MARÍLIA PARENTE LANÇA PRIMEIRA CANÇÃO REPORTAGEM

Jornalista premiada, a cantora e compositora pernambucana Marília Parente une os dois mundos pelo qual tão bem transita e lançou a sua primeira “canção-reportagem”. O single “Para la Tierra Volver” conta a história dos camponeses jurados de morte e em situação de conflito fundiário no Engenho Fervedouro, em Jaqueira, na Zona da Mata do Estado. A canção está disponível em todas as plataformas digitais.

De acordo com a cantora, o single nasce com uma proposta diferente e chama a atenção para uma história real. 

“Fiquei chocada ao tomar conhecimento de que havia uma lista de dez camponeses jurados de morte em Jaqueira. Um deles tomou sete tiros em uma emboscada, quando voltava para o Engenho em sua moto, e sobreviveu. Ao perceber que a história vinha sendo pouco divulgada, senti uma nova necessidade: a de ser uma compositora menos existencial e mais aqui e agora. As pessoas estão fartas de histórias tristes, mas elas precisam saber do que acontece debaixo de seus narizes. A música torna tudo mais palatável”, disse.

Após o primeiro disco “Meu Céu, Meu Ar, Meu Chão e seus Cacos de Vidro” (2019) onde conectou a música nordestina com as culturas pop e oriental e o rock, em "Para la Tierra Volver" Marília revela uma faceta mais folk com forte influência da Nueva Canción. 

“Além da história contada em versos, uma forte característica de Bob Dylan, outra novidade é que me arrisco por outro registro vocal, mais médio e grave, quase oposto ao que utilizei até aqui. Consequência da influência de cantoras como Joan Baez, Mercedes Sosa e até Sandy Denny, do Fairport Convention. Talvez eu nunca mais volte a cantar assim ou repita depois, é tudo parte de uma linda aventura”, completa.

A ficha técnica tem violão de aço principal da própria Marília, gaitas de Rodrigo Cm, guitarras e baixo de Rodrigo Padrão e bateria de Caio Wallerstein. A música foi masterizada e mixada por Tonho Nolasco, que também gravou o segundo violão e o mellotron. A capa do single faz referência ao projeto gráfico do disco “Bryter Layter”, de Nick Drake, e conta com foto de Cláudia Parente, mãe de artista, e arte assinada por Juvenil Silva. Detalhe: foto feita em Exu Pernambuco, terra de Luiz Gonzaga.

Nenhum comentário

LIVRO SOBRE JUVENTUDE RURAL NO SEMIÁRIDO É LANÇADO PELA EMBRAPA

A publicação reuniu um conjunto de instituições parceiras e é resultado do Projeto Pedagroeco, executado entre os anos de 2017 a 2019. Será lançada nesta quinta (21), em evento on-line.

“Os jovens do campo querem ser valorizados, acessar internet e mídias digitais, participarem de formações para a agricultura, precisamos de projetos que gerem renda e educação, queremos permanecer no campo”, destaca o jovem Luiz César da Silva, 19 anos, morador da Comunidade Sítio Pedra Miúda, em Mata Grande, Alagoas.

César é um dos milhares de jovens que driblam as dificuldades para permanecerem no campo pelo desejo de seguir o caminho dos pais: trabalhar na agricultura. Dados do Censo Agropecuário de 2017 apontam o envelhecimento dos trabalhadores rurais sem reposição nas camadas etárias mais baixas como um dos principais obstáculos ao crescimento da agricultura familiar no Brasil.

E César também é um dos 150 jovens que participaram do Projeto Pedagroeco – Metodologia de produção pedagógica de materiais multimídia com enfoque agroecológico para a agricultura familiar, que foi implementado com estes atores sociais nos estados de Alagoas, Sergipe, Bahia, Piauí e Paraíba.

Durante mais de dois anos, a Embrapa atuou em parceria com universidades, institutos federais de educação, organizações não governamentais que compõem a Articulação  Semiárido Brasileiro (ASA), além do Ponto de Cultura Grãos de Luz e Griô em um projeto que teve justamente o objetivo de estimular o protagonismo juvenil e a divulgação de experiências dos jovens sertanejos e suas famílias com a agricultura familiar e com a agroecologia, com o foco na comunicação para o desenvolvimento e na valorização da cultura local.

