A SANFONA DE DOMINGUINHOS E LUIZ GONZAGA

A sanfona é mesmo meu pulmão, meu coração, meu estômago, minhas vísceras. Quando ela se abre, é minha respiração que vai junto. Quando se fecha, é meu suspiro.

A sanfona sabe de todas as minhas saudades, revira todas as minhas lembranças, desce ao poço profundo do meu passado e traz-me milhões de presentes. É, a sanfona é a rainha do meu salão de miudezas.

A sanfona é a lâmpada a clarear meu terreiro, é o sol a festejar os meus dias. Quando chove, a sanfona é meu abrigo. À noite escura, é ela a lua escondida por trás da escuridão. Meus ouvidos são a passarela por onde ela desfila soberana. Minha pele sofre quando a escuta bem baixinho nos agudos suaves.

Meus olhos se fecham, enquanto meu peito vibra nas prolongadas notas graves. Me desculpe, Luz Deus, mas meus santos todos tocam sanfona, sem piedade. Tem dois santos no altar-mor de minha catedral: São Luiz Gonzaga do Nascimento e São Dominguinhos. Essa da foto pertence ao segundo, já que o primeiro é primeiro mesmo. (Texto Professor doutor Aderaldo Luciano)

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O SENHOR DE ESCRAVOS EM NÓS: O VINHO AMARGO DA HISTÓRIA PÁTRIA

Há um senhor de escravos habitando a subjetividade de muitos brasileiros. Há um desejo de escravização do outro, do considerado inferior, transmitido pela educação de gerações, no país que foi o último a abolir o vergonhoso comércio de carne humana, cujas elites intelectuais produziram uma visão idealizada e adocicada do martírio cotidiano de milhões de homens e mulheres pretos. 

Habita nosso inconsciente coletivo a fantasia senhorial do poder desabrido e sem peias sobre o corpo do outro, a vontade de servidão e de serviço sem limites daqueles considerados diferentes, fracos, subumanos. 

Uma boa parcela dos brasileiros que se consideram brancos e, por isso, superiores, acalentam sonhos, muitas vezes não explicitados, de ter a sua disposição um outro em quem possa descarregar suas frustrações, seus ressentimentos, suas raivas, seus ódios. Alguém de pele escura, de pele parda a sua disposição para descarregar as suas pulsões de morte, a sua agressividade, os seus desejos destrutivos.

Quando Gilberto Freyre, um dos intelectuais que edulcoraram a escravidão e que tinha por ela uma indisfarçável nostalgia, utiliza o par de categorias psicanalíticas sadismo e masoquismo para pensar as relações entre senhores e escravizados, ele acerta, por um lado, ao descrever o desejo sádico dos senhores e senhoras, que gozavam infligindo humilhação, dor e sofrimento públicos a seus escravizados e erra ao atribuir a eles o desejo masoquista, como se eles se submetessem a sevícia dos senhores e senhoras de forma voluntaria e disso retirassem prazer. 

DURVAL MUNIZ DE ALBUQUERQUE JR Professor da UFPE e UFRN. Autor do livro “A Invenção do Nordeste”. Análises históricas e questões regionais. Escreve às terças no Diário do Nordeste

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HORA DO PLANETA: NO BRASIL, MONUMENTOS E PRÉDIOS PÚBLICOS DEVEM APAGAR AS LUZES NESTE SÁBADO

Na noite de 25 de março, às 20h30, luzes serão apagadas em diversos pontos do país, para chamar a atenção da sociedade sobre a crise climática. O apagão faz parte da Hora do Planeta, evento promovido anualmente pela organização ambientalista não-governamental WWF.

A proposta é que indivíduos, grupos e empresas apaguem as luzes por 60 minutos, para pensar em como cuidar do planeta. Limpar a praia, plantar uma árvore, se engajar em movimentos comunitários ou simplesmente reunir os amigos no momento de desligar a energia elétrica são maneiras de aderir ao movimento.

Segundo a WWF, qualquer pessoa, em qualquer lugar, pode participar da mobilização. Apoiadores em mais de 190 países e territórios participam do evento, que acontece no Brasil desde 2009.

