JURANDY DA FEIRA: DE PÉ NA ESTRADA, TERRA VIDA ESPERANÇA, CANTO DO POVO, FRUTOS DA TERRA

Jurandy estará se apresentando em Ouricuri, Pernambuco, no sábado 27, no tradicional Forró do Poeirão, evento organizado pelo compositor e cantor Tacyo Carvalho, que também contará com a presença de Joquinha Gonzaga. Jurandy na vida e obra de Luiz Gonzaga é presente e futuro. É tese e síntese de talento e dedicação ao melhor da música brasileira.

Em dezembro de 2017, as festividades dos 105 anos de Luiz Gonzaga, em Exu, Pernambuco, contou com a presença de Jurandy da Feira. A voz de Jurandy e seus versos provocaram um turbilhão de Felicidade/Encontro aos gonzagueanos de
toda parte do Brasil, que visitam Exu, neste período do ano, na esperança de colher os bons frutos da música e memória de privilegiados que conviveram com o Rei do Baião.

Morador do Rio de Janeiro há mais de 40 anos, Jurandy mantém a sua essência e nunca deixa de estar bem perto do Nordeste, ao tomar em consideração suas escolhas estéticas e de repertório. Em Exu, o cantor reviveu as emoções ao falar de Luiz Gonzaga e da cultura brasileira. 

Jurandy é o compositor entre outros sucessos das músicas Frutos da Terra, Nos Cafundó de Bodocó, Canto do Povo, além de Terra Vida Esperança. Para Jurandy, a resistência é o que faz sentido para seguir no meio musical, pois somente o talento não basta. 

A história conta que Luiz Gonzaga costumava acolher em casa compositores, em quem descobrisse afinidades, e acreditasse, obviamente, no talento. Depois de avisar que seriam gravados por ele, vinha o convite para ir ao Rio de Janeiro.

Jurandy Ferreira Gomes, é conhecido como Jurandy da Feira, o “da Feira” foi praticamente imposto por Luiz Gonzaga. Quando começou a aparecer como artista em sua cidade natal, Tucano, no sertão da Bahia, ele era chamado de Jurandy da Viola, por causa do violão, seu instrumento desde a adolescência.

“Quando Luiz Gonzaga gravou a primeira música minha, quando fui olhar no selo do disco. Estava lá Jurandy da Feira. Fui conversar com ele. Disse que aquilo não ia pegar bem na minha cidade, porque iam pensar que eu queria ser de Feira de Santana. Ele disse que não era de Feira de Santana, mas da feira, a feira do povo, do cantador. Acabei concordando, mas até hoje eu tenho que me explicar ao povo de lá”, conta Jurandy, em visita a Petrolina. 

Luiz Gonzaga em vida, sorria e se divertia com esta história e explicava: "Eu botei assim, para lembrar o lado de cantador, de poeta de cordel em feiras livres do Interior. O talento de Jurandy é de uma riqueza muito grande, igual a dia de feira."

Para o ano de 2018, Jurandy da Feira, está repleto de poesia, música e um novo CD.

O compositor tinha 24 anos quando conheceu o Rei do Baião. Foi levado a ele por José Malta, um jornalista, e produtor dos shows de Gonzagão. “Fomos para Exu, para a casa de Luiz Gonzaga. Passei uma semana lá. Mas era aquela coisa. Ninguém chegava a Gonzaga. Ele é que chegava às pessoas. Era fechado, meio cismado. Foi ele que se chegou pra mim, e perguntou sobre o violão que eu havia levado comigo. Se eu tinha um violão, por que não tocava? Quis saber se eu fazia músicas. Pediu para cantar para ele. Depois me disse que queria uma música que falasse de Bodocó”. 

Passou algum tempo e eu fiz Nos cafundó de Bodocó. O cafundó, foi porque eu achei que a cidade ficava longe de tudo. Naquela época ainda estavam asfaltando as estradas, e fui da Bahia até lá de Karmann-Ghia (carro esportivo, de dois lugares, saído de linha em 1971), a maior poeira, foi um sofrimento a viagem até o sertão pernambucano”.

Luiz Gonzaga gostou de Nos cafundó de Bodocó. Veio o inevitável convite para ir ao Rio. A música foi aprovada pelos produtores de Gonzagão na época, coincidentemente dois pernambucanos, Rildo Hora e Luiz Bandeira. Nos cafundó de Bodocó entrou num dos melhores álbuns de Luiz Gonzaga nos anos 70, Capim novo (1976). Lula gravaria mais outras três composições de Jurandy, que sacramentariam uma amizade que durou até o final da vida de Lua. 

