Dominguinhos: deixou mais ricos os céus e a terra e mais emotivamente misteriosa a razão de haver estrelas e gente

Dia 12 fevereiro: Dominguinhos completaria 75 anos.

Dominguinhos encantou o Brasil com sua sanfona e voz, simplicidade e humildade.  Dominguinhos tornou-se um cantador que melhor soube interpretar a alma brasileira e vive na boca do povo, no puxado da sanfona em todos os recantos desse Brasil.

Garanhuns agreste de Pernambuco é o lugar onde nasceu Dominguinhos e a cidade através da Prefeitura realiza o Festival Viva Dominguinhos, este ano em sua III Edição.

O evento cria a oportunidade para discutir a Política Cultural no mundo globalizado e mais torna Garanhuns uma vitrine de atração de desenvolvimento econômico e social.

Garanhuns nesse sentido consolida um calendário que já é um dos principais acontecimentos do Nordeste.  Garanhuns firma com o Festival Viva Dominguinhos o incentivo e valorização da cultura e arte, um festival ancorado na alma e no profissionalismo do filho mais ilustre da música brasileira.

Garanhuns ao valorizar a arte, vida e obra de Dominguinhos abastece todo o Brasil, Estado, através da impressionante riqueza de ritmos, do cordel aos cantadores de viola, do aboio ao frevo, do armorial ao maracatu, do baião ao xote e xaxado,  as múltiplas variações da música nordestina/brasileira presentes na sanfona, triangulo e zabumba, “uma autêntica orquestra”, na definição de Luiz Gonzaga.

O professor paraibano, radicado no Rio de Janeiro, doutor em ciência da literatura Aderaldo Luciano, sempre me lembrou que Luiz Gonzaga foi pedra angular, referência -mor do forró, mas o Rei do Baião, não trilhava sozinho. Havia por trás de si, uma constelação de compositores, músicos, além de profícuos conhecedores do seu trabalho, amigos talhados de sol, nascidos do barro vermelho, com almas tatuadas por xique-xiques e mandacarus.

E por isto Garanhuns é o local apropriado para ser o palco capaz de reunir milhares de admiradores, com sede e fome de ouvir, cantar, silenciar, transformar e aplaudir em noites e nuances do céu estrelado sanfonado do mestre Dominguinhos, o discípulo que inovou a arte do mestre Luiz Gonzaga.

Garanhuns vai proporcionar no próximo mês de abril com o Festival Viva Dominguinhos a oportunidade de conhecermos e ampliar o debate sobre compositores, músicos, artistas que sabem divisar o Cruzeiro do Sul do Sete Estrelo e muito além disso discutir e como lidar com a máquina capitalista avassaladora dominante hoje da “indústria musical”.

Dominguinhos Vive. Garanhuns é agora um pedaço de terra de todos nós brasileiros. Dominguinhos, qual Luiz Gonzaga tornou-se uma estrela luminosa a brilhar. Como disse Fernando Pessoa, “quem, morrendo, deixa escrito um belo verso, deixou mais ricos os céus e a terra, e mais emotivamente misteriosa a razão de haver estrelas e gente”.

Viva Garanhuns. Viva o Nordeste. Viva Petrucio Amorim, Xico Bizerra, Três do Nordeste, Jorge de Altinho, Elba Ramalho, Anastácia, Paulo Vanderley, Luiz Ceará,  Quinteto Violado, Flávio Leandro, Cezinha, Flávio José, Viva o Fole de Oito Baixos, Targino Gondim... Viva o Festival Dominguinhos.
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Gibão e Chapeu de couro do Mestre Aprigio, de Ouricuri destaque na Vila Isabel

A Escola de Samba Vila Isabel desfilou na Sapucaí do Rio de Janeiro contando a vida de Miguel Arraes, político cearense, nascido no Crato, três vezes governador de Pernambuco. A escola retomou uma tradição de enredos políticos, com forte cunho social.

