CAETANO VELOSO: REVELA A HISTÓRIA DA COMPOSIÇÃO DA MÚSICA CAJUÍNA

Nascido em Teresina, capital do Piauí, Torquato Neto foi um poeta, jornalista, letrista, tropicalista e experimentador ligado à contracultura, que morreu aos 28 anos, em 1972, no Rio de Janeiro. Entre várias canções marcantes do Tropicalismo, ele compôs as canções Geleia Geral, em parceria com Gilberto Gil, e Mamãe Coragem, com Caetano Veloso.

"Existirmos: a que será que se destina? Pois quando tu me deste a rosa pequenina/ Vi que és um homem lindo e que se acaso a sina do menino infeliz não se nos ilumina/ Tampouco turva-se a lágrima nordestina/Apenas a matéria vida era tão fina e éramos olharmo-nos intacta retina/ A cajuína cristalina em Teresina.

“O rapaz chorou muito aquele dia.” O rapaz era Caetano Veloso e a frase é a atribuída a "Doutor Heli", pai de Torquato Neto. Naquele dia, em Teresina, algum tempo depois da morte trágica do poeta piauiense, um encontro entre Caetano e Heli resultou em uma das canções mais conhecidas do repertório da música brasileira: Cajuína. Aos que escutam a música sem conhecer a história por trás dela, é quase impossível saber do que se trata. Mas Caetano tratou de explicar a passagem.

"Existirmos, a que será que se destina?", questiona Caetano Veloso no primeiro verso de Cajuína, clássico de sua carreira que apareceu no disco Cinema Transcendental, de 1979 e que ele mesmo admitiu, em uma entrevista no começo dos anos 2000, que é uma de suas preferidas. A resposta não vem na sequência da canção, justamente porque parece ser uma provocação que cabe ao ouvinte (ou leitor) responder.

Caetano provavelmente se fez essa pergunta também na cena que o inspirou a escrever a música, durante uma visita à casa do pai do poeta Torquato Neto, que havia se suicidado em 1972 em Teresina, no Piauí, sua terra natal.

No livro Verdade Tropical, o cantor dá a sua versão mais acabada para o episódio, contando que fora um grande amigo de Torquato nos anos 1960 e que, na época de sua morte, eles estavam um tanto afastados um do outro, o poeta tinha se tornado mais próximo do cantor e compositor Chico Buarque, que estava ao lado de Caetano quando ambos receberam a notícia de sua morte.

O poeta e escritor piauiense Paulo José Cunha escreveu há alguns anos que a ocasião da visita de Caetano ao pai de Torquato, Heli Nunes, aconteceu durante uma turnê em que o cantor desembarcou na capital do estado para um show. "Ele retornava pela primeira vez à cidade onde havia nascido um de seus principais parceiros na Tropicália e seu grande amigo", disse.

O próprio Caetano afirmou o seguinte durante o programa Altas Horas, da Rede Globo, em 2014: "Torquato era um parceiro, letrista do Tropicalismo, e ficamos muito abalados com sua morte, mas eu não chorei quando soube. Mas quando eu fui a Teresina, anos depois, e encontrei o pai do Torquato no hotel -- ele foi me procurar. Quando eu o vi, chorei muito. No final, ele ficou me consolando e me levou à casa dele. Ele estava sozinho porque a esposa dele estava hospitalizada e Torquato era filho único", começou.

"A casa dele tinha muitas fotografias do Torquato e nós ali, sozinhos, ficamos em silêncio. Ele ficava passando a mão na minha cabeça e dizendo: 'Não chore tanto'. Aí ele foi na geladeira, pegou uma garrafa de cajuína, colocou dois copos e ficamos bebendo sem falar nada. Depois ele foi no jardim, colheu uma rosa-menina e me trouxe. Cada coisa que ele fazia eu chorava mais".

Doutor. Heli, como se desejasse relembrar a beleza da vida, deu ao amigo de seu filho uma rosa-menina colhida diretamente do quintal; e também serviu cajuína, como se quisesse adocicar aquele instante. Caetano continuava a derramar lágrimas, mas não mais de tristeza ou amargura. “Era um sentimento terno e bom, amoroso, dirigido a Dr. Heli e a Torquato, à vida. Mas era intenso demais e eu chorei”, definiu Caetano.

Na cidade seguinte à turnê de Caetano pelo Nordeste, na primeira parada, ele diz ter composto a canção. Em Verdade Tropical, Caetano diz que assim que soube da morte de Torquato, sentiu uma "dureza de ânimo". "Me senti um tanto amargo e triste mas pouco sentimental", o que foi quebrado apenas quando ele foi à casa de Heli.

