ESTUDO DA UNIVASF APONTA TENDÊNCIA DE CRESCIMENTO DA COVID-19 EM PETROLINA E JUAZEIRO

Diariamente, pesquisadores da Universidade Federal do Vale do São Francisco (Univasf) se debruçam sobre os números oficiais da disseminação do novo coronavírus em Petrolina (PE) e Juazeiro (BA) para abastecer modelos matemáticos epidemiológicos que ajudam a compreender o comportamento da pandemia nestas duas cidades. 

Sempre no final da tarde da sexta-feira, o Grupo Modelos Matemáticos para Covid-19 (GMC-Vasf) divulga um boletim com uma análise semanal sobre a doença e estimativas para a semana seguinte. O último boletim (Nº 6/2020), divulgado na sexta-feira (17), mostra que permanece uma tendência de aumento do número de casos de pessoas infectadas pelo novo coronavírus e também do número de óbitos nos municípios.

No cenário estimado para a próxima sexta-feira (24), o número de infectados pela doença deverá variar entre 4.622 e 4.995 pessoas. Já o número de óbitos previsto para a mesma data irá variar em torno de 99 a 109 casos. De acordo com os dados do estudo, cerca de 60% da população da região estaria infectada pela Covid-19 na primeira semana de setembro. O boletim mais recente também confirmou as estimativas que haviam sido apontadas para a semana passada, período em que foram confirmados 3.602 casos de pessoas infectadas e 90 óbitos na região.

Um dos integrantes do GMC-Vasf, professor Paulo de Carvalho, do Colegiado de Engenharia Agrícola e Ambiental, explica que as estimativas que constam nos boletins, disponíveis no site do grupo de pesquisa, refletem a situação da região e são obtidas por meio de modelos matemáticos ajustados aos dados disponibilizados pela Faculdade de Ciências Aplicadas e Sociais de Petrolina (Facape) e Secretarias de Saúde das duas cidades. Ele esclarece que as medidas adotadas para o controle da doença não são sentidas de forma imediata. “Em média, as medidas adotadas levam 15 dias para surtir efeito. Portanto, os números mostram o impacto de ações que foram tomadas duas semanas antes, a exemplo de um afrouxamento no isolamento social ou de uma maior rigidez nestas ações”, observa.

O grupo utiliza um conjunto de modelos matemáticos distintos e faz o cruzamento das informações para chegar à variação média divulgada a cada semana. “São equações já consolidadas e utilizadas no mundo inteiro para estudos epidemiológicos”, frisa. O pesquisador destaca também que esta é a primeira semana que o grupo utiliza a média móvel, que é a média aritmética dos sete dias anteriores, para fazer as estimativas, o que possibilita uma maior confiabilidade dos números, por diminuir a influência da variação dos dias.

Além do boletim semanal, o GMC-Vasf elabora um relatório mensal com uma análise mais abrangente e aprofundada sobre a situação da pandemia nas duas cidades, incluindo a disseminação da doença pelos bairros. O estudo visa subsidiar o poder público com informações que podem contribuir para a elaboração de políticas públicas e estratégias de enfrentamento e combate ao novo coronavírus. 

“Os modelos apontam, com uma dada margem de segurança, as curvas características da disseminação da Covid-19, que têm um comportamento padrão já identificado no mundo inteiro. Dessa forma, é possível prever o período de ascensão, de estabilização e de decréscimo da doença”, diz Carvalho. A expectativa, segundo indicam os dados, é que o período de queda nos números da Covid-19 na região seja alcançado a partir do início de agosto.

Grupo multidisciplinar de pesquisadores que reúne docentes e estudantes de pós-graduação da Univasf, o GMC-Vasf deu início ao trabalho de análise dos dados em maio e a divulgação do primeiro boletim ocorreu em meados de junho. Os pesquisadores utilizam os números do “Report sobre o avanço do Covid-19 no Brasil e no mundo”, da Faculdade de Ciências Aplicadas e Sociais de Petrolina (Facape), da Secretaria de Saúde de Juazeiro e do Grupo de Pesquisa em Doenças Infecciosas e Negligenciadas do Vale do São Francisco (GPDIN) da Univasf para analisar a evolução da pandemia de Covid-19 na região. Os dados da pesquisa são divulgados no site e nas redes sociais (Instagram,  YouTube e Twitter) do GMC-Vasf.
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FATOS HISTÓRICOS POLITICO, CULTURAL E DOS MOVIMENTOS SOCIAIS: OS 50 ANOS DA MISSA DO VAQUEIRO DE SERRITA

