Elba Ramalho: "Minha voz não carrega preconceito, açoite ou ofensa"

Essa entrevista surgiu de uma conversa de Elba Ramalho com o jornalista Hildebrando Neto, da TV Cabo Branco, Paraíba. Elba queria, de uma vez por todas, esclarecer alguns pontos dessa polêmica sobre a programação do São João. Segue a conversa.

Sílvio Osias – Uma entrevista que você deu em Pernambuco deflagrou um debate sobre a descaracterização das festas juninas no Nordeste. Para começarmos essa conversa, como você resumiria aquela fala?

*Elba Ramalho – O movimento Devolva Meu São João, lançado na rede e criado pelo sanfoneiro Chambinho ( que fez o papel de seu Luiz no filme De Pai prá Filho), ganhou adesão de todos os artistas regionais e se disseminou com muita força. Isto ocorreu logo após a apresentação das grades artísticas pelas prefeituras, bem antes da minha fala! Quis manifestar  meu apoio ao movimento, porque achei justo. Ratifico: só falei porque fui perguntada. Procurei ser delicada e democrática na minha fala, mesmo sabendo que poderia ser fogo em pólvora. Inicio dizendo: o céu é grande, cabem todas as estrelas e nenhuma atropela a outra. O resto, já sabemos. Não havia, de minha parte, revolta, nem discussão inflamada, porque isso não resolve, não auxilia nem ilumina.

A sua postura me pareceu muito clara. Mas nem todos entenderam assim. Que tipo de desconforto você enfrentou (e enfrenta) por causa desse debate?
*O desconforto maior veio nas palavras  de um jornalista campinense, coordenador de comunicação da prefeitura de Campina. Foi difícil digerir e compreender a razão de tanto ódio, destilado de forma deselegante contra minha pessoa. Coisas que um ser humano não deve fazer a outro. Faltou-lhe perseverança, pela função que exerce. Respondi desejando-lhe paz e bem. A partir daí, o que deveria ser um diálogo saudável, ganhou ares de competição, intolerância, infelizmente. Continuo em paz, aguardando o concurso sábio do tempo.

Vivemos no Brasil um momento de muita intolerância. Você acha que os desdobramentos desse debate, com alguns excessos de ambos os lados, têm a ver com isso?
*Vivemos debaixo do mesmo céu. Devemos buscar sempre a reconciliação e nunca a intolerância. Picasso disse, entre outras coisas: aprenda as regras como profissional para que possa quebrá-las como artista. Os debates que se seguiram saíram do limite da  tolerância, reconheço, de ambos os lados, mas não foram gerados por mim. Minha voz não carrega preconceito, açoite ou ofensa. Sou cristã e, apesar das confusões mentais geradas pela ignorância, continuo emanando luz na tentativa de dissipar as quimeras. Amo o que faço, respeito o que os outros fazem, isso é tudo. Espero que alcancemos o tempo onde falar sobre árvores não seja uma falta. O ministério que me foi dado por Deus não pode ser desacreditado, porque minha voz é verdadeira.

Os seus vínculos profundos com a música do Nordeste nunca lhe impediram de dialogar com outras expressões musicais. Tenho a impressão de que isso não ficou claro nessa discussão de agora. Você concorda?
*Sim, construí minha carreira sobre rochas, com os pés no Nordeste e os olhos no mundo. Meu diálogo com a música transpõe os muros do preconceito, repito. Não podemos limitar a música já que tem o poder de aproximar povos e promover a paz. Minha maior satisfação não é ter vendido milhões de discos, nem ganhar dinheiro, é dividir o palco com meus colegas. E não importa a nacionalidade, cor ou crença. Cantei com artistas diversos; cubano, venezuelano, chileno, porto-riquenho, americano, português, alemão, francês e até japonês. O Brasil é o celeiro da diversidade. Rico, vasto, com uma cultura híbrida, tudo parece estar junto e misturado. Aliás, tenho um projeto de verão que se chama Elba Convida, onde recebo, há mais de 15 anos, artistas de todos os segmentos da música brasileira no meu palco. Resumindo, no verão deste ano estiveram comigo: Zélia Duncan, Maria Gadú, Chico César, Ney Matogrosso, Timbalada, Mart’Nália, Samuel Rosa, Aline Rosa, Margareth Menezes, Simone e Simaria. Inclusive a própria Marília foi convidada, mas não obtivemos resposta.  Mas samba é samba, baião é baião, rock é rock, sertanejo é sertanejo.

