Alexandre Garcia, antigo assessor da ditadura, por Urariano Mota

Entre as notícias leves da semana, esteve a de Alexandre Garcia, ou Alexandre Eggers Garcia, virar porta-voz de Bolsonaro. Depois, Garcia procurou esclarecer a informação, com a eterna modéstia que não lhe falta. Alexandre, o grande jornalista, preferia continuar o seu trabalho para 15 jornais e 280 emissoras de rádio. Apenas. Melhor que Hércules, parecia, por executar mais de doze trabalhos. Mas para quem não sabe, ele escondeu o óbvio, porque é um mestre em omitir. A sua fala, falha ou coluna apenas era, é reproduzida em rede. 

Aliás, por falar em omitir, no seu perfil no Portal dos Jornalistas ele informa, e reproduz depois aonde vai, porque é mestre em rede: “O primeiro emprego no jornalismo foi um estágio na sucursal do Jornal do Brasil (RJ) em Porto Alegre. Começou a escrever na editoria de Economia e se especializou em Bolsa de Valores. Nessa época, conciliava um emprego no Banco do Brasil com o do jornal. Pouco tempo depois, foi contratado pelo JB e largou o trabalho no banco”.

Omitir também é mentir. Se ele saiu por um tempo, sob licença generosa, mais adiante voltou com ainda mais generosidade, porque ocupou cargos comissionados na direção geral do Banco do Brasil. E continuou e saiu no fim muito bem, como pesquiso aqui em um comentário na web:

“Alexandre Garcia é aposentado pelo Banco do Brasil, com uma belíssima aposentadoria paga pela PREVI. Na época, anos 70, havia uma situação esdrúxula, abominável, típica daqueles tempos apelidada de ‘teta dupla’, que consistia no seguinte. O cara estava lá no BB em Brasília, daí através de um ‘pistolão’, era convocado por um órgão público, e o funcionário era cedido para um ministério, por exemplo (Maílson da Nóbrega é outro exemplo), no chamado ‘interesse do serviço, com ônus para o Banco’. O nome ‘teta dupla’ se aplicava porque o cedido acumulava os dois proventos. O BB cedia o funcionário com ônus, isto é, ele continuava na folha de pagamentos e contando tempo de serviço normalmente. Posteriormente isso acabou, agora se o funcionário for cedido ele opta pelo salário do novo órgão ou fica com o salário do BB, porém os custos são repassados. Aposentou-se no topo da carreira, como se tivesse exercido altos cargos por mais de 30 anos. Se passou uns 2 ou 3 anos no BB foi muito”.

Na verdade, no Banco do Brasil ele fingiu trabalhar, porque na ocasião, recebendo salário de comissionado para 8 horas, não cumpria sua jornada. E falava, com modéstia e impunidade, pois sempre esteve a favor dos ventos: “o que outros fazem em oito horas, eu faço em quatro”. Gênio. Os demais, coitados, que se submetessem à carga geral das oito horas por dia.

Nesta semana, ao divulgar as razões para o seu trabalho com a ditadura, neste novo tempo da extrema-direita, ele fala, de passagem: “Certa vez, em casa, eu tirava o suor no chuveiro, minha mulher irrompeu ao banheiro com um ultimato. ‘Ou eu ou o Figueiredo’. E optei pelo Figueiredo”, publicou. É um autêntico puxa-saco de plantão, que se exibe despudorado, como prova maior de amor não há.

A propósito do ilustre servidor da ditadura, há um livro, “No Planalto com a Imprensa”, de André Singer, Mário Hélio Gomes, Carlos Villanova e Jorge Duarte, sobre o qual publiquei breve resenha em  19/01/2011, no Direto da Redação do saudoso Eliakim Araújo. O texto foi reproduzido depois na redecastorphoto e no Observatório da Imprensa.