A comissão de frente de Jaime Arôxa trouxe um cortejo fúnebre nordestino, com corpos carregados em redes. "Não é a morte física.
É a morte pela falta da cultura, da educação. E combina com o carnaval, porque a vida retoma com a chegada da cultura", explicou Arôxa.

Para homenagear o centenário de Miguel Arraes, as mazelas sociais que ele enfrentou foram lembradas na avenida: a seca, as moradias sobre palafitas, as dificuldades dos cortadores de cana, o analfabetismo. Esses temas vieram ao lado de ícones culturais de Pernambuco, como o frevo e o bloco carnavalesco Galo da Madrugada, que mereceu um enorme carro ao fim do desfile.
 

O cantor Martinho da Vila encarnava um cangaceiro. O sambista se emocionou do começo ao fim da passagem da escola, da qual é presidente de honra e símbolo maior. Detalhe: o chapeu de couro e o gibão é confecção do artesão Mestre Aprigio.

Mestre Aprigio está em plena atividade em Ouricuri. Mestre Aprigio nasceu em Exu no dia 25 de maio de 1941. “Mestre Aprigio”, José Aprigio Lopes confecciona couro e sem nenhuma pretensão ou arrogância conta que conhece bem o repertório de Luiz Gonzaga. Ele confeccionou a partir de 1955 os chapéus de couro usados por Luiz Gonzaga.

 “Meus chapéus serviram de coroa para os dois grandes reis que conheci, veja só que privilégio, Luiz Gonzaga e Dominguinhos”, diz o Mestre Aprigio.

Nas músicas cantadas Luiz Gonzaga uma das marcas é a exaltação ao chapéu de couro e gibão. Uma das homenagens mais bonitas é  "Aquela Sanfona Branca, de Benito de Paula que foi dedicado ao Rei do Baião:

“Aquela sanfona branca
Aquele chapéu de couro
É quem meu povo proclama
Luiz Gonzaga é de ouro
Aquele tom nordestino
A voz sai do coração
É ele o rei do baião, é Luiz
É cantador do sertão
É filho de Januário
É quem canta o Juazeiro
É festa, é povo, Luiz alegria
Luiz Gonzaga é poesia”...
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Deus era um tocador de pife e foi soprando nele, num pife feito de taboca que deu vida ao homem

Minhas mais remotas lembranças de uma banda de pífanos levam-me às margens do Rio São Francisco, em Propriá, no Sergipe. Ali onde o calor entra pela boca do rio e desce sobre os viventes, devagar e sempre.

O São Francisco foi o primeiro rio que vi de verdade. Nessa primeira vez, passei sobre ele por volta das 4 da manhã. Viajava num velho ônibus da São Geraldo que vinha de Natal, no Rio Grande do Norte, passava em Campina Grande, descia por Caruaru, se mandava para dentro das Alagoas, parava em São Miguel dos Campos e caminhava para Aracaju. Antes de Aracaju, deixou-me na entrada de Propriá. Não havia ninguém me esperando. Com minha mochila, caminhei a pé por mais ou menos dois quilômetros até à Rua Japaratuba, à procura da Fraternidade Marista. Em lá chegando, sentei praça sob o comando do Irmão Salatiel.

Pois bem, desse tempo passado no Sergipe conheci todo o sertão e as cidades para baixo de Propriá. Lembro bem de Brejo Grande, onde me batizei nas curvas do rio, e de Neópolis, onde atravessei para Penedo, numa balsa barulhenta com medo de ser arrastado pelas águas.

Nessas minhas viagens, tinha eu 17 anos, escutei uma banda de pífano, banda cabaçal, zabumba, como queiram. A Briga do Cachorro Com a Onça e O Besouro Mangagá foram minha primeira aula. E ainda não ouvira falar da Banda de Pífanos de Caruaru. Aquilo arrebatou-me de tal forma que fiquei como metido em um transe. O casamento dos pífanos, um na melodia, outro numa espécie de contracanto, a zabumba marcando num compasso diferente de tudo que eu ouvira, uma caixa malassombrada marcando um xaxeado e um par de pratos como um enxame de chuveirinhos juninos.