Quando meus querido e inesquecíveis  amigos padre João Câncio, Luiz Gonzaga e Pedro Bandeira criaram a Missa do Vaqueiro, há meio século,  no Sitio Lajes, o fundamento foi a defesa do homem do campo, na pessoa do vaqueiro Raimundo Jacó e, por extensão, toda a vaqueirama e trabalhadores deste Sertão "judiado", como dizia o sacerdote filho do barbeiro Mestre Chico, lá de Petrolina.

João Câncio era uma criatura extremamente humana, político e socialmente centrado na obra de Deus através da Igreja Católica de Dom Helder Câmara. Ora, ele foi ordenado, juntamente com meu inesquecível amigo Mansueto de Lavor, filho de Serrita, em 1964, em plena ditadura militar.

Foi assim que João Câncio dos Santos transformou-se no padre-vaqueiro, que fazia a celebração paramentado com as vestimentas do vaqueiro. E participava das vaquejadas em muitos municípios do Sertão.

O filho de Mestre Chico surpreendeu a própria Igreja quando sugeriu aos vaqueiros (durante a missa assistida por milhares de pessoas, com a participação de turistas nacionais e  estrangeiros),  que assistissem  a celebração montados nos cavalos e apresentassem seus instrumentos de trabalho – da cela até a última peça de sua vestimenta, durante o ofertório e a hóstia seria trocada pelo queijo, rapadura e farinha, alimentos básicos do homem da lida do campo.

João Câncio – que enfrentava os políticos atrasados da região de fronte erguida, resumia o verdadeiro sentido da Missa do Vaqueiro como "Um Grito de Justiça no Sertão".

Hoje, porém, tudo isso foi esquecido...

Transformaram a missa em uma coisa que trata de despesas, de dinheiro, contratação de artistas, aluguel caro de barracas e até cobrança de estacionamento dos familiares dos vaqueiros que tanto foram defendidos por João Câncio.

Eu continuo com o compromisso de não deixar que enterrem em "cova rasa" a memória e o sentimento cristão daqueles que fundaram a Missa do Vaqueiro do Sítio Lajes.

Viva João Câncio e Luiz Gonzaga. Um forte abraço ao meu amigo Pedro Bandeira, hoje com a saúde abalada, mas que deve mais uma vez comparecer ao altar de pedra do Sitio Lajes nos próximos  anos (depois da pandemia do novo coronavírus) , lembrando nosso primeiro encontro ali no centro das caatingas, onde os vaqueiros Raimundo Jacó Mendes e Miguel Lopes (acusado de matar seu colega) trabalhavam para os fazendeiros São do Alferes e dona Tereza.

Pela primeira vez em 50 anos a Missa do Vaqueira não vai realizada, presencialmente!
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FUNCULTURA DA MÚSICA E GERAL ABRE INSCRIÇÕES PRESENCIAIS

Produtores culturais de Pernambuco podem inscrever projetos nos editais da Música e Geral do Funcultura, a partir desta segunda-feira (20), presencialmente. Seguindo recomendações previstas no Plano de Convivência das Atividades Econômicas no Estado, a Secult-PE e a Fundarpe abrem atendimento físico com protocolo de atendimento diferenciado.

Interessado em inscrever projetos culturais de forma presencial devem usar obrigatoriamente máscaras, assim como terão suas temperaturas medidas na entrada do espaço, que neste primeiro momento será o Teatro Arraial Ariano Suassuna (Rua da União, Boa Vista). No local haverá distribuição de alcool em gel para o público - que deve também respeitar o distanciamento de 1,5 m entre si.

Em rodadas que devem atender vinte pessoas por vez - com distribuição de fichas para atendimento direcionado ao Espaço Pasárgada - o horário para inscrições será das 8h às 12h e das 13h às 16h.

As inscrições para o Funcultura Geral também podem ser feitas a partir de hoje até 26 de julho de 2020, via Sedex para o endereço Rua da Aurora, nº. 463/469, Térreo, Boa Vista.