Para além do mercado, para além da terceirização, você não acha que os gestores públicos devem ter um compromisso maior com a manutenção de algumas das nossas tradições?
*Chegamos ao cerne mais importante da questão. Esse discurso já foi conclamado por diversos artistas e não preciso citar nomes: a responsabilidade da preservação da cultura dessa ou daquela região está nas mãos de gestores, de curadores, ou seja, pessoas que são credenciadas para fazê-lo. Precisamos saber se essas pessoas têm consciência, responsabilidade e capacidade para gerarem arte e cultura devidamente.Uma modalidade musical pode ser arte ou show business para alguns. Para Miles Davis, jazz não era apenas jazz, para Almir Sater, sertanejo não é apenas sertanejo, para mim, forró não é apenas forró, mas o caminho pelo qual nos conectamos com o infinito.
Para Elba Ramalho, forró e São João não são assuntos de show business, vão além do cultural, alcançam o espiritual, o místico. Não tenho outros interesses nessa festa senão a emoção de ouvir a voz de seu Luiz, a sanfona de Dominguinhos e Sivuca, o pandeiro de Jackson, a voz de Marinês, o barulhinho bom dos trios regionais. Isso não é xenofobia, é afeto.

Numa mensagem ao prefeito de Campina Grande, você adotou um tom de conciliação, de harmonia, que tem a ver com a sua formação, com o que você é. Pra você, esse episódio está superado? O que teremos no seu show da noite do dia 23?
*Silvio, o conflito não edifica. O prefeito desejou falar comigo, ratificou sua admiração pelo meu trabalho e foi muito cortês. Reconheço que, ao terceirizar a festa, o risco que ele corre é muito grande porque qualquer equívoco lhe será atribuído. Música é também comércio e pode gerar muito, muito dinheiro. Ok, está tudo certo! O problema é a força da grana que ergue e pode destruir coisas belas. Respondi à sua gentileza com a mesma delicadeza que precede minhas ações neste mundo. Claro, estou ansiosa para cantar em Campina Grande, a cidade que me deu régua e compasso, no palco onde tudo começou. Desejo realmente que tudo seja passado a limpo. E passado. Isso só vai ocorrer se as coisas estiverem fundadas na VERDADE! Infelizmente, VERDADE não é base e ética de alguns profissionais. Só para atualizar, estou cantando nas grandes festas de São João do Brasil, pelo menos onde nossa música nordestina é considerada original, genuína. Muitas quadrilhas do Rio e São Paulo me homenageiam, contam minha história, o que muito me honra. Logo que acabem os festejos juninos, sigo para shows no Japão e na Europa. Quem estiver aberto a compreender minhas palavras vai saber que estão carregadas  de amor e de zelo. Aos amigos sertanejos, Zezé, Luciano, Chitão, Xororó, Daniel, Vanessa Camargo, Simone e Simaria e todos os  outros, digo: sejam bem vindos ao Maior São do Mundo. Sejam bem vindos também Zeca Pagodinho, Skank, Ney Matogrosso, Martinho da Vila, Zélia Duncan, Cidade Negra, Maria Gadú, Mestrinho, FalaMansa. Viva a democracia, viva a diversidade! No final, nada é entre você e os homens, mas tudo é entre você e Deus! É vida que segue! E viva São João do Carneirinho!
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Forró...o nosso Patrimônio da música brasileira

O IPHAN recebeu o pedido para transformar o Forró em Patrimônio Imaterial do Brasil. Mesmo que o órgão não consiga prosseguir, depois falarei sobre isso, independente de qualquer querer das elites, o forró é a música patrimonial do Brasil. E todos sabemos que o Brasil não é só samba, sertanejo, axé e funk.

O Brasil é verdadeiramente uma grande sala de chão batido, uma sala de reboco, com folhas de eucalipto espalhadas e lá no canto da parede um trio tocando sanfona, triângulo e melê. Quem não souber o que é um melê, procure saber, forrozeiro não é.

