PADRE CÍCERO A CAMINHO DOS 90 ANOS ENCANTAMENTO

 “O nome do padre Cícero / ninguém jamais manchará, / porque a fé dos romeiros / viva permanecerá, / pois nos corações dos seus / foi ele um santo de Deus / é e pra sempre será.” Tema de incontáveis folhetos de cordel espalhados pelas feiras sertão afora.

Quem já ouviu falar dos preceitos ecológicos do Padre Cicero, muitos o seguem como exemplo de fé e religiosidade, mas poucos sabem que ele foi um dos primeiros defensores do meio ambiente, do bioma caatinga.


Cícero Romão Batista nasceu em Crato, Ceará no dia 24 de março de 1844. Foi ordenado no dia 30 de novembro de 1870. Celebrou a sua primeira missa em Juazeiro em 1871. No dia 11 de abril de 1872 fixou residência em Juazeiro. Padre Cícero faleceu no dia 20 de julho de 1934, na cidade de Juazeiro.


A jornalista Camila Holanda escreveu que nas entranhas do Cariri do Ceará foi emergido uma versatilidade de ícones que, entrelaçados povoam o imaginário cultural que habita a região.


Nas terras do Ceará ouvi uma das mais belas histórias. Resumo: o teatrólogo, pesquisador cultural Oswaldo Barroso, ressalta um dos mais valiosos símbolos, a vigorosa força mítica e religiosa. Oswaldo, cidadão honorário de Juazeiro do Norte, diz que a primeira vez que esteve no Cariri foi nos anos 70 e a experiência fez com que suas crenças e certezas de ateu fossem desconstruídas e reconstruídas com bases nos sentimentos das novas experiências e epifanias vividas.


"Desde o início, não acreditava em nada de Deus. Mas quando fiz a primeira viagem ao Horto do Juazeiro do Norte, foi que eu compreendi o que era Deus. Isso mudou minha vida completamente", revelou Oswaldo.


Um outra narrativa importante encontrei na mitologia dos Indios Kariris. Nela a região é tratada como sagrada, centro do mundo, onde no final dos tempos, vai abrir um portal que ligará o Cariri  para a dimensão do divino.


A estátua do Padre Cícero encontra-se no topo da Colina. Muitos romeiros percorrem a Trilha do Santo Sepulcro. A pé eles percorrem às 14 estações trajeto marcado por frases e conselhos ambientais do Padre Cícero, que já alertava naquela época para os muitos desequilíbrios ambientais e impactos da agressão humana na natureza.


Padre Cicero descreveu os preceitos ecológicos:

1) Não derrube o mato, nem mesmo um só pé de pau;
2) Não toque fogo no roçado nem na caatinga;
3) Não cace mais e deixe os bichos viverem;
4) Não crie o Boi e nem o bode solto; faça cercados e deixe o pasto descansar para se refazer;
5) Faça uma cisterna no oitão de sua casa para guardar água de chuva;
6) Não plante em serra a cima, nem faça roçado em ladeira que seja muito em pé; deixe o mato protegendo a terra para que a água não a arraste e não se perca sua riqueza;
7) Represe os riachos de 100 em 100 metros, ainda que seja com pedra solta;
8) Plante cada dia pelo menos um pé de algaroba, de caju, de sabiá ou outra árvore qualquer, ate que o sertão todo seja uma mata só;
9) Aprenda tirar proveito das plantas da caatinga a maniçoba, a favela e a jurema; elas podem ajudar a conviver com a seca;
10) Se o sertanejo obedecer a estes preceitos a seca vai aos poucos se acabando o gado melhorando e o povo terá sempre o que comer, mas se não obedecer, dentro de pouco tempo o sertão todo vai virar um deserto só.

Rezemos com Fé! . Os sorrisos são a alegria da alma.
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MINISTRA DA CULTURA GANHA LIVRO LUIZ GONZAGA 110 ANOS DO NASCIMENTO E É CONVIDADA PARA VISITAR EXU

A trajetória épica de um dos maiores ícones da cultura brasileira ganhou ainda mais forma com o lançamento do livro Luiz Gonzaga: 110 anos do nascimento, do autor paraibano Paulo Vanderley. O livro chegou até as mãos do atual presidente Luiz Inácio Lula da Silva e na última quinta-feira (13) também da Ministra da Cultura Margareth Menezes.