O poeta e letrista Torquato Neto surgiu no cenário nacional em 1967, ao lado dos compositores mais famosos do movimento que seria chamado de Tropicalismo. Com Caetano Veloso, Gilberto Gil, Edu Lobo e Jards Macalé compôs canções como Geleia Real, Louvação, Marginália 2, Mamãe Coragem e Deus vos Salve esta Casa Santa. Além disso, também trabalhava como jornalista -- tinha uma coluna chamada Música Popular no jornal O Sol e outra, batizada de Geleia Real, no Última Hora. O aumento da repressão durante a ditadura militar fez com que ele se afastasse dos amigos e do trabalho e se internasse em uma clínica diante de um quadro de instabilidade mental.

Conhecido como o Anjo Torto da Tropicália, Torquato se suicidou em novembro de 1972, um dia depois do seu aniversário de 28 anos. Os amigos tinham acabado de deixar sua casa, no Rio de Janeiro, quando ele entrou no banheiro e ligou todas as torneiras de gás, morrendo asfixiado. Os jornais da época relataram que as últimas anotações encontradas em seu caderno de espiral traziam frases como "Pra mim chega" e "O amor é imperdoável", esta última atribuída justamente a Caetano Veloso. (Fonte: Livro Verdade Tropical)

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HELENA THEODORO: RÁDIO PÚBLICA NÃO TEM DONO, TEM QUE SER PLURAL

No mês em que completa o seu centenário, a Rádio MEC foi o tema central de uma audiência pública realizada na última quarta-feira (12) na Comissão de Cultura da Câmara dos Deputados. Durante o evento, que debateu o resgate do protagonismo da emissora e a busca pela inovação tecnológica, a radialista aposentada Helena Theodoro foi homenageada. A iniciativa reconhece as mais de três décadas que ela dedicou à Rádio MEC.

A carreira de radialista de Helena é marcada por sua múltipla formação. Natural do Rio, ela é professora da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), com graduações em Direito e em Pedagogia, mestrado em Educação, doutorado em Filosofia e pós-doutorado em História comparada. É referência no país na pesquisa em história e cultura afro-brasileira.

Sua passagem na Rádio MEC, iniciada aos 15 anos de idade, é marcada por programas como Samba na Palma da Mão, Faixa Autoral e Origens. Ela também coordenou nacionalmente o Projeto Minerva. Instituído pelo regime militar e produzido pela Rádio MEC, era um programa radiofônico de educação a distância de transmissão obrigatória pelas demais emissoras.

Considerada a primeira emissora do país, a Rádio MEC nasceu como Rádio Sociedade, criada em 1923 por Edgard Roquette-Pinto e Henrique Morize. Doada em 1936 ao Ministério da Educação e Saúde Pública (posteriormente Ministério da Educação e Cultura - MEC), a emissora acabaria sendo rebatizada como Rádio MEC. Mais tarde, a sigla deixaria de ser uma referência à pasta, passando a significar música, educação e cultura, considerados os três pilares da sua programação.

Nessa entrevista concedida à Agência Brasil, Helena Theodoro conta detalhes da sua trajetória na Rádio MEC e discute a importância da emissora. 

Agência Brasil: Como foi sua entrada na Rádio MEC em 1958? 

Helena Theodoro: Um repórter do Diário de Notícias, chamado Pedro Jorge, tinha um projeto que ele chamava de Estudantes do Ano, onde aqueles jovens negros que se destacavam ganhavam uma fotografia no jornal para estimular os outros a estudar. Eu estava estudando no Conservatório de Música, fazendo piano e harmonia. E ele me escolheu como uma das estudantes do ano. Os meus pais eram militantes do movimento negro e eu tinha passado muito bem qualificada para o Instituto de Educação do Rio de Janeiro. Naquela época, as crianças negras não costumavam ser destaque em colégios considerados de qualidade no Rio, como era o Instituto de Educação. E eu passei em sétimo lugar. 

O Pedro Jorge sabia que eu era ligada ao movimento dos meus pais, que batalhavam para a criação do Renascença Clube, frequentavam o Teatro Experimental do Negro do Abdias Nascimento, eram fãs e colaboradores da orquestra do maestro Abigail Moura, participavam de toda a movimentação nos anos 50 do pessoal negro no Rio de Janeiro. E aí ele me convidou para participar do programa Tarde Estudantil como pianista. Era um programa da Rádio MEC de estudantes universitários e secundaristas.

Agência Brasil: Então você começou como pianista? 