A juventude forrozeira tem como base para seu gosto, geralmente, os acordes de Luiz Gonzaga, as sincopadas de Jackson, a genialidade de Dominguinhos e a leveza de Sivuca. De vez em quando adentram no universo dos trios e têm no Trio Nordestino a voz das vozes de Lindú; entram pelo swing de Os Três do Nordeste, com Parafuso rodopiando assustadoramente; entranham-se pelo Trio Mossoró, com a identidade mais sertaneja de João Mossoró; alguns distanciam-se um pouco mais no tempo e chegam ao Trio Nagô ou ao Trio Marayá.

Mas quero trazer para os amantes da arte forrozal quatro pilares para nossa sala. Não sei mais qual foi o ano no qual estreamos na Rádio Serrana de Araruna, ZYI 692, AM 590, aos domingos, entre 6 e 9 das manhãs paraibanas. Éramos três a escrever o Suíte Nordestina: Ney Vital Guedes, Pedro Freire e eu. Depois veio Ednaldo da Silva, o Dina. Procurávamos não ficar na mesmice e vivíamos a vasculhar as feiras do brejo em busca de discos de artistas anônimos e outros que não chegavam em nosso cidade. Os sebos de Campina Grande e João Pessoa eram vasculhados, visita a amigos da zona rural, era uma caçada épica. No repertório dos discos de vinil tocávamos não os carros chefes, mas músicas de boa qualidade escondidas nas 12 faixas tradicionais.

Nessas buscas encontramos o magnífico Azulão. A primeira canção do mestre de Caruaru que toquei no rádio foi Apanhadeira de Café, de Brito Lucena e Azulão. Uma marchinha que eu ouvia de Xuxu, um vizinho que, quando bebia, a cantava com uma emoção de doer o peito da gente. De Azulão a Jair Alves, cognominado O Barão do Baião, foi um pulo.

Comprei o disco em Remígio e corri pra casa para ouvir. Chamou-me atenção o baião Aproveita a Maré, de Valdrido Silva e Humberto de Carvalho. Quando ouvi fiquei meio aéreo com um baião que não falava de seca, nem de amor perdido, mas do mar, das sereias e seus cantos. A eles, certa vez, juntou-se Assisão, que tempos depois viraria febre nas rádios com Eu Fiz Uma Fogueirinha. 

Mas Sebastião do Rojão foi quem surpreendeu-me com canções que iam entre o baião e o bolero, entre o rojão e a dor de cotovelo. Foram os quatro cavaleiros durante um bom tempo em minha radiola Aiko e nas ondas da Rádio Serrana, no Suíte Nordestina.

Fonte: Aderaldo Luciano-professor, doutor em Ciencia da Literatura
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Barraca de venda de fogos de artíficios explode em Petrolina

No final da manhã desta terça-feira, 20, uma das barracas de vendas de fogos de artifícios juninos, próximo ao Cemitério Central de Petrolina provocou uma  explosão. O carro do Corpo de Bombeiros foi acionado para apagar o incêndio.
De acordo com informações do Corpo de Bombeiros, as vítimas atingidas pela explosão da barraca de fogos de artifícios tiveram escoriações leves. O estabelecimento comercial ficava localizado próximo ao Cemitério Campos das Flores, no Centro de Petrolina.




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Folha São Paulo denuncia que estão silenciando os sanfoneiros e cantores do autêntico forró

Enquanto as fogueiras arderem em homenagem ao santo mais importante da tradição nordestina, sanfona, triângulo e zabumba estarão em silêncio. No lugar do trio de forrozeiros, a "banda de um homem só" comandará a festa de Caruaru (PE) em 24 de junho, dia de São João. Atrás das suas pick-ups, o DJ Alok, com os seus beats eletrônicos, será a atração principal da capital do forró.

A novidade também chegou em Conceição de Almeida (BA), cidade de 20 mil habitantes do recôncavo baiano. Sob bandeirinhas e balões coloridos, e mediante um cachê de R$ 180 mil, a cantora Anitta transformará o arraial em um baile funk carioca. A "invasão" de ritmos sem familiaridade com os festejos juninos do Nordeste, incluindo o sertanejo universitário, vem mudando a cara do São João da região. O que por décadas foi uma celebração das tradições da zona rural, aos poucos está se tornando um festival de ritmos variados.

A ameaça ao "São João raiz" provocou a reação de artistas, produtores e admiradores da cultura que ganhou o mundo a partir do trabalho de Luiz Gonzaga (1912-1989). Com a hashtag #DevolvaMeuSãoJoão, eles pedem, nas redes sociais, que xaxado e baião voltem a ser destaque. "A realidade é que estão silenciando os artistas e aos poucos acabando com a cultura do Nordeste", diz Chambinho do Acordeon, que em 2016 deu vida a um sanfoneiro em "Velho Chico", da Globo. O personagem se deparava com a falta de oportunidades nas festas de São João.

