SILVERIO PESSOA SOLICITA EXONERAÇÃO DO CARGO DE SECRETÁRIO DE CULTURA DE PERNAMBUCO

Silvério Pessoa não está mais à frente da Secretaria de Cultura do Estado. Em comunicado divulgado à imprensa nesta quinta-feira (20),  o ex-gestor da pasta afirmou que se despede do cargo "com o sentimento de dever cumprido e a certeza de ter dado voz a quem muitas vezes está à margem do processo".

Em entrevista exclusiva concedida à Folha de Pernambuco no início da atual gestão do Governo do Estado, Silvério afirmou ter recebido com surpresa a Secretaria. "Foi um mix de surpresa e de desafio, mas ao mesmo tempo de muita leveza", comentou, à época.

Sete meses após assumir a pasta na Cultura, Silvério deixa o cargo exatamente na véspera do Festival de Inverno de Garanhuns (FIG 2023), com início nesta sexta-feira (21) na cidade agrestina.

Em nota a governadora Raquel Lyra, agradeceu pelos serviços prestados por Silvério, enquanto esteve à frente da Secretaria de Cultura de Pernambuco:

“Agradeço a Silvério pela dedicação à frente da Secretaria de Cultura e por todo o trabalho de escuta e    execução de ações estruturadoras para o setor, incentivando diversas linguagens e expressões culturais e valorizando os nossos artistas”.

Confira a carta assinada por Silvério à governadora Raquel Lyra, entregando o cargo na secretaria:

Governadora Raquel Lyra,Hoje as minhas primeiras palavras são de despedida e gratidão.

Agradeço a confiança pelo convite para o honrado cargo de secretário de Cultura do Estado de Pernambuco, posição que com dedicação ocupei nos últimos meses. Como em todos os ciclos da vida, no entanto, chegou o momento de encerrar essa jornada: sem dúvidas, tempo de aprender, tempo de semear as bases de uma política cultural mais múltipla e democrática no nosso Estado.

Despeço-me do cargo com o sentimento de dever cumprido e a certeza de ter dado voz a quem muitas vezes está à margem do processo, valorizando nossos artistas e suas mais variadas expressões e linguagens inseridas também nas culturas das periferias em todo o Estado.

Estruturar e fomentar a política cultural de um Estado tão rico e diverso como Pernambuco não é tarefa simples, mas tenho a convicção que contribui com o processo. Nesse período, trazer à tona o debate sobre a pedagogia da cultura e a multiculturalidade e riqueza da cultura periférica, através do “Fala, Periferia”, que lançamos em abril, são exemplos de ações estruturadoras que por certo renderão bons frutos.

Implantamos com a Secretaria de Educação o projeto de alfabetização dos mestres e mestras da Zona da Mata e promovemos muitas escutas através do “Secult de Andada”, percorrendo quase 1.500 km visitando e me reunindo com aqueles que têm dificuldades em obter acesso ou qualquer tipo de apoio.

Estruturamos a execução da Lei Paulo Gustavo e fomos o primeiro estado do Nordeste e um dos primeiros estados do Brasil a ter o plano de ação aprovado e os recursos liberados.

O olhar para as diferenças e particularidades de cada linguagem esteve presente no nosso cotidiano, refletindo a construção das ações de uma política cultural forte e pulsante, marcada pela valorização dos artistas pernambucanos.

Premissas que também marcam a organização do 31º Festival de Inverno de Garanhuns, que se inicia nesta sexta-feira (21), com a presença dos nossos talentos, acompanhados de tantos outros nomes da cena artística e cultural do nosso país.

Decidi dedicar meu tempo agora para minha carreira e, também para a docência, pois como artista e professor sinto falta dos palcos e da sala de aula.

Agradeço ao time da Secretaria, que esteve junto comigo nesta jornada, desejando muito sucesso e novas conquistas para os que seguem na missão de mudar Pernambuco.

Por fim, agora como artista e pernambucano, seguirei na torcida e sempre à disposição, em outros palcos, em defesa da nossa cultura.

Silvério Pessoa.