De acordo com Giselli Cavalcanti, analista de engajamento do WWF-Brasil, a Hora do Planeta tem mais de 400 eventos programados pelo país, tanto virtuais quanto presenciais. Este ano, a WWF-Brasil ofereceu um mapa de visibilidade dessas ações, que podem ser consultadas no site da instituição. “O objetivo é que, em um esforço global, a gente consiga fazer a nossa parte, mas também cobrar medidas urgentes dos governos e das lideranças para barrar a crise climática e reverter a queda da biodiversidade”, afirma Cavalcanti.

Tradicionais parceiros da WWF, os escoteiros têm diversas atividades programadas para a Hora do Planeta, tais como vigílias, debates e observação de estrelas. Bruno Souza, diretor do Grupo Escoteiro José de Anchieta (GEJA), em Brasília, explica que os escoteiros já trabalham sobre um conjunto de ações associadas aos objetivos de desenvolvimento sustentável da Organização das Nações Unidas (ONU) e que as atividades programadas para o dia 25 fazem parte dessas ações.

“O GEJA participa da Hora do Planeta desde que ela começou no Brasil, então todo ano a gente faz ações desse tipo e, principalmente, orienta os nossos jovens sobre a responsabilidade de cada um na questão da preservação do meio ambiente”, diz.

Para Giselli Cavalcanti, a participação dos escoteiros na Hora do Planeta tem um impacto significativo. “Essas crianças e esses jovens estão se engajando com a pauta ambiental, estão levando essa discussão para outros espaços também, seja nas escolas, nas comunidades, nas famílias”, explica. Cavalcanti destaca ainda o envolvimento crescente das empresas, que têm participado da mobilização com palestras, workshops e apoio a projetos de cuidado ambiental, além de reverem suas formas de atuação.

No Brasil, monumentos e prédios públicos em diversas cidades devem apagar suas luzes às 20h30 deste sábado, como forma de adesão ao movimento. Enquanto isso, na Mongólia, acontecerá um desfile de moda sustentável com estilistas locais, apresentando roupas recicladas e redesenhadas. Já o WWF-Letônia sediará seu tradicional concerto da Hora do Planeta para parceiros e apoiadores. Essas e outras ações fazem parte dos esforços da instituição "para que a década termine com mais natureza e biodiversidade do que quando começou", a fim de evitar danos irreversíveis ao planeta.

A bióloga Nurit Bensusan, especialista em biodiversidade e pesquisadora do Programa de Política e Direito do Instituto Socioambiental (ISA), questiona a efetividade dessas ações. Para ela, a Hora do Planeta seria mais um apaziguamento de consciência que uma proposta de transformação.

“Cada pessoa individualmente poderia fazer muito mais, se posicionando contra uma economia que despeja seus impactos socioambientais nos outros agentes da sociedade. Cada um de nós poderia contribuir para tornar essa economia inaceitável, mas a gente não faz isso”, destaca.

Bensusan citou o relatório lançado pelo Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas (IPCC) na última segunda-feira (20). O documento alerta que a temperatura média mundial subiu 1,1 grau Celsius acima dos níveis pré-industriais – uma consequência direta de mais de um século de queima de combustíveis fósseis, bem como do uso desordenado e insustentável de energia e do solo.


O relatório também aponta que os desastres naturais relacionados ao clima atingem sobretudo as pessoas econômica e socialmente mais vulneráveis. “É muito difícil a gente analisar a crise climática separada do colonialismo, do racismo, da discriminação, do preconceito e das desigualdades”, complementa.


De acordo com a bióloga, para transformar o cenário atual, apenas mudanças na rotina não são suficientes. Para ela, uma espécie de “fé’ na tecnologia nos faz crer que os danos socioambientais causados pelo clima são contornáveis, o que levaria a um adiamento de soluções efetivas. “O que funcionaria seria uma conscientização radical das pessoas”, defende. Já para Giselli Cavalcanti, a Hora do Planeta aumenta a conscientização e a mobilização dos diferentes setores da sociedade na causa ambiental, o que pode ser considerado um dos efeitos positivos da campanha.