O cantor J. Sobrinho sentiu na pele a perda de espaço. Em 2016, depois de 23 anos de carreira, pela primeira vez não tocou sua sanfona na noite de São João de Feira de Santana (BA). "Fiz uma fogueira e fiquei em casa", conta.

Com mais de 20 discos, o paraibano Flávio José também está vendo a agenda de shows minguar a cada ano. Há pelo menos cinco, contabiliza o cantor, eram 25 apresentações em todo o Nordeste -esse ano não passarão de 15.
Sertanejos chegam perto disso.

No período entre 15 de junho e 5 de julho, ponto alto das festas, a goiana Marília Mendonça fará nove shows no Nordeste. O cantor Luan Santana fará dez, mesmo número de Maiara e Maraísa. "Há um desequilíbrio, a grade não pode ser 18 sertanejos e dois forrozeiros, porque não é festa do peão, é São João", diz a cantora Elba Ramalho ressaltando que O forró nunca vai acabar porque está na nossa alma. O povo gosta do xote, do xaxado, do baião.

Atração principal da noite de São João em Campina Grande (PB), Marília Mendonça rebateu: "Vai ter sertanejo no São João, sim". A declaração dada durante um evento privado no Recife gerou um embate com os forrozeiros. 

A ciranda continuou com o cantor Alcymar Monteiro. Para ele, Marília "canta para cachaceiros e não tem autoridade para falar nada". Procurada pela reportagem, Marília não retornou. Alcymar critica as prefeituras, responsáveis por organizar as festas. "Dinheiro de cultura é para cultura. Infelizmente, os prefeitos se venderam a esse modelo econômico perverso que trata o forró como música de segunda."

O São João se tornou ponto alto da economia das cidades do Nordeste. De maior ou menor porte, acontecem em quase todos municípios da região. As tradicionais são em Caruaru (PE) e Campina Grande (PB). Na Bahia, Amargosa, Cruz das Almas e Senhor do Bonfim dividem o reinado. A prefeitura de Caruaru estima que 2,5 milhões de pessoas passem pelos 17 palcos onde acontecem mais de 400 apresentações neste mês.

 Em Campina Grande, hotéis já estão lotados e casas de moradores alugadas para atender a demanda dos turistas. Diante da proporção que as festas ganharam, as prefeituras defendem a convivência de atrações tradicionais com outros artistas. O objetivo, segundo os gestores, é atrair patrocinadores e garantir a sustentabilidade do São João, que chega a custar R$ 12 milhões por cidade.

"Precisamos ter atrações de sucesso que atraiam mais público e garantam o retorno financeiro. No final, são os grandes artistas que acabam bancando os pequenos", disse o prefeito de Campina Grande, Romero Rodrigues (PSDB).

Presidente da Fundação de Cultura de Caruaru (PE), Lúcio Omena diz que, dos 400 artistas na programação do São João, 75% são locais. Ele defende, porém, que a cidade abrace outros ritmos. "A gente não pode ser inquisidor", diz. Ele conta ter negociado com o DJ Alok para que parte de sua apresentação seja com músicas de forró. O setor hoteleiro também defende o formato "festival de ritmos variados" para o São João e comemora os bons números em plena crise. Os hotéis de Pernambuco registram quase 90% de lotação.

"As atrações de renome nacional ajudam o setor. O jovem vem para assistir aos shows e os pais o acompanham", observa Eduardo Cavalcanti, vice-presidente da Associação Brasileira da Indústria de Hotéis em Pernambuco. A cantora paraibana Elba Ramalho, 65, ganhou a linha de frente da discussão sobre o espaço dado ao forró nas festas de São João no Nordeste após criticar prefeitos por priorizar artistas sertanejos. Ela nega preconceito com artistas de outros ritmos, mas diz que o forró deve ser prioridade em junho.

LEI LUIZ GONZAGA: Enquanto a discussão perdura, um grupo de artistas prepara um projeto de lei que será levado ao Congresso ainda este ano. A proposta, batizada de Lei Luiz Gonzaga, é que municípios e Estados que não priorizarem os artistas regionais no período junino não recebam verba federal. Uma lei semelhante, chamada "Lei da Zabumba", foi aprovada na Bahia em 2016, prevendo que pelo menos 60% dos recursos estaduais sejam usados com artistas locais. O efeito prático, contudo, se revelou limitado.