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RIO SÃO FRANCISCO ESTÁ SENDO INVADIDO POR ESPÉCIES DE PEIXES QUE NÃO SÃO NATIVOS DO VELHO CHICO, ALERTA PESQUISADOR

O rio São Francisco está sendo invadido por espécies de peixes que não são nativos do Velho Chico. Isto está sendo constatado principalmente no baixo curso do rio. Segundo o professor da Universidade Federal de Alagoas (UFAL) e coordenador da Expedição Científica do Baixo São Francisco, Emerson Soares, os tucunarés, apaiaris e tilápias, que são ciclídeos, se adaptaram muito bem à região. 

“Além de serem prolíficos, com grande voracidade, e predadores, tem a questão do aumento da salinidade, devido a retenção de água para geração de energia elétrica e irrigação. Também há as espécies costeiras que adentram nas águas interiores que competem com os organismos nativos de água doce por alimento. Estas são desfavorecidas pela mudança de qualidade de água. Dentre as espécies de peixes costeiras que adentram no continente, citamos camurupim, robalos, tainhas, baiacus e xaréus, por exemplo”, explicou.

Soares acrescentou que o novo perigo são espécies exóticas oriundas da Ásia, trazidas por aquicultores para cultivos intensivos na região e, que por algum problema como enchentes ou rompimento de tanques escavados com fuga de espaços confinados, acabam indo parar no rio, tais como o panga ou o camarão da Malásia.

Para o presidente do Comitê da Bacia Hidrográfica do Rio São Francisco, Maciel Oliveira, o Comitê vê estes estudos com grande preocupação. “Essas espécies invasoras trazem enormes prejuízos, a exemplo do tucunaré, que é da região Norte do país, e que aqui já se encontra há muito tempo. Existem outras espécies que também estão sendo citadas, como o panga. Entretanto, a nossa maior preocupação é com relação ao mexilhão dourado que pode trazer enormes prejuízos econômicos, socioambientais e para a população ribeirinha. Iremos cobrar das autoridades competentes um plano de ação e monitoramento que seja efetivo para o combate ao mexilhão dourado aqui na região do Baixo São Francisco e em toda a extensão da bacia”.

O pesquisador da UFAL complementa que as espécies invasoras podem causar desequilíbrio ecológico, com o aumento da predação de espécies nativas, bem como vão competir por alimento e por espaço com organismos locais, e que podem transmitir parasitoses e enfermidades à população. “O mexilhão dourado é outra espécie perigosa, que se alastra e ocupa o ambiente rapidamente e traz problemas para bombas e estações de abastecimento dos municípios, o que acarreta em um aumento dos custos de tratamento da água”, pontuou Emerson Soares.

É importante ressaltar que medidas importantes precisam ser tomadas para minimizar o dano ao rio São Francisco, e o professor da UFAL citou que o aumento da fiscalização, uma legislação mais rígida contra espécies exóticas, ordenamento da atividade aquícola (medidas de controle e de prevenção de fugas de peixes de piscicultura), a promoção de ações para captura e retirada destas espécies da região, como pesca e extração das espécies exóticas do ambiente, promoção de políticas de incentivo ao uso destas espécies na cadeia produtiva, tais como produção de farinha de peixe, uso de casca do mexilhão para fabricar tijolos e cobogós na construção civil, uso destes organismos como biofertilizantes, produção de adubos, a produção de silagem, a promoção de torneios de pesca controlada e esportiva com vistas a soltar as espécies nativas e capturar peixes exóticos, são bons exemplos para a busca da diminuição das espécies invasoras na região do Baixo São Francisco.

A Expedição Científica, por exemplo, tem trazido muitas informações sobre estas espécies, já que tem monitorado o aparecimento delas e correlacionou com as mudanças da qualidade de água e no ambiente. Também tem estudado de que forma esses organismos vêm aparecendo na região e como têm se proliferado.

Pescador há mais de 30 anos, Rodrigo Vieira, de Neópolis (SE), relatou que algumas espécies invasoras estão prejudicando bastante o trabalho dos ribeirinhos, pescadores e outros moradores da região do Baixo São Francisco que indiretamente sobrevivem do que ele oferece. 

