Compositor cearense tem vida retratada em Livro de Jurani Clementino

“Certo mesmo é um ditado do povo/ Pra cavalo velho, o remédio é capim novo…”

Quem não conhece os versos acima, que fazem parte do refrão de um dos maiores sucessos e Luiz Gonzaga nos anos 1970? Capim novo, conhecida nacionalmente pela inclusão na trilha da primeira versão da novela Saramandaia, foi escrita pelo compositor cearense Zé Clementino (1936-2005).


A inspiração para a letra é autobiográfica, revela o jornalista e professor universitário Jurani Clementino no livro Zé Clementino: o ‘matuto’ que devolveu o trono ao Rei, lançamento da editora da Universidade Estadual da Paraíba, por meio do selo Latus. Com 240 páginas, o livro destaca Clementino como “um sensível cronista da vida do Nordeste” e tem o objetivo de apresentar um “Zé Clementino que é resultado das várias impressões, diversos olhares e pontos de vista”.

Por meio de depoimentos de familiares, amigos próximos e reprodução de entrevistas, o autor – primo distante do compositor – traça perfil de um parceiro de Gonzaga que, ao contrário do conterrâneo Humberto Teixeira e outros como Zé Dantas e Antonio Barros, nunca deixou sua terra natal: Várzea Alegre, homenageada no hino que escreveu para a cidade e a música Contrastes de Várzea Alegre, gravada pelo Rei do Baião, e assim analisada por Jurani no capítulo “Desvelando os contrastes”: “Os contrastes demonstram ainda a capacidade perceptiva e observacional do autor, que ao se referir aos fatos curiosos da cidade, deixa claro a sua veia humorística, o seu poder irônico e sua poesia singular”.

Para os fãs e estudiosos da obra do Rei do Baião, o livro é particularmente revelador, pois conta como Clementino escreveu sucessos como Xote dos cabeludos, o desabafo do cantor pernambucano diante das mudanças no comportamento masculino nos anos 1960. “Era uma espécie de protesto a uma moda que fazia a cabeça dos homens ‘modernos’”, lembra Jurani, citando um trecho emblemático da letra, gravada em 1967: “Cabra do cabelo grande, cinturinha de pilão/ Calça justa bem cintada, costeletas bem fechadas, salto alto, fivelão/ Cabra que usa pulseira, no pescoço um medalhão/ Cabra com esse jeitinho no sertão do meu Padim/ Cabra assim não tem vez, não”.

No livro, Jurani também reproduz entrevista de Clementino ao Diário do Nordeste nos anos 1970, quando ele detalha como funcionava sua parceria musical: “As composições que Luiz Gonzaga gravou foram encaminhadas com melodia e letra. O Rei do Baião dava uma ajeitada, impunha o seu estilo. E a música passava a ser dos dois. Aceitava essa situação, queria a parceria”, explica o compositor.

No capítulo “O esquecimento de um Zé”, Jurani muda o tom expositivo e tece críticas aos que narram a vida do cantor sem citar o compositor cearense: “É impressionante a forma quase desrespeitosa como a memória de Clementino é tratada por grande parte dos biógrafos de Luiz Gonzaga”. Por outro lado, ele ressalta o trabalho de uma sobrinha de Clementino, a professora Ana Emília, fundamental na catalogação da obra do tio, que dizia desconhecer a quantidade de músicas que havia escrito.

 “Muitas vezes, a professora teve que recorrer a Zé Clementino para saber o que significava determinada palavra, verso, uma vez que o áudio estava praticamente incompreensível”, narra Jurani. Ana Emília, ao final do trabalho, conseguiu quantificar as músicas de Clementino, gravadas por Gonzaga (Sou do banco, O jumento é nosso irmão) e outros grandes artistas nordestinos como Sirano, Dominguinhos, Trio Nordestino, Messias Holanda e Genival Lacerda.

No fim do livro, o autor reproduz os discos de Gonzaga que incluem músicas de Clementino, entre eles Óia eu aqui de novo, O sanfoneiro do povo de Deus, Sertão 70 e Capim novo, e ainda contabiliza: “Até março de 2005, foram gravadas 41 músicas, que somadas as 20 regravações, totalizam 61 interpretações, distribuídas entre 32 intérpretes do cancioneiro popular a nível nacional e regional”. Zé Clementino: o ‘matuto’ que devolveu o trono ao Rei é um livro indicado não só para pesquisadores da música brasileira, mas para aqueles que desejam conhecer mais sobre a vida e obra do autor de versos que até hoje habitam a memória do povo nordestino.
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De Jurani Clementino
. Latus Editora e Editora da Universidade Estadual da Paraíba, 240 páginas. Encomendas pelo telefone (83) 3315-3300.


Fonte: O Estado de Minas/Carlos Marcelo
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Saudade: Há um ano silenciava a voz sanfona de Dominguinhos



Há exatamente um ano, Pernambuco perdia um de seus músicos mais ilustres: o mestre sanfoneiro Dominguinhos. Nesta quarta-feira (23), a Rádio Jornal e o Estado prestam homenagens ao garanhuense que ficou famoso nacionalmente ao expandir e reinventar o legado deixado por seu “padrinho”, o pernambucano de Exu, Luiz Gonzaga.