A lei vale só para recursos aplicados diretamente pelo Estado,não se aplica aos convênios com municípios, para onde vai o grosso da verba. Para Paulo Vanderley Tomaz, que há 20 anos pesquisa o legado de Luiz Gonzaga, a lei é uma iniciativa válida. Mas o fundamental é que os gestores que organizam o São João saibam valorizar o forró e as tradições juninas.
"Sem essa consciência, estaremos condenados a perder nossa cultura", diz. Seria um passo atrás. Ou como se diz na quadrilha junina: anarriê.

Fonte: Folha de São Paulo
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Jornalista José Teles acusa prefeituras e promotores de festas pelo péssima qualidade do São Joao 2017

Num debate de que participei, na Rádio Jornal, no programa do meu amigo Ednaldo Santos, com Xico Bizerra e Anselmo Alves, confessei meu pessimismo sobre mudanças no formato adotado para os festejos juninos no Nordeste. Assim como o Carnaval, não tem mais volta o São João. Aliás, como de resto, quase todas as festas populares. É uma equação de fácil resolução. O povo é só público. A festa é de Prefeituras e produtores. Quanto mais palcos e artistas, melhor. Por isso são criados polos descentralizados, anunciados como se fossem um presente para o coitadinho que mora longe e, portanto, não tem acesso ao artista famoso.

A descentralização apenas apressa o fim das manifestações populares que ainda existiam porque estavam distante dos palcos. Se o povo da zona rural ou da periferia não vai aos palcos, levam-se os palcos a ele. Em lugar de incentivar a continuidade do tipo de festa que se fazia no local, promove-se a inserção destes "atrasados" na cultura "muderna" de palco e plateia.
O modelo, que foi disseminado, Nordeste afora, para os festejos juninos, é uma bastardização cultural mais grave do que a que se faz no Carnaval. Na região, a folia de Momo acontece, basicamente, em Salvador, no Recife e em Olinda. Enquanto o São João é festejado em centenas de municípios. Em todos os estados.

Acho que não tem volta, tanto São João quanto Carnaval. Pelo menos duas gerações cresceram indo ver a festa, e não brincar na festa. Não a entendem de outra maneira. Os secretários de cultura não assumem o cargo esboçando uma política cultural que possa ser continuada. Pensam nas atrações que serão contratadas para o próximo São João.

O São João tradicional existe apenas nos comerciais que se divulgam pela TV ou Rádio. Todos eles têm como música de fundo, o forró tradicional. Raros são os municípios que apresentam peças promocionais anunciando o que contrataram como atrações para o palco principal, Luan Santana, Jorge e Mateus, Wesley Safadão, e similares, todos pagos regiamente, e sem atraso. Estes nem são convidados para o coquetel de lançamento do "São João Monumental" de determinada cidade. Só chegam na hora do show.

O São João não tem mais volta também porque os forrozeiros acomodaram-se no papel de convidados da própria festa. Aceitam o papel de coadjuvantes, num filme que todo ano se repete, com muita conversa mole, péssima trilha sonora, grande bilheteria, e público garantido.

Fonte: Jose Teles-Jornal do Commercio
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Pífanos marcam novena na Fazenda Araripe para festejar São João Batista

Sempre que visito Exu, Pernambuco compreendo que a história vem se tecendo com a força da própria vida. E por isto, disse o cantador Virgilio Siqueira, daí não ser possível guardar na própria alma a transbordante força de uma causa. Daí não ser possível retornar, afinal, a gente nem sabe ao certo se de fato partiu algum dia...

Em tempos de forró eletrônico e quadrilhas estilizadas, a melhor tradição junina sobrevive em um lugarejo do Sertão. A Fazenda Araripe, berço do sanfoneiro Luiz Gonzaga e de Barbara de Alencar luta para manter as comemorações em homenagem ao padroeiro São João Batista.

Numa festa onde o sagrado mistura-se ao profano, a impressão reinante é de que o tempo não passou, apesar dos 149 anos decorridos desde que a imagem de "São João do Carneirinho", como é conhecida no lugar, chegou da França, cumprindo uma curiosa promessa.

