PACTO ECONÔMICO EM DEFESA DO MEIO AMBIENTE É ASSINADO

Mais de 50 empresários brasileiros divulgaram um manifesto em defesa de uma economia voltada para a conservação do meio ambiente.

O documento intitulado "Por um Pacto Econômico com a Natureza" afirma que acatástrofe de maio no Rio Grande do Sul e os incêndios no Pantanal tornam mais urgente a necessidade de união de esforços contra os desafios das mudanças climáticas.

A carta menciona o despreparo da nação e manifesta um compromisso de buscar saídas com a sociedade, colaborar com o Poder Executivo no combate ao desmatamento e na recuperação de áreas degradadas, contribuir com o Legislativo na criação de leis que disciplinem o licenciamento ambiental e incentivar o Judiciário na defesa do direito constitucional ao meio ambiente.

Mas o documento observa que todos os brasileiros têm a responsabilidade de repensar hábitos e processos, e que cabe à iniciativa privada acelerar a adaptação da economia brasileira à nova realidade do clima.

O documento afirma que um pacto econômico com a natureza dará impulso ao país no cenário global, que o Brasil pode gerar renda e empregos, preservar áreas verdes e transformar espaços urbanos, e que o país precisará apresentar um plano de redução de emissões de carbono em 2025, como anfitrião da cúpula global sobre crise climática.

Por fim, o documento, assinado por 52 cidadãos empresários, afirma que o empresariado e os Três Poderes precisam se unir em defesa do meio ambiente, da economia e da prosperidade da população.

"A gente tem a COP vindo aí no ano que vem. Então, é uma oportunidade sensacional para a gente conseguir se juntar e mostrar para o mundo que a gente quer liderar essa conversa globalmente. Então, nossa expectativa é que agora a gente possa desdobrar em algo concreto, em conversas com o Estado, com os Três Poderes e com a sociedade civil”, diz o empresário Pedro Bueno.

"O que nós queremos é um fórum permanente onde nós possamos discutir de forma colaborativa, de forma construtiva, as soluções para os problemas. E nós temos já um conjunto de soluções para serem apresentadas e debatidas, mas que têm que ser implementadas, porque nós precisamos entrar em modo ação", afirma o empresário Walter Schalka.

Nenhum comentário

CULTURA NORDESTINA EM CADA PALAVRA É TEMA DO FESTIVAL RIOMAR DE LITERATURA

O pesquisador Paulo Vanderley é um dos nomes confirmados na 2ª edição do Festival RioMar de Literatura, que acontecerá em 14 de setembro, com uma programação diversificada. Paulo Vanderley é autor do livro Luiz Gonzaga 110 anos do nascimento. Este ano o evento faz homenagem a cultura nordestina.

O evento acontece no Teatro RioMar Fortaleza.

Com a temática “Cultura Nordestina em cada palavra”, o festival receberá escritores renomados, artistas e o público apaixonado pela rica cultura nordestina. Com uma programação gratuita e diversificada, que inclui homenagens, debates, apresentações artísticas e um show de encerramento, o festival destaca a importância da Literatura Nordestina para a construção do imaginário popular da região.

Nenhum comentário

CICLO DO CORDEL REALIZA PALESTRA NO SERTÃO DO PAJEÚ

 O Sertão do Pajeú, berço dos mais originais estilos literários, receberá mais uma ação formativa gratuita do projeto "Ciclo do Cordel", onde alunos de escolas públicas terão acesso ao ensino teórico e prático de um cordel. Com incentivo do Funcultura, o projeto inicia nesta segunda, 26/8, na EREF Doutor Diomedes Gomes Lopes, em Iguaracy (PE) e na EREM Aristaque José de Veras, na Ingazeira (PE).

Os participantes abordarão a origem da Literatura de Cordel, suas especificidades técnicas de criação (métrica, rima e oração), escrita criativa, seus meios de circulação, entre outros dados técnicos da manifestação popular, com um total de 40h/ aula de formação. 