Nunca mais parei de ouvir. Depois encontrei com João do Pife, em Caruaru e, com seus discos debaixo do braço, fui fazer uma comparação com Zé da Flauta, nos discos de Alceu Valença. Olhem bem, desculpem-me vocês aí da Bossa Nova, mas o pife é nosso. O pife é o sopro da vida, é o bicho escondido rosnando enfezado.

Tenho certeza, e vou colocar isso em um poema, viu Beto Brito, tenho certeza que Deus era um tocador de pife e foi soprando nele, num pife feito de taboca, que deu vida ao Homem com seu sopro fiel. Foi mesmo. E vou mais além em meu sonho de jeca: a trilha sonora do Universo, viu Stephen Hawking, é da Banda de Pífanos de Caruaru: é a Briga do Cachorro Com A Onça!

Fonte: Texto professor doutor em Ciencia da Literatura Aderaldo Luciano-facebook
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Aderaldo Luciano: os 10 livros livres que li

"Por volta do ano de 1972, com 8 anos, lembro-me bem que se iniciaria aí minha sina de leitor. Li avidamente durante 10 anos, sem horário para parar, nem para iniciar. Fiquei conhecido em minha cidade como o menino que não dormia e que, todos os dias, à meia-noite, fazia uma ronda pelas ruas mal assombradas. Acordava tarde, por ter adormecido mais tarde ainda.

Diziam e muitos ainda dizem que eu não gostava de trabalhar. E é verdade: eu gostava de ler. Passei à cidade a figura de um “cabra” preguiçoso. E ninguém nunca me elogiou por conta dos livros que eu lia".


Este pedaço de história é do hoje professor Aderaldo Luciano, Pós-doutorando. Fatos que merecem ser transformados em filme. Estou preparando o roteiro:

Em 1972 Aderaldo era um ajudante de feira. Um daqueles meninos que ficava por ali, aos sábados, com um balaio esperando que alguma senhora passasse e me chamasse para carregar a sua feira. Era o dia todo com balaios pesadíssimos e algum dinheiro no final do dia. Esse dinheiro servia-me para três coisas: ir ao cinema todos os dias do final de semana; fazer um lanche depois do cinema na lanchonete de Zé Nunes (onde tomei minha primeira coca-cola e detestei); e comprar gibis e revistas na banca de Seu Carneiro. Um dia, nesse mesmo ano, essa constância foi quebrada pela presença, na feira, de um homem cantando e vendendo folhetos de cordel.

Desse homem comprei o primeiro cordel: Vicente, O Rei dos Ladrões, de Manoel D’Almeida Filho. E esse foi o primeiro livro que determinou muita coisa em minha vida. A ele sou grato por tornar-me um estudioso dessa arte literária. Digo mesmo sem falsa modéstia: sou um estudioso. Não sou um curioso ou alguém que se autodetermina pesquisador. Carreguei para dentro dos meus estudos de graduação, de mestrado, de doutorado e de pós-doutorado e expandi para a vida meu deslumbramento com o cordel brasileiro, graças a esse primeiro encontro. Para mim, Vicente, O Rei dos Ladrões é o livro mais importante de minha existência como leitor.

Esse encontro se deu na infância. Ainda nessa época descobri a biblioteca do Centro Social Pio XII, pertencente à Paróquia, sob a direção do Padre Ruy. Foi meu paraíso. Todas as noites da semana, a partir das 19 horas, eu estava lá. Naquelas mesas enormes li pela primeira vez: 20 Mil Léguas Submarinas, de Júlio Verne. A aventura do Capitão Nemo, o Nautilus, Ned Land e todas as maravilhas de um mar que ficava longe de onde eu morava, mas que me seduzia de maneira estranha abriram-me a escotilha do sonho e da esperança. Li a obra completa de Júlio Verne, mas a chave mestra foi 20 Mil Léguas e sua continuação A Ilha Misteriosa. Foi o segundo livro mais importante de minha vida.