O baiano, portanto, testemunhou os bons e maus momentos de Luiz Gonzaga em suas duas últimas décadas de vida: “Ele passou uma época em baixa. Várias vezes assisti a apresentações suas numa churrascaria chamada Minuano, na estrada Rio/São Paulo. Era aquele barulho de churrascaria. Mas quando ele dava o boa noite., pra começar a cantar, menino ficava quieto. Os adultos se calavam. Ficava silêncio enquanto ele cantava”.

Foi Luiz Gonzaga que levou Jurandy para gravadora, e ajudou a suas músicas serem gravadas por nomes como Trio Nordestino, Terezinha de Jesus. Atualmente Jurandy da Feira é um dos artistas mais admirados no meio da cultura brasileira e gonzagueana.

“Ele, Luiz Gonzaga, chegou a me prestigiar num show num colégio de padres em Tucano, minha terra natal. Passou a me apelidar de “minha paz”, porque quando chegava sempre desejava a ele: “Uma paz, seu Luiz”, relembra emocionado Jurandy.

Jurandy traz a poesia do ritmo da cultura brasileira na alma. É fartura de dia de Feira.  Luiz Gonzaga sabia reconhecer um fiel discípulo...Tenho Dito...
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ABERTAS AS INSCRIÇÕES PARA A APRESENTAÇÃO DE TRABALHOS NO CLISERTÃO 2018

Gestores, educadores e amantes da leitura já podem inscrever seus trabalhos científicos, até o dia 20 de fevereiro, no 4º Congresso Internacional do Livro, da Leitura e da Literatura no Sertão (Clisertão). O evento, promovido pela Universidade de Pernambuco (UPE), campus Petrolina, ocorrerá entre os dias 7 e 11 de maio, e vai abordar o tema ‘As Margens da/na Literatura, Linguagem e Leitura’.

Os interessados devem fazer suas inscrições através do email: clisertao4@yahoo.com.  É necessário o envio de um resumo do trabalho, contendo entre 15 e 25 linhas, o comprovante de pagamento e os dados do autor ou autores. O modelo com a ficha de inscrição está disponível no edital do congresso.

Segundo a coordenação do evento, os trabalhos serão avaliados por uma Comissão Científica, que dentre vários pontos, analisará a pertinência da obra junto ao Clisertão. A lista com os trabalhos aceitos será publicada no site da UPE (www.upe.br/petrolina) até o dia 10 de março.

Entre as linhas temáticas do evento, estão a ‘Leitura, Hibridismo e Desterritorialização’, ‘Literatura Popular’, ‘Cadeia Produtiva do Livro’, ‘Os discursos reinventados sobre o Sertão’ e ‘Aspectos sociais da leitura, do livro e/ou da literatura’.

Com a proposta de discutir a produção e circulação do livro em Petrolina e região, o 4º Clisertão será dividido por espaços de vivências e realizado em diversos locais da cidade. Na UPE, vão ser apresentados, entre outras coisas, conferências, minicursos, saraus, teatros e mesas redondas. Também haverá espaço para a ecoleitura, que ocorrerá em vinícolas, ilhas e sítios arqueológicos. O congresso ainda incluirá escolas, praças e barquinhas na programação, com o objetivo de promover troca de saberes.

Este ano, o Clisertão, que já se consolidou como um dos principais eventos socioculturais da região, trará para o município personalidades como o linguista e escritor, Marcos Bagno (UnB); o poeta Jessier Quirino; o crítico literário Flavio Kothe (UnB); e o jornalista Eric Nepomuceno. Além deles, estarão presentes os convidados internacionais Elicura Chiuhailaf (um dos mais importantes escritores do Chile); Pablo Montoya (Colômbia, vencedor do Prêmio Casa de las Americas); Alejandro Reyes (México); Abdulbaset Jarour (Síria) e Keto Kebongo (República do Congo).