“Quando entramos no rio para pescar temos grandes prejuízos porque, inclusive, aparecem siris que danificam as redes, mexilhões que acabam atrapalhando o trabalho de todos os profissionais. Porém, o tucunaré que é considerado uma espécie invasora pelos cientistas e demais pesquisadores acabou trazendo benefícios para nós, pois é fácil de pescar, bem como é vendável, circula bem economicamente”, finalizou. (CHBSF)

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PADRE CÍCERO A CAMINHO DOS 90 ANOS ENCANTAMENTO

 “O nome do padre Cícero / ninguém jamais manchará, / porque a fé dos romeiros / viva permanecerá, / pois nos corações dos seus / foi ele um santo de Deus / é e pra sempre será.” Tema de incontáveis folhetos de cordel espalhados pelas feiras sertão afora.

Quem já ouviu falar dos preceitos ecológicos do Padre Cicero, muitos o seguem como exemplo de fé e religiosidade, mas poucos sabem que ele foi um dos primeiros defensores do meio ambiente, do bioma caatinga.


Cícero Romão Batista nasceu em Crato, Ceará no dia 24 de março de 1844. Foi ordenado no dia 30 de novembro de 1870. Celebrou a sua primeira missa em Juazeiro em 1871. No dia 11 de abril de 1872 fixou residência em Juazeiro. Padre Cícero faleceu no dia 20 de julho de 1934, na cidade de Juazeiro.


A jornalista Camila Holanda escreveu que nas entranhas do Cariri do Ceará foi emergido uma versatilidade de ícones que, entrelaçados povoam o imaginário cultural que habita a região.


Nas terras do Ceará ouvi uma das mais belas histórias. Resumo: o teatrólogo, pesquisador cultural Oswaldo Barroso, ressalta um dos mais valiosos símbolos, a vigorosa força mítica e religiosa. Oswaldo, cidadão honorário de Juazeiro do Norte, diz que a primeira vez que esteve no Cariri foi nos anos 70 e a experiência fez com que suas crenças e certezas de ateu fossem desconstruídas e reconstruídas com bases nos sentimentos das novas experiências e epifanias vividas.


"Desde o início, não acreditava em nada de Deus. Mas quando fiz a primeira viagem ao Horto do Juazeiro do Norte, foi que eu compreendi o que era Deus. Isso mudou minha vida completamente", revelou Oswaldo.


Um outra narrativa importante encontrei na mitologia dos Indios Kariris. Nela a região é tratada como sagrada, centro do mundo, onde no final dos tempos, vai abrir um portal que ligará o Cariri  para a dimensão do divino.


A estátua do Padre Cícero encontra-se no topo da Colina. Muitos romeiros percorrem a Trilha do Santo Sepulcro. A pé eles percorrem às 14 estações trajeto marcado por frases e conselhos ambientais do Padre Cícero, que já alertava naquela época para os muitos desequilíbrios ambientais e impactos da agressão humana na natureza.


Padre Cicero descreveu os preceitos ecológicos:

1) Não derrube o mato, nem mesmo um só pé de pau;
2) Não toque fogo no roçado nem na caatinga;
3) Não cace mais e deixe os bichos viverem;
4) Não crie o Boi e nem o bode solto; faça cercados e deixe o pasto descansar para se refazer;
5) Faça uma cisterna no oitão de sua casa para guardar água de chuva;
6) Não plante em serra a cima, nem faça roçado em ladeira que seja muito em pé; deixe o mato protegendo a terra para que a água não a arraste e não se perca sua riqueza;
7) Represe os riachos de 100 em 100 metros, ainda que seja com pedra solta;
8) Plante cada dia pelo menos um pé de algaroba, de caju, de sabiá ou outra árvore qualquer, ate que o sertão todo seja uma mata só;
9) Aprenda tirar proveito das plantas da caatinga a maniçoba, a favela e a jurema; elas podem ajudar a conviver com a seca;
10) Se o sertanejo obedecer a estes preceitos a seca vai aos poucos se acabando o gado melhorando e o povo terá sempre o que comer, mas se não obedecer, dentro de pouco tempo o sertão todo vai virar um deserto só.

Rezemos com Fé! . Os sorrisos são a alegria da alma.
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MINISTRA DA CULTURA GANHA LIVRO LUIZ GONZAGA 110 ANOS DO NASCIMENTO E É CONVIDADA PARA VISITAR EXU

A trajetória épica de um dos maiores ícones da cultura brasileira ganhou ainda mais forma com o lançamento do livro Luiz Gonzaga: 110 anos do nascimento, do autor paraibano Paulo Vanderley. O livro chegou até as mãos do atual presidente Luiz Inácio Lula da Silva e na última quinta-feira (13) também da Ministra da Cultura Margareth Menezes.