Ali, pude ver que nos trechos onde o eufemismo recomendaria chamar de momentos menos honrosos do jornalista, eram indicadas ações vis como se fossem coisas bobas, ossos do ofício de experientes assessores, entre um riso e outro.

Ainda que o livro não tivesse qualquer espírito investigativo, pois as palavras dos assessores de imprensa entrevistados eram sempre as últimas e se aceitavam sem qualquer contraditório, podiam ser notados atos falhos dos profissionais no Planalto. A primeira coisa que se percebia vinha a ser  a banalização da ditadura. Era como se um golpe de Estado, censura, clima de terror, torturas e assassinatos não fossem o preço necessário para o acesso agradável aos ditadores da ocasião.

Mas nos flagrantes de ser vil, servil, nada se comparava a Alexandre Garcia, quando esteve numa posição intermediária entre assessor do assessor e secretário do secretário de imprensa de Figueiredo. Ele assim se dirigiu, em suas primeiras horas de poder, ao general Rubem Ludwig:

‘Agora, gostaria de ouvir os seus conselhos de como proceder lá dentro porque costumo vestir a camisa dos lugares onde trabalho.’

Quanta entrega de espírito e devoção à causa para segurar o cargo, poderia ser comentado.
Para Alexandre Garcia, enfim, nada era mais honroso que isto, exibido com orgulho em seu currículo:

‘Condecorado com a OBE (Ordem do Império Britânico) pela Rainha Elizabeth’.  Então a resenha de 2011 concluía: Deus salve a rainha. Para tal honra, John Reed e semelhantes deviam se torcer de inveja por todos os séculos.

Agora, o adulador maior de ditadores fala que não será porta-voz oficial de Bolsonaro. “Porta-voz de todos”, ele publica no Twitter. Mentira. Fora do Planalto, ele serve melhor ao presidente fascista nos comentários e artigos. Aquelas mesmas falas geniais para 15 jornais e 280 emissoras de rádio. A cada frase, nova façanha. Um Hércules da bajulação em rede.  

*Fonte: www.vermelho.org.br
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HUMBERTO TEIXEIRA COMPLETARIA NESTA SÁBADO (5) 104 ANOS DE NASCIMENTO

No Museu da Imagem e do Som Alcântara Nogueira, em Iguatu-Ceará, está exposta uma flauta que tem uma importância fundamental na música brasileira. O seu dono, no entanto, nunca foi reconhecido exatamente pelo talento como flautista, nunca se arvorou a um Pixinguinha, ou Benedito Lacerda, dois grandes flautistas que viveram na sua época.

O dono dela é natural de Iguatu e começou a aprender música na flauta que lhe foi presenteada pelo pai. Teve como professor um tio músico, o maestro Lafaiete Teixeira. E o aprendizado contribuiu para que ele se tornasse um dos mais importantes compositores da música brasileira.
Humberto Cavalcanti de Albuquerque Teixeira, completaria hoje dia (5), 104 anos de seu nascimento.

Humberto Teixeira morreu no dia 03 de outubro de 1979 no Rio de Janeiro.

O Doutor do Baião, como também era conhecido tem uma extensa obra musical, e nem toda composta por baiões. No entanto, foi por este ritmo, estilizado em 1946, em parceria com o pernambucano Luiz Gonzaga, que ele fez fama e fortuna.

O encontro dos dois foi um destes acasos fundamentais que mudaram o curso da música brasileira. Em 1945 Luiz Gonzaga tinha na cabeça a ideia de criar uma nova dança, uma nova tendência musical, baseada nos ritmos que trouxe com ele do sertão de Pernambuco. 

Já começava a fazer sucesso com a Moda da mula preta e Xamego. Seu parceiro mais habitual na época era Miguel Lima. Um dia Gonzaga procurou Lauro Maia, compositor cearense, para juntos deflagrarem o novo ritmo. Maia esquivou-­se da empreitada e sugeriu que Luiz Gonzaga procurasse seu cunhado, o advogado Humberto Teixeira.