Helena Theodoro: Comecei como pianista. Mas no Instituto de Educação, a gente tinha a Associação Metropolitana de Estudantes Secundários. A gente tinha uma consciência muito grande da política nacional, a gente se empolgava com a história da reforma agrária. E eu comecei a escrever no Tangará, que era o nosso jornal dos estudantes secundaristas. Também passei a escrever para o jornal O Metropolitano, que era voltado para os estudantes universitários. 

E depois o pessoal da Rádio MEC começou a se interessar pelas minhas poesias. Eu já escrevia poesia para a Revista Ciência Popular. Eu tive uma formação muito voltada para a arte. Tive uma infância muito estimulada para o campo das artes. O meu pai me levava para todos os concertos para a juventude. Domingo era religiosamente sagrado ir à feira em Vila Isabel, mas antes ele me levava para assistir os concertos para a juventude no Theatro Municipal.

Agência Brasil: O Origens é um dos programas que marca a sua trajetória. Como ele foi pensado? 

Helena Theodoro: Em 1963, eu fui efetivamente contratada. E aí eu passei a ser técnica de Comunicação Social. Toda quinta-feira eu tinha programação, e, mais tarde, comecei a fazer os meus próprios programas. Eu comecei com o Mundo da Criança, porque eu já era professora primária e tinha feito uma série de livros nos anos 70. Quando eu me formei em Pedagogia, eu fui junto com o Frei Davi fazer um trabalho de rádio educativo com o pessoal do Mobral [Movimento Brasileiro de Alfabetização, órgão criado pela ditadura militar]. E aí a gente começa a achar brechas para atender a comunidade preta e pobre. E eu fiz o programa Mundo da Criança. Eu buscava fazer na Rádio MEC o que eu tinha feito nos meus livros infantis, mostrando para a criança a importância da natureza. Depois, tivemos uma série com o personagem Bentinho Benedito. O Luiz Carlos Saroldi, que era muito meu amigo, era da Rádio Nacional. Depois foi da Rádio JB [Jornal do Brasil]. Eu pedi a ele para criarmos uma história que falasse de um menino negro criado pela avó, que era de terreiro. E que retratasse o negro como um artista plástico e não como músico, para sair do estereótipo. Vocês não imaginam o quanto eu sofri com a Editora Bloch porque os ilustradores não queriam pintar crianças negras. E também teve a série sobre o dia a dia, onde valorizamos o lixeiro, a empregada doméstica, as pessoas que plantam e que colhem. 

Mais tarde eu passei para o programa Faixa Autoral, na medida em que eu estava muito ligada à divulgação da música preta brasileira. Depois, como eu estava muito interessada na educação, veio o Origens. Nele, coloquei no ar pessoas que não estão mais entre nós como é o caso de Lélia Gonzalez, Maria Beatriz Nascimento, Joel Rufino dos Santos e Oliveira Silveira que deu a sugestão para que o 20 de novembro fosse o Dia de Zumbi. E eu transplantei os contos do Mestre Didi, que são incríveis. Inclusive foi ele quem fez a vinheta do Origens. É ele tocando e cantando. E eu radiofonizei os contos com a equipe de radioteatro. Quem era essa equipe? Nicette Bruno, Paulo Goulart, Fernanda Montenegro e Myriam Pérsia. Vocês não imaginam a qualidade. Eles depois vão para a TV Tupi. Era uma rádio que dava visibilidade aos artistas. 

Na Rádio MEC, a gente tinha contato com os poetas. Walmir Ayala, Vinícius, todo mundo era presente na Rádio MEC. A gente tinha o programa de jazz do Paulo Santos, a gente tinha uma relação muito íntima com todo o movimento cultural. No Samba na Palma da Mão, eu levei Martinho da Vila, Zeca Pagodinho, Jorge Aragão, Aluisio Machado e Dona Ivone Lara que gravou pela primeira vez na Rádio MEC. Todos os grandes sambistas do Rio de Janeiro passaram pelo programa. Eu tinha facilidade de convidá-los porque eu estava casada com o Nei Lopes. Eu comi feijoada feita por Clara Nunes, morram de inveja. Uma pessoa linda, maravilhosa. 

Mas olha a importância de manter a memória da Rádio MEC. Ela é o princípio de tudo. Criou muitos projetos de qualidade. Veja o nosso trabalho incrível nos anos 70 no projeto Minerva, buscando dar consciência crítica através dos programas radiofônicos que eram distribuídos para todo o Brasil. Eu fui coordenadora nacional do projeto. Fomos reconhecidos pelos ingleses.   

Esse projeto também recebeu algumas críticas e chegou a ser apelidado de “projeto me enerva”. Como você avalia essas críticas? 