"Voltando de Brasília com o coração carregado de boas memórias e o peito repleto de esperança. Fomos recebidos pela Ministra da Cultura, Margareth Menezes, na sede do ministério da cultura, acompanhado por Fabiano Piúba, Secretário de Formação Cultural, Livro e Leitura do Minc. Foi um momento emocionante e significativo, pois podemos apresentar pessoalmente, junto com o diretor da Editora Viu Cine, Ulisses Brandão, nosso livro:  "Luiz Gonzaga: 110 anos do Nascimento", escreveu Paulo Vanderley em suas redes sociais.

De acordo com Paulo Vanderley, o livro é escrito em primeira pessoa, com o próprio Rei do Baião contando sua história, a partir de uma intensa pesquisa em acervos de entrevistas. O projeto também está em formato de áudio, narrado pelo próprio biografado a partir desse material. 

"Dessa forma, o público consegue ter acesso ao conteúdo de parceiros musicais e os herdeiros de Seu Luiz Gonzaga no forró em diversas plataformas".

Paulo Vanderley é pesquisador, criador e mantenedor do mais completo site de Luiz Gonzaga no Brasil www.luizluagonzaga.com.br

De acordo com Paulo, durante o encontro, ele teve a oportunidade de compartilhar com a Ministra Margareth Menezes a importância de preservar e valorizar nossa rica cultura popular, representada brilhantemente por artistas como Luiz Gonzaga e muitos outros que continuam esse legado no Nordeste. 

"A propósito, convidei a ministra para conhecer a cidade de Exu, berço do Rei do Baião e fonte inspiradora  de suas criações. Viva Seu Luiz Gonzaga", finalizou Paulo Vanderley.

Exu é a terra onde nasceu Luiz Gonzaga e a mulher revolucionária Barbara de Alencar.

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ACERCO DO RÁDIO É UM DOS PRINCIPAIS DESTAQUES NA EXPOCRATO 2023

Há 100 anos, o rádio como conhecemos hoje tinha as primeiras ondas sonoras transmitidas no Brasil, e Roquette Pinto, nome importante para a radiodifusão brasileira, previa o sucesso deste meio de comunicação. Porém, a ação de comunicar a partir do som nasceu em solo brasileiro ainda em 1899, com o inventor do rádio, o Padre Roberto Landell de Moura.

Um pedaço desta paixão pelo Rádio pode ser admirado no Festival Expocrato 2023 que teve início no domingo (9) e segue até o dia 16 de julho no Crato, município do Cariri cearense. Trata-se da Exposição, acervo pessoal,  do radialista e Jornalista Antonio Vicelmo proporcionando aos visitantes do evento uma "visão dos aparelhos radiofônicos".

Na exposição é possível encontrar Rádios da década de 40 e 50 e lógico os mais modernos, sintonia em FM. Encontramos o ABC A Voz de Ouro, Transglobe, Semp,  Caravelle, Motoradio, Philco 8 faixas.

O jornalista, radialista e escritor, Antônio Vicelmo do Nascimento, ganhou recentemente a Medalha do MéritoBárbara de Alencar, a mais alta honraria concedida pelo poder público municipal cratense, às pessoas que prestaram relevantes serviços ao Município.

Com mais de cinco décadas de atuação na imprensa, Vicelmo é também advogado e poeta, sendo um dos grandes divulgadores da cultura brasileira, cearense e nordestina, destacando de forma relevante o Município do Crato, através de sua atuação como comunicador.

Por mais de três décadas trabalhou como repórter do Jornal Diário do Nordeste, além de ter atuado na TV Verdes Mares, também do Sistema, tendo sido correspondente através da sucursal do jornal, instalada na rua Tristão Gonçalves, em Crato. 

Ele inspirou a criação do caderno Regional do DN, pela ampla valorização da cultura regional e das riquezas do Cariri. Recentemente publicou a sua biografia, com o título "E Era Só… 50 anos de jornalismo",relatando a sua trajetória profissional.

Vicelmo é também um dos jornalistas que durante todos os anos de atuação em sua trajetória profissional, deu voz aos movimentos sociais da região, além dos grupos de tradição cultural, expandido a divulgação desses grupos.