Missas e homenagens marcam 01 ano da ausência física de Dominguinhos

Fonte: Radio Jornal
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José Neumane Pinto: Dominguinhos um principe nascido em forma matuto flor


Trecho de Tenho sede, de Dominguinhos e Anastácia: “Traga-me um copo d’água, tenho sede / e essa sede pode me matar. / Minha garganta pede um pouco d’água / e os meus olhos pedem o teu olhar”.

"O sertanejo é antes de tudo um forte”, sapecou Euclides da Cunha em “Os sertões”. Os desavisados reconhecerão na definição o protótipo do cangaceiro, do cabra macho, do matuto destemido que não leva desaforo para casa. Ledo engano. Como o próprio Euclides deixou claro, essa força não reside na coragem, na valentia ou no destemor, mas repousa na improvável força interior contida no termo euclidiano Hércules-Quasímodo.

O sanfoneiro, compositor e cantor Dominguinhos encarnou o lado sensível, belo e pungente dessa força, contrapondo-o à valentia da cabroeira que dormia ao relento e lutava contra as tropas da lei e da ordem. Lampião era o sertanejo-mandacaru. Dominguinhos, o matuto-flor: a flor que brota do cacto com a beleza protegida pela agressividade bélica dos espinhos.

Desde cedo ungido príncipe da música regional nordestina que o Rei Gonzaga fundou e sustentou com o rebuliço mágico dos 180 baixos de sua sanfona, o garoto de Garanhuns, Pernambuco, cruzou as veredas da vida sem trocar de patente nem de coroa: sempre foi menino, sempre foi príncipe. Consciente da majestade de seu Lua, legitimada pela dimensão universal de sua herança, a grandeza dele, caudatária da simplicidade, o tornou herdeiro perpétuo, impedindo-o de subir ao trono com o desaparecimento físico do criador do forró.

Não se confunda, contudo, essa simplicidade com complexo de inferioridade ou desconhecimento do próprio potencial que levou Gonzaga a lhe transferir sanfona, cetro, reinado e gibão. Nada disso: mantendo-se na infância, ele preservou o segredo da beleza e da variedade da obra que o fundador trouxe das brenhas para transformar no ponto de contato e de solidariedade dos deserdados da seca no bulício das metrópoles.
 
Em Dominguinhos comungavam a humildade dos mansos de espírito e a altivez dos gênios que reconhecem seu valor ao identificá-lo não nas glórias da fama, mas na consciência da fidelidade a sua grei, que a retribui com um amor mudo, sincero e pleno, que vai além do aplauso fácil. Este reconhecimento passou, é claro, pela unção real, mas se confirmou em todos os contatos que o artista manteve com seu público, gente com quem partilhava as mesmas origens e com quem se comunicava pela mudez de cúmplices egressos dos mesmos roçados nos quais a necessidade e a escassez tornam a solidariedade gênero de primeira necessidade. Esse povo aprendeu a linguagem das pausas longas e o reconhecimento da labuta na textura áspera da pele da palma da mão acostumada com a soleira que ofusca e a aridez do solo de pouca água.
 
Se o Rei do Baião fez de Asa Branca, com a letra do urbano Humberto Teixeira, o hino da diáspora nordestina pelo mundo afora, o príncipe da sanfona compôs em Lamento Sertanejo, com a letra-síntese de Gilberto Gil, negro e interiorano qual Gonzaga, a saga do retirante aculturado.

 “Quando o verde dos teus olhos se espalhar na plantação, / eu te asseguro, não chore não, viu, / eu voltarei, viu, pro meu sertão”:  Gonzaga e Teixeira cantaram o mito da volta do homem à terra, bastando que caia a chuva do céu. “Por ser de lá, / na certa por isso mesmo, / não gosto de cama mole, / não sei comer sem torresmo. / Eu quase não falo, / eu quase não sei de nada. /  Sou como rês desgarrada / nessa multidão boiada caminhando a esmo“ – na melodia de Dominguinhos Gil decretou a saga de um Ulisses-Quasímodo que não retorna a Penélope, mas faz do desassossego solitário o jeito de ficar onde estiver, construindo Ítaca em si mesmo.

A Odisseia do cantor do vale do Araripe, nos confins onde Pernambuco acaba no Ceará, foi registrada no percurso do peixe em Riacho do Navio, com letra do parceiro Zé Dantas, partindo do Atlântico na direção do paraíso idílico perdido nas margens do riacho da Brígida, contra a correnteza. Essa busca do cordão umbilical enterrado na porteira do curral avoengo se expressa na utopia do desterrado: “Pra ver o meu brejinho, / fazer umas caçada, / ver as ‘pegá’ de boi, / andar nas vaquejada, / dormir ao som do chocalho / e acordar com a passarada, / sem rádio e sem notícia / das terra civilizada”.