Teixeira vinha de uma família classe média, o avô era chefe político da região, o coronel Francisco Alves Teixeira. Adolescente, foi mandado para estudar em Fortaleza, em seguida ao Rio de Janeiro, onde pretendia estudar medicina. Mas mudou de ideia, e fez direito. 

Passou a compor com parceiros durante o curso. A obra que considera inicial intitula­-se Sinfonia do café, composta para um musical chamado Muiraquitã. A composição não fez sucesso, mas agradou a Alberto Byington Junior, presidente da gravadora Columbia (depois Continental). Que gostou da música e pediu que lhe encontrassem o autor.

Dias depois ele recebeu uma ligação de Braguinha, diretor musical da Columbia, pedindo que Humberto Teixeira comparecesse à Columbia porque a Sinfonia do café seria gravada. Cunhado de um compositor bem sucedido como Lauro Maia (casado com a irmã de Humberto), o caminho estava aberto.

Até o encontro com Luiz Gonzaga, o cearense tivera várias composições lançadas por artistas famosos do Rio. Nenhuma, porém, nem de longe chegou perto do que aconteceria com as parcerias que passou a assinar com o pernambucano de Exu, Pernambuco que apareceu em seu escritório, na Avenida Calógeras, Centro do Rio, numa tarde de outono de 1945.

Em entrevista (publicada em livro) ao pesquisador cearense Miguel Ângelo de Azevedo, conhecido como Nirez, Humberto Teixeira contou em detalhes o encontro inicial com Luiz Gonzaga: "Eu fechei praticamente o escritório, como eu fazia sempre que vinha negócio de música. Nós relembramos, retrospectamos em torno dos ritmos nordestinos, do Ceará, de Pernambuco, a terra dele...Naquele dia chegamos a duas conclusões muito interessantes. Uma delas é que a música ou o ritmo que iria servir de lastro para nossa campanha de lançamento da música do Norte, a música nordestina seria o baião. Nós achamos que era o que tinha características mais fáceis, mais uniformes, para se alcançar essa música". Ao final da reunião, a dupla estava com Asa branca praticamente pronta. Três dias mais tarde, fizeram Baião, lançada pelo grupo vocal Quatro Ases e um Curinga, em 1946, gravada por Luiz Gonzaga três anos depois.

Dos muitos parceiros que Luiz Gonzaga teve, foi com Humberto Teixeira, ao menos nos primeiros meses, que Gonzaga mais teve participação ativa na letra ou na música. 

Boa parte do que criaram na primeira safra do baião veio de melodias ou versos de domínio público. Asa branca, Juazeiro, Légua tirana, Baião de dois, eram temas que se cantavam...e que o Brasil e o exterior cantam até os dias de hoje, 2019.
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Cuscuzerias valorizam cultura nordestina no Vale do São Francisco

Uma das bases da alimentação do povo nordestino é, sem dúvidas, o cuscuz. O prato, já tradicional na cultura africana, ganhou novos elementos na vinda ao brasil e se tornou figura habitual nas refeições, acompanhado de ovos, carne de charque, leite ou manteiga.

Se no Brasil o surgimento do cuscuz está ligado às camadas mais pobres da população, como famílias de escravizados que fugiam ou de bandeirantes, hoje o prato é um símbolo do nordeste, o que fica evidente nas camisas, canecas, quadros e memes na internet sobre o prato. No Vale do São Francisco, um dos ramos da culinária local que impressiona quem vem de fora, e até mesmo aos que nasceram às margens do Rio São Francisco, são as cuscuzerias.

A proposta é valorizar o cuscuz, servido em porções individuais, chamadas de “peitinho”, devido á forma da cuscuzeira, e cheio de acompanhamentos como bode, frango, diversos queijos e até banana da terra. Em cada estabelecimento, a média é de 300 pratos por dia e cerca de 300kg de cuscuz por mês. Yeslândia Sampaio há quatro anos começou a vender cuscuz e pastéis junto com seus pais e o irmão em um trailer.