A trajetória e os resultados deste projeto foram registrados no livro que a Embrapa e as instituições parceiras lançam nesta quinta-feira (21), nas redes sociais. A publicação Juventudes, Identidades e Saberes Agroecológicos – relatos sobre experiências e diálogos entre o Pedagroeco e a Pedagogia Griô no Nordesteapresenta os resultados do Projeto e traz a visão dos jovens que vivenciaram a experiência. O lançamento acontece, às 19h, durante o Encontro Nacional da Pedagogia Griô, na página do Facebook “Pedagogia Griô”.

Composto por sete capítulos, o livro apresenta leituras de diversos atores e reúne, portanto, uma multiplicidade de formações tais como educadores populares, agricultores, técnicos agrícolas, pedagogos, engenheiros-agrônomos, biólogos, geógrafos, cientistas sociais, jornalistas, historiadores entre outras. Traz os relatos de experiências do Projeto em cada um dos estados e apresenta a proposta metodológica que foi sendo construída no percurso.

A publicação pode ser baixada gratuitamente no repositório de publicações da Embrapa, disponível no endereço https://www.embrapa.br/busca-de-publicacoes/-/publicacao/1125276/juventudes-identidades-e-saberes-agroecologicos-relatos-sobre-experiencia-e-dialogos-entre-o-pedagroeco-e-a-pedagogia-grio-no-nordeste.

“Não se trata de um guia metodológico. Longe disso. Mas o livro inspira, do ponto de vista metodológico, outras intervenções, outras possibilidades de diálogo entre a ciência e as comunidades locais, sejam assentamentos, comunidades quilombolas e diversos grupos sociais”, salienta o pesquisador Fernando Curado, que atua na Embrapa Alimentos e Territórios, com sede em Maceió (AL).

AGROECOLOGIA: O projeto envolveu quatro centros de pesquisa da Embrapa: Embrapa Tabuleiros Costeiros, Embrapa Algodão, Embrapa Semiárido, Embrapa Meio-Norte e organizações não governamentais com atuação em agroecologia e no sertão nordestino.

A base metodológica do trabalho foi a Pedagogia Griô – proposta pedagógica facilitadora de rituais de vínculos e aprendizagem entre idades, escolas, comunidades, grupos étnicos-raciais e de gênero, territórios de identidade, saberes ancestrais de tradição oral e as ciências, artes e tecnologias universais. Por meio de uma parceria com o Ponto de Cultura Grãos de Luz e Griô, com sede em Lençóis (BA), foi possível trabalhar a Pedagogia Griô como fio condutor dos processos de aprendizagem.

“A Pedagogia Griô articula pautas importantes no mundo contemporâneo, promovendo o diálogo e a interação com a tradição, para reinventá-las. Então são contribuições que acontecem nessas relações intergeracionais que a Pedagogia Griô facilita em suas práticas pedagógicas, tanto afetivas quanto científicas”, afirma Lilian Pacheco, que é a criadora da Pedagogia Griô.

Para a analista da Juliana Andrea Oliveira Batista, coordenadora do Projeto, e uma das editoras técnicas do livro, ao abraçar a Pedagogia Griô, o Pedagroeco ampliou seu olhar para as questões de identidades, ancestralidades e territorialidades da juventude agroecológica que convive com o Semiárido. Juliana atua na Supervisão de Inclusão Tecnológica da Secretaria de Inovação e Negócios da Embrapa (SIN), em Brasília. Ela destaca, ainda, a importância da participação das organizações não governamentais, entre elas, a Articulação Semiárido Brasileiro (ASA), que trouxe o componente da comunicação popular e o olhar da convivência com o Semiárido para a metodologia.

“Para nós da Embrapa um dos ganhos do projeto foi o exercício da construção coletiva e da escuta, pois ressignificamos o projeto a partir da visão e da experiência dos movimentos sociais. E isso fez com que o Pedagroeco fosse incorporado às agendas de trabalho das organizações parceiras, ultrapassando, assim, os muros da Embrapa”, afirmou Juliana, destacando, ainda que o trabalho em rede foi outra grande lição.