Por volta de 1850, quando uma epidemia de cólera alastrava-se, assolando as cidades vizinhas, o Barão de Exu e então proprietário da Fazenda Araripe, Gualter Martiniano de Alencar, apavorado pela perspectiva de ver a moléstia dizimar seu

povo, fez um apelo a São João Batista: se no seu município ninguém fosse vitimado pelo cólera, ele ergueria um templo ao santo, onde o padroeiro seria cultuado com toda dignidade até a quinta geração da família Alencar.

Coincidência ou não, o fato é que a doença, que liquidou a população de Granito, ao sul de Exu, e boa parte da de Crato, ao norte, "não desceu a serra do Araripe", como costumam dizer os narradores da história. O barão preparou-se, então, para cumprir a promessa.

Em 1867, acompanhada dos três reis magos e de uma artística caixa de música, chega da França a imagem de São João Batista, para ocupar a capela que já estava quase concluída. Talhada em madeira , a estátua de um metro de altura.Em 2018 portanto serão 150 anos.

No ano seguinte, começariam oficialmente os festejos juninos no lugar. Mas as novenas ainda seguem o  ritual, embora não ecoem mais pelo interior da capela as vozes possantes de Santana Gonzaga, mãe do rei do baião, e de Sinharinha dos Canários, personagem de suas músicas.

Em um local no centro da fazenda, conhecido como "latada", uma sanfona, um triângulo e um pandeiro demonstram, na prática, o que significa "forró de pé-de-serra" para uma platéia que é mestre no assunto. Em cada casa da vila, que não tem mais que 100 habitantes, uma fogueira esquenta a festa.

 A professora Neide Carvalho, que desde a infância era uma freqüentadora assídua da festa e em vida escreveu suas memórias sempre dizia que a Fazenda Araripe "é o último reduto de São João tradicional na região, apesar de não ser uma festa divulgada".

Na página do Facebook "Fazenda Araripe" consta que nem poderia ser diferente. "Afinal, com os recursos e escassos nesses tempos de seca, somente uma promessa firmada em um passado longínquo, aliada à veneração dispensada ao padroeiro e ao fato de que ali nasceu e viveu o rei do baião, são capazes de manter acesa a fogueira de São João do Carneirinho para iluminar a vila durante nove dias por ano".
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A cultura virou suco em Petrolina e no Brasil

Ao tomar posse, Michel Temer decretou o fim do Ministério da Cultura. Depois de uma semana de protestos, ele voltou atrás. A pasta foi recriada, mas o presidente continuou a tratá-la com indiferença.

Em pouco mais de um ano, Temer já teve três ministros da Cultura. Agora precisará nomear o quarto. O cineasta João Batista de Andrade, que exercia o cargo como interino, pediu demissão na sexta-feira.

O primeiro da fila foi Marcelo Calero, indicado pelo PMDB do Rio. Ele assumiu depois que pelo menos seis mulheres recusaram o posto. Sua breve gestão foi marcada por desentendimentos com artistas e vaias em festivais de cinema.

O diplomata só fez algo digno de nota ao pedir demissão. Ele disse ter recusado pressões para atender interesses particulares do colega Geddel Vieira Lima. O peemedebista fazia lobby pela construção de um edifício em área tombada pelo patrimônio histórico em Salvador.

Após a saída de Calero, Temer entregou a pasta ao PPS em troca de uma dúzia de votos no Congresso. O escolhido foi o deputado Roberto Freire. Crítico do "aparelhamento" em governos petistas, ele distribuiu cargos públicos a 18 correligionários.

Em fevereiro, Freire se envolveu num lamentável bate-boca com o escritor Raduan Nassar. No mês passado, ele deixou o governo depois da divulgação da conversa de Temer com Joesley Batista. Seu lugar foi ocupado por Andrade, que durou apenas 26 dias na cadeira.

Ao sair, o diretor do filme "O Homem que Virou Suco" disse que o ministério estava "absolutamente inviabilizado" pelo corte de 43% no orçamento. Agora Temer estuda nomear um deputado para saciar a bancada do PMDB, que costuma espremer seus ministérios até a última gota.

A nova barganha com a Cultura tem potencial para mobilizar a classe artística em novos protestos contra o governo. A essa altura, o presidente já deve estar arrependido de ter recriado a pasta.

Fonte: Folha de S. Paulo – Bernardo Mello Franco
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