Filho de Vicente Anselmo do Nascimento e Maria Do Carmo Simplício, Antônio Vicelmo do Nascimento nasceu em 10 de janeiro de 1942, em Brejo Santo, na região do cariri cearense. 

O jornalista e radialista e é casado com a bióloga Marisa Maria Rolim do Nascimento, com quem teve quatro filhos: Paulo Ernesto Arrais do Nascimento, João Ricardo Arrais, Marcos Eduardo Arrais e Pedro Henrique Arraes, falecido. Iniciou sua vida profissional como radialista na Rádio Araripe do Crato. Trabalhou na Ceará Rádio Clube, rádio Verdes Mares, TV Ceará e TV Verdes Mares. Foi editor do matutino Pré-nove e um dos fundadores do jornal Diário do Nordeste, o qual participou da cobertura de entrega dos documentos solicitando a reabilitação do Padre Cícero, no 

Atualmente trabalha na Rádio SomZoom Sat 

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SEVERINA BRANCA: O SILÊNCIO DA NOITE É QUE TEM SIDO TESTEMUNHA DAS MINHAS AMARGURAS

Com chão de poesia e terra batida sobre versos e tragos líricos, uma região nos rincões do sertão entre Pernambuco e Paraíba exala sentimento rimado. “Diz a lenda que quem bebe da água do Rio Pajeú vira poeta”, dizem. É a onipresença da poesia nas cidades de Ouro Velho e Prata, na Paraíba, e em São José do Egito, em Pernambuco, que mostra o documentário O Silêncio da Noite É que Tem Sido Testemunha das Minhas Amarguras, de Petrôneo Lorena.

Em tempos de tantas tragédias, um filme como este chega a ser um bálsamo para os corações machucados ou endurecidos pelas incontáveis tragédias que o país vem passando nos últimos tempos. Afinal, não é todo dia que se tem notícia de uma cidade onde a vida exala poesia popular. E isso não é apenas modo de falar: nas ruas, feiras, casas, nos mercados e em cada bar da região, o sentimento brota em forma de verso falado ou cantado.

“Aqui é o eixo, aqui é o terreno e quando você nasce numa aldeia, você vive, voa e espaceia, mas sempre dá retorno à sua aldeia. Aqui, o Pajeú, foi um foco de poesia, é chão de poesia. As plantas aqui é [sic] poeta, até a terra tem o cheiro da poesia e aqui é um micróbio pesado. Aí não tem como se desgarrar. Esse nome não pode ser perdido. São José do Egito é valoroso”, declara o poeta João Badalo em uma das muitas mesas de bar que servem de cenário para o filme.

O longo verso que dá nome ao filme faz alusão a uma das figuras centrais da cidade de São José do Egito: Severina Branca, a “Eleonor Rigby do Nordeste”, foi quem deu o mote ao poema de Didi Patriota. Musa e prostituta, poetisa e boêmia, Severina encantava os poetas da região e e era tema frequente dos versos falados e cantados por lá. “O título refere-se também à dor e à alegria de ser poeta; da cumplicidade da madrugada na criação desses versos num sertão conservador e da utilidade social que a poesia traz a essas pessoas”, declara o diretor Petrônio Lorena.

Hoje uma senhora com o corpo marcado pelas agruras da vida, Severina guarda na memória cada estrofe feita pelos homens que marcaram sua existência. E, mesmo durona e debochada, se emociona ao ouvir os versos de Patriota:

“Quando moça fui muito desejada

Das mulheres julguei a mais feliz

Mas o tempo cruel, velho juiz

Sentencia qualquer sonho de fada

A beleza foi sendo apagada

Cada um foi falso às suas juras

E eu peço a Deus lá nas alturas

Que me mostre na vida algum sentido

Que o silêncio da noite é quem tem sido

Testemunha das minhas amarguras”

Tão emblemática para a poesia daquelas bandas, Severina Branca é descrita – com imensa ternura poética em uma locução em off – como uma mulher à frente de seu tempo: “Severina Branca é uma figura gêmea, clonada com Eleanor Rigby. Enquanto Eleonor foi nascer em Liverpool, perto de John Lennon, Severina Branca nasceu em São José do Egito e teve o mesmo dinâmico modo de ser, como uma rapariga maravilhosamente liberta, linda, uma mulher autêntica, totalmente fora de preconceitos. Todos os prefeitos novos daquela terra do Pajeú passaram suas inocências pro coração de Severina Branca. É das que levam cachorro cheio de rabugem, arrastando e tomando cana pelos bares de todos os cantos. Eu sei que Severina fez um mote: ‘O Silêncio da noite é que tem sido testemunha das minhas amarguras’.”