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ELIAS LOURENÇO, O PROGRAMA ALÔ NORDESTE, UMA PAIXÃO PELO RÁDIO E LUIZ GONZAGA

Lá na Paraíba, nas palavras do amigo e  professor Aderaldo Luciano, "durante todo o tempo em que me entendo por gente vi surgir e consolidar-se dentro de mim o amor e o respeito pelo Rádio. Ainda criança, botei os olhos num rádio Semp à válvula e certa vez meu pai, Francisco Assis Guedes, me levou a Campina Grande, para conhecer os estúdios da Rádio Borborema. Ali vi os mistérios que envolvem o Rádio".

Nos anos 80 e 90 não havia a facilidade da tecnologia e por isto, "tornei-me notívago, navegando no dial, buscando emissores de longe, locutores que me falariam de cidades e acontecimentos que eu planejava vivenciar. Durante o dia me via rodeado pelas rádios locais, pelas ondas que vinham de Campina Grande e suas três rádios AM: Caturité, Cariri e Borborema. Nomes fortes, direto de nossas raízes".

Foi na programação das rádios que aprendi a viver a brasilidade. Retalhos do Sertão, Bom dia Nordeste (com Zé Bezerra) cuja abertura era um jingle sensacional de João Gonçalves. José Lira na Campina Grande FM. Ivan Ferraz, Wilson Maux. Todos mestres...

Mas, o meu encanto e aprendizado maior aconteceu quando um dia sintonizei a Rádio Clube de Pernambuco, Recife. A voz de ELIAS LOURENÇO. No clima da notícia. Alô Nordeste! Elias chamando prá cantar Jorge de Altinho, Flávio José, Petrúcio Amorim, Marinês, Elba Ramalho, Raimundo Fagner, Três do Nordeste, Assisão Trio Nordestino, cantadores de Viola, aboiadores e Luiz Gonzaga.

Uma madrugada, muito frio em Areia-Paraíba, através do Rádio ouvi Elias Lourenço anunciando numa quarta-feira, 02 de agosto de 1989: "Morreu Luiz Gonzaga". Chorei em silêncio! Não imaginava o traçava o destino. O silêncio foi "quebrado" pela som do Rádio,  a sanfona de Luiz Gonzaga, a voz de Elias Lourenço: "são quatro da manhã e trinta minutos no Nordeste"...

Ontem, através do amigo Edilson Gonzaga, lá de Gravatá-Pernambuco, revivi toda esta trajetória desde quando por décadas acompanho Elias Lourenço através do Rádio. Não o conheço pessoalmente, Elias Lourenço, mas trago nele um sentimento de gratidão. Gratidão pela minha formação profissional...Sou grato porque com Elias Lourenço aprendi amar ainda mais meu Nordeste, a cultura brasileira e os estudos, afinal, só a Educação Liberta.

Atualmente Elias Lourenço faz o programa Alô Nordeste na Rádio Folha em Recife de segunda a sexta - 2h às 5h e no Sábado - 2h às 6h. No último dia 12 de janeiro ele completou 79 anos. Veterano profissional do rádio, Elias Lourenço percorreu uma longa carreira para chegar hoje a ser considerado um dos radialistas mais queridos e respeitados perante os ouvintes. 

Seu trabalho sempre é voltado para a divulgação da cultura brasileira e em seus programas tem procurado ressaltar o talento do artista regional, particularmente aqueles que se dedicam aos ritmos mais típicos da região, como o forró. 

Elias Lorenço é pernambucano de Arcoverde. Já trabalhou na comunicação das Rádios Atual, de São Paulo; Poty, de Paulo Afonso: e em Pernambuco percorreu quase todos os prefixos radiofônicos – Olinda, Globo, Relógio, Capibaribe, Continental, Jornal, Clube e agora na Folha FM.

Um dia, me vi do lado de dentro na Rádio Serrana de Araruna-Paraíba com os amigo Aderaldo Luciano que me fez o convite em 1999, para participar da produção e apresentação de um programa de Rádio. E então até hoje, jornalista, empresto minha homenagem e gratidão, valorização pela cultura a Aderaldo e a você, até hoje minha referência de apresentador de Rádio.

Para minha alegria e compromisso profissional, hoje estou na Rádio Emissora Rural, apresento o programa Nas Asas da Asa Branca-Viva Luiz Gonzaga, todos os domingos ás 7hs da manhã. 