O que a gente estava fazendo? A gente estava vendo a necessidade do país de crescer e pensar criticamente. A quem interessa isso? E a quem não interessa isso? 

Agência Brasil: Chegou a sofrer alguma interferência do regime militar? 

Helena Theodoro: Olha, eu fui na Alemanha e lá eu vi algo que eu quis fazer aqui. O caderno de acompanhamento de conteúdo do Projeto Minerva era vendido nas bancas pela Editora Abril. Eu queria distribuir gratuitamente pelos jornais. A ideia era que os jornais pagassem taxas menores ao governo em troca de espaço para um suplemento. Eu fui mexer com a Editora Abril. Ela ganhava muito dinheiro vendendo esses cadernos. E aí depois de um tempo me tiraram de lá. Fiquei doente. Fiquei dois meses de cama. Eu sempre amei o Projeto Minerva. 

Agência Brasil: Podemos dizer que seus programas na rádio articulam sua formação artística e política? 

Helena Theodoro: A minha vida de pianista, de professora, de militante política e de militante do movimento negro está completamente relacionada. Papai e mamãe eram sócios da orquestra do maestro Abigail Moura. Foi a primeira orquestra voltada para tradição musical africana. Ele usava instrumentos africanos. E quem eu encontro na Rádio MEC que era uma figura presente na minha vida de filha de um militante: o maestro Abigail Moura. Ele consertava os instrumentos da Rádio MEC e ensaiava a orquestra afro-brasileira lá na Rádio MEC. Então, eu fechei os meus laços de amizade com o maestro Abigail Moura e conheci uma pessoa incrível na minha vida que se chama Haroldo Costa. 

Ao mesmo tempo, a minha mãe havia passado no concurso para os Correios e Telégrafos e trabalhava como intérprete de inglês na Praça Mauá. Era vizinha do edifício A Noite, onde funcionava a Rádio Nacional. E ela faz amizade com o pessoal da Rádio Nacional. Ela conheceu um jovem que trabalhava como empregador de correspondência que ela adota como se fosse filho. E ela estimula esse menino que é o Hermínio Bello de Carvalho. Então, desde muito cedo, eu fui criando relações que estão ligadas com o movimento negro, com a música popular brasileira e com uma consciência política do nosso país. 

Agência Brasil: E como você avalia a importância do rádio para o país? 

Helena Theodoro: No rádio, você não mostra as coisas, você deixa as pessoas imaginarem. Você desenvolve a intuição. Você estimula a reflexão das pessoas. A televisão te chapa um negócio e é aquilo que você viu e acabou. Historicamente, o rádio foi fundamental para a formação do país. Dona Helza Camêu me ensinou muito cedo que o Brasil no século 19 falava tupi-guarani. E foram as rádios que criaram uma unidade em torno do idioma português em um país continental como o nosso. Principalmente a Rádio MEC e a Rádio Nacional. E a Rádio Roquette-Pinto também. 

Eu fui à Espanha, onde há grupos separatistas, como os bascos. Na Itália, há uma série de divisões linguísticas. Eu fui em vários países africanos onde não há uma unidade. Inclusive vi uma experiência muito linda no Senegal. Você sabe que lá eles falam aproximadamente sete dialetos. Então, quando a criança entra na escola, ela não se comunica da mesma maneira que a outra. E essas crianças têm um ano para aprender a falar e escrever em francês, que é a língua obrigatória do país. Eles montaram uma estratégia incrível. Reuniram professores doutores pela Sorbonne para trabalhar na alfabetização. Eles fizeram uma seleção dos contos mais populares no Senegal, que são conhecidos diferentes dialetos. Traduziram para o francês e desenvolveram teatro para essas históricas. Eu vi. As crianças vão ouvir essas histórias em francês. Só que elas conhecem essas histórias. São da sua realidade. Eu fiquei pensando: eles usam o método Paulo Freire lá e a gente não usa aqui. E uma coisa mais interessante ainda. Eles usam músicas deles. E colocam letras francesas. É um transplante que facilita a compreensão das crianças. Em um ano, eles conseguem alfabetizar. 

Você também foi, por três anos, jurada do Prêmio Nacional Jornalista Abdias do Nascimento, criado pela Comissão de Jornalistas pela Igualdade Racial (Cojira) do Sindicato dos Jornalistas Profissionais do Rio de Janeiro. Como foi essa experiência? 

É um trabalho incrível de premiar jornalistas que realmente contam para a gente a verdade da vida. Eu acho absolutamente necessário, porque eu acho que a grande responsável do atraso brasileiro é a mídia. A gente tem uma mídia que valoriza a mentira. 