"Voltando de Brasília com o coração carregado de boas memórias e o peito repleto de esperança. Fomos recebidos pela Ministra da Cultura, Margareth Menezes, na sede do ministério da cultura, acompanhado por Fabiano Piúba, Secretário de Formação Cultural, Livro e Leitura do Minc. Foi um momento emocionante e significativo, pois podemos apresentar pessoalmente, junto com o diretor da Editora Viu Cine, Ulisses Brandão, nosso livro:  "Luiz Gonzaga: 110 anos do Nascimento", escreveu Paulo Vanderley em suas redes sociais.

De acordo com Paulo Vanderley, o livro é escrito em primeira pessoa, com o próprio Rei do Baião contando sua história, a partir de uma intensa pesquisa em acervos de entrevistas. O projeto também está em formato de áudio, narrado pelo próprio biografado a partir desse material. 

"Dessa forma, o público consegue ter acesso ao conteúdo de parceiros musicais e os herdeiros de Seu Luiz Gonzaga no forró em diversas plataformas".

Paulo Vanderley é pesquisador, criador e mantenedor do mais completo site de Luiz Gonzaga no Brasil www.luizluagonzaga.com.br

De acordo com Paulo, durante o encontro, ele teve a oportunidade de compartilhar com a Ministra Margareth Menezes a importância de preservar e valorizar nossa rica cultura popular, representada brilhantemente por artistas como Luiz Gonzaga e muitos outros que continuam esse legado no Nordeste. 

"A propósito, convidei a ministra para conhecer a cidade de Exu, berço do Rei do Baião e fonte inspiradora  de suas criações. Viva Seu Luiz Gonzaga", finalizou Paulo Vanderley.

Exu é a terra onde nasceu Luiz Gonzaga e a mulher revolucionária Barbara de Alencar.

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ACERCO DO RÁDIO É UM DOS PRINCIPAIS DESTAQUES NA EXPOCRATO 2023

Há 100 anos, o rádio como conhecemos hoje tinha as primeiras ondas sonoras transmitidas no Brasil, e Roquette Pinto, nome importante para a radiodifusão brasileira, previa o sucesso deste meio de comunicação. Porém, a ação de comunicar a partir do som nasceu em solo brasileiro ainda em 1899, com o inventor do rádio, o Padre Roberto Landell de Moura.

Um pedaço desta paixão pelo Rádio pode ser admirado no Festival Expocrato 2023 que teve início no domingo (9) e segue até o dia 16 de julho no Crato, município do Cariri cearense. Trata-se da Exposição, acervo pessoal,  do radialista e Jornalista Antonio Vicelmo proporcionando aos visitantes do evento uma "visão dos aparelhos radiofônicos".

Na exposição é possível encontrar Rádios da década de 40 e 50 e lógico os mais modernos, sintonia em FM. Encontramos o ABC A Voz de Ouro, Transglobe, Semp,  Caravelle, Motoradio, Philco 8 faixas.

O jornalista, radialista e escritor, Antônio Vicelmo do Nascimento, ganhou recentemente a Medalha do MéritoBárbara de Alencar, a mais alta honraria concedida pelo poder público municipal cratense, às pessoas que prestaram relevantes serviços ao Município.

Com mais de cinco décadas de atuação na imprensa, Vicelmo é também advogado e poeta, sendo um dos grandes divulgadores da cultura brasileira, cearense e nordestina, destacando de forma relevante o Município do Crato, através de sua atuação como comunicador.

Por mais de três décadas trabalhou como repórter do Jornal Diário do Nordeste, além de ter atuado na TV Verdes Mares, também do Sistema, tendo sido correspondente através da sucursal do jornal, instalada na rua Tristão Gonçalves, em Crato. 

