de repassar arte, conhecimentos e cultura pela oralidade. E respeita o tempo e o espaço daquelas pessoas retratadas – aliás, forja uma nova relação de tempo-espaço, um tempo dilatado, como se as horas demorassem a passar enquanto poetas declamam suas rimas.

Distribuído pela Inquieta Cinema, o documentário foi exibido pela primeira na 40ª Mostra Internacional de Cinema de São Paulo, ainda em outubro de 2016. Questões relativas a orçamento protelaram a estreia, só ocorrida agora nos idos de março. “Mas sabia que acho até bom esse tempo todo?”, revela Petrônio Lorena, “porque o filme amadureceu e criou uma expectativa em todas as pessoas que nele aparecem, uma ansiedade mesmo, que acho até legal”. O silêncio da noite é que tem sido testemunha das minhas amarguras é contra a pressa que rege os tempos atuais, é contra as necessidades de rótulos e contra as normas que decretam que o Sertão e tudo que dele deriva estão mortos. Se esse não for um motivo atraente para a ida ao cinema, que o sejam os versos de Severina que denominam o filme – afinal, nesta longa noite que tem anestesiado o Brasil desde 2016, é o silêncio quem tem sido testemunha das nossas amarguras.

LUCIANA VERAS é repórter especial da Continente e crítica de cinema.

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MUDANÇAS CLIMÁTICAS PODEM CAUSAR PERDA DE VEGETAÇÃO EM 99% DA CAATINGA EM ATÉ 2060, ALERTA ESTUDO

As mudanças nos padrões de chuvas e temperatura podem causar a perda de espécies vegetais em 99% do território da Caatinga até 2060, aponta um estudo da Unicamp. A projeção revela ainda que as áreas mais afetadas serão as chapadas Diamantina e do Araripe, além de parte do Planalto da Borborema.

O levantamento foi realizado a partir de um banco de dados com mais de 400 mil registros relacionados à ocorrência de aproximadamente 3 mil espécies. Com a ajuda de métodos estatísticos e algoritmos de inteligência artificicial, os pesquisadores identificaram como cada planta respondia às variações características do clima.

Primeiro autor da pesquisa, o professor Mário Moura, do Instituto de Biologia, explica que o mapeamento das espécies considerou dois tipos de vegetação: a arbórea, que geralmente consiste em árvores de grande porte; e a não arbórea, que inclui cactos, gramas e capins, por exemplo.

"Nós percebemos que, no cenário otimista, 50 espécies de plantas poderiam ser extintas na Caatinga, e no cenário pessimista esse número chegaria a 250. Então 99% do território vai ter perda de espécies, especialmente a região Sul do bioma e a Noroeste, que são pontos turísticos muitas vezes", afirma o pesquisador.

Após a junção das informações sobre a ocorrência de espécies e variações do clima, o próximo passo foi cruzar os dados com os cenários de mudanças globais disponibilizados pelo Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas (IPCC, na sigla em inglês).

"Uma vez que identificamos essa relação entre ocorrência da espécie e clima, podemos pegar os mapas de clima do futuro e projetar essa mesma relação. [...] No final das contas, fazendo todas essas combinações, foram quase 1,5 milhão de mapas gerados", detalha Moura.

Os mapas revelaram, ainda, que 40% das comunidades de espécies vegetais da Caatinga devem passar por um processo de simplificação, no qual espécies raras e exclusivas a uma região são substituídas por plantas comuns, tornando o bioma menos variado.

"É como se você pegasse a biodiversidade, colocasse num liquidificador e batesse. Isso reduz um pouco a eficiência de todos os serviços ecossistêmicos, ou a própria resiliência que essa biodiversidade pode ter aos impactos do clima", diz.

Presente exclusivamente no Brasil, a Caatinga abrange 10% do território nacional, ainda que aproximadamente um terço da extensão do bioma tenha sido convertida em áreas agrícolas, e abriga cerca de 30 milhões de pessoas, segundo o pesquisador.

A perda de espécies vegetais afeta diretamente o ecossistema, prejudicando o processo de fotossíntese, aumentando a concentração de gás carbônico na atmosfera e acentuando os efeitos das mudanças climáticas.

"Quando a gente fala que tem uma floresta de pé, tem carbono no tronco, nas raízes e nas folhas da floresta. Quando tem desmatamento, você perde aquela vegetação que estava fazendo fotossíntese, então o sequestro de carbono que aquela vegetação fazia, você deixou de ter", explica Moura.