Durante todo o processo formativo, os jovens foram instigados a compreender suas realidades, ancestralidades, modos de vida e a relação com a agricultura praticada por suas famílias. Como desafio, contaram suas histórias e sistematizaram as experiências agroecológicas em formato multimídia: vídeos produzidos a partir de celulares, áudios, fotografias, cordel, poesia, teatro.

Por isso, a comunicação popular foi outro componente importante do projeto. Gleice Mary Gomes, assessora pedagógica da Associação dos Agricultores Alternativos (Aagra), com sede em Igaci (AL), diz que o Pedagroeco foi abraçado pela instituição justamente pelo fato de favorecer a divulgação das experiências agroecológicas das comunidades. “A Aagra sempre realizou cursos de formação em agroecologia para a juventude, então, o projeto só veio a fortalecer este trabalho, pois trouxe para o debate as diversas formas de comunicação que podem ser usadas para a divulgação das experiências nas comunidades e assim valorizá-las e transformá-las em exemplos a serem seguidos”, explica.

Gleice conta que os jovens atendidos pela Aagra passaram a perceber nas suas comunidades tradições que antes passavam despercebidas, como, por exemplo, os alimentos tradicionais que são produzidos pelos mais velhos, atualmente bastante valorizados em circuitos gastronômicos.

“Um dos desdobramentos importantes foi o fato de alguns jovens do projeto passarem a se inserir em atividades produtivas rurais já desenvolvidas por suas famílias. Hoje temos jovens produzindo de forma agroecológica ou se capacitando para fazerem a transição agroecológica. Essa ideia de que é possível viver no campo passou a se efetivar na prática”, finalizou a técnica da Aagra. Uma das coordenadoras da Aagra na época, Cristianlex Soares dos Santos confirma que o projeto passou a fazer parte de uma das linhas de ação da instituição. “A expectativa é dar continuidade ao projeto no âmbito da instituição”, ressalta.

Um dos destaques da publicação são os relatos das experiências vivenciadas por jovens como o alagoano Luiz César da Silva, o sergipano, Egídio dos Santos Neto, o piauiense Miguel Andrade, a paraibana Sidineia Camilo entre tantos outros.

Para Egídio dos Santos Neto, assessor técnico do Centro Dom José Brandão de Castro, participar das oficinas influenciou positivamente inclusive em suas atividades profissionais.  Morador da Aldeia Xokó, da Comunidade Indígena Ilha de São Pedro, em Porto da Folha (SE), ele destacou que as oficinas permitiram maior conexão com sua ancestralidade e identidade. “Hoje, nos encontros e capacitações reservamos um momento para a conexão dos participantes com sua ancestralidade para valorização de suas identidades individuais e comunitárias”, detalha.

Egídio já atuou em diversos projetos que tem como base o desenvolvimento de estratégias de convivência com o semiárido, por exemplo, a implantação de tecnologias sociais como o biodigestor, roçados consorciados, a produção agroecológica de quintais produtivos, a criação de pequenos animais e, recentemente, participou de um projeto do PNUD (Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento) voltado para a recuperação de áreas degradadas, uma parceria com o Ministério do Meio Ambiente.

Mailson Melo, por sua vez, relata que as oficinas contribuíram para fortalecer o seu trabalho com o turismo comunitário em Mocambo (SE). “O turismo de base comunitária tem contribuído para o resgate de nossas origens, da nossa essência”, afirmou o estudante que atua no município como integrante da Pastoral da Juventude Rural da Comunidade Quilombola de Mocambo (SE).

"Compreendemos que esse processo de empoderamento da juventude vem de experiências anteriores. Mas a afirmação da identidade e da ancestralidade e a vivência nas comunidades potencializam essa condição da juventude", ressalta Magda Cruciol, analista da Embrapa Informática Agropecuária, que também coordenou as atividades do projeto, trabalho iniciado quando ainda atuava na Embrapa Meio-Norte.