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QUIOSQUE DA UMBUZADA SERÁ INAUGURADO NESTE SÁBADO (25)

As famílias agricultoras do distrito de Massaroca, em Juazeiro, vão contar com um espaço de comercialização dos produtos de 24 famílias que integram a Cooperativa Agropecuária Familiar de Massaroca e Região (Coofama).

O “Quiosque da Umbuzada” será inauguradono próximo sábado (25) e possibilitará à população local, visitantes e às pessoas que trafegam pela BR 407, uma diversidade de itens agroecológicos. “Os ovos, as galinhas caipiras, os doces e as geleias são alguns produtos que a gente vai colocar no quiosque. Vai ajudar na comercialização dos produtos, agregando valor”, destaca a secretária da Coofama, Ana Lúcia Silva.

“Pra mim que sou um produtor de ave de postura, vai ser mais um ponto de apoio. Nosso gargalo era o escoamento de nossos produtos e com esse quiosque vai ser muito bom, vou ter onde vender. Só tenho a agradecer, é mais uma conquista”, também celebra o cooperado Rogério Serafim.

A construção desse quiosque é resultado das ações de assessoria técnica desenvolvidas com as famílias agricultoras, o que evidencia a importância das políticas públicas de Ater para a melhoria da qualidade de vida no campo, principalmente no fomento de espaços que possibilitam e potencializam o escoamento do excedente da produção. “Era um sonho da Cooperativa ter um lugar para comercializar os nossos produtos dentro do distrito. E aí, quando chega a assessoria técnica do Irpaa, junto com o projeto Pró-Semiárido, através da CAR e o Fida, a gente vê esse sonho se realizando”, ressalta Ana Lúcia.

A programação festiva de inauguração começará às 7h com a realização da feira mensal de produtos agroecológicos no distrito e, ao longo da manhã, vai contar com a abertura do Quiosque e a degustação de alimentos, com destaque para a umbuzada. Também acontecerão apresentações culturais do músico Ildemar Voz e Violão e das bandas Xerim de Xiqueiro e Novo Swing.

Essas ações de assessoria técnica junto às famílias agricultoras, à Coofama e de fomento para a construção do espaço, são viabilizadas através do projeto Pró-Semiárido, que é executado pelo Irpaa. O projeto é uma realização do Governo do Estado da Bahia, através da Companhia de Desenvolvimento e Ação Regional (CAR), órgão da Secretaria de Desenvolvimento Rural (SDR), com recursos via acordo de empréstimo com o Fundo Internacional de Desenvolvimento Agrícola (Fida).

O Quiosque da Umbuzada recebe também o apoio de diversas entidades, como a Central de Cooperativas da Caatinga (Central da Caatinga).

(FONTE: Foto e cards: Divulgação/Coofama)

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NA TERRA DE LUIZ GONZAGA, A TERAPIA HOLÍSTICA DÁ O RITMO NA BUSCA DO CORPO E MENTE SAUDÁVEL

O caminho que liga Exu, Pernambuco ao Crato-Ceará é a via das escolhas, das encruzilhadas, da fé,  do trabalho, dons e saberes. As paisagens agem e ardem em eco.  Quais mãos trabalharam na confecção desse origami?

Nesta terça-feira, dia 21 de março, teve início um novo ciclo de todo planeta, o Sol em sua trajetória pelo zodíaco cruza a Linha do Equador Terrestre, e assinala o equinócio de outono no hemisfério sul, e o equinócio da primavera no hemisfério norte e marca a sua saída do signo de Peixes, o último do Zodíaco, para a entrada no de Áries, o primeiro. 

Os raios do Sol incidem nos hemisférios Norte e Sul de forma igual e o dia e a noite se equilibram, tendo 12 horas cada, daí o nome “equinócio”.

Este momento de harmonia da Natureza marca o início do Ano Novo Zodiacal, e é como se fosse um réveillon astrológico, ideal para começar uma nova fase.

Em Exu, não é só o ritmo e a harmonia de  Luiz Gonzaga que ecoam provocando saberes. Um dos exemplos de dedicação é o trabalho de Alvenir Peixoto. Ela é mãe e avó, filha de  Pedro Tenório de Alencar e Amélia Peixoto de Alencar.