Para o pesquisador, os impactos climáticos não podem ser revertidos, apenas atenuados. Para isso, a esperança é de que estudos como esse possam orientar as esferas pública e privada em direção a políticas de preservação ambiental.

"É a última década que a humanidade tem para tentar frear isso. É como se você tivesse uma bola de neve para descer na montanha: vai chegar um ponto ali em que você não consegue segurar mais essa bola de neve. Ela vai embora e você não consegue frear", analisa. (g1 Campinas)

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PLANO DE TRANSIÇÃO ECOLÓGICA PODE SER GRANDE MARCA DO GOVERNO LULA, DIZ MINISTRO DA FAZENDA

O ministro da Fazenda, Fernando Haddad, disse, nesta segunda-feira (10/7), que apresentou ao presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) um Plano de Transição Ecológica — que ele considera que pode ser a grande marca do governo. A informação foi dada em entrevista ao podcast O Assunto.

"Se tudo se desdobrar como espero, a partir da reunião de sexta-feira, eu penso que a questão socioambiental vai ser a grande marca do governo. Eu senti da parte dele [Lula] um entusiasmo muito grande", disse Haddad.

Segundo o ministro, o plano está em validação com o presidente. Ele afirmou que a pasta estava “trabalhando em silêncio” para mapear todas as oportunidades que o Brasil tem como vantagens competitivas em relação ao mundo.

“Então, isso vale para a infraestrutura, para a geração de energia limpa, para a atração de investimentos estrangeiros que querem produzir produtos verdes e transformar isso numa marca do Brasil", disse Haddad, sobre as vertentes da iniciativa.

O ministro disse acreditar que a transição ecológica irá gerar empregos de ponta. "Ele pode parecer exagerado, mas é um plano com mais de 100 ações que vão se desdobrar em quatro anos. Então, a ideia é ir desde o crédito de carbono, passando pela reforma tributária, até a exploração de terras raras. É um mapeamento muito amplo das oportunidades", explicou.

"Importante entregar ao longo do mandato do presidente essas ações que vão desde leis que vão ser encaminhadas a partir de agosto, como a Lei de Crédito de Carbono, até a infraestrutura legal que desburocratiza investimentos verdes", acrescentou Haddad.

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LAMPIÃO E MARIA BONITA: NOITE DE 28 DE JULHO

Aquela noite, 28 de julho, era a noite de seus desejos. Seus corpos se amariam como nunca. Seus olhos confessavam seu amor. Havia uma necessidade de abraçar mais forte, de se beijar mais quente, de sussurrar segredos. 

O suor os unia em complexa solução salgada. Seus fluidos se misturavam cumprindo seu destino. A lua, a noite, o silêncio no campo. A terra calava-se diante de tanta cumplicidade. Nus, abraçados, juraram amor eterno, enquanto seus dedos se entrelaçavam. 

A  rusticidade de suas vidas nunca invalidara seus momentos de paixão.  O cactos, a poeira da caatinga, os bichos mais estranhos, a brisa inexistente, tudo reverenciava e abençoava sua união. Naquela noite, toda a alegria do mundo invadia-lhes a aura. Até que veio a manhã e adormeceram para sempre.

Fonte: Aderaldo Luciano-professor. Doutor em Ciência da Literatura

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MOVIMENTOS SOCIAIS REIVINDICAM QUE PREFEITURA DE JUAZEIRO SUSPENDA PROJETO QUE AGRIDE O RIO SÃO FRANCISCO

Após a gestão municipal dizer não a realização de uma audiência pública para discutir com a sociedade um Projeto de Lei que visa reduzir de 500 para 100 metros a Área de Preservação Permanente (APP) em um trecho de 16 km nas margens do Rio São Francisco, organizações da sociedade civil se mobilizaram e realizaram uma audiência popular na última quarta, dia 28.

Cerca de 200 pessoas participaram do evento, realizado na Universidade Federal do Vale do São Francisco (Univasf), Campus Juazeiro. Uma média de 20 organizações sociais assumiram a realização da audiência e outras dezenas se somaram à discussão, fazendo do evento um momento com ampla participação popular, com representatividade de diversos segmentos da cidade e do campo. A Secretaria Municipal de Meio Ambiente enviou colaboradores/as ao evento, mas estes/as não se manifestaram.