“Começou aquela coisa familiar mesmo, só nós quatro e a gente percebeu que apesar de sair pastel, teve o boom do cuscuz, todo mundo só queria saber do cuscuz recheado. E começou no boca a boca, todo mundo chegava falando”. Hoje, a cuscuzeria batizada de Lampião Aceso, funciona num ponto fixo na cidade, com capacidade para quase 100 pessoas.

O mesmo aconteceu com Jamerson Costa, o Lozão, como é conhecido pelos amigos e família. A ideia de servir o cuscuz veio na casa de amigos, quando viu a cuscuzeira que serve porções individuais. No início, Jamerson conciliava a jornada de trabalho do comércio com a produção dos pratos. Com a demissão no trabalho, a saída foi investir na Lozão Cuscuzeria, que hoje faz até delivery. 

“Inicialmente nós não fazíamos entrega, mas o espaço foi ficando tão pequeno que a gente acabou expandindo, já que fisicamente não dá pra crescer ainda, a gente expandiu para que o nosso cuscuz chegasse à casa dos clientes, das pessoas que não conseguiam ir até lá”.

O que levaria alguém a sair de casa para comer algo que ela mesma pode preparar? O diferencial das cuscuzerias é a variedade de sabores. Além dos acompanhamentos tradicionais, alimentos como o queijo do reino e até o camarão fazem parte dos cardápios, que têm preços baixos e garantem a fidelização dos clientes, como Yeslância explica. 

“A gente tem cliente que janta aqui de segunda á sábado, tem outros que vêm três vezes na semana. Cuscuz não enjoa, é uma maravilha”. Já em Lozão, o cardápio batiza cada prato com uma rua, monumento, bairros da cidade e as ilhas do são Francisco, o que vira um atrativo.

“A gente apresenta ao turista, eu faço isso pessoalmente, dizer o que a gente tem, o que é [a ilha do] rodeadouro, de onde vem [a ilha] do massangano, lá tem o samba de véio. Essa é uma forma de regionalizar e mostrar o que tem, tanto para o turista de casa, como os que vem de fora”.

A valorização da cultura e da culinária nordestina é presente em cada aspecto das cuzcuzerias, que agregam na decoração as chitas, candeeiros, cordéis e outros elementos que garantem que a visita seja uma imersão de sabores e sentidos do que é ser nordestino. 

Mesmo com o crescimento de fast foods, food trucks e franquias de multinacionais na região, as cuscuzerias fazem parte de um nicho específico da culinária, que relembra as origens do povo que aqui vive e as belezas da região, como enfatiza Lozão. 

“A gente nordestino tem que dar esse valor porque somos muito ricos nisso, nossa culinária é deliciosa, de custo baixíssimo. O Nordeste nada mais é do que um cuscuz recheado bem bonito!”.

Fonte: Brasil de Fato (Vanessa Gonzaga)
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Lojas Neto Tintas comemoram 25 anos com sorteio de prêmios e brindes

As Lojas Neto Tintas Automotivas estão em festa neste ano de 2019, isso porque, comemora 25 anos de história na cidade de Petrolina e Juazeiro e consequentemente na região do Vale do São Francisco.

Para compartilhar a festa a loja está promovendo uma grande promoção junto com seus clientes. São inúmeros sorteios de prêmios e brindes. Entre os prêmios os clientes concorrerão ao sorteio de motos no mês de novembro.

As Lojas localizadas em Petrolina (Avenida Sete de Setembro) e Juazeiro (Bairro João XXIII), tem atualmente na gerência administrativa os empresários Italo Lino, Abilio e Icaro. São 25 anos de parceria e empreendedorismo no setor de Tintas Automotivas em Geral.