Serão oficineiros os integrantes do Clube do Cordel: Natália Oliveira, Carla Santana, Francisca Araújo, Thaynnara Queiroz e  Nilson Gonçalves, grupo que há anos vem fortalecendo a cena do Cordel em eventos e projetos: o Clube do Cordel nasceu com o propósito de fomentar a produção literária e estimular a formação de novos cordelistas através da união da cultura e da educação de maneira prazerosa e significativa para os alunos. A proponência do projeto é da poetisa Francisca Araújo e Luna Vitrolira é a idealizadora deste Ciclo do Cordel para o Funcultura; enquanto Taciana Enes assina a produção executiva. O incentivo é do Funcultura.

Francisca, que é natural de Iguaracy, destaca a importância de levar a projeto a sua terra: "Falar sobre literatura de cordel é muito importante para o fortalecimento da escrita e da cultura da oralidade. É muito especial para mim poder trazer à minha cidade um projeto como este, especialmente, por contemplar estudantes da rede pública na escola onde estudei e trabalhei há alguns anos atrás", afirma.

UM CORDEL PARA CHAMAR DE SEU-Durante a formação, os alunos ainda serão apresentados aos principais cordelistas do repertório popular, além do destaque para a produção literária feminina. O curso também oferecerá certificado e a criação (diagramação) e impressão dos folhetos. 

Como culminância, um sarau que será apresentado pelos poetas integrantes do coletivo "Clube do Cordel" e os alunos, fomentando a oralidade e a escrita na poesia popular: será online, através do link youtube.com/@clubedocordel8022 no dia 01º de setembro, às 10h. É possível acompanhar mais detalhes do projeto em instagram.com/clube.do.cordel .

Nenhum comentário

VEGETAÇÃO INTELIGENTE E RIQUEZA CULTURAL: A CAATINGA É MUITO MAIS QUE A SECA E ESCASSEZ

A Caatinga cobre cerca de 11% do território brasileiro, incluindo todos os Estados do Nordeste e o norte de Minas Gerais, e é o único bioma exclusivamente brasileiro, com aproximadamente 380 espécies endêmicas. No entanto, a região é vista como paisagem proscrita, renegada e frequentemente associada a rusticidade, escassez, seca e miserabilidade. Uma pesquisadora da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo (FAU) da USP investigou os significados negativos atribuídos a esse bioma e propõe abordagens pedagógicas para promover uma visão mais positiva do semiárido brasileiro.

A partir de entrevistas, visitas ao sertão nordestino e acesso a bibliografia científica, jornais e obras literárias, a pesquisa encontrou indícios de que a desvalorização desse bioma pode estar associada a narrativas deturpadas difundidas pela mídia, obras literárias e ações governamentais. RI.CA.ATINGA: o semiárido clama pela valorização de sua riqueza é o título da tese defendida pela nordestina Andreia de Araújo. Há quase duas décadas morando em São Paulo, a arquiteta não esquece de suas raízes e deseja ver a riqueza do semiárido nordestino reconhecida.

A investigação começou por visitas às cidades nordestinas no Agreste Pernambucano – Bezerros, Caruaru e Gravatá – em busca de um entendimento da relação entre a região e as pessoas que nela viviam. A pesquisadora conversou com distintos atores da sociedade, usando uma abordagem fenomenológica em que “a construção de um olhar é feita a partir da imersão, com intenção aberta a todas as possibilidades, sem julgamento nem conceito prévio”. Entre os entrevistados, estavam o famoso xilogravurista J. Borges, um agente turístico e um casal de advogados. Alguns temas de pertencimento surgiram na conversa, como o laço emocional que eles tinham com a terra e com as pessoas, que as mantinham conectadas ao lugar. A valorização dos aspectos locais e relatos nostálgicos referenciavam imagens bucólicas na infância. “Os relatos encontrados contrariavam as narrativas que as mídias divulgavam sobre o povo nordestino”, diz.