Muito além de “apenas” musa, Severina também é autora de muitos versos, como o que relembra quando foi ignorada por um antigo grande amor. Ao declamar as linhas abaixo em um bar cheio de poetas, toma uma dose de cachaça e exclama saudosa: “Eita, nossa vida de prazer!”

“Pedi esmola a Abraãozinho

Este não me deu ouvido

Quem outrora me adorava

Não ouve mais meu gemido

Passa por mim torce a cara

Fingindo desconhecido”

Não é à toa que o ato de memorizar é chamado de “saber de coeur”, do francês, saber com o coração. É exatamente isso que os moradores de São José do Egito fazem: quem não faz verso, conhece de coeur as rimas dos grandes poetas e glosadores locais e declama nos bares, nas casas, nas festas, em todo e qualquer lugar. Tudo na região é motivo para dizer poesia, como afirma o jovem Antônio Marinho: “Nas rodas de conversa de São José sempre sai uma história de repente. Você vai engraxar o sapato aqui em São José e o engraxate lhe diz uma poesia. Aí você diz uma coisa pra brincar com ele e ele diz ‘Oxente, tá feito a poesia de não sei de quem’ e aí conta uma história e diz um verso. Se fala de tudo também, de futebol, de putaria, mas a poesia está sempre presente, é impressionante”.

Os amores, desamores e as amarguras da vida na região tem virado versos há várias gerações. Debochadas ou rebuscadas, magoadas ou matreiras, felizes ou deprimidas, as rimas dos poetas e poetizas daqueles rincões vem se transformando com o passar do tempo, mas a tradição da poesia oral se mantém acesa e, mesmo renovada, continua reverenciando os antigos trovadores.

O Silêncio da Noite É que Tem Sido Testemunha das Minhas Amarguras é o segundo longa-metragem de Petrônio e foi finalista entre os dez melhores filmes da 40ª Mostra Internacional de Cinema de São Paulo, em 2016. É uma ode ao sentimento genuíno, à riqueza da cultura popular, mas, acima de tudo, uma celebração da cultura e do povo nordestino. De tão leve, seus 78 minutos voam como a pomba símbolo do hino sertanejo, Asa Branca, composta pela dupla Luiz Gonzaga e Humberto Teixeira.

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MEUS AVOS MARIA E SEVERINO, RITA E ANTONIO

"Nos últimos anos, a Avó estava se dando muito mal com o próprio corpo. Seu corpo de Ararinha cansada negava-se a segui-la.

- Ainda bem que a mente viaja sem passagem - dizia.

Eu estava longe...eu tinha viajado!

A Avó sentia que tinha chegado a hora de morrer. Antes de morrer, quis visitar a minha casa com corpo e tudo. Chegou de avião. Viajou entre as nuvens, entre as ondas, convencida que estava indo de barco; e quando o avião atravessou uma tempestade, achou que estava numa carruagem, aos pulos, sobre a estrada de pedras.

Ficou em casa um mês. No meio da noite despertava e queria jogar xadrez ou brigava com meu avô, que tinha morrido há quarenta anos...

No final, disse: - Agora já posso morrer. E regressou. Visitou a família toda, casa por casa, parente por parente, para que todos vissem que tinha regressado muito bem e que a viagem não tinha culpa. E então, uma semana depois de ter chegado, deitou-se e morreu...

Ás vezes, a Avó vem me Ver nos sonhos. Eu caminho na beira de um Rio e ela é peixe que me acompanha deslizando suave, suave, pelas águas".

Nós tínhamos a intimidade de parentes
de amigos noturnos
De fim de madrugada.
Nós éramos dois versos
Dividindo em duas pátrias:
O pajeú e o pampa,
E dentro
Da tristeza que me espanta
Pela chama da morte que arde,
Se faz sombra teu nome
Na cruz que ilumina a tarde.

Fonte: O Livro dos Abraços-Eduardo Galeano.

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