“As famílias que residem em comunidades rurais têm na agricultura a principal atividade econômica. Nós queremos seguir o caminho dos nossos pais, o caminho da agricultura que nos fez ser quem somos hoje. Porém, precisamos de investimentos, diz o estudante Luiz César da Silva. “O Pedagroeco nos deu visibilidade, permitiu um debate sobre as perspectivas para a agricultura e para o campo, mostrou nosso potencial e a importância de nossas origens e ancestralidades”, afirmou Luiz César da Silva, hoje estudante de Geografia da Universidade Federal de Alagoas, e morador da Comunidade Sítio Pedra Miúda, na cidade de Mata Grande.

Nenhum comentário

'O QUE É QUE JUSTIFICA NESTE MOMENTO O BRASIL NÃO TER VACINAS DISPONÍVEIS PARA A SUA POPULAÇÃO", QUESTIONA MÉDICA E PESQUISADORA DA FIOCRUZ

Ao ser contemplada com o Prêmio São Sebastião, promovido pela Arquidiocese do Rio de Janeiro, a pneumologista e pesquisadora da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz) Margareth Dalcomo fez um desabafo sobre a escassez de vacinas no país, classificando como "injustificado" o fato de o Brasil não ter disponíveis os imunizantes para a população.

"O que é que justifica que, neste momento, um país como o Brasil, a décima ou nona economia do mundo, não tenha uma capacidade competitiva de servir, de servir à nossa obrigação para a qual nós fomos formados. Nós, como médicos, que somos pesquisadores, que temos uma vida pública, o que é que pode justificar, neste momento, cardeal Dom Orani [arcebispo do Rio], que o Brasil não tenha as vacinas disponíveis para a sua população? Isso é absolutamente injustificado. Não há nada, nenhuma explicação que possa justificar isso", lamentou Dalcomo.

Atualmente, o Brasil enfrenta dificuldades para liberar uma carga de 2 milhões de doses da vacina Oxford/AstraZeneca, produzida pelo governo da Índia em parceria com o instituto indiano Serum.

Ao mesmo tempo, laboratórios brasileiros esperam que a China libere a exportação de dois tipos de ingrediente farmacêutico ativo (IFA) produzido em solo chinês. O IFA é a "matéria-prima" para que as vacinas sejam processadas e produzidas no Brasil.

O atraso afeta a produção brasileira da vacina de Oxford, prevista em um contrato da Fiocruz com o laboratório Astrazeneca; e a produção da CoronaVac, fruto de parceria entre o Instituto Butantan e o laboratório chinês Sinovac.

A indefinição sobre o cronograma de importação desses produtos coloca em risco a continuidade do programa de imunização brasileiro – que pode ser interrompido se as novas doses não ficarem prontas até o início de fevereiro.

Visivelmente emocionada, Dalcomo afirmou, no início do discurso, ter recebido a notícia de que as vacinas não viriam da China ou da Índia.

"Eu acho que agora é a hora da sociedade brasileira mostrar, realmente, o que eu tenho tentando chamar [atenção] como médica e como cidadã de consciência cívica. É absolutamente inaceitável que, neste momento, no Brasil, a gente tenha acabado de receber a notícia de que as vacinas não virão da China, e que não virão da Índia", acrescentou.

Em vídeo enviado nesta quarta-feira (20) à TV Globo, a pesquisadora esclareceu que a afirmação sobre as vacinas se referia ao atraso e à "enorme expectativa" de que os imunizantes finalmente cheguem.

"Na verdade, as vacinas chegarão, mas com um atraso que gera em nós uma enorme expectativa. E é com essa expectativa que todos nós continuamos comprometidos pessoal e institucionalmente, para fazer materializar essa ânsia de toda a população brasileira."

A cientista também lembrou que, embora a Fiocruz tenha firmado um acordo de cooperação no ano passado para a entrega do IFA da vacina Oxford/AstraZeneca, o atraso na chegada do insumo representou um fracasso na gestão diplomática.

"Depois de nós termos feito um acordo de cooperação como fizemos, estabelecido ponto a ponto desde agosto do ano passado, que uma instituição pública como a Fiocruz, com a sua linha de produção absolutamente pronta, toda a IFA, o insumo farmacêutico pronto e pago para chegar ao Brasil, e que as gestões diplomáticas tenham fracassado até esse ponto."