'O rádio está vivo, a faixa AM está viva, querem matá-la no Brasil, mas ela ainda representa uma enorme atividade pelo interior dos Brasis. Amo o Rádio, Sinto-me parte dele, Sou um guardião, embora tanta coisa ruim aconteça aos seus microfones. Mas uma coisa é o Rádio, a outra, seus donos e vozes".
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FORRÓ DO POEIRÃO EM OURICURI TERÁ TÁCYO CARVALHO, JOQUINHA GONZAGA E JANDUY DA FEIRA

Tacyo Carvalho, Joquinha Gonzaga, Dijesus, Jurandy da Feira se apresentam no sábado (27), no Forró do Poeirão, a partir das 13h, em Ouricuri-Pernambuco, na Churrascaria Chico Guilherme. O evento será um Tributo a Luiz Gonzaga e tem o objetivo de valorizar a passagem do Dia Nacional do Forró, comemorado no dia 13 de dezembro – data de nascimento do Rei do Baião –, e também uma homenagem a todos os seguidores de Luiz Gonzaga

Segundo Tacyo Carvalho, cantor e compositor, organizador do Forró do Poeirão, o Tributo acontece e dá visibilidade aos músicos e ao próprio forró. “O projeto amplia o espaço para os artistas divulgarem seus trabalhos. O compromisso é o legado deixado por Luiz Gonzaga”.

Tácyo ganhou o apelido de Luiz Gonzaga: o garotão de Ouricuri. Isto aconteceu devido a popularidade que Tácyo atingiu apresentando programas de Rádio no Rio de Janeiro e sendo um dos responsáveis em divulgar a vida e obra de Luiz Gonzaga nos meios de comunicação no sudeste. Tácyo é o autor de Trem do Sertão, uma das mais belas músicas do cancioneiro brasileiro. 

"O forró do poeirão é uma oportunidade de fazermos um grande encontro, confraternização de amigos e amantes da boa música e valorizar nosso forró, xote e baião".

As camisas custam R$ 25 e darão direito a entrada do evento. Contatos: 71 994066714
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JURANI CLEMENTINO, VÁRZEA ALEGRE E A CULTURA QUE TRANSFORMA

Recebi a notícia de que uma crônica, escrita por mim, foi vencedora de um concurso cultural realizado em São Paulo. A competição literária faz parte das comemorações dos 70 anos da Livraria Cultura e tem como tema a seguinte pergunta: Como a cultura te transforma?  A história vencedora garante uma viagem para Nova Iorque nos Estados Unidos. Compartilho com vocês o conteúdo da minha crônica que narra a experiência comum a muitos nordestinos que saem de suas terras rumo à cidade grande…

**Nasci numa família simples, do interior do Ceará, que tinha pouco acesso à cultura escrita. Cresci ouvindo histórias narradas apaixonadamente pelos mais velhos. Aos vinte anos segui o destino irremediável a todos aqueles jovens que ali moravam. Peguei a estrada rumo à cidade de São Paulo em busca de emprego. Como eles mesmos diziam: atrás de uma vida melhor. Mas eu não fazia a menor ideia do que seria uma vida melhor. Minha vida podia não ser muito boa, mas descobri que trabalhar em São Paulo nem sempre significava melhorar a vida. Até que um dia, deixei a zona sul, onde morava na casa de uma tia, e fui a Avenida Paulista. Não recordo exatamente qual o dia da semana. Provavelmente um sábado. Dia de folga. E lá me deparei com algo que se se aproximava da minha concepção de melhorar de vida. Vou explicar.

Sempre gostei de ler. Na escola, conheci autores clássicos de nossa literatura como: Rachel de Queiroz, Machado de Assis, Vinicius de Moraes, José de Alencar, Clarice Lispector… Desejava ser igual a eles. Queria ser escritor também. Aquela viagem ao centro de São Paulo mudaria a minha vida. Não queria dizer que acidentalmente entrei naquela galeria de lojas onde estava instalada a Livraria Cultura, mas o fato é que não fui ali de propósito. Acho que, como muita coisa na minha vida, encontrar aquele espaço, foi mais um dos acasos que me aconteceram. Ali eu me reencontrei. Ali eu percebia o significado de uma vida melhor. Uma vida melhor pra mim era ter uma livraria em casa.