"o objetivo é manter a valorização dos clientes com a máxima qualidade dos produtos, o que o faz termos maior crediblidade no mercado de pinturas automotivas na região em que atuamos", ressalta Italo.

"Acrescento o que nos foi transmitido, além do amor e paixão, vontade de trabalhar todo dia, uma equipe que  mantêm o ótimo atendimento e o melhor relacionamento com nossos clientes. Estamos sempre atualizados sobre as boas novidades e inovações do setor de pinturas automotivas", concluiu Italo.
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FESTIVAL VIVA DOMINGUINHOS 2019 SERÁ REALIZADO ENTRE 25 A 27 DE ABRIL

O prefeito Izaías Régis divulgou a data no Viva Dominguinhos. O evento será realizado entre os dias 25 e 27 de abril deste ano. 

O Viva Dominguinhos abre a temporada de festividades juninas com uma programação repleta de artistas nacionais e locais que apresentam o autêntico forró nordestino, em homenagem ao sanfoneiro, cantor e compositor Dominguinhos, que nasceu em Garanhuns, e está sepultado no município. 

O gestor do município ressaltou que a festa já faz parte do calendário junino do Nordeste “O Viva Dominguinhos já se consagrou como um dos maiores eventos culturais do Brasil, sendo hoje conhecido nacionalmente como o evento que abre o São João do Nordeste. Nós queremos ressaltar o forró tradicional, além de incentivar projetos e oficinas que fazem Garanhuns respirar cultura durante os três dias de evento. 

O Viva Dominguinhos cresce a cada ano, e em 2019 com certeza teremos um público ainda maior que nos anos anteriores, aumentando nossa movimentação econômica”, comemorou.
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A força negra da compositora paraibana Cátia de França

Cátia de França tem 71 anos e saiu da Paraíba em busca de mostrar sua arte pelo Brasil afora quando tinha apenas 19 anos. Tem em sua bagagem um encontro de letras, sons e sonhos. Suas canções já foram gravadas por grandes nomes da MPB, como Elba Ramalho, Amelinha e Xangai. Tem 6 discos gravados: 20 Palavras ao Redor do Sol (1979), Estilhaços (1980), Feliz  Demais (1985), Avatar (1996), No Bagaço da Cana: Um Brasil Adormecido (2012) e Hóspede da Natureza (2016). Essa mulher forte representa bem o momento político que estamos vivendo, na necessidade de resistir a preconceitos e ao ódio, “mas com o poder do humor” e da arte.

Confira a seguir a conversa entre o BdF e a lenda viva da música brasileira.

*Brasil de Fato: Gostaria que você falasse um pouco da sua origem e da influência da sua mãe, a primeira professora negra da Paraíba, Adélia de França, na constituição do que é Cátia de França hoje?
Cátia de França: Você focar Cátia de França, você tem que saber as origens, o tronco, as raízes, quem foi essa pessoa que me gerou, então tem a presença dela. Minha mãe era uma figura irrequieta para a época, as pessoas que me dizem, andava bem vestida, morava na Rua da República, depois Rua da Pedra, ensinou em Itabaiana, Rio do Peixe, Pedras de Fogo, Guarabira. No entanto, as pessoas acessavam a internet e não tinha nada sobre minha mãe, aí uma universitária daqui de João Pessoa, Simone Cavalcanti, pesquisou sobre ela e passaram a saber quem era ela. Eu estou trabalhando para que essa dissertação seja publicada com a história dela! Tem uma escola aqui em João Pessoa, em Valentina, com o nome dela, mas não tem a foto dela. Era para ter um pôster dela para as crianças saberem quem era ela. Porque meu trabalho é todo em cima de livros? Porque mamãe me deu livros, eu me lembro faltava manteiga, mas não faltava livros, então essa era a figura revolucionária. Na certidão de nascimento dela não dizia que ela era negra, dizia que ela era parda, ela ficava o cão porque botaram parda, ela dizia isso não é coisa nenhuma, eu sou negra, porque não colocaram no meu registro? E o grande senão dela era o não reconhecimento do meu avô, que era um comerciante altamente conhecido no interior, e não assumiu ela, então na certidão dela ficou só o nome da minha avó, que era lavadeira, Severina de França. Mas ela tirou isso de letra, começou a ensinar, era requisitada. A escola dela era na Almeida Barreto, rua do mercado central, de um lado era a casa de hospedagem para rapazes, filhos de fazendeiros do interior da Paraíba, e do outro, eram de moças, e eu convivia com aquele povo todo, entendeu? E ela logo de pequena, ela me deu um piano, com 4 anos de idade, me deu um pianinho de brinquedo, mas saía o som né? Para eu amar aquela coisa, para não ser você tem que ser isso. Com 12 anos, eu recebi um piano caríssimo para a época, imagine com o salário de professora primária, ela me deu um piano alemão, imagino o quanto ela não penou para pagar aquilo! E eu tenho ele até hoje. Eu quero ver se eu faço aqui uma fundação para eu colocar tudo meu, meus papéis, retratos, discos, telas, tudo isso eu quero ver se fica tudo em um canto só, com toda a segurança possível. Tem muito material meu na estação ciência, que eu tenho que retirar de lá e colocar em um canto que ninguém mexa mais. Eu tenho que conseguir isso junto de algum órgão para me dar essa salvaguarda. 