Naquela mesma biblioteca descobri a coleção completa das obras de Jorge Amado e Jubiabá marcou-me tão abruptamente que não consegui parar de ler até terminar. Pedi à moça que tomava conta da biblioteca que me deixasse levar aquele livro para casa. E secretamente ela me concedeu, contanto que eu o trouxesse de volta no outro dia para que ninguém notasse a falta do exemplar na estante. Foi a noite mais gostosa de minha vida. Ainda hoje quando vou a Salvador procuro os lugares citados pelo velho Jorge: a ladeira do Taboão, o elevador, a Barra. Portanto, Jubiabá completava a Regência Trina de meus dias como leitor. Não preciso dizer que entrei no mundo de Jorge Amado e fiquei decepcionado quando, na Faculdade, notei que ninguém estudava a obra do bom baiano.

Mas ali, no meio das estantes amarrotadas de coisas sensacionais, passeando o olhar, descobri, com o dorso voltado para dentro, como se alguém o quisesse esconder, um antigo exemplar de Zé Limeira, Poeta do Absurdo, de Orlando Tejo. Minhas mãos tremiam sacudidas pela ansiedade. Segurei aquele livro como uma joia que fosse feita de maizena, não podia esfarelar, nem deformar-se. Sentei e li, do começo, do prefácio, cada capítulo, cada verso, cada título, cada pormenor. Causou-me tamanho impacto que, trinta e poucos anos depois eu publicaria algo inspirado nele: O Auto de Zé Limeira, que transformou-se em música, em canto jogral, em trilha de minissérie na Globo, em livro, dizem, cult.

Fui orientando minhas leituras para as noites, cada vez mais aprofundadas porque o dia ficava, metade para a escola, metade para brincar. Ganhei muitas vezes o prêmio de melhor aluno. Não, eu nunca fui um aluno estudioso, nunca estudei em casa, nunca fiz exercícios, resolvia tudo, sempre, nos minutos anteriores às aulas e muita coisa entrava mesmo durante elas. Eu gostava mesmo era de ler. Me divertia. Havia uma leitura básica e outras leituras mais amenas, gibis e revistas, fotonovelas e livros de bolso (da CEDIBRA ou da Monterrey), fossem de faroeste ou ficção ou espionagem. Quando migrei da biblioteca do Padre para a Biblioteca Municipal, descobri o livro esquisito de um certo Edgar A. Poe: Histórias Extraordinárias. O Barril de Amontilado, O Poço e o Pêndulo, A Queda da Casa de Usher e todo o universo noturno como eu.

Foi arrebatador. Todos os dias lembro de Poe.

Alinhados, na mesma estante de aço, estavam Poe e Balzac. Meu Deus!? Depois de Poe entrou-me A Comédia Humana. Agradeço todos os dias ao filho da mãe que não sabendo o que fazer com os livros, com a biblioteca, amontoou-a naquele prédio da Rua do Sertão. Livros velhos, poeirentos, cheios de ácaros e que eu descobri enfileirados. Estava o sistema, muito mais que literário, balzaquiano. Sonhei dias e noites e sóis e luas com Paris. Vasculhei cada centímetro daquela coleção da antiga Editora Globo, de Porto Alegre. Foi perdido por aí que, acho, encontrei o texto A Procura do Absoluto. 


Essa novela de Balzac trucidou-me. Mas o pior que poderia me acontecer é que na cidade não havia ninguém com quem eu pudesse trocar ideias a respeito. Solitariamente eu sofria por conta de minhas leituras, sem ter com quem falar de minhas inquietações. Foi foda. Virei o menino estranho, preguiçoso e que não dormia de noite.