Ele inspirou a criação do caderno Regional do DN, pela ampla valorização da cultura regional e das riquezas do Cariri. Recentemente publicou a sua biografia, com o título "E Era Só… 50 anos de jornalismo",relatando a sua trajetória profissional.

Vicelmo é também um dos jornalistas que durante todos os anos de atuação em sua trajetória profissional, deu voz aos movimentos sociais da região, além dos grupos de tradição cultural, expandido a divulgação desses grupos.

Filho de Vicente Anselmo do Nascimento e Maria Do Carmo Simplício, Antônio Vicelmo do Nascimento nasceu em 10 de janeiro de 1942, em Brejo Santo, na região do cariri cearense. 

O jornalista e radialista e é casado com a bióloga Marisa Maria Rolim do Nascimento, com quem teve quatro filhos: Paulo Ernesto Arrais do Nascimento, João Ricardo Arrais, Marcos Eduardo Arrais e Pedro Henrique Arraes, falecido. Iniciou sua vida profissional como radialista na Rádio Araripe do Crato. Trabalhou na Ceará Rádio Clube, rádio Verdes Mares, TV Ceará e TV Verdes Mares. Foi editor do matutino Pré-nove e um dos fundadores do jornal Diário do Nordeste, o qual participou da cobertura de entrega dos documentos solicitando a reabilitação do Padre Cícero, no 

Atualmente trabalha na Rádio SomZoom Sat 

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SEVERINA BRANCA: O SILÊNCIO DA NOITE É QUE TEM SIDO TESTEMUNHA DAS MINHAS AMARGURAS

Com chão de poesia e terra batida sobre versos e tragos líricos, uma região nos rincões do sertão entre Pernambuco e Paraíba exala sentimento rimado. “Diz a lenda que quem bebe da água do Rio Pajeú vira poeta”, dizem. É a onipresença da poesia nas cidades de Ouro Velho e Prata, na Paraíba, e em São José do Egito, em Pernambuco, que mostra o documentário O Silêncio da Noite É que Tem Sido Testemunha das Minhas Amarguras, de Petrôneo Lorena.

Em tempos de tantas tragédias, um filme como este chega a ser um bálsamo para os corações machucados ou endurecidos pelas incontáveis tragédias que o país vem passando nos últimos tempos. Afinal, não é todo dia que se tem notícia de uma cidade onde a vida exala poesia popular. E isso não é apenas modo de falar: nas ruas, feiras, casas, nos mercados e em cada bar da região, o sentimento brota em forma de verso falado ou cantado.

“Aqui é o eixo, aqui é o terreno e quando você nasce numa aldeia, você vive, voa e espaceia, mas sempre dá retorno à sua aldeia. Aqui, o Pajeú, foi um foco de poesia, é chão de poesia. As plantas aqui é [sic] poeta, até a terra tem o cheiro da poesia e aqui é um micróbio pesado. Aí não tem como se desgarrar. Esse nome não pode ser perdido. São José do Egito é valoroso”, declara o poeta João Badalo em uma das muitas mesas de bar que servem de cenário para o filme.

O longo verso que dá nome ao filme faz alusão a uma das figuras centrais da cidade de São José do Egito: Severina Branca, a “Eleonor Rigby do Nordeste”, foi quem deu o mote ao poema de Didi Patriota. Musa e prostituta, poetisa e boêmia, Severina encantava os poetas da região e e era tema frequente dos versos falados e cantados por lá. “O título refere-se também à dor e à alegria de ser poeta; da cumplicidade da madrugada na criação desses versos num sertão conservador e da utilidade social que a poesia traz a essas pessoas”, declara o diretor Petrônio Lorena.