Nasceu de batismo Alvenir Peixoto Tenório. Atualmente tem 62 anos, há 4 anos fechou um ciclo de  40 anos como educadora.  

"Nesse tempo, há  23 anos,  transmutei para Terapeuta Holística Integrativa, e  há 10 anos me fiz Artesã.  Arrisco-me  na poesia e  na contração de histórias", revela Alvenir, ressaltando que nasceu em um lar sertanejo, cujos valores foram transmitidos no cotidiano de maneira prática nas rodas de conversas motivadas por seu pai o seu avô materno.

"Honro a minha ancestralidade, honro meus pais pois sou parte do que recebi deles", diz Alvenir.

Esse ano Alvenir completa 30 anos de Práticas Integrativas Complementares e há 23 anos exerce, com honra, a missão  de auxiliar na saúde,  bem estar e felicidades  das pessoas como terapeuta.

Com Formação em Holística de Base, pela UNIPAZ-Recife , Alvernir é Reikiana,  shiatsuterapeuta, Psicopedagoga Clínica,  trabalha com Radiestesia, Cromoterapia,  Pêndulo,  Terapia Angelical,  Fitoterapia e audição terapêutica. 

Alvenir destaca os saberes. "Inserido na minha prática,  o conhecimento ancestral das meisinhas, (fitoterapia), dos escaldas pés, dos banhos de ervas,  de argilas fortalecem os saberes da nossa caatinga, da energia do sertanejo tão  elucidado na vasta obra de Luiz Gonzaga, nosso eterno  Rei do Baião".

De acordo com a terapeuta, os Saberes da Caatinga une benzedeiras(os), parteiras(os) e  raizeiras ( os) em prol da vida, da saúde  e do bem estar de todos que compartilham essa região, assim como a Chapada Nacional do Araripe  um cinturão de energia  que abraça a todos com sua generosa  riqueza energética e espiritual.

"Exu  tem como essência na sua formação a união dos povos tradicionais,  os índios Ançus,  os afro descendentes e o povo que veio de  Freixerio de Sotelo. Os Saberes espirituais estão presentes na formação de um povo. Acredito que não seja diferente de nossa Exu".

Ligia Peixoto Lino Araújo é filha de Alvenir. Apaixonada pela natureza e os elementos essenciais de quem busca qualidade de vida.  Todos os dias ela vai trabalhar na Budega, espaço e nome apropriado para uma das empresas pioneiras em vendas de itens para quem busca saúde para a mente e corpo.

No Brasil, em consonância com as recomendações da Organização Mundial da Saúde M, foi aprovada, desde 2006, a Política Nacional de Práticas Integrativas e Complementares no SUS (PNPIC), contemplando, entre outras, diretrizes e responsabilidades institucionais para implantação/adequação de ações e serviços de medicina tradicional chinesa/acupuntura, homeopatia, plantas medicinais e fitoterapia, além de instituir observatórios em saúde para o termalismo social/crenoterapia e para a medicina antroposófica no Sistema Único de Saúde (SUS).

A utilização da natureza para fins terapêuticos é tão antiga quanto a civilização humana e, por muito tempo, produtos minerais, de plantas e animais foram fundamentais para a área da saúde. Historicamente, as plantas medicinais são importantes como fitoterápicos e na descoberta de novos fármacos, estando no reino vegetal a maior contribuição de medicamentos.

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ESPIRITUALIDADE, ECOLOGIA, SUSTENTABILIDADE E O CUIDADO COM A MÃE TERRA SÃO TEMAS EM DISCUSSÃO NO VI SIMPÓSIO INTERNACIONAL PADRE CÍCERO

O VI Simpósio Internacional Padre Cícero e I Simpósio Internacional de Religiões e Espiritualidades prossegue até o dia 23 de março.

Aberto oficialmente na noite deste domingo, 19, no auditório Beata Maria de Araújo, na Universidade Federal do Cariri (UFCA), o VI Simpósio Internacional Padre Cícero e I Simpósio Internacional de Religiões e Espiritualidades: Pluralismo Religioso e Cosmovisões no Nordeste. Juazeiro do Norte e o Cariri se tornam o epicentro dos debates sobre religiosidades e o Padre Cícero, com a presença de dezenas de estudiosos do Padre Cícero e das religiões de vários países. Os eventos de abertura contaram com apresentações culturais, a exemplo do Coco do Frei Damião, com a Mestra Marinês.