Em seguida, Andreia coletou depoimentos – de forma virtual, por conta da pandemia – em uma oficina montada por ela. O tema foi Visões das paisagens brasileiras, e atividade foi feita durante a Semana de Arquitetura e Urbanismo & Design. A proposta era investigar a percepção das pessoas (64% do Sudeste, 20% do Nordeste e 14% do Sul) sobre a Caatinga antes e depois de uma ação pedagógica que ela faria logo depois da oficina.

Inicialmente, foram apresentadas ao público imagens de diversas paisagens brasileiras, incluindo Amazônia, Pantanal, Mata Atlântica, Campos Sulinos e Cerrado. As pessoas foram questionadas a respeito de impressões que tinham sobre essas regiões e os adjetivos que associavam a cada paisagem. Em relação à Caatinga, as respostas foram predominantemente negativas, com palavras como “morte”, “secura”, “aridez”, “deserto”, “tristeza”, “povo sofrido” sendo frequentemente mencionadas. “As imagens verdejantes, mesmo sendo da Caatinga, foram menos apontadas, ou sequer foram selecionadas pelos participantes”, conta a pesquisadora.

No entanto, outros ícones importantes da cultura brasileira, como Luiz Gonzaga e Ariano Suassuna, enaltecem o Nordeste e a cultura regional. Em uma de suas canções, Luiz Gonzaga ilustra a representatividade das grandes feiras – que foram responsáveis pelo surgimento e crescimento de algumas importantes capitais regionais, como Feira de Santana, Caruaru, Garanhuns, Mossoró, entre outras, abastecidas pelas produções vindas dos brejos (áreas úmidas e pantanosas).

Na canção A Feira de Caruaru,  Luiz Gonzaga dizia: “A Feira de Caruaru faz gosto a gente ver, de tudo que há no mundo nela tem pra vender… Tem massa de mandioca, batata assada, tem ovo cru, banana, laranja e manga, batata-doce, queijo e caju, cenoura, jabuticaba, guiné, galinha, pato e peru. Tem bode, carneiro e porco, se duvidar isso é cururu. Tem bode, carneiro e porco, se duvidar isso é cururu”.

Na canção Luar do Sertão, Luiz Gonzaga celebrou a noite sertaneja: “Não há, ó gente, oh! Não, luar como esse do sertão…Oh que saudade do luar da minha terra. Lá na serra branquejando, folhas secas pelo chão. Este luar cá na cidade tão escuro não tem aquela saudade, do luar lá do sertão”.

A pesquisadora cita também o escritor modernista Mário de Andrade, que defendeu o semiárido nordestino em relatos de suas viagens ao Norte e Nordeste do Brasil, no final da década de 1920. Suas observações foram publicadas em crônicas, colunas e entrevistas no jornal Diário Nacional, onde atuava como redator, em janeiro de 1929.

“Vatapá, cavala em molho de coco, doces de comer pouco, deliciosos […] creme de camarão, casquinhas de caranguejos, o chouriço daqui é um doce, a canjica daqui inteiramente diversa da sulista … (Trecho das crônicas de Mário de Andrade, Diário Nacional, janeiro/1929).

Nenhum comentário

PRFESSOR MAIADSON VIEIRA: O SILENCIAMENTO E ESQUECIMENTO DA MEMÓRIA DE LUIZ GONZAGA TEM PROVOCADO MARCAS PROFUNDAS

 Com o pouco público registrado na Missa da Saudade, celebrada em Exu. Pernambuco, Parque Aza Branca, para celebrar os 35 anos de morte de Luiz Gonzaga, o professor Maiadson Vieira, responsável pela disciplina batizada de Cultura Gonzagueana, alerta para o que ele denomina de "Apagão Cultural, o esquecimento da Cultura". quando tô estudando sobre cultura, política e sociedade, um dos pontos mais fortes é justamente esse que você muito bem citou:

"Cultura é feita pelo povo e para o povo, os governos/secretarias de cultura tem a função de fomento, para que os artistas/produtores de cultura popular continuem mantendo essas manifestações vivas. Acontece justamente o contrário, as secretarias\governos decidem quem produzirá e quem não produzirá, colocam sua logomarca e deixam perecer todas aquelas que eles não aprovarem, tiram fotos e postam nas redes fakes de valorização da cultura, quando o ano inteiro eles nem sequer visitam esses artistas pra saber se ele tá conseguindo manter a manifestação cultural dele. Um evento cultural nasce, e outros perecem por falta de suporte de gestão".