Já avisei aos amigos, por diversas vezes, que a cidade onde nasci, por opção de minha mãe, chama-se Areia, na Paraíba do Norte. Na biblioteca, agora meu refúgio, ao lado de Poe e Balzac, não foi difícil chegar a Borges. Estava na mesma estante aquele estranho Ficções. Caralho, meus amigos, caralho, como diria Bukowiski, num acesso furioso. 

Que coisa mais louca para minha frágil cabeça adolescente, mas que magnetismo me suspendia do chão mortal. O Milagre Secreto, O Jardim de Veredas Que se Bifurcam, As Ruínas Circulares, O Fim: que plantação mais poderosa de cravos e de rosas. Foi Borges o responsável por tudo. E fui lendo. Por essa época conheci Sebá. Agora, eu tinha com quem conversar. O que ele descobria passava para mim, o que eu descobria passava para ele.

Caminhando não sei para onde, trocava passos vagarosos. Nesse mesmo período, e parece que esses livros que nos mudam ou nos completam, vão se sucedendo assim num mesmo tempo, um tempo conspirador, aguardavam meus olhos um exemplar da primeira edição do EU, de Augusto dos Anjos. Ainda com as páginas coladas. Parece que ninguém se deixara seduzir por aquele grosso e amarelado volume. Com uma régua fui rasgando as dobraduras e de dentro delas foram saltando os sonetos mais contundentes que pude ler em toda minha vida. A poesia e a biografia do poeta raquítico faziam mais um refém. 

Decorei vários poemas e, já com um violão a tiracolo e tendo conhecido a cachaça brejeira, aliados a uma represa que queria explodir, fui acrescentando adjetivos à minha existência areense. Agora eu era o louco. Eu já estava no ensino médio. Estava me preparando para o vestibular. E aconteceu uma ruptura. Uma oportunidade de mudar de cidade, sonho que sempre acalentei. No último ano resolvi, com 16 anos, que entraria na Fraternidade Marista, em Lagoa Seca, perto de Campina Grande, e faria a experiência que me ofertaria a possibilidade de ver o outro lado do mundo. 

Fui estudar no Colégio Diocesano Pio XI, na Presidente Vargas, perto do Cine Avenida, em Campina. Eu queria fazer Comunicação Social, mas foi Adoniran, professor de História, quem, durante uma aula, falou de História da Riqueza do Homem, de Leo Huberman. Eita, piula. Saía do mundo literário, da ficção, do cordel, das aventuras, da poesia, para a reflexão histórico-social e no final do ano, nem vestibular, nem Campina. Fui-me embora para Propriá, no Sergipe, viver a vida das comunidades eclesiais de base e a Teologia da Libertação.

O Irmão Salatiel, meu superior, era assinante do Círculo do Livro, todo mês entrava livro novo em nossa casa da Rua Japaratuba. Até que, naquele dia, eu peguei Não Verás País Nenhum, de Ignácio de Loyola Brandão. Esse livro fecha a lista daqueles que muito me influenciaram e que transformaram minha vida. Este em especial por conta de eu ter me sentido durante toda a minha existência como um homem marcado: um homem com um furo na mão, uma marca que, por mais que eu tente esconder, ela grita. 

A maldição que me persegue me faz ser irmão de muitos outros homens que, neste momento, estão tentando entender sua existência. Homens que se acham especiais, mas que precisam comprar pão para comer. Homens que amam a humanidade, mas que se sentem enojados com as merdas que ela produz. Homens cheios de esperança, mas que em algum momento têm coragem de se matar. Homens que não agridem uma borboleta, mas passam ao largo de um mendigo e podem até agredi-lo. Há uma marca em nós: a marca da letra, a marca da besta, a marca do sonho, a marca do zorro. São esses meus dez livros, livres.