O simpósio está sendo realizado por meio de diversas parcerias, entre elas a UFCA e a Unileão. São homenageados grandes nomes que contribuíram ao longo dos anos para a pesquisa, o fortalecimento da historicidade em torno da religiosidade e do Padre Cícero, a exemplo da irmã Annette Dumoulin, religiosa da Congregação de Nossa Senhora (Cônegas de Santo Agostinho), que faleceu em 21 de maio de 2021, além dos pesquisadores Daniel Walker, Raimundo Araújo e Geraldo Barbosa, também falecidos.

O coordenador geral do evento, Océlio Teixeira de Souza, destacou os nomes que estão sendo homenageados e que contribuíram com a realização dos simpósios, ao longo das suas edições. Ele fez um breve retrospecto de todas as edições realizadas e as temáticas trabalhadas. A URCA chega a 6ª edição, com a ampliação dos debates e discussões.

Na programação do Simpósio, estão sendo tratados sete eixos temáticos, incluindo: EIXO 1 – Padre Cícero, Romarias e Catolicismos no Nordeste;

EIXO 2 – Protestantes e Evangélicos; EIXO 3 – Religiões Afro-Diaspóricas e Afro-Brasileiras; EIXO 4 – Cosmovisões Indígenas e a Luta pela Terra; EIXO 5 – Doutrinas Científico-Religiosas e Novas Espiritualidades; EIXO 6 – Espaço Público, Religião e Política e EIXO 7 – Espiritualidade, Ecologia e o Cuidado com a Mãe Terra.

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DIOCESE PUBLICA NOTA EM DEFESA DE COMUNIDADES ATINGIDAS POR MINERADORA

Após visita realizada no último sábado (18), a comunidades atingidas por uma empresa de mineração no interior de Sento Sé, o Bispo da Diocese de Juazeiro, Dom Beto Breis, publicou uma nota em defesa dos moradores.

Na nota, Dom Beto disse que foi às comunidades a fim de “escutar os gritos e as reivindicações dos que sofrem com os efeitos e impactos da presença da Empresa Tombador Iron Mineração Ltda. E com os temores do que poderá surgir ainda mais. Tal Empresa desde 2021 atua na extração e produção de granulado e finos de hematita (minério de ferro) de alto teor (67% Fe) numa pequena serra (Serra da Bicuda) distante 22 quilômetros da sede do município. Se São José sentiu-se impelido pelos sonhos que lhe indicavam as pro-vocações de Deus, são aqui os ‘pesadelos’ enfrentados por tantas famílias de 12 comunidades que nos interpelam e desafiam”.

Na visita, Dom Beto estava acompanho “por quem já apoia a luta e a resistências desses moradores: membros da Comissão Pastoral da Terra (CPT), pesquisadores/ professores da Fiocruz e da UNIVASF (Universidade Federal do Vale do São Francisco), Padre Claudimiro (vigário da Paróquia) e o seminarista Danilo”.

Segundo o bispo, “Importa ecoar seus gritos e lamúrias, pois não faltam os que lhe são indiferentes ou impõe ameaças de retaliações porque não permanecem calados e isolados. Fica evidente que as chagas profundas e extensas abertas por ocasião da construção da Barragem de Sobradinho permanecem dolorosas e são reabertas com força diante de outros empreendimentos em nome do ‘Desenvolvimento’ que exclui o respeito com a vida humana e o cuidado com a Criação”.