Maiadson Vieira que nasceu em Exu, e atualmente é professor no município de Santa Cruz da Venerada, proporcionou no ano de 2022, aos Estudantes do 1º ano do ensino médio da Escola Estadual São Vicente de Paula, em Exu, no Sertão de Pernambuco, a oportunidade de aprender mais sobre o cantor e compositor Luiz Gonzaga. Batizada de ‘Cultura Gonzagueana’, a disciplina optativa pretendia levar aos educandos conhecimento sobre a cultura e história local, tendo como base a vida e carreira do maior ícone do município, o Rei do Baião.

“Seguimos na luta, porque agir não precisa ser combinado com o silenciar. Da pra protestar, dá pra lutar e ao mesmo tempo agir. Uma coisa não impede a outra e vice versa. Iniciativas como esta eletiva proporcionam a manutenção da cultura e da história local, valorizando as temáticas abordadas na obra do pernambucano do século, gerando assim, o sentimento de pertencimento dos alunos para com a cultura e a história local, promovendo ainda a democratização cultural e uma educação cultural efetiva para os educandos”, afirma o professor Maiadson Vieira, responsável pela disciplina.

Mesmo a disciplina ‘Cultura Gonzagueana’ não sendo obrigatória, o professor considera uma grande conquista aproximar os estudantes de Luiz Gonzaga. “Apesar de ser uma disciplina eletiva, ela quebrou os muros da escola e introduz em sala de aula o autêntico poder da cultura popular”, avalia.

Maiadson Vieira recebeu o título de Moção de Aplausos concedido pela Câmara de Vereadores de Petrolina, autoria do então vereador Cesar Durando.

O advogado Jaiminho de Exu, cantor e compositor, em conversa com a REDEGN, disse que as manifestações pela passagem dos 35 anos de partida do nosso querido Luiz Gonzaga mais uma vez passou em branco sob a ótica dos governos municipal, estadual e federal na sua terra natal Exu".

"Se não fosse uma reunião feita por amigos gonzagueanos sanfoneiros e simpatizando organizado por voluntários e a Ong Parque Aza Branca o dia 02 de agosto teria passado em branco na terra do rei. Mais um ano sem nenhum fomento, apoio e atenção dos órgãos públicos ao maior artista brasileiro principalmente no seu torrão Natal", finalizou Jaiminho.

CONFIRA TEXTO PROFESSOR MAIADSON VIEIRA: Eu acredito que o que está acontecendo na cidade de Exu, Pernambuco já é um problema muito antigo, posto que, a ausência de educação cultural por parte dos governantes, acarreta na ignorância cultural de seu povo. A minha formação cultural se deve ao meu professor do fundamental I, pois, o Estado de Pernambuco fornecia as disciplinas de Cultura Pernambucana e Geografia de Pernambuco, e isso pra mim era inspirador. Meu professor da 2ª e 3ª série, fez questão de naturalizar em sala de aula a vida e obra de Luiz Gonzaga, e sempre nos levava pra ter aulas nos terreiros mais importantes da cultura popular pernambucana; o Parque Aza Branca.

Lembro que inúmeros artistas da terra sempre estavam dentro das salas de aula e a gente mesmo sem saber o que era cultura, tinha vivências com ela. Naquele período havia investimento em cultura! Coisa que não se tem mais. Cultura deixou de ser prioridade! É Inadimissivel completarmos 35 anos de ausência de Luiz Gonzaga e não termos um evento público alusivo a ele. Em contra partida, inúmeros outros eventos privados o homenagearam de maneira mais tímida. É necessário que o poder público comece a dirigir energia a salvaguardar e proteger em sua própria cidade Luiz Gonzaga, que nos compreende, nos representa e que dá sentido a nossa caminhada como conterrâneos dele e amantes dele.