Fonte: Aderaldo Luciano-Professor. Pos doutorando.
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Na Serra do Araripe Pernambuco Ceará saudade da Barraca Verifique e os atuas vendedores de frutas

Quem viaja do Exu, Pernambuco para o Crato, Juazeiro do Ceará, guarda sempre na lembrança, hoje apenas recordação da "Barraca Verifique", onde Luiz Gonzaga, tomava uma bicada/lapada de Catuaba. Neste caminho duas músicas tocam: Vou pro Crato e Barraca Verifique:
"Descendo aquela ladeira,
nunca mais vou esquecer
Pedaço de chão gostoso,
na barraca verifique catuaba vou beber
Se passo por lá, tenho que parar
Pra ver seu Zé, sua mão apertar Eita catuaba boa vou correndo to à toa,
quero no Crato chegar. 

Haja o que houver sei que chego lá. Nem que eu passe o dia inteiro
eu chego no Juazeiro
pra meu padrinho visitar.



O caminho/a estrada que liga Exu ao Crato  é a via das maravilhas. As paisagens agem e ardem em eco. Quais mãos trabalharam na confecção desse origami? A planície sem fim, cada casinha perdida ao lado de um cajueiro. Estradas de terra vicinais, plantações de abacaxis, um pedaço da mata atlântica. Barraquinhas de frutas e seus sitiantes. São os vendedores de frutas na beira da
estrada.

E lembrei que Cada poeta tenta exprimir as qualidades de um determinado fruto em sextilhas, para testar o poder de concisão do verso criando uma enciclopédia dos frutos do Brasil.

Eis alguns:
Jaca
A casca é dura e furante.
o bago, doce e macio.
O caroço tem segredos,
O talo parece um rio
represando visgo e seivas
como uma mulher no cio.

Sapoti, puro desejo
Perfumoso e sensual
Mais doce do que o mel
Uma geléia real
De muitos frutos comi
Garanto não tem igual


Com carne de sol, então,
Dá "sustança" e dá calor!
Você fica em condição
Pros embates do amor!
Outra delícia, trem bão,
É fazer, dele, o licor!

O Pequi dá lá no alto,
Já me disse o chapadeiro!
Colhido, vem pro asfalto,
Com seu gosto, com seu cheiro!
De ir buscá-lo, não falto,
Todo mês de fevereiro!

O seu pé, o pequizeiro
É uma árvore bonita!
Se a seca é um braseiro
Ele não seca e não frita!
Contando, meu companheiro,
A gente nem acredita!

Por isso, meus companheiros
Com alegria, venho aqui,
Conclamar os violeiros,
Cujo talento eu já vi:
Sejamos bons brasileiros
E vamos comer Pequi!
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Luiz Gonzaga e a sanfona escultura de curva da mulher amada

O arquiteto Oscar Niemeyer gostava de falar sobre sua paixão pelo trabalho e pelas obras que construiu pelo país.

Uma das definições mais extraordinárias do amor ao trabalho foi ele dizer que a maior atração era a curva livre e sensual. "A curva que encontro nas montanhas. No curso sinuoso dos sentidos, nas nuvens do céu. No corpo da mulher preferida. De curvas é feito todo o universo."

A partir deste conceito analiso o significado da Mulher no universo sempre apaixonante que encontramos nos versos cantados por Luiz Gonzaga.

Luiz Gonzaga acariciava a sanfona, como se deve tocar a mulher amada. Provocava prazer percorrendo o corpo imaginado sem pressa dos 8 aos 120 baixos, dedos leves em cada nota, acorde, acordes de tal forma que antes do fim da nota, a mulher preferida,  já se encontre em pleno êxtase...suspirando, querendo mais de tanto prazer.
 

Na música "Morena Cor de Canela constitui um roteiro da mulher bonita e sensual, enumerando suas qualidades e perigos, culminando num jogo plurissignificativo.