Já a partir do dia  27 de julho a 3 de agosto as inscrições poderão ser realizadas também presencialmente em locais específicos, de acordo com a Área Cultural/Linguagem do projeto:

- Proponentes das linguagens Artes Integradas, Artes Plásticas, Artes Gráficas e congêneres (Artes Visuais), Artesanato, Circo, Cultura Popular e Tradicional e Patrimônio que desejarem se inscrever presencialmente devem comparecer à Estação Central Capiba/Museu do Trem (Rua Floriano Peixoto s/n, São José – Recife), das 8h às 12h e das 13h às 16h;

-Já os proponentes de Design e Moda, Fotografia, Gastronomia, Literatura, Ópera, Dança e Teatro devem comparecer ao Teatro Arraial Ariano Suassuna (Rua da Aurora, 457 – Boa Vista, Recife ), das 8h às 12h e das 13h às 16h. 

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NEUROCIENTISTA DIZ QUE BRASIL SOFRE A PIOR TRAGÉDIA COLETIVA DA HISTÓRIA COM A PANDEMIA DO COVID-19 QUE ELE CONSIDERA FORA DE CONTROLE

O neurocientista Miguel Nicolelis, um dos cientistas mais influentes do Brasil, disse hoje que, com mais de 77.800 mortes, seu país sofre a pior tragédia coletiva da história com a pandemia do COVID -19, que ele considera “fora de controle” e com um cenário “dantesco” por ter mais vítimas do que a Guerra da Tríplice Aliança (1864-1870) contra o Paraguai.

“Estamos em um cenário dantesco, é a pior tragédia humana da história do Brasil, sem considerar a escravidão ou o genocídio indígena, que são processos seculares. Estamos falando de apenas quatro meses. Brasil, na guerra da Tríplice Aliança (Argentina e Uruguai) contra o Paraguai, perdeu 50.000 soldados em seis anos. A pandemia já ultrapassou essa marca “, afirmou o especialista em entrevista à Xinhua.

O também coordenador do Comitê  Científico de Combate ao Novo Coranavírus do Consórcio Nordeste, que agrupa nove estados da região mais pobre do Brasil, elogiou a cooperação da China com o Brasil na pandemia e considerou “o caminho a seguir” em termos de equipamentos para enfrentar a emergência de saúde.

No entanto, afirmou que, sem dúvida, no Brasil a doença do novo coronavírus (covid-19) “carece de uma coordenação central nas ações para mitigá-lo”.

Nicolelis, que há 32 anos trabalha nos Estados Unidos, se estabeleceu em sua casa em São Paulo durante a pandemia e a partir daí coordena a equipe de especialistas do  Consórcio Nordeste que delineou políticas regionais contra o covid-19.

Ele indicou que neste momento a pandemia está experimentando o efeito “bumerangue”, já que o pico de contágio nas capitais mais afetadas do Nordeste, como Fortaleza (Ceará), Recife (Pernambuco) e São Luiz (Maranhão), já passou, mas o surto avançou para o interior dos estados e deve retornar aos grandes centros urbanos.

“São Luiz e Fortaleza foram as cidades que alcançaram resultados rápidos ao fazer duas semanas de ‘confinamento’ (confinamento total), mas agora podemos ver o efeito bumerangue. Um grande esforço está sendo feito para convencer os prefeitos de pequenas cidades a não ceder à abertura da atividade para evitar multidões e infecções “, explicou.

Quando perguntado sobre como o vírus se espalhou no Brasil, ele citou como um dos motivos o fluxo de pessoas no final de fevereiro, após o Carnaval.

Mas também o fato do governo federal ter mantido em operação aeroportos e rodovias federais, que atravessam o país, transportando mercadorias e pessoas.

No segundo semestre, Nicolelis  informou que uma das recomendações que deu é adiar até 2021 as eleições municipais agendadas para novembro.

“Não vejo o Brasil fora da crise em novembro e o drama crescerá se houver multidões”, afirmou.

Os efeitos da pandemia durarão até 2021.

Diante dessa situação, o gabinete do prefeito de São Paulo, a maior cidade do Brasil e da América do Sul, decidiu suspender as tradicionais celebrações de rua do Ano Novo.