Hoje uma senhora com o corpo marcado pelas agruras da vida, Severina guarda na memória cada estrofe feita pelos homens que marcaram sua existência. E, mesmo durona e debochada, se emociona ao ouvir os versos de Patriota:

“Quando moça fui muito desejada

Das mulheres julguei a mais feliz

Mas o tempo cruel, velho juiz

Sentencia qualquer sonho de fada

A beleza foi sendo apagada

Cada um foi falso às suas juras

E eu peço a Deus lá nas alturas

Que me mostre na vida algum sentido

Que o silêncio da noite é quem tem sido

Testemunha das minhas amarguras”

Tão emblemática para a poesia daquelas bandas, Severina Branca é descrita – com imensa ternura poética em uma locução em off – como uma mulher à frente de seu tempo: “Severina Branca é uma figura gêmea, clonada com Eleanor Rigby. Enquanto Eleonor foi nascer em Liverpool, perto de John Lennon, Severina Branca nasceu em São José do Egito e teve o mesmo dinâmico modo de ser, como uma rapariga maravilhosamente liberta, linda, uma mulher autêntica, totalmente fora de preconceitos. Todos os prefeitos novos daquela terra do Pajeú passaram suas inocências pro coração de Severina Branca. É das que levam cachorro cheio de rabugem, arrastando e tomando cana pelos bares de todos os cantos. Eu sei que Severina fez um mote: ‘O Silêncio da noite é que tem sido testemunha das minhas amarguras’.”

Muito além de “apenas” musa, Severina também é autora de muitos versos, como o que relembra quando foi ignorada por um antigo grande amor. Ao declamar as linhas abaixo em um bar cheio de poetas, toma uma dose de cachaça e exclama saudosa: “Eita, nossa vida de prazer!”

“Pedi esmola a Abraãozinho

Este não me deu ouvido

Quem outrora me adorava

Não ouve mais meu gemido

Passa por mim torce a cara

Fingindo desconhecido”

Não é à toa que o ato de memorizar é chamado de “saber de coeur”, do francês, saber com o coração. É exatamente isso que os moradores de São José do Egito fazem: quem não faz verso, conhece de coeur as rimas dos grandes poetas e glosadores locais e declama nos bares, nas casas, nas festas, em todo e qualquer lugar. Tudo na região é motivo para dizer poesia, como afirma o jovem Antônio Marinho: “Nas rodas de conversa de São José sempre sai uma história de repente. Você vai engraxar o sapato aqui em São José e o engraxate lhe diz uma poesia. Aí você diz uma coisa pra brincar com ele e ele diz ‘Oxente, tá feito a poesia de não sei de quem’ e aí conta uma história e diz um verso. Se fala de tudo também, de futebol, de putaria, mas a poesia está sempre presente, é impressionante”.

Os amores, desamores e as amarguras da vida na região tem virado versos há várias gerações. Debochadas ou rebuscadas, magoadas ou matreiras, felizes ou deprimidas, as rimas dos poetas e poetizas daqueles rincões vem se transformando com o passar do tempo, mas a tradição da poesia oral se mantém acesa e, mesmo renovada, continua reverenciando os antigos trovadores.

O Silêncio da Noite É que Tem Sido Testemunha das Minhas Amarguras é o segundo longa-metragem de Petrônio e foi finalista entre os dez melhores filmes da 40ª Mostra Internacional de Cinema de São Paulo, em 2016. É uma ode ao sentimento genuíno, à riqueza da cultura popular, mas, acima de tudo, uma celebração da cultura e do povo nordestino. De tão leve, seus 78 minutos voam como a pomba símbolo do hino sertanejo, Asa Branca, composta pela dupla Luiz Gonzaga e Humberto Teixeira.

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MEUS AVOS MARIA E SEVERINO, RITA E ANTONIO

"Nos últimos anos, a Avó estava se dando muito mal com o próprio corpo. Seu corpo de Ararinha cansada negava-se a segui-la.

- Ainda bem que a mente viaja sem passagem - dizia.

Eu estava longe...eu tinha viajado!

A Avó sentia que tinha chegado a hora de morrer. Antes de morrer, quis visitar a minha casa com corpo e tudo. Chegou de avião. Viajou entre as nuvens, entre as ondas, convencida que estava indo de barco; e quando o avião atravessou uma tempestade, achou que estava numa carruagem, aos pulos, sobre a estrada de pedras.

Ficou em casa um mês. No meio da noite despertava e queria jogar xadrez ou brigava com meu avô, que tinha morrido há quarenta anos...