Quando eu criei a eletiva de Cultura Gonzagueana, eu me inspirei no meu professor do ensino fundamental Moisés Lopes, posto que, os artistas populares devem invadir as escolas e as salas de aula, para que possamos preservar a nossa memória e a nossa cultura. Eu sempre costumo dizer que quando educadores se unem em prol da cultura e da poesia popular, a gente consegue popularizar o ato de ser sensível. E é disso que Exu precisa, de sensibilidade cultural para a nossa história. Foi isso o que eu tentei, apesar de ter encontrado inúmeras barreiras na cidade, por exemplo, no período da disciplina Cultura Gonzagueana, nós ganhamos Moção de Aplausos na Câmara de vereadores de Petrolina, enquanto fomos esquecidos na nossa própria cidade. O que tem acontecido aqui é inexplicável, não há valorização pelos que ainda são fazedores de cultura, artistas populares e amantes da cultura que, não havendo suporte e dignidade pra os seus trabalhos acontecerem, acabam desistimulando de continuarem perpetuando a cultura e a memória local.

Se não existirem medidas urgentes para salvaguardar, estruturar e fomentar a manutenção da memória e da história do povo exuense, do povo pernambucano e do povo nordestino, aos poucos vamos perdendo aquilo que há de mais precioso: nossa cultura. Uma vez eu li que pra se apagar um povo, primeiro faz-se necessário apagar a sua cultura, a sua memória e a sua história, e em Exu, esse apagamento, silenciamento e esquecimento da memória de Luiz Gonzaga tem feito marcas profundas em seu povo.

Quando se fala em cultura, além das tradições e  e da reparação histórica pela memória de Luiz Gonzaga, a gente também fala sobre renda na mesa dos artistas, de todo o comércio local e de todo o povo. Ter uma cultura ativa, e um local que acolhe bem os visitantes, também é necessário! Mas como acolher bem os visitantes, se a cidade ainda não consegue acolher nem o seu povo? Luiz Gonzaga nunca foi bem acolhido em Exu, e a prova disso é como andam as atividades que celebram sua memória e existência. É desesperador como estamos sofrendo com a falta de compromisso com a obra de quem tanto colaborou para sermos quem somos hoje. Essa semana nós tivemos mais um dia 02 de agosto em que a cidade esvaziou-se da memória do Luiz Gonzaga e o setor público nada fez. Comemoramos nas iniciativas privadas... Não deveríamos estar mendigando cultura dentro da cidade do maior ícone dela, não é verdade?

Enfim, tenho esperanças de que algum dia Luiz Gonzaga seja de fato rei dentro de sua própria cidade, porque no mundo inteiro ele já é homenageado, amado, querido e celebrado! Nós temos uma dívida histórica com seu legado, resta saber quando conseguiremos pagar. Por enquanto, resta doer o peito, limpar as lágrimas e fazer o trabalho de formiguinha de lutar pelo que é nosso, pois quando se trata de Gonzaga, ele apenas nasceu em Exu e se compôs, mas, ele pertence a todo o povo nordestino que o celebra e o ama.

Nenhum comentário

LIVRO ANALISA A NATUREZA NA OBRA DE GUIMARÃES ROSA

A relação simbiótica da obra de João Guimarães Rosa com o mundo natural é o objeto de estudo da bióloga e professora mineira Mônica Meyer. Fruto de tese de doutorado apresentada na Universidade Estadual de Campinas em 1998, o livro “Ser-tão natureza: a natureza em Guimarães Rosa” foi publicado pela Editora UFMG em 2008 e teve duas reimpressões (a mais recente é de 2019). Na apresentação, Meyer narra a emoção ao consultar o Arquivo Guimarães Rosa, sob guarda do Instituto de Estudos Brasileiros da USP, e ter acesso aos originais então inéditos de “A boiada”, com as anotações do autor sobre sua viagem ao sertão mineiro em 1952. “Coração de mineira disparava em sístoles e diástoles, semelhante ao voo do pica-pau descrito no diário de viagem”, compara. “Me sentia coletando pedras preciosas das Minas Gerais, distante geograficamente, mas tão pertin, naquele momento mágico, do coração.”