Ao retomar as críticas sobre o atraso, Dalcomo foi mais enfática ao dizer que, no momento, a única explicação possível para que país não tenha vacinas para a população é, nas palavras dela, a "incompetência diplomática".

"Não há nada, neste momento, que justifique [o atraso], a não ser a desídia absoluta, a incompetência diplomática do Brasil que não permite que cada um dos senhores aqui presentes, as suas famílias ou aqueles que vocês amam estejam amanhã, ou nos próximos meses, de acordo com o cronograma elaborado, estejam recebendo a única solução que há para uma doença como a Covid-19."

O ministro das Relações Exteriores, Ernesto Araújo, negou nesta quarta que problemas políticos e diplomáticos tenham atrasado as negociações do Brasil com Índia e China, nas últimas semanas, para a importação de ingredientes e de vacinas prontas contra a Covid-19.

"Nós não identificamos nenhum problema de natureza política em relação ao fornecimento desses insumos provenientes da China. [...] Nem nós do Itamaraty, aqui de Brasília, nem a nossa embaixada em Pequim, nem outras áreas do governo identificaram problemas de natureza política, diplomática", afirmou Araújo.

Nenhum comentário

PARA LA TIERRA VOLVER, DE MARÍLIA PARENTE

No dia 16 de julho de 2020, o Engenho Fervedouro ouviu o estampido de sete tiros disparados contra o agricultor Edeilson Alexandre Fernandes da Silva. As sete balas alojaram-se no seu corpo e o eco dos tirombaços procuraram abrigo nos montes e vales, das matas e plantações do município de Jaqueira, em Pernambuco. 

Como na força de uma canção resistente, Edeilson não morreu, não partiu, não tombou para dentro da terra. Com os olhos turvos, com o sangue em fervo, com a hora próxima, seguiu sobre sua moto até ser vencido pela dor. O chão lambeu seu rosto, mas ele estava vivo.

A história dessa emboscada, os pormenores da luta, o diário do assentamento nas terras do Fervedouro, abriram o tempo fechado e salpicaram-se sobre a letra de um poema de Marília Parente, compositora, ativista e pilar de resistência pernambucana. À letra, aplicou-se um tecido de música; à música, um arranjo de canção; à canção, o convívio da voz. À essa luta-canção aplicou-se o título Para la tierra volver. O violão folk, de textura latina, a gaita rural, a guitarra roqueira, bateria comedida, contrabaixo pontuando, em conluio lúdico e orquestrado respiram um oxigênio vindo de um mundo de inspirações e esperanças.

Ninguém atravessará a história de Edeilson sem se perguntar sobre seu corpo fechado, sobre sua fome de viver, sobre seus olhos que insistiram em ver o verde e, em fé, ver o Fervedouro sair da utopia e entrar na canção real. Ninguém, nenhum ouvido, pisará nas plataformas digitais sentindo a canção na voz de Marília e vestirá a roupa da emboscada. A sua voz brinca fugindo das balas. O seu canto é o próprio olho aberto, o seu olho é a justa interpretação de sua alma. Uma canção de quase seis minutos, bem arranjada, cumprindo o seu propósito de adensar poesia à luta pelo chão.

Para la tierra volver tem alma e saber. Belo arranjo, acidentes bem controlados e dosados, melodia sem experimentos inúteis: é um poema em ascensão. Todo o conflito rural, as lutas pela posse da terra, sendo essa mesma terra a dona de tudo e de todos, o panorama das serras e a velha estação ferroviária da Great Western, com um trem que nunca mais chegará a Jaqueira, estão presentes na canção, são a canção, são seu som fundamental. A produção do single é de Marília Parente e Antonio Nolasco. “Não se pode conter a sina de um camponês, da terra ver tudo nascer y para la tierra volver”. Esta canção está marcada para viver.

O texto original foi postado na Revista Kuruma'tá.

*Aderaldo Luciano, nascido em Areia, na Paraíba, é poeta pautado pela estética da poesia do povo. Estudioso da poesia e da música do Brasil profundo, é mestre e doutor em Ciência da Literatura, pela Universidade Federal do Rio de Janeiro. Até junho de 2017 manteve uma coluna semanal no programa Sabadabadoo – A Gente Gosta de Sábado na Rádio Globo (Rio e São Paulo): o Cordel de Notícias.