Vejamos: "Olha o jeito dela, morena cor de canela pode morrer de paixão quem olhar nos olhos dela...corpo esculturado, beleza que Deus Criou
Cabelos anelados, boca cor de jambo
ela vai envenenando qualquer homem que lhe ver
sua cintura bem fininha, afinadinha
vai descendo, enlarguecendo
nos quadris, que tentação
as suas pernas torneadas, tão bonitas
pois qualquer homem fica com ela no coração
sai da janela, caminha requebrando
a gente vai olhando, vai ficando na ilusão...
não faz assim comigo não...

É a pura valorização da mulher. Já em "Vem Morena", Luiz Gonzaga na composição de Zé Dantas dispensa comentários: 

"Vem, morena, pros meus braços
Vem, morena, vem dançar
Quero ver tu requebrando
Quero ver tu requebrar
Quero ver tu remexendo
No Resfulego” da sanfona
“Inté” que o sol raiar
Esse teu fungado quente
Bem no pé do meu pescoço
Arrepia o corpo da gente
Faz o “véio” ficar moço
E o coração de repente
Bota o sangue em “arvoroço”

Esse teu suor salgado
É gostoso e tem sabor
Pois o teu corpo suado
Com esse cheiro de “fulô”
Tem um gosto temperado
Dos tempero do amor
Vem, morena, pros meus braços"...
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Sanfona e Trio Elétrico: um Estado chamado Bahia

Este ano, entre os dias 22 a 24, a organização do Carnaval de Juazeiro valorizou mais uma vez os sanfoneiros. Flávio Baião, Silas França, acompanhou Bell Marques (sempre Chiclete com Banana) e Luiz Caldas contou a história da música brasileira, trio elétrico e carnaval.
 
O sanfoneiro, compositor e cantor, Targino Gondim puxou a sanfona, discípulo de Luiz Gonzaga cantou o mestre naquele que foi na minha opinião, a melhor apresentação do
evento.

Em tempos de tanta música ruim, onde a porcaria musical impera, foi uma riqueza ouvir Targino Gondim e sua sanfona. Cabe aqui citar que a identidade cultural no mundo globalizado é fator de atração turística. O forró, baião, xaxado sempre será um fator de desenvolvimento econômico e social.

Louvável a atitude da Prefeitura de Juazeiro-Bahia  ter na programação sanfoneiros. Meu incentivo para que todos os eventos isto seja repetido na busca de repensar as relações entre cultura e discurso oficial. A atitude foi um exercício da cidadania cultural.

Luiz Gonzaga, diga-se, poucos sabem,  na década de 40 e 50 derrubava todas as atitudes já "cristalizadas" pelo tempo e puxava sua sanfona em pleno carnaval. Em 1947 o maior sucesso do carnaval foi "Quer ir mais eu?", frevo regravado até os dias de hoje.

Também na sanfona de Luiz Gonzaga foram gravados para o carnaval "Bia no Frevo", Ao Mestre Capiba, Arrasta Frevo.

No carnaval da Bahia, décade de 80,  o Brasil e o mundo tomou conhecimento do primeiro forró trio eletrizado:  "Instrumento Bom", autoria de Morais Moreira na voz de Luiz Gonzaga,  gravado com Trio Eletrico de Armandinho, Dôdo e Osmar. O Brasil canta até hoje...

Portanto, Targino Gondim, Luiz Gonzaga e o trio eletrico podem e devem ser considerados arte, show espetacular e é necessário criar uma expectativa de reorganização da política cultural, mesmo com a descrença no aparelhamento público(o Estado ainda é necessário quando a serviço da coletividade).

Tenho dito: Viva o Nordeste. Viva o carnaval com sanfona!Viva o forró!

*Ney Vital-Jornalista, pesquisador. Apresentador do Programa Nas Asas da Asa Branca-Viva Luiz Gonzaga. Pos-Graduado em Ensino de Comunicação Social - Uneb--UFRN
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