Agência Brasil: A Rádio MEC é vinculada hoje à Empresa Brasil de Comunicação (EBC), fundada em 2007 dentro de um esforço de estruturação do campo público da comunicação. Como você avalia esse processo? 

Helena Theodoro: Esse debate é básico. Não pode deixar nas mãos de interesses particulares algo que é de interesse público. Você vê o que o Twitter está fazendo. Estão permitindo até compartilhamento de ameaças de ataque às escolas. É comandado por um homem que tem trilhões de dólares. Há uma falta de ética. Desde sempre eu aprendi que o teu limite acaba onde começa o limite do outro. É preciso parar e pensar. Ouvir e escutar. A rádio nos permite isso. E a rádio pública não tem dono. Ela é de todos. A partir do momento que ela tem conhecimento dessa sua característica, ela não vai ser uma rádio que vai te levar para uma dada religião, que vai te levar para um dado partido. Ela não pode ser esse tipo de rádio. Ela tem que ser diversa. Ela tem que ser plural. Ela tem que ser democrática.

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NO DUETO COM GERALDO AZEVEDO, VERA DE MARIA MAGA CANTA COM O VENTRE, OMO PROMETEU O VELHO CHICO

O professor mestre e doutor em Ciência da Literatura, pela Universidade Federal do Rio de Janeiro, Aderaldo Luciano destaca que  "Vera de Maria Maga canta com o ventre, como prometeu o Velho Chico",

Confira 

Nós, os nordestinos, temos essa tradição musical provinda dos centros da terra, dos veios de água raros ou profusos, dos barbatões indomesticáveis, dos imensos lajedos e suas orações mineradas, da poeira fina perfurada pelos espinhos, de Canudos, nossa inexpugnável Macondo milenar. Uma linha melódica por fora da pauta aprisionando os modos europeus, a curva harmônica libertando o modo autóctone. Dessa marca de fogo e brasa nasceram nossos sonhos rítmicos. E, desses, os cometas riscando de luz o céu sertanejo.

O Rio São Francisco é a síntese manancial de nossas canções. Em algum lugar de suas margens, bebeu de suas águas santas Vera de Maria Maga. Essa mulher, pés enraizados no chão de nossa magia, tornou-se em Deusa Seresteira. Intensas, as águas franciscanas conversaram profundamente com seu ventre. Aninharam-se sob a Lua Cheia, emaranharam-se sob a Lua Nova e, numa palhoça forrada de humildade e fé, de trabalho e respeito, protegida pela aura da ancestralidade, Vera de Maria Maga cantou pela primeira vez.

Durante as audições do The Voice + de 2022, o Brasil pode descobrir essa mulher curando suas dores ao rasgar seu peito sob canções do povo. Vera de Maria Maga, campeã daquela temporada, vinha vestida de noiva, dando um passo de cada vez, rumo ao altar da consagração. Aplicando diligentemente os ensinamentos de seus técnicos, ciente do aprendizado, desabrochava sua voz de Poder e Carisma. Todos pudemos ver a Energia luminosa lhe envolvendo a alma, lhe adoçando o olhar, lhe acarinhando, lhe minorando as dores.

Agora, quando ouço Vera de Maria Maga, em dueto com Geraldo Azevedo, alinhavando a melodia de Chorando e Cantando, mergulho feliz e solerte, contente e solene, sem asas, só braços, mergulho para as águas de sua voz alta e avançada. É um cometa trazendo Luz para a noite imensa do sertão profundo. Uma segunda Lua, maior que a primeira, de fogo e quentura. Vera de Maria Maga canta com o ventre, como prometeu o Velho Chico. Vera de Maria Maga nos coloca para dormir, enquanto acende nossa fogueira interior. Vera de Maria Maga faz acontecer o Milagre de nossa existência.

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ENCONTRO DEBATE O JORNALISMO AMBIENTAL NO BRASIL ACONTECERÁ ENTRE OS DIAS 27 E 28 DE SETEMBRO

O jornalismo ambiental já é considerado no Brasil uma área de especialização do fazer jornalístico. Afinal, se tomarmos como principal marco inaugural para a atenção da imprensa às questões ambientais a Conferência RIO 92, já são 30 anos de estrada, com a incorporação das pautas ambientais em veículos de imprensa e o surgimento de um ecossistema de veículos independentes que pautam as temáticas ambientais.

E para pensar o futuro e desafios do jornalismo ambiental, uma das organizações mais antigas da área, o Núcleo de Ecojornalistas do Rio Grande do Sul (NEJ/RS), fundado em 1990, realiza o 5o Encontro Nacional de Pesquisadores de Jornalismo Ambiental, único evento no Brasil que reúne pesquisadores dedicados aos estudos de jornalismo e ambiente.