*Sobre a política cultural, como você acha que os governos se comportam frente à arte e à música?
Parece que cultura é uma coisa descartável, mas cultura é a digital de um povo. Você sente como é que se trata as artes populares através disso, e agora está todo mundo meio de cabelo em pé, como é que vai ser depois de janeiro de 2019, como é que vai ser encarado isso? Porque já estavam tentando quebrar o Ministério do Trabalho, você já sente como é que vai ser e o que é que vai vir aí pra a gente...Nesse tempo assim a gente vê quem é quem, a gente anda nas ruas e a gente já vê a digital do que vai vim. Onde eu moro, em São Pedro da Serra (RJ) você já vê a ódio. É uma violência contida, uma coisa contra o negro, contra o índio, contra a população LGBT, as máscaras estão caindo, estou chocada!

*Em 2017, durante entrevista à Revista Trip, você se definiu como uma mulher que tem sangue nas ventas, negra, índia, cigana, bruxa, candomblecista, aquariana, como você enfrenta os preconceitos? Na música também tem preconceito?
Eu ainda me defino assim e ainda mais, sou de esquerda. Na música também tem preconceito, daqui da Paraíba eu fui a primeira mulher a toca guitarra, eu já comecei daí, é uma coisa surda. Os garçons, as atores e atrizes das novelas que são babás, empregadas domésticas, motoristas são, eram sempre de negros, não havia um advogado negro, e no cinema, o racismo é muito mais visível, porque tem grandes roteiristas negras e não são chamadas, diretoras negras e não são chamadas, então é um movimento de amordaçar esse povo. Mas quando isso vem à tona e é publicado, não tem como esconder mais, não tem como segurar esse grito, uma coisa do povo negro com a ajuda dos orixás e dessa gana de sobreviver isso vem à tona. Então está latente!

*Como você define sua arte, você é escritora, multi-instrumentista, compositora?
Eu escrevi um cordel sobre Zumbi em 5 volumes, mas não sigo a métrica do cordel, o meu jeito de escrever cordel eu classifico como “catarinesca”, que é do meu nome Catarina, entendeu? Eu inventei uma modalidade! Está em vias de sair, acho que agora em 2019 sai, o infantil, o Natureza Naturalmente, e o Zumbi e tem o manual da sobrevivência, que é sobre as pessoas que se separam, como sobreviver a um descasamento?