Quantos livros, meu Deus! Parei por alguns instantes e contemplei o espaço como se admira um belo pôr do sol no sertão. Eu era a própria tradução da felicidade. Desejei morar ali. E como sabia que aquele desejo não passava de um devaneio particular, fiquei durante horas circulando por entre as prateleiras. Como não podia comprar aqueles livros que tanto desejava, tocava neles, abria, lia a orelha, sentia-os em minhas mãos, abraçava-os e colocava lentamente no lugar. Eu cuidava deles como se fossem meus. Fiquei ali sem pressa. Não vi as horas passar. Não senti fome. Não me deu sede porque toda a sede que eu tinha parecia saciada. Tinha sede de leitura.

Como foi difícil sair dali. Eu não fazia ideia de quando aquele momento ia se repetir. E por isso protelava tanto a minha despedida. Queria que aquele dia não acabasse. Tudo que eu desejava podia encontrar ali. Meses depois abandonei o emprego de metalúrgico e voltei pra o Nordeste. Investi no estudo. Conclui minha graduação em Jornalismo numa universidade pública e fiz Mestrado e Doutorado em Ciências Sociais. Nesse período também escrevi um livro biográfico sobre um importante compositor de Luiz Gonzaga. Sempre que volto a São Paulo faço questão de ir a paulista. Não sei exatamente se busco novidades literárias, tenho certeza que vou, em vão, atrás daquela primeira sensação. Foi uma sensação agradável que me deu coragem para correr atrás dos meus objetivos e ser o que sou hoje.
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COM RIMAS E SONHOS, POESIA AINDA MUDA CONTIDIANO E DEFINE VIDAS EM SÃO JOSÉ DO EGITO

Há dezenas (talvez centenas) de anos, uma viola foi enterrada no leito do Rio Pajeú. Desde então, quem bebeu de sua água, virou poeta. A lenda sertaneja pode até não ser verdade, mas foi a forma
que o povo encontrou para explicar porque existe tanto talento para a poesia em um só lugar. “Bom dia, poeta”, diz um. “Bom dia, poeta”, responde o outro. Vendedor, professor, farmacêutico… Seja no improviso ou munido de violas, há uma população inteira de cantadores poetas em São José do Egito, a 404 km do Recife. Considerada berço imortal da poesia, a cidade preserva, há gerações, a tradicional cultura que floresceu às margens do rio.

A relação da cidade com as palavras começou na colonização do Brasil pelos portugueses: “Os portugueses trouxeram a sonoridade do baião de viola e as influências dos mouros, muçulmanos que invadiram a Península Ibérica. Digamos que os cantadores são uma evolução dos trovadores”, afirma Fábio Renato Lima, professor de história na cidade e coordenador da banda Vozes e Versos. Talvez por isso o vocativo esteja presente em qualquer cumprimento na cidade. É uma populaçaõ de “poetas”.

A história do local está ligada a duas cidades vizinhas. Eles acreditam que as pessoas tenham seguido o percurso do rio no período da colonização, passando primeiro pelo “ventre da poesia”, Itapetim (PE) e por Teixeira (PB), considerada local de troca cultural entre os ibéricos e o povo da região. São José do Egito é a mais próxima do rio e o maior entre os três municípios, terminando por acolher os poetas da região e ganhando a alcunha de berço.

“Podemos comparar o processo que aconteceu em São José do Egito com o que aconteceu na Grécia. O país fabricou muitos filósofos e a cidade pernambucana conseguiu dar sequência aos seus poetas. É impressionante como eles têm orgulho de suas raízes”, explica Lourival Holanda, professor de letras e entusiasta da cultura popular.

Os poetas do Pajeú são comparados com os trovadores porque a poesia feita por eles não é tão simples como você pode imaginar. A mais tradicional é feita de improviso e ela não é formada apenas por quaisquer palavras que vêm à mente, mas possuem rima e métrica, como explica o historiador Fábio Renato: “Ela já surgiu metrificada, não é uma poesia livre”, explica.

A métrica é feita pela contagem das sílabas tônicas em um verso. Por exemplo, se a primeira linha do verso tiver sete sílabas tônicas, as demais linhas precisam ter a mesma quantidade.

á a rima é considerada por eles um pouco mais simples. “Se for, por exemplo, uma quadra (quatro linhas), as linhas pares precisam rimar”, explica Fábio sobre o que forma a sonoridade poética e a declamação cantada e arrastada dos poetas da região.

A dificuldade de adequação não impede que novos poetas surjam na cidade, porque essa é a forma natural de expressão que os filhos do município encontram. Vinícius Gregório, começou nessa aventura aos 14 anos para descrever a saudade originada com a mudança para o Recife.