O relaxamento das quarentenas nos dois estados mais afetados, Rio de Janeiro e São Paulo, “pode ser dramático”, porque, segundo Nicolelis em setembro, o número de mortos pode chegar a 150.000.

“Além de todos os problemas, temos pessoal médico saturado e exausto, com altas taxas de mortalidade e doenças. O sistema de saúde não se mede apenas a disponibilidade de leitos”, enfatizou.

Nicolelis, professor de Neurociência da Universidade Duke, Estados Unidos, destacou as relações de cooperação do Brasil com a China, que ele descreveu como “fundamentais” para enfrentar a pandemia.

“A China é nosso principal parceiro comercial e deve ser um parceiro estratégico para a pandemia. A China tem capacidade industrial para dar o que o Brasil precisa, a China é um parceiro para aliviar o drama brasileiro”, acrescentou o neurocientista.

Fonte* Xinhua é a agência de notícias oficial do governo da República Popular da China
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MISSA VAQUEIRO SERRITA 50 ANOS DE HISTÓRIA, MISTICISMO E FÉ

Compreender que a história vem se tecendo com a força da própria vida. E por isto, disse o cantador Virgilio Siqueira, daí não ser possível guardar na própria alma a transbordante força de uma causa. Daí não ser possível retornar, afinal, a gente nem sabe ao certo se de fato partiu algum dia...

“Tengo/legotengo/lengotengo/lengotengo … O vaqueiro nordestino/morre sem deixar tostão/o seu nome é esquecido/ nas quebradas do Sertão ...” Os versos ecoam pelo lugar, realçados pelo trote dos animais e o balançar natural dos chocalhos trazidos pelos donos, todos em silêncio. É música. É arte.

Cada arte emociona o ser humano e maneira diferente! Literatura, pintura e escultura nos prendem por um viés racional, já a música nos fisga pelo lado emocional. Ao ouvir música penetramos no mundo das emoções, viajamos sem fronteiras.

A viagem através do "pensamento) mais uma vez é o destino Serrita, Pernambuco, município próximo a Exu, terra onde nasceu Luiz Gonzaga, ali no sítio Lages, um primo do Rei do Baião, no ano de 1951, Raimundo Jacó, homem simples, sertanejo autêntico, tendo por roupa gibão, chapéu de couro tombou assassinado.

Realizada anualmente sempre no quarto domingo do mês de julho, a Missa do Vaqueiro tem em suas origens uma história que foi consagrada na voz de Luiz Gonzaga e criada com os amigos Padre João Câncio e Pedro Bandeira, violeiro e o único que vive e participa da Missa. Pedro Bandeira atualmente mora em Juazeiro do Norte, Ceará.

Este ano a Missa do Vaqueiro de Serrita completa 50 anos. As celebrações serão virtuais devido ao decreto de pandemia que não permite aglomerações.

A música composta por Nelson Barbalho, ainda ecoa nos sertões brasileiros: Raimundo Jacó, um vaqueiro habilidoso na arte de aboiar. Reza a lenda que seu canto atraía o gado, mas atraía também a inveja de seus colegas de profissão, fato que culminou em sua morte numa emboscada. O fiel companheiro do vaqueiro na aboiada, um cachorro, velou o corpo do dono dia e noite, até morrer de fome e sede.

A história de coragem se transformou num mito do Sertão e três anos após o trágico fim, sua vida foi imortalizada pelo canto de Luiz Gonzaga. O Rei do Baião, que era primo de Jacó, transformou “A Morte do Vaqueiro” numa das mais conhecidas e emocionantes canções brasileiras. Luiz Gonzaga queria mais. Dessa forma, ele se juntou a João Câncio dos Santos, na época padre que ao ver a pobreza e as injustiças sociais cometidas contra os sertanejos passou a pregar a palavra de Deus vestido de gibão, para fazer do caso do vaqueiro Raimundo Jacó o mote para o ofício do trabalho e para a celebração da coragem.

Assim, em 1970, o Sítio Lajes, em Serrita, onde o corpo de Raimundo Jacó foi encontrado, recebe a primeira Missa do Vaqueiro. De acordo com a tradição, o início da celebração é dado com uma procissão de mil vaqueiros a cavalo, que levam, em honras a Raimundo Jacó, oferendas, como chapéu de couro, chicotes e berrantes, ao altar de pedra rústica em formato de ferradura. 