Nenhum comentário

58 ANOS SEM O MESTRE VITALINO, ARTESÃO E MÚSICO DEIXOU LEGADO PARA A ARTE E A CULTURA BRASILEIRA

2

20 de janeiro de 1963, dia de São Sebastião, 10h de um domingo: Vitalino Pereira dos Santos perdia a batalha contra a varíola, doença infecciosa altamente contagiosa causada por um vírus, muitas vezes transmitido pelas gotículas de saliva, que acarretou na morte do maior ícone da representatividade popular do Nordeste brasileiro. Nesta quarta-feira, o falecimento do mestre completa exatos 58 anos. Ele morreu, aos 54 anos, na casa de taipa onde morava, no Alto do Moura, em Caruaru,  Agreste pernambucano. Anos depois, em 1971, foi inaugurado no local o Museu Mestre Vitalino.


Primeiro ceramista a ter real destaque no país e até internacionalmente, Vitalino foi pioneiro em retratar o cotidiano do povo da zona rural utilizando o barro. Suas peças traduzem os costumes nordestinos, como a vaquejada, o violeiro, os retirantes e as lavadeiras. É chamado de Mestre justamente por ter deixado seguidores. 

Filho dos lavradores Marcelino Pereira dos Santos e Josefa Maria da Conceição, Vitalino nasceu no sítio Ribeira dos Campos, distrito de Caruaru, perto do Rio Ipojuca, Agreste de Pernambuco, no dia 10 de julho de 1909. Ainda criança, aos 6 anos, fez seu primeiro trabalho com as sobras de barro usado por sua mãe na produção de utensílios domésticos, que eram vendidos na Feira de Caruaru. A peça ganhou o título de "Um gato maracajá trepado numa árvore, acuado por um cachorro e o caçador fazendo pontaria". Uma senhora do Recife comprou a obra por dois tostões. 

No ano de 1924, na adolescência, o escultor dedicou-se à música. Passou a tocar pífano e criou a banda Zabumba Vitalino. Alguns exemplares do instrumento de sopro utilizados por ele estão expostos no Museu Mestre Vitalino. A partir dessa época, o artista começou a tratar de temas e elementos folclóricos regionais. Daí pra frente, criou definitivamente seu estilo de obra figurativa, tornando-se uma das referências da cultura popular brasileira. 

Em 10 de dezembro de 1931, aos 22 anos, Vitalino casou-se com Joana Maria da Conceição, com quem teve 16 filhos. Seis sobreviveram: Amaro, Manuel, Severino, Antônio Vitalino, Maria Pereira dos Santos e Maria José Pereira dos Santos. No final da década de 1940, após 17 anos de casamento, ele saiu do sítio Ribeira dos Campos, ao lado da sua família, e se mudou para o Alto do Moura, onde viveu o restante da vida. 

O reconhecimento da obra do Mestre Vitalino ganhou mais relevância após a sua morte. O artesão deixou um legado para a arte e a cultura brasileiras. A produção do caruaruense passou a ser iconográfica e serviu de inspiração para a formação de várias gerações de artistas populares. 

O Museu do Homem do Nordeste (Muhne), a Editora Massangana, a Cinemateca Pernambucana e o Cehibra (Centro de Documentação e de Estudos da História Brasileira Rodrigo Mello Franco de Andrade), vinculados à Fundação Joaquim Nabuco (Fundaj), contam com memórias do Mestre Vitalino. 

O acervo do Museu do Homem do Nordeste é composto por 118 peças do artista, com sete delas cedidas ao Museu Cais do Sertão, localizado no Recife Antigo. No Muhne, há várias obras de Vitalino expostas. Em comemoração ao centenário do artesão, em 2009, o Museu do Homem do Nordeste lançou o livro "Vitalino menino" - roteiro de Walter Ramos e ilustração de João Lin -, que abriu a coleção Brincadeiras de Mestres. 