“A ideia do evento é pensar que futuros são possíveis para o ambientalismo e o jornalismo, dentro de uma ideia de estruturação numa era pós-Bolsonaro, da reconstrução da pauta ambiental no país, de legislação, relação com povos originários e com a própria imprensa”, explica Ilza Maria Tourinho Girardi, líder do Grupo de Pesquisa em Jornalismo Ambiental (UFRGS/CNPq) que co-organiza o evento. A pesquisadora explica também que o encontro começou a ser realizado em 2007, dentro do Congresso Brasileiro de Jornalismo Ambiental, como uma mostra científica.

Entre os dias 27 e 28 de setembro, jornalistas e ambientalistas convidados irão debater temas como o desmonte ambiental no Brasil, o papel das redes de pesquisas e até uma perspectiva latino-america da academia.

“A finalidade é criar um referencial teórico para a cobertura jornalística”, afirma Ilze, “no Brasil, a disciplina de Jornalismo Ambiental ainda não é obrigatória nos cursos de graduação mas, embora meio ambiente seja um tema transversal, a disciplina é muito importante na formação destes estudantes e esses encontros podem trazer para a academia, cursos e coordenadores o alerta sobre essa necessidade. Mas é fundamental ter uma pressão para que isso mude”. A programação do encontro conta com a presença de quinze pesquisadores e jornalistas, distribuídos em 4 mesas temáticas que ocorrerão ao longo dos dois dias de evento.

As inscrições para o encontro são gratuitas e podem ser feitas através deste link-https://www.even3.com.br/enpja2022/.  

A iniciativa conta com apoio do Programa de Pós-Graduação em Comunicação da UFRGS, do Curso de Jornalismo da UFSM/FW e do Curso de Jornalismo da Uniritter/POA.

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BALANÇO SOBRE COMBATE A CRIMES AMBIENTAIS É DIVULGADO PELO ICMBIO

O Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio) divulgou um balanço de operações deflagradas em todas as regiões do país, com o objetivo de combater crimes ambientais praticados em unidades de conservação. Entre os ilícitos que são alvo das operações estão desmatamento e ocupações irregulares, além de caça e pesca ilegais.

Parque Nacional do Grande Sertão Veredas-Uma das operações deflagradas pelo instituto foi entre os dias 17 e 26 de março no Parque Nacional do Grande Sertão Veredas, localizado na divisa dos estados de Minas Gerais e Bahia. A operação teve como foco o combate à caça de animais e à criação irregular de gado nos limites do parque.

Segundo o ICMBio, foram apreendidas armas de fogo sem registro e munição. Atos de infração foram lavrados contra os suspeitos – alguns tendo em posse animais abatidos e congelados, prontos para consumo. “Dois suspeitos foram conduzidos para a delegacia de Polícia Civil da cidade mineira de Buritis em uma das etapas da fiscalização”, informou o instituto.

No extremo norte do parque, dois suspeitos foram detidos e levados à delegacia de Polícia Civil da cidade de Santa Maria da Vitória, na Bahia. “Além disso, houve um autuado por desmatamento, construção irregular e introdução de espécies no ambiente”, acrescentou.

Chapada dos Veadeiros-No Parque Nacional da Chapada dos Veadeiros, em Goiás, o ICMBio flagrou construções irregulares em uma ocupação, bem como a criação de búfalos e outros animais e extrações irregulares de palha de Indaiá. Foram também encontrados “apetrechos de pesca” nos limites do parque.

Os fiscais apreenderam e destruíram o material no local. Além disso, as ocupações foram “descontinuadas no interior do parque, e autos de infração, ordens de demolição, embargos e apreensões foram aplicados”, informou o instituto.

“Todos os registros são incompatíveis com o propósito da unidade, que está na categoria de proteção integral”, complementou o ICMBio.

Chapada das Mesas-Três pessoas foram presas em flagrante por transportar e comercializar madeira ilegalmente no Parque Nacional da Chapada das Mesas, localizado no Maranhão.

Os agentes que participaram da Operação Chapada Limpa VII lavraram autos e emitiram duas notificações “para retirar uma construção não autorizada na margem do rio limítrofe ao parque”. De acordo com o ICMBio, os ilícitos ambientais cometidos no parque podem resultar em multas que, somadas, passam de R$ 200 mil.

“O objetivo da operação foi combater a extração e comércio de madeira retirada ilegalmente, ocupações irregulares e pesca ilegal dentro da unidade de conservação”, acrescentou.