A missa, uma verdadeira romaria de renovação da fé, acontece sempre ao ar livre. A Missa do Vaqueiro enche os olhos e coração de alegria e reflexões. O poeta cantador de Viola, Pedro Bandeira se faz presente ao evento e o peso dos seus mais de 80 anos ilumina com uma mágica leveza rimas e versos nos improvisos da inteligência. Vaqueiros e suas mãos calejadas, rostos enrugados pelo sol iluminam almas.

Em Serrita ouvimos sanfonas tocando alto o forró e o baião. Corpo e espírito ali em comunhão. A música do Quinteto Violado, composto por Janduhy Filizola é fonte de emoção. A presença de Jesus Cristo está no pão, cuscuz, rapadura e queijo repartidos/divididos na liturgia da palavras.

Emoção! Forte Emoção é que sinto na Missa do Vaqueiro ao ouvir sanfona e violeiros:
“Quarta, quinta e sexta-feira/sábado terceiro de julho/Carro de boi e poeira/cerca, aveloz, pedregulho/Só quando o domingo passa/É que volta os viajantes aos seu locais primitivos/Deixa no caminho torto/ o chão de um vaqueiro morto úmido com lágrimas dos vivos.

E aqui um assunto místico: quando o gado passa diante do mourão onde se matou uma rês, ou está esticado um couro, é comum o gado bater as patas dianteiras no chão e chorar o sentimento pelo “irmao” morto. O boi derrama lágrimas e dá mugidos em tons graves e agudos, como só acontece nos sertões do Nordeste!

Assim eu escutei e aqui reproduzo...
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ALFREDO SIRKIS: UMA VIDA EM DEFESA DA VIDA

A imagem cristalizou desde que soube do seu carro estraçalhado num poste: Alfredo Sirkis de pé sobre a mesa da redação da Veja na sucursal do Rio fazendo um comício acalorado para os colegas. Ele contestava as regras de funcionamento da revista e resolveu reagir no momento em que deixava o emprego. Eram os anos 80, ele voltava de um exílio de oito anos e muitos comícios. Contava como escapou do golpe no Chile, no trabalho de estivador na Suécia, da sobrevivência pelo jornalismo na França e em Portugal onde deixou saudades como “Marcelo Dias”, um dos pseudônimos adotados lá fora.

As outras conversas eram sempre sobre política e ele tinha histórias. Fazia política desde os tempos de movimento estudantil no Colégio de Aplicação. No golpe de 1964 tinha 14 anos mas frequentou passeatas como a dos 100 mil em junho de 1968 e, aos 17 anos, resolveu entrar para a luta armada.

Estava longe de ser um terrorista sanguinário como pintava o regime. Sirkis era engraçado, pândego mesmo, tão humano que participou dos sequestros do embaixador alemão, Ludwig von Holleben, e do suíço Giovanni Bucher, seguro de que não conseguiria executar com sua krupskaia [apelido inspirado na companheira de Lenin da metralhadora soviética que utilizava] nenhum dos dois caso o governo não soltasse os presos em troca. Foram 40 no caso do alemão, 70 pelo suíço a quem se afeiçoou tanto que deu de presente um disco de Joan Baez.

Ele pertencia ao movimento da Vanguarda Popular Revolucionária e conversou com o líder do movimento sobre sua decisão de abandonar tudo e deixar o país, Carlos Lamarca o apoiou.

Quando integrou a redação da revista Veja na sucursal carioca, Sirkis tinha acabado de lançar Os Carbonários, que levou o Jabuti de 1981. Ali, avaliava os erros da luta armada por estar desconectada da base popular e os acertos utópicos da nossa geração. Sempre reafirmando sua vocação pacifista. Era um colega e tanto. “Não me orgulho, nem me envergonho”, escreveu na 14ª edição do livro Os Carbonários, um best-seller.

Entre tantos que morreram na tortura ou sob o rótulo de “desaparecidos”, e foram executados na volta do exílio, Sirkis retornou em 1979 com a lei da Anistia e juntou-se aos sobreviventes como Cid e César Benjamin ou Daniel Aarão Reis, todos atuando por um Brasil melhor até hoje. Lamarca não teve o mesmo final, executado junto com a companheira, Iara Iavelberg, na Bahia no ano em que Sirkis deixou o país em 1971.