Confira o texto na íntegra 

ESCUTAR E CON-SENTIR

 + Dom Beto Breis, OFM

Bispo Diocesano de Juazeiro

No dia 18 de março, Véspera da Festa de São José, Padroeiro da Paróquia e do município

de Sento Sé, visitamos comunidades dessa extensa rede de comunidades para escutar os

gritos e as reivindicações dos que sofrem com os efeitos e impactos da presença da

Empresa Tombador Iron Mineração Ltda. E com os temores do que poderá surgir ainda

mais. Tal Empresa desde 2021 atua na extração e produção de granulado e finos de

hematita (minério de ferro) de alto teor (67% Fe) numa pequena serra (Serra da Bicuda)

distante 22 quilômetros da sede do município. Se São José sentiu-se impelido pelos

sonhos que lhe indicavam as pro-vocações de Deus, são aqui os “pesadelos” enfrentados

por tantas famílias de 12 comunidades que nos interpelam e desafiam. Fomos

acompanhados por quem já apoia a luta e a resistências desses moradores: membros da

Comissão Pastoral da Terra (CPT), pesquisadores/ professores da Fiocruz e da UNIVASF

(Universidade Federal do Vale do São Francisco), Padre Claudimiro (vigário da Paróquia)

e o seminarista Danilo.

Registro a seguir algumas falas, sinalizando entre aspas as que consegui anotar com

literalidade. Importa ecoar seus gritos e lamúrias, pois não faltam os que lhe são

indiferentes ou impõe ameaças de retaliações porque não permanecem calados e isolados.

Fica evidente que as chagas profundas e extensas abertas por ocasião da construção da

Barragem de Sobradinho permanecem dolorosas e são reabertas com força diante de

outros empreendimentos em nome do “Desenvolvimento” que exclui o respeito com a

vida humana e o cuidado com a Criação.

Infelizmente essa realidade não é isolada e única. Comunidades como Angico dos Dias,

em Campo Alegre de Lourdes, sofrem há anos com os desmandos da Mineradora Galvani.

E a CBPM1

já festeja os passos para uma Província Mineral que abrangerá grande parte

do território de nossa Diocese de Juazeiro. A propósito, temos informações de que o

Estado da Bahia se destaca na oportuna flexibilização das leis ambientais.

As frases e citações seguirão a ordem das exposições, sendo um primeiro grupo aquelas

acolhidas pela manhã, na Comunidade de Pascoal/Limoeiro, e, a seguir, aquelas na

Comunidade do Tombador (à tarde).

1 A Companhia Baiana de Pesquisa Mineral (CBPM) é a empresa de pesquisa e desenvolvimento do Estado

da Bahia, indutora destes processos no setor mineral do estado. Sua atuação é centrada na ampliação e

aprimoramento do conhecimento geológico do território baiano, na identificação e pesquisa de seus

recursos minerais e no fomento ao seu aproveitamento, atraindo, para este fim, a iniciativa privada.

Fundada em 18 de dezembro de 1972, a CBPM é reconhecidamente uma das mais dinâmicas empresas

no cenário da pesquisa mineral no Brasil. O acervo de dados e informações geológicas, geradas e

difundidas por ela ao longo da sua trajetória, contribuiu para tornar a Bahia um dos estados brasileiros

mais bem estudados e conhecidos geologicamente, pondo em destaque a grande diversidade de seus

ambientes geológicos, ricos em depósitos minerais.

(fonte: http://www.cbpm.ba.gov.br/institucional/missao-visao-valores/)

Do 2

PASCOAL/LIMOEIRO

 Sentimento de medo. “Parecia um boato” (a chegada da empresa mineradora), mas

o que “nossos pais passaram na época da construção da Barragem enfrentamos agora”.

“Tenho o sentimento de que somos invisíveis”. Estradas sem estruturas para caminhões

bitrens, que muitas vezes passam em comboio.

 “Moramos aqui há tantos anos e chegam se achando donos. Parece que os

inoportunos somos nós.... Não estou feliz no que é meu.... Nos documentos deles aqui

não tem ninguém. É o que somos para eles: ninguém”

 O líder da comunidade Ademir (falecido em 2015) já alertava os moradores

prevendo dores e sofrimentos “tapando as variantes”.

 Há indícios de que estão construindo uma barragem de rejeitos. Brumadinho e

Mariana servem de alerta para nós.

 “Prefiro acreditar no poder da união do povo. Meus pais perderam tudo com a

barragem. Não vamos desistir, pois eu quero viver aqui... Fé em Deus e no poder da luta

do povo. A gente quer ser feliz aqui”.