No final, disse: - Agora já posso morrer. E regressou. Visitou a família toda, casa por casa, parente por parente, para que todos vissem que tinha regressado muito bem e que a viagem não tinha culpa. E então, uma semana depois de ter chegado, deitou-se e morreu...

Ás vezes, a Avó vem me Ver nos sonhos. Eu caminho na beira de um Rio e ela é peixe que me acompanha deslizando suave, suave, pelas águas".

Nós tínhamos a intimidade de parentes
de amigos noturnos
De fim de madrugada.
Nós éramos dois versos
Dividindo em duas pátrias:
O pajeú e o pampa,
E dentro
Da tristeza que me espanta
Pela chama da morte que arde,
Se faz sombra teu nome
Na cruz que ilumina a tarde.

Fonte: O Livro dos Abraços-Eduardo Galeano.

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O SILÊNCIO DA NOITE É QUE TEM SIDO TESTEMUNHA DAS MINHAS AMARGURAS

“Tá tudo bem, sim, eu não entendo muito dessas coisas não, mas por mim tá tudo bom”, dizia Severina Branca por telefone à Continente no final da noite de uma sexta, pouco antes de ela e o diretor Petrônio Lorena acompanharem a exibição de O silêncio da noite é que tem sido testemunha das minhas amarguras em São José do Egito. Antes de estrear no Recife, onde está em cartaz no Cinema do Museu, em Casa Forte, o documentário circulou pelo interior de Pernambuco: Arcoverde, Belo Jardim, Triunfo, a Serra Talhada natural do cineasta e Caruaru.

Severina é musa, estrela, protagonista e uma das poetas retratadas por Petrônio. A frase extensa que dá título a este que é o segundo longa dele, aliás, veio dela. “E tem a ver com aquele momento de contemplação da madrugada, quando a cantoria já terminou e os poetas, indo para casa, começam a pensar naqueles versos e em como eles fazem sentido”, conta o diretor. O silêncio da noite é que tem sido testemunha das minhas amarguras deve ser visto por todos aqueles que adoram poesia e cantoria e, também, por quem se interessa por narrativas documentais que fogem dos esquemas convencionais.

“A linha cronológica do filme é como se fosse um único sábado: começa com a feira e termina de madrugada”, explica Petrônio, que começou a viajar pelos sertões da Paraíba e de Pernambuco ainda em 2010. Foram sete viagens ao todo, as primeiras delas “sem grana nenhuma” e tampouco sem equipamento, pois o diretor queria pegar intimidade “e confiança” com aquelas figuras que viria a retratar. Jorge Filó, Bia e Antônio Marinho (filha e neto de Lourival Batista, o Louro do Pajeú), Graça Nascimento e Rildo de Deus, entre outros, são registrados em instantes preciosos e numa linguagem ora rebelde, ora transcendental. Um filme de Petrônio, afinal, não poderia ter uma composição imagética banal.

E tudo isso tem a ver, também, com a matéria principal sobre a qual ele se debruça: a criação. De onde surgem os versos, os motes, as glosas? De onde vem a chama que inspira os poetas e cantadores? Entre um gole e outro de cerveja, entre uma visita e outra a bares ou cabarés, entre festividades e conversas na porta de casa, O silêncio da noite… descortina essa vida de quem se encarrega de repassar arte, conhecimentos e cultura pela oralidade. E respeita o tempo e o espaço daquelas pessoas retratadas – aliás, forja uma nova relação de tempo-espaço, um tempo dilatado, como se as horas demorassem a passar enquanto poetas declamam suas rimas.

Distribuído pela Inquieta Cinema, o documentário foi exibido pela primeira na 40ª Mostra Internacional de Cinema de São Paulo, ainda em outubro de 2016. Questões relativas a orçamento protelaram a estreia, só ocorrida agora nos idos de março. “Mas sabia que acho até bom esse tempo todo?”, revela Petrônio Lorena, “porque o filme amadureceu e criou uma expectativa em todas as pessoas que nele aparecem, uma ansiedade mesmo, que acho até legal”. O silêncio da noite é que tem sido testemunha das minhas amarguras é contra a pressa que rege os tempos atuais, é contra as necessidades de rótulos e contra as normas que decretam que o Sertão e tudo que dele deriva estão mortos. Se esse não for um motivo atraente para a ida ao cinema, que o sejam os versos de Severina que denominam o filme – afinal, nesta longa noite que tem anestesiado o Brasil desde 2016, é o silêncio quem tem sido testemunha das nossas amarguras.