Na oportunidade, instituições que representam a sociedade civil no Conselho Municipal de Meio Ambiente apresentaram o Projeto de Lei e as devidas críticas. O Instituto Regional da Pequena Agropecuária Apropriada (Irpaa), entidade que integra a coordenação da ASA, é uma destas representações da população de Juazeiro no referido órgão e na oportunidade ratificou que uma decisão desta precisa contar com a escuta da população, não podendo ser aprovado sem um diálogo amplo. O coordenador institucional da entidade, Clerison Belém, questionou: “ao invés da gente tá discutindo redução da área de preservação, da mata ciliar, da vegetação nativa, por que a prefeitura não poderia está debatendo com a gente um Projeto de Lei de Recaatingamento?”

A quilombola Ovídia Sena, moradora da comunidade de Rodeadouro, no entorno do local onde se define o início do perímetro urbano que teria a APP reduzida, conforme o texto do PL, denunciou que a construção de condomínios e outras ocupações ilegais da margem do rio já vem sendo um problema para as famílias da região. “Se continuar assim, esse bem que favorece toda essa região vai acabar sendo morto”, teme a liderança, denunciando que só aumenta construções que chegam até a beira e ao próprio rio.

Além de autoridades presentes, uma média de 30 pessoas de diferentes representações populares usaram a palavra para afirmar que são contra a redução. Além disso, foi consenso que se deve encaminhar pedido à gestão municipal solicitando que o PL seja retirado da pauta do Conselho e não seja levado à Câmara de Vereadores/as. Outros encaminhamentos foram propostos, a exemplo da continuidade da mobilização em torno de outras problemáticas que envolvem o rio no município.

O vereador Emerson Mitu (PCdoB) e a vereadora Valdeci Alves (MDB) declararam que se o projeto for para votação na Câmara irão votar contra a aprovação, dizendo não à redução para 100 metros da área destinada à proteção do rio. Valdeci, conhecida como Neguinha da Santa Casa, é presidenta da Comissão de Meio Ambiente da Câmara e disse que “o que for bom pra Juazeiro eu vou estar votando, eu vou estar apoiando, não se preocupem que eu não vou votar porque apóio a prefeita (…) eu jamais vou votar contra o povo”, se comprometeu.

O deputado estadual Crisóstomo Lima, o Zó (PCdoB), também esteve presente e colocou o mandato à disposição. Assim como ele, a deputada estadual Neusa Cadore (PT), por meio de nota, também se dispôs a levar a pauta para a Assembleia Legislativa da Bahia (Alba), dada a importância do rio para o estado e para o Brasil. Neusa preside a Frente Mista Ambientalista e em Defesa dos Territórios de Povos e comunidades Tradicionais da Alba. No evento, foi lida ainda nota de apoio do mandato do deputado federal Jorge Solla (PT/BA).

A Universidade do Estado da Bahia (Uneb) também esteve representada na audiência e juntou-se às organizações mobilizadas, bem como a Diocese de Juazeiro, educadores/as, estudantes, partidos de esquerda, associações rurais e ativistas que atuam em diversos segmentos. No próximo dia 30, a sociedade civil novamente estará mobilizada para participar de reunião extraordinária do Conselho Municipal de Meio Ambiente, onde serão apreciadas contribuições da relatora do PL e sub-relator, este último representante da Univasf que enviou propostas em acordo com o movimento.

A audiência popular foi organizada pela Univasf, Irpaa, Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), Coletivo Enxame, Associação de Advogadas e Advogados pela Democracia, Justiça e Cidadania, Movimento Popular de Cidadania – MPC, Setorial de Meio Ambiente e Desenvolvimento - Smad e Setorial de Combate ao Racismo - PT Juazeiro, União das Associações do Vale do Salitre – UAVS, Promotoras Legais Populares – PLP, Câmara de Turismo Sertão do São Francisco, Conselho Pastoral dos Pescadores/as – CPP, Colegiado Territorial Sertão do São Francisco, Articulação Quilombola, Frente Negra do Velho Chico, Povos de Terreiro, Articulação Semiárido Brasileiro (ASA), Rede Nacional de Mulheres Negras, Associações de Bairros, Movimento dos/das Trabalhadores/as Sem Terra (MST), Movimento de Atingidos/as por Barragens (MAB), além do vereador Mitu.

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