Foi em busca da democracia e de um Brasil mais humano que ele dedicou o resto da vida à defesa do Meio Ambiente, mordido, como ele dizia ter sido, depois de assistir uma palestra de uma líder esquimó sobre o derretimento do gelo. Se até lá existe essa preocupação, por que não no Brasil? O ambientalismo não era um problema da humanidade. Era “o” problema.

Foi um dos fundadores do Partido Verde, que presidiu mas abandonou ao dizer que tinha sido transformado em “puteiro pelos parasitas”. Participou de várias convenções sobre mudanças climáticas, de Bali a Durban, elaborou leis como a lei Sirkis que viabilizou o Fórum Global na Rio 92. Foi Secretário Executivo do Fórum Brasileiro de Mudança do Clima e diretor executivo do Centro Brasil no Clima.

Foi o vereador mais votado quatro vezes no Rio, secretário municipal de meio ambiente entre 1993 e 1996, deputado federal de 2011 a 2015. Resolveu não se recandidatar em 2014. Estava famoso pelas campanhas que fez enterrado na areia da praia até a cabeça, sufocado pela poluição, tomando banho para alegar que no Rio só existem dois tipos de água – a poluída e a que falta, entrando num dos buracos de esgoto da cidade, correndo da polícia ou acendendo um fósforo contra o desmatamento da Amazonia.

Suas aparições públicas eram um show e chamavam atenção para a causa ambiental. Quando defendeu um transporte menos poluente, sua obsessão, inventou uma viagem de catmarã da Praça XV à Barra, no qual todos os convidados importantes passaram mal, incluindo Gilberto Gil que foi presidente da Fundação Onda Azul enquanto ele era vice, de 1997 a 2001.

Este era o Sirkis, que numa conversa com Bolsonaro, muito antes de se tornar presidente, questionou o capitão que apontava a superpopulação como o mal maior do Brasil. E Sirkis, “Olha só, Jair, você acabou de dar um excelente argumento a favor do casamento gay”. Dizia que Bolsonaro odiava o meio ambiente, os ecologistas, e se identificava com os grileiros e o garimpo ilegal. “Ele tem alma de Bandeirante, naqueles que entram na mata para procurar pedra preciosa e matar índio”.

Carluxo aproveitou para fazer uma gozação no twitter no dia da sua morte, ridicularizando o ambientalista na série “ódio do bem”.

Não foi à toa que no último dos 10 livros que Sirkis deixou, Descarbonários, ele faz um duro ataque a Bolsonaro e ao regime. E relata, junto com o descalabro ambiental, que se não nos cuidarmos a natureza seguirá em frente e quem vai estar em extinção no futuro próximo é a raça humana. “Quem está seriamente ameaçado é homo sapiens, habitante do planeta”. Nossa sina seria similar a dos dinossauros.

Sirkis sai da vida aos 69 anos de pé, sobre a mesa, como a imagem que cristalizei.

Texto publicado originalmente no site da ABI.

*Norma Couri é jornalista.
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FEMINICÍDIO: 61% DAS VÍTIMAS SÃO MULHERES NEGRAS

Um relatório produzido pela Rede de Observatórios da Segurança, grupo de estudos sobre violência nos estados de São Paulo, Rio de Janeiro, Bahia, Ceará e Pernambuco, reuniu dados que demonstram como a população negra é a principal vítima da violência no país. Os negros (pretos e pardos) são 75% dos mortos pela polícia.

Entre as vítimas de feminicídio, 61% são mulheres negras. Enquanto a taxa geral de homicídios no Brasil é de 28 pessoas a cada 100 mil habitantes, entre os homens negros de 19 a 24 anos esse número sobe para mais de 200.

Segundo o relatório, as operações policiais violentas em áreas onde predominam populações negras e as abordagens ao “elemento suspeito cor padrão” são difundidas e interpretadas por parte da sociedade como ações de combate ao crime e não como política pública altamente racializada.
Para repercutir a violência contra a população negra, Jota Batista conversa nesta segunda-feira (20), às 10h40, no Espaço Aberto, com a advogada especialista em Direitos Humanos e ativista do Movimento das Mulheres Negras, Vera Baroni, Yabassé do Terreiro de Mãe Amara.
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