LUCIANA VERAS é repórter especial da Continente e crítica de cinema.

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MUDANÇAS CLIMÁTICAS PODEM CAUSAR PERDA DE VEGETAÇÃO EM 99% DA CAATINGA EM ATÉ 2060, ALERTA ESTUDO

As mudanças nos padrões de chuvas e temperatura podem causar a perda de espécies vegetais em 99% do território da Caatinga até 2060, aponta um estudo da Unicamp. A projeção revela ainda que as áreas mais afetadas serão as chapadas Diamantina e do Araripe, além de parte do Planalto da Borborema.

O levantamento foi realizado a partir de um banco de dados com mais de 400 mil registros relacionados à ocorrência de aproximadamente 3 mil espécies. Com a ajuda de métodos estatísticos e algoritmos de inteligência artificicial, os pesquisadores identificaram como cada planta respondia às variações características do clima.

Primeiro autor da pesquisa, o professor Mário Moura, do Instituto de Biologia, explica que o mapeamento das espécies considerou dois tipos de vegetação: a arbórea, que geralmente consiste em árvores de grande porte; e a não arbórea, que inclui cactos, gramas e capins, por exemplo.

"Nós percebemos que, no cenário otimista, 50 espécies de plantas poderiam ser extintas na Caatinga, e no cenário pessimista esse número chegaria a 250. Então 99% do território vai ter perda de espécies, especialmente a região Sul do bioma e a Noroeste, que são pontos turísticos muitas vezes", afirma o pesquisador.

Após a junção das informações sobre a ocorrência de espécies e variações do clima, o próximo passo foi cruzar os dados com os cenários de mudanças globais disponibilizados pelo Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas (IPCC, na sigla em inglês).

"Uma vez que identificamos essa relação entre ocorrência da espécie e clima, podemos pegar os mapas de clima do futuro e projetar essa mesma relação. [...] No final das contas, fazendo todas essas combinações, foram quase 1,5 milhão de mapas gerados", detalha Moura.

Os mapas revelaram, ainda, que 40% das comunidades de espécies vegetais da Caatinga devem passar por um processo de simplificação, no qual espécies raras e exclusivas a uma região são substituídas por plantas comuns, tornando o bioma menos variado.

"É como se você pegasse a biodiversidade, colocasse num liquidificador e batesse. Isso reduz um pouco a eficiência de todos os serviços ecossistêmicos, ou a própria resiliência que essa biodiversidade pode ter aos impactos do clima", diz.

Presente exclusivamente no Brasil, a Caatinga abrange 10% do território nacional, ainda que aproximadamente um terço da extensão do bioma tenha sido convertida em áreas agrícolas, e abriga cerca de 30 milhões de pessoas, segundo o pesquisador.

A perda de espécies vegetais afeta diretamente o ecossistema, prejudicando o processo de fotossíntese, aumentando a concentração de gás carbônico na atmosfera e acentuando os efeitos das mudanças climáticas.

"Quando a gente fala que tem uma floresta de pé, tem carbono no tronco, nas raízes e nas folhas da floresta. Quando tem desmatamento, você perde aquela vegetação que estava fazendo fotossíntese, então o sequestro de carbono que aquela vegetação fazia, você deixou de ter", explica Moura.

Para o pesquisador, os impactos climáticos não podem ser revertidos, apenas atenuados. Para isso, a esperança é de que estudos como esse possam orientar as esferas pública e privada em direção a políticas de preservação ambiental.

"É a última década que a humanidade tem para tentar frear isso. É como se você tivesse uma bola de neve para descer na montanha: vai chegar um ponto ali em que você não consegue segurar mais essa bola de neve. Ela vai embora e você não consegue frear", analisa. (g1 Campinas)

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