 “Daqui não saio” (idosa octogenária)

 “A gente vivia sossegado (pescando, tirando casca de angico…), mas hoje o

desassossego é grande”. Tenho um filho de oito anos: “queria que ele tivesse o sossego

que eu tive quando era criança...” (...) Os motoristas dos caminhões não nos respeitam.

 “Essa indignação minha vem desde quando era criança. Tinha oito anos na época

da construção da Barragem. A água do rio estava podre devido a tantas plantas e animais

mortos”. Água era inapropriada para consumo. Devia-se esperar alguém com canoa para

pegar agua corrente no meio do rio. “Mamãe fervia a água, mas tão grande era a sede que

a gente bebia a água assim mesmo, morna.”. Gosto horrível. “Chega hoje uma

mineradora…”. (...) “Onde Deus está? Porque tanta injustiça, tanta coisa errada? Até já

pedi perdão a Deus por isso. ”

 “Nossa luta não começou agora. No início ninguém acreditava”. Poucos se uniam.

Agora 90% da população acordou ...”A comunidade desperta agora”.

 “Sinto-me estranho na minha própria casa”. Sem segurança para ir de moto a

Sento Sé.

 “Muitos se acomodam diante das dificuldades e da força dessa Empresa. E o

desenvolvimento prometido não chega: “cadê os empregos? ”. Somos descartados. “Nada

do que foi prometido aconteceu de fato”. “A gente se fortalece com o apoio de quem não

é daqui”. “O povo da cidade julga e não acredita nas causas das comunidades. Dizem que

é ‘politicagem’”.

 “Estão nos expulsando” a partir do momento em que as famílias perdem os bichos

que criam e o que produzem” (por exemplo, acerolas).

 “A cada dia a indignação cresce mais. ” Pessoas da comunidade são manipuladas e

desconstruir não é fácil.

 Nos doze (12) dias (de manifestação) “ninguém veio” (Prefeita, vereadores...). “As

autoridades quando acordarão? ” “Também outras comunidades não acordaram ainda. ”

Do 3

“Não dá mais para aguentar”: poeira e explosões somos nós que enfrentamos. “Eles

(Mineradora) se acham donos”.

TOMBADOR

 Há quase 50 anos “a Chesf fez promessas, mas enganou e iludiu. Pessoas ficaram

sem casas... “Não somos animais, merecemos respeito”. (...) Hoje não temos mais

alegria”.

“Fomos surpreendidos pela gestão municipal, que não ouve as comunidades”.

 “Corremos o risco de morrer de silicose”

2=A estrada piorou muito depois que

chegou a Empresa” (lama ou poeira)

 Tomaram posse das nossas terras. “Pobres não têm vez, dizem as pessoas... Não

somos nada”

3-Medo dos rejeitos, que poderão “estrondar” no São Francisco. Montes altos de

terras surgidos recentemente indicam que tem barragem sendo feita. Pó de pedra nas

casas.... Estão desmatando. Por outro lado, “nenhum do povoado foi empregado... Para

nós, só prejuízo”.

 “Tenho medo de ter que sair daqui. Minha mãe morreu esperando indenização

da Chesf”. Quase meio século depois da Barragem de Sobradinho a maioria das pessoas

já morreu. A relocação das famílias é um trauma. Hoje chegam outros modelos de

desenvolvimento prontos. “Não respeitam as terras dos nossos antepassados”.

4-“Se alguém tira a vida do outro vai preso. E essas mineradoras? ”. A Empresa

Tombador Iron está em expansão.

5- “Jesus está no meio de nós. Ele está do lado dos pobres.

 Eles dizem que aqui não mora ninguém. Mas a gente produz, faz troca de

sementes...

 As manifestações que paralisaram a estrada foram 178 horas de um movimento

ordeiro, pacífico. Mas nenhuma autoridade apareceu. “Mas a luta não está perdida”.

 “Lembro-me da época da construção da Barragem, pois era criança: animais mortos

nas águas; nos colocaram na caatinga sem morada”. Barracas de lona preta.6

 “A Chesf jogou nós igual a porcos. Bolos de barro e lonas de galé”

Juazeiro, 20 de março de 2023

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