*Com 71 anos, como você avalia a sua trajetória?
Foi preciso muita coragem e minha mãe já preparou para isso porque eu me lembro que com 15 anos ela me mandou para um colégio interno em Pernambuco, aí a família toda ficou em polvorosa, mamãe dizia: eu preparei ela para a vida, ela vai e não vai acontecer nada, eu não posso ir e não tenho tempo porque tudo depende de mim e do meu trabalho, da sobrevivência da gente e meu marido é um homem doente, não vai levar ela. Então eu fui e já comecei com 15 anos pegando 2 ônibus e indo estudar em Pernambuco, saí com 19 anos, formada professora e daí ela começou a dizer que eu saí para ser uma coisa e voltou outra, porque eu me converti a religião evangélica e mamãe não era de religião nenhuma. Mamãe dizia: isso vai criar um obstáculo para o tipo de arte que a minha filha vai exercer, porque tudo não é de Deus, é do demônio e eu não quero isso. Aí mamãe me colocou para andar com o jornalista Diógenes Brayner sair comigo e começar a compor, daí eu comecei, tirei carteira de músico por imposição dela, para eu ficar profissional, e daí eu não parei mais. 
Quando fui para o Rio, aí já tinham pessoas me esperando que arrumaram emprego para mim, mas não na área de música. Aí Elba chega, precisa de músicos aí chama eu, Pedro Osmar, Damilton Viana, Vital Farias, e a gente foi requisitado para fazer teatro, a parte de música junto para ir para São Paulo e daí não parei mais. Então eu peguei os anos de chumbo de São Paulo, em 1975.

*Sobre esses tempos que não podiam falar de política, do que você se lembra?
Eu me lembro que a música chegava a partir de corais, os estudantes liam partituras nas escolas e isso na época foi tudo retirado durante a ditadura. E a tendência é isso mesmo eles não querem que as pessoas se expressem, uma certa liberdade que pode dar vazão aquele grito que precisa sair, isso é retirado. Então na época em 1975, onde tinha nordestino, a polícia caía logo em cima. Ficam por ali os olheiros, quando sabia, a gente ficava num canto que tinha papéis dizendo que a gente estava trabalhando no teatro em frente, mas mesmo assim fomos colocados em um camburão, juntou bastante gente e para não observarem isso, fomos soltos na rua de trás. Foi um negócio muito estranho.

*E qual o papel da arte para sobrevivermos a tempos de ódio e intolerância?
Sempre, não precisa nem cantar, entendeu? Um traço que você dê num muro, o grafismo, qualquer manifestação artística você pode desmembrar e desmascarar e criar um coágulo nesse organismo que se instalou por causa de inércia da gente. Isso veio não foi de uma hora para a outra, sabe aquela coisa de ir deixando, permitindo, entendeu? A mesma coisa da igreja católica, a igreja católica se achando com aquela coisa, de repente outras religiões tomaram a frente e agora é o agronegócio e as igrejas que não sejam de matrizes católicas, tomaram o poder. No Rio de Janeiro a gente sente isso e a tendência é essa. Se você for ler a bíblia, com um olhar de abertura, em momento algum, esse ensinamento diz que é para pegar as armas. Não!  Bíblia é amor, condescendência, então quando Jesus fez o Ministério dele, ele não foi pegar cabeças coroadas na Sinagoga, ele não pegou doutores, ele pegou pescadores, lavradores, foi numa casta mais humilde que ele pousou a igreja dele, então existe toda uma mentira, o gesto de arma na mão, isso não vem da Bíblia, na Bíblia não tem isso. Se quiser ler da maneira correta, ali na bíblia não se ensina isso, então usam para querem mascara, confundir e é tudo em cima de coisas mentirosas, é o tal do fake news. Vi tios mandar fotos de fuzil para o sobrinho dizendo: olha aqui para você! Então gente tem que mais do que nunca que dar as mãos e se preparar porque temos mais 4 anos pela frente.