“Eu comecei a relatar as fases da minha vida e a temática varia entre a saudade, amor, amizade e questões sociais”, conta.

Um dos poetas mais famosos do Sertão pernambucano, Lourival Batista assinava suas obras com o próprio nome, mas era reconhecido mesmo como Louro do Pajeú. Precursor da “escola” da poesia de São José do Egito, teve o talento reconhecido por nomes políticos e artísticos de expressão nacional, com reconhecimento que o fez famoso em todo o país. 

Entre os nomes que o reverenciaram estavam Gilberto Gil – que, na época da Tropicália, visitou sua casa no Sertão pernambucano – ou Luiz Gonzaga, que não escondia admiração ao sertanejo. Tanto clamor o ajudou a ir além da poesia aos olhos da população local.

“A casa do meu avô era aberta para quem quisesse entrar. As pessoas se sentiam à vontade nela”, conta o neto Antônio Marinho, sobre as lembranças de sua infância. “Toda as noites, minha avó fazia uma sopa. Não me lembro de ter sentado uma única vez e não ter encontrado, além da minha família, ao menos uma pessoa desconhecida para o jantar. Meu avô não julgava ninguém. Já vi sentar com a gente prostitutas, bêbados e homossexuais, pessoas bastante discriminadas pelo povo da época”, completa. Após a ceia, era o momento reservado para a poesia, declamada se sobremesa fosse.

Tamanha popularidade fez com que o aniversário (6 de janeiro) de Louro do Pajeú virasse evento oficial da cidade. Poetas e cantadores de viola da região de diferentes gerações uniam-se na grande casa na cidade, mesmo depois da morte do poeta, em dezembro de 1992. “A festa sempre foi muito forte. Mas em 2005, minha avó, Helena, faleceu e a casa ficou fechada”, diz Marinho. Cansados de ver a receptiva casa fechada, desde 2011 a comemoração foi retomada, com direito a trio de forró pé-de-serra em frente à residência. No ano seguinte, virou festival municipal, com palcos e oficinas.

A marca de Lourival Batista continua exposta. “Criamos o Instituto Lourival Batista, a Casa do Repente. Na entrada, tem uma placa de 1989 que Miguel Arraes levou para meu avô homenageando o repente”, explica Marinho. 

Fonte: Mayra Couto-Jornalista
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TRIO SINHÁ FLOR MENINAS INSPIRADAS NA SANFONA GONZAGUEANA

Fui apresentado ao Trio Sinha Flor pelo pesquisador Higino Canuto. Daí em diante foi amor pela música e voz dessas três meninas nascidas em Belo Horizonte, mas que vivem em São Paulo, dão uma visão bem sofisticada ao autêntico forró pé-de-serra. 

As mineiras mesclam o ritmo baião com suavidade e profissionalismo e o melhor sem se afastar das raizes fincadas em Luiz Gonzaga. Não é muito comum vermos bandas femininas de forró, ainda mais que, além de tocar e cantar, ainda compõem suas letras. 

O Trio Sinhá Flor, formado por Carol Bahiense (triângulo, sanfona e voz), Cimara Fróis (sanfona e voz) e Talita del Collado (zabumba, violão, flautas, percussão e voz), residentes em São Paulo, levam a rica e tradicional cultura nordestina aos setes cantos do país, propondo uma nova formação do gênero, mostrando que zabumba, sanfona e triângulo também são instrumentos para as mulheres.

Além do forró, o trio mescla outros estilos e arranjos a suas composições, dando uma cara própria ao grupo, em um repertório que vai de Luiz Gonzaga à MPB moderna, além de buscar inspiração em grupos vocais e expoentes de outros gêneros, como Quatro Ases e Um Coringa, Demônios da Garoa, Trio Esperança e Quarteto em Cy, apresentando um forró com uma roupagem mais contemporânea, flertando com o jazz até.

As artistas têm uma performance única e peculiar no palco, nascida das experiências e conhecimentos pessoais de cada integrante, contribuindo para que cada apresentação seja única e especial, não apenas para dançar, mas também ao assistir.

As meninas têm três projetos realizados: “Uma Homenagem ao Rei do Baião”, “Histórias Cantadas do Sertão Brasileiro” e “Forró Floreado”, todos enfatizando a cultura brasileira.
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