Tumucumaque e Floresta Nacional-Dois autos de infração foram emitidos pelos fiscais do ICMBio no Parque Nacional Montanhas do Tumucumaque e na Floresta Nacional do Amapá, entre os dias 3 e 6 de abril. Todos foram punidos por porte de itens usados para caça ilegal.

A Operação Semana Santa foi deflagrada com o objetivo de combater a caça e a pesca ilegal nas duas unidades – ilícitos que, segundo o instituto, aumentam em períodos próximos à Semana Santa, quando aumenta o consumo de pescado.

O material apreendido na operação, que contou com o apoio do Batalhão Ambiental da Polícia Militar, foi encaminhado à Polícia Federal.

Reserva Biológica Abufari-No período de 15 de março a 10 de abril, a Operação Migração III, realizada na Reserva Biológica Abufari, no Amazonas, fiscalizou o interior da unidade de conservação e também embarcações que percorriam o Rio Purus.

Dois autos de infração e um termo de apreensão foram lavrados na área terrestre, e mais de 6 quilos de peixes, apreendidos nas embarcações. Mais de R$ 275 em multas foram aplicados e os peixes foram doados a duas instituições sem fins lucrativos do município de Tapauá.

Os fiscais vistoriaram também “áreas com potencial desmatamento”, tendo por base dados obtidos por satélite. Além disso, promoveram, com a população local, uma atividade de conscientização sobre pesca irregular.

Lagoa do Peixe-No Parque Nacional da Lagoa do Peixe, as ações implementadas pelo ICMBio foram de vigilância diária, de “pontos onde param aves de vida livre”, a fim de identificar possíveis casos de gripe aviária.

“Dessa forma, é possível avaliar a saúde das aves frequentando a região e adotar medidas, se necessário”, justificou o instituto, ao informar que o parque segue “todas as normas recomendadas” desde os primeiros alertas sobre o risco de ingresso da gripe aviária na região.

O ICMBio informa que, fora da época da migração de aves, a vigilância costumava ser feita mensalmente. Durante o período das aves presentes, a vigilância é semanal.

“No entanto, a vigilância tem ocorrido de forma diária, com equipe em campo, para identificar desde o princípio possíveis focos. Até o momento, nenhum caso de gripe aviária foi registrado no parque”, acrescentou. (Agencia Brasil)

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TRADICIONAL NO SÃO JOÃO DE CARUARU, ALCYMAR MONTEIRO FICA DE FORA DO EVENTO 2023

Nome tradicional na grade artística do São João de Caruaru, o cantor Alcymar Monteiro está fora da programação deste ano. Ele se manifestou nas redes sociais lamentando a situação.

O artista diz não ter recebido contato oficial da Fundação de Cultura de Caruaru, o que inviabilizou a participação no evento, considerado o "maior e melhor São João do Mundo".

A manifestação aconteceu nessa terça-feira (11), data em que a prefeitura da cidade divulgou as atrações que farão parte da festa, que terá 65 dias de programação.

"Gostaríamos de deixar claro que sempre tivemos um grande carinho pelo público de Caruaru e por essa festa que foi tão tradicional", ressalta o comunicado publicado nas redes sociais.

No último ano, Alcymar Monteiro a se apresentou no palco principal da festa no primeiro domingo de junho. O artista também participou do evento em 2019, antes da pandemia da Covid-19, e integrou a programação da festa em anos anteriores.

Além dele, o cantor Jorge de Altinho, que afirmou em 2022 ter sido "esquecido" do São João de Caruaru, também publicou um comunicado em que informa que não vai participar da festa este ano.
 
O cantor disse ter compromisso em outro estado na data proposta pela prefeitura. "Não foi possível adequar a agenda de shows para nossa apresentação", publicou.

Na lista de artistas que vão se apresentar no palco principal do São João de Caruaru em 2023, estão diversos cantores nacionais e de diferentes gêneros, a exemplo de Ivete Sangalo, Bell Marques, Aline Barros, Leo Santana, Simone Mendes e João Gomes.

Também integram a programação Elba Ramalho, Dorgival Dantas, Limão com Mel, Santanna, Fulô de Mandacaru, Nattan, Xand Avião, Raphaela Santos, Gusttavo Lima, Wesley Safadão, entre outros artistas.