*Muitos jovens redescobriram Cátia de França. Como você recebeu isso?
Foi a internet. A internet é uma faca de dois gumes, tanto pode usar para porcaria, como pode usar para ter acesso. No momento que acabaram as lojas, não se vendem mais discos, os meninos baixam tudo na internet. Onde eu chego predomina só jovens cantando junto, no Circo Voador, no Rio de Janeiro e em Belo Horizonte, recentemente, foi assim. Então a internet me colocou de novo no topo, enquanto que a mídia burra quer me amordaçar porque não interessa uma meia dúzia que tem na mão o monopólio da mídia, a eles não interessa uma negra, com ideias de esquerda, lésbica e de macumba, não querem, é muita minoria em cima, então a internet que me colocou no meu devido lugar, onde merecidamente eu teria que estar.

*Como você quer ser lembrada?
É o poder do humor, faz rir, mas também faz pensar. O poder da dança, meu trabalho é todo suingado mas ali pelo meio, se você ver o texto que eu estou dizendo, daquela capoeira, “sustenta a pisada”, eu aliada à literatura cortante como de João Cabral de Melo Neto, de José Lins do Rego, que é aqui da Paraíba, Guimarães Rosa, a coisa da criança que existe dentro da gente, que é o Manoel de Barros. 
Você pode dizer grandes coisas, mas não pode deixar essa criança, a gente não pode deixar de rir e de dançar, porque enquanto há vida, há reação e há esperança. E não esquecer nunca que a minha mãe lá trás, Adélia de França, ela é uma pessoa do humor, uma vez ela estava dando aula e o côco caiu na cabeça dela, ela riu, e disse: - Levei agora mesmo um cascudo de Deus! 
Então minha mãe e minha parte negra da família tinham muito humor, minha tia Celina era muito engraçada. Então eu quero ser lembrada, a filha da Adélia, que tinha como livro de cabeceira Geografia da Fome, de Josué de Castro e tinha na parece de casa, de um lado Dom Hélder Câmara e do outro, Che Guevara, minha mãe era assim, e eu quero sempre que lembrei disso.

Fonte: Brasil de Fato
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Ivanildo Vila Nova diz que cantoria de Viola não dá sinal de cansaço

A cantoria popular existe há mais de 200 anos e para o repentista Ivanildo Vila Nova, ela não dá sinais de cansaço. Ele é uma das atrações da primeira edição do projeto De Repente no Espaço de 2019, realizada pela Fundação Espaço Cultural (Funesc). Ele e o potiguar Miro Pereira fazem uma espécie de “duelo” de versos hoje no palco do 29º Salão de Artesanato da Paraíba.

Quem já conhece a dinâmica das apresentações do De Repente no Espaço já está familiarizado com a figura de Iponax Vila Nova, declamador oficial do evento e filho de Ivanildo. Ele introduz os convidados e pede ajuda da plateia para apresentar motes, temas e palavras, que serão incorporadas aos versos ágeis e improvisados dos repentistas.

Há quase 60 anos no ofício, Ivanildo ficou nacionalmente conhecido por conta de “Nordeste Independente”, parceria com Braulio Tavares gravada por Elba Ramalho em 1984. Censurada pela Ditadura Militar, a canção evidencia as riquezas do Nordeste em uma resposta à xenofobia que sulistas e sudestinos dirigiam aos nordestinos.

Para o repentista, exercer essa profissão exige uma série de coisas, sendo uma das principais um repertório. “Desde sempre, o cantador tinha que estar antenado e saber do que acontecia na cidade, no país, para poder pensar rapidamente e improvisar versos. Desde quando entra na profissão, ele precisa ter certo conhecimento humanístico”, afirma.

O pernambucano é conhecido por muitos como o maior cantador da atualidade, com participação em mais de 500 congressos, noitadas e torneios de cantadores. Miro também não fica atrás. Com mais de 30 anos de estrada, já participou de mais de 300 festivais, além de promover eventos de cantoria no interior do Rio Grande do Norte.
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