Dividido em quatro capítulos, o livro de Mônica Meyer oferece minuciosa e preciosa análise sobre a forma pela qual o autor incorporava o mundo natural em suas obras. “A natureza para Guimarães Rosa não se apresenta como um espetáculo ou uma coleção de aspectos naturais compondo um cenário ou um palco, onde se desenrola a aventura da viagem. O ambiente/sertão não está separado das pessoas, dos bichos, das plantas, e sim dentro de cada um, caracterizando o jeito de ser e de viver”, destaca a professora.

Para Mônica Meyer, as paisagens em “Grande sertão: veredas” são vivas e mutáveis, reconstruídas e recriadas internamente pelo narrador, Riobaldo, com conhecimento e sentimento. Ela afirma que a paixão de Guimarães Rosa pelo mundo natural se revela na forma poética de citar e descrever plantas, animais, rios, morros... “O espaço é esquadrinhado em quatro dimensões ligando os elementos do céu, da terra, da água e do fogo.” Flores, cores (o amarelo traduz a paixão do autor pelo cerrado, afirma Meyer), passarinhos, bois, até os tipos de capim que compõem a paisagem nos escritos do mineiro são descritos e analisados pela professora aposentada da Faculdade de Educação da UFMG.

Ao visitar a região, em 1993, ela chegou a entrevistar Manuelzão, um dos integrantes da comitiva de Rosa, e incluiu no livro um depoimento do vaqueiro que já chamava a atenção para as transformações no ecossistema.

“Hoje tudo é eucalipto (...). Aqui é a Vereda Grande. Na vereda tem só água que nasce na vereda. Mas assim mesmo, a areia daqui deste lugar vem com o trator limpa a vereda, limpa o eucalipto. A água da enxurrada carrega areia prá veredas vai entupindo as vereda. Vai indo até que as veredas acaba secando. Mas hoje não encontra quase nada, não. No meio do eucalipto não tem nada. Nem marimbondo gosta de eucalipto.”

Mônica Meyer lembra que ela e Manuelzão chegaram a se perder em meio aos eucaliptos perfilados “como um gigante”. “Em três décadas observo o avanço desenfreado e galopante do eucaliptal, a instalação do agronegócio com o uso de pivôs, a pulverização de agrotóxicos, a diminuição, assoreamento e morte das veredas”, lamenta. Mas ela também guarda boas recordações. “Me causou impacto a beleza das veredas ornada com buritizais de variadas tonalidades, orquestrada pelo som dos ventos, das araras, das maritacas, das águas: exercitei o olhar e descobri ‘buritis meninos’, ‘folhas que se dedeiam’”, lembra.

 Leia, a seguir, a entrevista da autora de “Ser-tão natureza” ao Estado de Minas.

O que diferencia Guimarães Rosa de outros autores brasileiros do século 20 na representação do mundo natural?

A natureza é descrita em arranjo caprichado, transformada em personagem viva, dinâmica e animada rebrilhando na luz e na escuridão plena de significados e recados. Guimarães Rosa ultrapassa uma concepção reducionista, estreita e imediatista que concebe a natureza apenas como cenário, recurso natural e mercadoria. A proximidade, intimidade e aprendizado do sertanejo com mundo natural resultam um processo de integração entre cultura e natureza, que atravessa o ser-tão. O escritor se ocupa em revelar em sua obra que o sertão não é apenas um espaço biogeográfico, de uma riqueza extraordinária em cultura popular, de um patrimônio natural ancestral e exuberante. O ser-tão é também metafísico, traduz a linguagem animada dos seres vivos, dos ventos, das águas, da terra. A natureza concebida e representada como um ritual de passagem para alcançar a espiritualidade e a transcendência.