Confira íntegra da nota públicada por Alcymar Monteiro:
"É com tristeza que informo que não estaremos presentes no São João de Caruaru deste ano.
Infelizmente, não houve nenhum contato oficial entre a Fundação de Cultura de Caruaru e nossa produção, o que inviabilizou a nossa participação no evento.
Gostaríamos de deixar claro que sempre tivemos um grande carinho pelo público de Caruaru e por essa festa que foi tão tradicional.
Esperamos que, em breve, possamos voltar a nos reencontrar em Caruaru.
Desejamos a todos um excelente São João".
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XICO SÁ: DORES DA RODOVIÁRIA E O DIA DE IR EMBORA

Mãe, ainda me lembro quando tu colocaste a rede no fundo da mala, mala de couro, forrada com brim cáqui, e perguntaste, tentando sorrir no prumo da estrada: “Filho, será que na capital tem armador nas paredes?”

Naquela noite eu partiria para o Recife, que conhecia apenas de fotos e do mar de histórias trazidos pelos amigos. Lembro de uma penca de fotografias em especial, que ilustrava uma bolsa de plástico que usava para carregar meus livros e cadernos. Lá estavam as pontes do centro, casario da Aurora ao fundo, lá estava a sede da Sudene, símbolo de grandeza naquele apagar dos anos 1970, lá estava o Colosso do Arruda, o estádio do Santa…

Quando o ônibus gemeu as dores da partida, aquela zoada inesquecível que carregamos para todo o sempre, tu me olhaste firme, e eu segurei as lágrimas tão-somente para dizer que já era um homem, que era chegada a hora de ganhar o mundo, pé na estrada, o mundo estrangeiro que conhecia somente pelo rádio, meu vício desde pequeno, no rádio em que ouvia os Beatles, as resenhas e as transmissões esportivas, além de todo um sortimento de novidades daqui e de fora.

Lembro que naquele dia, mãe, ouvimos juntos o horóscopo de Omar Cardoso, na rádio Educadora do Crato (ou teria sido na Progresso de Juazeiro?). Que falava dos novos rumos do signo de Libra. Você disse: “Tá vendo, meu filho, você será muito feliz bem longe”.

A voz de Omar Cardoso e o seu mantra ecoava no juízo: “Todos os dias, sob todos os pontos de vista, vou cada vez melhor!”

Foi o dia mais curto de toda a existência. O almoço chegou correndo, a merenda da tarde passou voando… e quando dei fé estava diante da placa Crato/Recife, Viação Princesa do Agreste.

Todo choro que segurei na tua frente, mãe, foi derramado em todas as léguas seguintes. Mal chegou em Barbalha eu já estava com os dois lenços de pano –outro cuidado seu com o rebento- molhados. Em Missão Velha, uma moça bonita, uma estudante que voltava de férias, me confortou: “É para o seu bem, foi assim também comigo”.

Quando chegou em Salgueiro, além dos lenços e da camisa nova -xadrezinho da marca Guararapes-, o livro Angústia, de Graciliano Ramos, um dos motivos da minha vontade de conhecer a vida, também já estava encharcado.

E assim foi a viagem toda. Com direito a soluços, que acordaram a velhinha que ia ao meu lado, quando o ônibus chegou ao amanhecer no Recife.

Arrastei a mala pelo bairro de São José e procurei a pensão mais econômica.

Sim, mãe, tem armador de rede, escrevi na primeira carta. Naquele tempo não se usava, em famílias sem muito dinheiro, o telefone. Era tudo na base do “espero que esta te encontre com saúde”, como a gente escrevia na formalidade das missivas.

É mãe, neste teu dia, que está quase chegando a hora, quero lembrar que a coisa que mais me comoveu foi tua coragem, que eu até achava, cá entre nós, que fosse dureza além da conta d´alma. Até falei, um dia no divã, sobre o assunto, como se eu quisesse que naquela despedida o sertão virasse o teu mar de pranto.

Eis que recentemente me contaste como foi duro, que tudo não passava de um jeito para não fazer que eu desistisse de ganhar a rodagem. Aí me lembrei de uma sabedoria que citava nas cartas e bilhetes, quando eu esmorecia um pouco na sobrevivência da cidade grande: “Saudade não bota panela no fogo”. E ainda reforçava: “Saudade não cozinha feijão, coragem, filho, coragem”.

Em nome das mães de todos os meninos e meninas que partiram, dona Maria do Socorro, quero te deixar beijos e flores.

Sim, mãe, agora já sabes que somos de uma família de homens chorões, são 18h40 de um sábado, e eu choro um pouco, como fazia no fundo daquela rede colorida que puseste no fundo da mala, chorava tanto nos sótãos das pensões do Recife  que os chinelos amanheciam boiando no quarto, como se quisessem tomar o caminho de volta para casa.

*Fonte Crônica de Xico de Sa  escrita em 2005.

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