A Editora Massangana também publicou o livro "Mestre Vitalino" em 1986, da autora Lélia Coelho Frota. Outro exemplar sobre o artista - "Vitalino: um ceramista popular do Nordeste", escrito pelo autor René Ribeiro e publicado pelo Instituto Joaquim Nabuco de Pesquisas Sociais em 1972 - está presente no campus Derby da Fundaj, na Sala de Leitura. (Fonte: Fundaj)

Nenhum comentário

LIVRO OS SERTÕES: OS DISCURSOS E A INFLUÊNCIA DA MÍDIA NA GUERRA DE CANUDOS

A escolha das palavras certas para descrever o ambiente e revelar tragédias. Descortinar violências, "Brasis" diferentes e até a própria consciência. Nas mesmas frases e páginas, misturas de ciências e arte literária. O espírito combativo, curioso e metódico de Euclides da Cunha é anunciado desde as primeiras páginas de Os Sertões (1902), obra monumental da literatura e do jornalismo brasileiro, segundo explicam estudiosos do consagrado escritor, que nasceu em 20 de janeiro de 1866 (há 155 anos). 

Mesmo depois de tanto tempo - a primeira edição do livro saiu em 1902 -, os especialistas ouvidos pela Agência Brasil argumentam que a profundidade do trabalho do brasileiro, marcado pelo olhar científico e ao mesmo tempo artístico, explica a atualidade dos seus escritos e a necessidade de ser revisitado no século 21.   

O autor, ex-oficial do Exército e engenheiro, escrevia para o jornal O Estado de S. Paulo, e foi para a Bahia reportar o que acontecia na Guerra de Canudos (que durou entre novembro de 1896 a outubro de 1897). Euclides esteve na região entre 10 de setembro e 3 de outubro (23 dias) e publicou suas impressões no jornal como Diário de Uma Expedição, a partir das 22 cartas e 55 telegramas escritos. Os trabalhos seriam a inspiração para o livro que seria publicado cinco anos depois, dividido em três partes:  A Terra, O Homem e A Luta. 

Euclides se surpreendeu bastante com o que viu e vivenciou. “Aquela campanha lembra um refluxo para o passado. E foi, na significação integral da palavra, um crime. Denunciemo-lo”, escreveu ele logo na nota preliminar. Segundo pesquisadores, diante do que flagrou, ao invés de compilar relatos e se ater a uma versão do governo central, Euclides mergulhou nas histórias dos sertanejos (sob a liderança polêmica do religioso Antônio Conselheiro), nos contextos amplos do cenários e do ambiente da caatinga e buscou as causas do acontecimento. “Ele sempre acreditou no consórcio entre a ciência e a arte”, afirma o professor de literatura brasileira e hispânica na Universidade da Califórnia, Leopoldo Bernucci, em entrevista por videoconferência. “Euclides tinha uma mente extremamente curiosa em um período marcado pelo culto à ciência”.

O livro Os Sertões, de Euclides da Cunha, publicado, pela primeira vez em 1902, é considerado um marco também para o jornalismo brasileiro (e não apenas para a literatura). Um dos méritos, além da inovação dos caminhos narrativos para história de não-ficção, foi se contrapor a notícias falsas que eram publicadas em jornais da Região Sudeste sobre a Guerra de Canudos. Havia uma ideia que corria pelos veículos e pela opinião pública que a revolta dos sertanejos, na verdade, era uma tentativa de restabelecer a monarquia na década seguinte da proclamação da República.

A professora Walnice Galvão, docente emérita da USP, investigou os discursos dos jornais da época no livro No Calor da Hora. Estas versões, inclusive, trouxeram uma ideia equivocada para o próprio Euclides da Cunha. “Eu percebi, com clareza, como a mídia jornal influenciou o país. Convenceram a opinião pública brasileira que Canudos era uma conspiração restauradora da monarquia, e todo mundo acreditou. Essas notícias falsas estavam nos editoriais, reportagens e até nas caricaturas”, diz, lembrando que os jornais, em tempos sem rádio ou TV, faziam o serviço principal de comunicação.