O que é mais notável na forma que Guimarães Rosa representa a natureza em “Grande sertão: veredas”? João Guimarães Rosa apresenta uma cartela de cores, cheiros, sons, luzes e sombras do cerrado, bioma presente em grande parte do Brasil. “Grande sertão: veredas” traduz perfeitamente essa natureza “belimbeleza”, viva e pulsante. O escritor descreve a diversidade da flora e fauna irmanada, imbricada, integrada aos rios, mares de montanhas, morros, serras, chapadas, grotas, céu de nuvens e constelações. A narrativa flui com melodia e delicadeza filosófica, estética e poética que transporta o leitor para um uni-verso móvel, sinestésico, que o faz sentir e imaginar aquele microcosmo sertanejo criado, ruminado de recordações, experiências, conhecimento e sentimento em puras misturas. A presença de onomatopeias é recorrente e a leitura em voz alta traz encantamento e facilita a compreensão do texto.

Como as percepções e impressões da viagem de Guimarães Rosa acompanhando uma boiada no início dos anos 1950, anotadas em cadernetas, se refletiram em “Grande sertão: veredas”?

 As anotações da viagem ao sertão de Minas em 1952, acompanhando a Boiada, foram recriadas no romance “Grande sertão: veredas” e principalmente em “Corpo de baile”, publicado também em 1956. Há múltiplas e distintas referências aos bois, paixão do escritor. Os passarinhos e as aves em geral ganham um destaque especial em refinados detalhes, assim como os insetos. Os lugares por onde a Boiada passou pousou são representados. Por exemplo: o encontro emblemático entre Riobaldo e Reinaldo no porto do Rio-de-janeiro, afluente do Rio São Francisco. A descrição das canoas, os sacos de arroz atados com folha nova de buriti e o pau d’óleo confere com as notas do dia 14 de maio de 1952, registradas durante a permanência na Fazenda da Sirga. Outra fazenda, a Santa Catarina, localizada em Andrequicé e pouso da comitiva da Boiada em 21 de maio de 1952, adquire relevância no romance, pois marca o encontro amoroso entre Riobaldo e Otacília. A identificação da flor caeté, de cor branca perfumosa, metaforicamente representa e sela um compromisso entre eles. O expressivo, e significativo, apelido de casa-comigo é a resposta que Otacília dá a flor. Em “Grande sertão: veredas”, o tempo e as ações transcorrem em sintonia com o calendário ecológico, as estórias e o saber tradicional do sertanejo se entrelaçam na trama do texto.

O livro chama atenção para o fato de Guimarães Rosa revelar, em suas anotações no início dos anos 1950, preocupação com desmatamento. Poderia citar como o escritor explicitou essa e outras questões ambientais?

 Antes de chegar à Fazenda da Sirga, de onde saiu a Boiada, Guimarães Rosa observa o desmatamento em marcha e a presença de eucalipto. Ele manifesta sensibilidade e preocupação pela destruição depredatória que avança sem interesse em conhecer a biossociodiversidade do cerrado. Retoma o tema no conto “As margens da alegria” que conta, pelo olhar de uma criança, as impressões sobre a construção de uma grande cidade, que mesmo não nomeada sabemos se tratar de Brasília. O escritor se ocupa principalmente em revelar e exaltar em sua obra literária a natureza entrelaçada com a cultura popular. O sertão não é um deserto, árido, inóspito e violento, essa visão estereotipada que predomina no senso comum. Os gerais, esse sertão móvel regido pelo calendário da natureza com seus ciclos de seca e chuva, de sons e silêncios, beleza e pobreza, cheio de contrastes, de vida e embates. O escritor nos convida a sair de uma inércia mental, do óbvio e do senso comum para o exercício da observação, da aprendizagem, de uma viagem pelo sertão físico e metafísico, a fazer uma travessia. (Fonte Jornal Estado de Minas)

Nenhum comentário

← Postagens mais recentes Postagens mais antigas → Página inicial