O professor Leopoldo Bernucci, da Universidade da Califórnia, também chama a atenção sobre o avanço das fake news (notícias falsas) à época, mas reitera que Euclides da Cunha não conseguiria avançar nas pesquisas que lhe renderam o término de Os Sertões sem apoio dos jornais impressos. “Ele tinha também uma ligação muito forte com os jornais e lhe serviu de fontes de informação importantes. Percebi que há diferenças de datas e números em documentos. Uma nova pesquisa que pode ser feita é comparar os documentos para precisar dados sobre eventos históricos”.

Para o professor de direito Arnaldo Godoy, que também é pesquisador em literatura, os escritos de Euclides, bem como a própria trajetória trágica pessoal do escritor, são capazes de provocar estudos sobre notícias falsas. “Considero muito importante tentar compreender o papel da comunicação na construção ou na desconstrução de um criminoso”, afirmou.

Para o professor de jornalismo Edvaldo Pereira Lima, um dos principais pesquisadores de jornalismo literário do país, a obra Os Sertões é marco inquestionável do gênero no país. Ele contextualiza que, em outras coberturas de conflitos bélicos de guerra civil nos Estados Unidos e na África (por parte de correspondentes europeus), existiam iniciativas pioneiras de se amadurecer essa escola narrativa que excedesse a ideia de uma notícia crua. “Isso tem relação com a dificuldade de transmitir a intensidade de um campo de batalha de uma forma fria ou preso apenas à informação”.

No Brasil, o primeiro caso é na obra de Euclides. “Muito mais do que informar, Euclides procura trazer uma leitura completa de compreensão de realidade, trazendo as múltiplas causas e a atenção principal na figura humana. Os Sertões faz com que o leitor compreenda de forma integral aquele acontecimento, em suas diferentes dimensões”, afirma Pereira Lima.

O pesquisador explica que, no jornalismo literário,  as pessoas são tratadas em profundidade e que, na obra euclidiana, há uma leitura quase psicológica. “Jornalismo literário é literatura também. Entendo como literatura tanto a ficção como a não-ficção. Um estilo pautado pela literatura do real. O que caracteriza a literatura é a qualidade e a excelência do nível narrativo. E isso é marcante com Euclides por causa de sua sensibilidade ao trazer aspectos sutis da realidade”. 

Esses aspectos servem para denunciar, investigar e ser caminho inspirador para a transformação social e humana. “Ler a obra é uma experiência de sensibilização para 'ressignificar' a realidade. Uma grande experiência de transformação de consciência para os cidadãos brasileiros”, afirma. (Fonte: Agencia Brasil)
Nenhum comentário

ALERTA: É FALSO QUE MINISTÉRIO DA SAÚDE FAÇA CADASTRO PARA A VACINAÇÃO CONTRA COVID-19 POR TELEFONE OU MENSAGENS

Golpistas se aproveitam da expectativa pela vacinação contra Covid-19 para enganar cidadãos e obter acesso a aplicativos de mensagens como o WhatsApp e o Telegram, segundo informou o Ministério da Saúde.

De acordo com publicação da pasta nas redes sociais, os golpistas ligam para os celulares das vítimas e fazem um falso questionário para levar o cidadão a acreditar no golpe e compartilhar com o criminoso um código que dá acesso aos aplicativos de mensagens.

A isca usada pelos golpistas é a possibilidade de pré-agendar uma data para a vacinação. A pasta, no entanto, não está agendando datas para a vacinação contra a Covid-19 e não faz ligações para cidadãos.

"O Ministério da Saúde esclarece que não realiza agendamento para aplicação de nenhum tipo de vacina, e nem envia códigos para celular dos usuários do SUS (Sistema Único de Saúde). Caso receba solicitação de cadastro, não forneça seus dados e denuncie às autoridades competentes", diz a publicação do ministério nas redes sociais.

Outra modalidade do golpe, também sugerindo agendamento para vacinação contra o novo coronavírus, acontece por meio de SMS. A vítima recebe uma mensagem de texto, supostamente do Ministério da Saúde, pedindo para que clique no link e confirme o código para agendar a vacinação. Ao fazer isso, a vítima dá aos golpistas acesso aos seus aplicativos de mensagem.

Procurado, o Ministério da Saúde não respondeu aos questionamentos enviados pela reportagem.

Nenhum comentário

← Postagens mais recentes Postagens mais antigas → Página inicial