A Ilíada do sanfoneiro da “Suíça nordestina” mantém o desterrado no desterro, universo transportado de Garanhuns para os guetos nordestinos nas metrópoles – o Brás em São Paulo, o Campo de São Cristóvão no Rio…

Nesses lugares, o cavalo de madeira transporta o retirante para os ambientes urbanos, tornando-o uma espécie de extra-terrestre adaptado aos hábitos e à cultura da Troia que desconhecia. O retirante pede água, busca o amor e vai ficando: a obra de Dominguinhos é a consciência de que todo lugar é sertão e o sertão é aqui mesmo, reconhecido nas manchas de suor tornadas mapas da solidão que virou ritual de encontro. 

Como cantou em Tenho sede, com letra de Anastácia, sua mulher e parceira de origem: “Traga-me um copo d’água, tenho sede / e essa sede pode me matar. / Minha garganta pede um pouco d’água / e os meus olhos pedem teu olhar”.

Fonte; Publicado na Pag.D03 do Caderno 2 do Estado de S. Paulo de quarta 24 de julho 2013

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Lembranças: Crônicas Na Grande Area- Armando Nogueira



 Fonte: Na Grande Area-Armando Nogueira

O preparador físico Toninho Oliveira, do Flamengo, fez um teste nesta fase de pré-temporada do time em Teresópolis: media o batimento cardíaco dos jogadores, sempre que tocavam na bola. O resultado mostrou que apenas um não ficava abalado: Romário. Com o craque, a coisa é diferente: quem se emociona é a bola. *****

Maracanã, enfeita de bandeiras tuas arquibancadas que hoje é dia de festa no futebol. Encomenda um céu repleto de estrelas. Convida a lua (de preferência, a lua cheia). Veste roupa de domingo nos teus gandulas. Põe pilha nova no radinho do geraldino. E, por favor, não esquece de regar a grama (de preferência, com água-de-cheiro).

Avisa à multidão que ninguém pode faltar. É despedida do Zico e estou sabendo, de fonte limpa, que, hoje à noite, ele vai repartir conosco a bela coleção de gols que fez nos seus vinte anos de Maracanã. Eu até já escolhi o meu: quero aquela obra-prima, o segundo gol do Brasil contra o Paraguai nas Eliminatórias do Mundial de 1986. Lembro-me como se fosse hoje. 

Zico recebe de Leandro um passe de meia distância já na linha média dos paraguaios. Um efeito imprevisto retarda a bola uma fração de segundo. Zico vai passar batido - pensei. Pois sim. Sem a mais leve hesitação, sem sequer baixar os olhos, ele cata a bola lá atrás com o peito do pé, dá dois passos e, na mesma cadência, acerta o canto esquerdo do goleiro paraguaio.

Passei uma semana vendo e revendo no teipe aquele instante mágico de um corpo em harmonioso movimento com o tempo e com o espaço. E a bola, coladinha no pé, parecia amarrada no cadarço da chuteira.
Um gol de enciclopédia.
Se o amável leitor aceita uma sugestão, dou-lhe esta: escolha um dos gols que Zico fez graças à sua arte singular de chutar bola parada.

Chutar a bola de falta à entrada da área é um talento que Deus lhe deu mas não de mão beijada, como imaginam os desavisados. Zico trabalhou seriamente, anos e anos, para alcançar a perfeição dos efeitos sublimes. À tardinha, quando terminava o treino, ele costumava ficar sozinho no campo do Flamengo - ele, uma barreira artificial, uma bola e uma camisa caprichosamente pendurada no canto superior das traves. A camisa era o alvo.

Zico passava horas sem fim, chutando rente à barreira e derrubando a camisa lá de cima das traves.

Chegava o domingo, na cobrança da falta, a bola já estava cansada de saber onde ela tinha que entrar.

Não tenho dúvida em dizer que tardará muito até que apareça alguém que domine como Zico o dom de cobrar falta ali da meia-lua.

Celebremos, querido torcedor, a última noite do maior artilheiro da história do Maracanã. Será uma despedida de apertar o coração. Se te der vontade de chorar, chora. Chora sem procurar esconder a pureza da tua emoção. Basta uma lágrima de amor para imortalizar o futebol de um supercraque.

Cantemos, Maracanã, teu filho ilustre, relembrando em comunhão os dribles mais vistosos, os passes mais ditosos, os gols mais luminosos desse fidalgo dos estádios que tem uma vida cheia de multidões.

Louvemos o poeta Zico que jogava futebol como se a bola fosse uma rosa entreaberta a seus pés.
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Juazeiro do Norte celebrou os 80 anos de morte do Padre Cícero


Às 5h do domingo 20, as ruas de Juazeiro do Norte (CE) já estavam lotadas de peregrinos de diversas partes do Brasil. 

A cerimônia que lembrou os 80 anos da morte de Padre Cícero começou às 6h. A missa foi transmitida ao vivo por cinco redes de televisão católicas e várias rádios. A Praça de Nossa Senhora do Perpétuo Socorro e os arredores nunca estiveram tão cheios – ao todo, cerca de 300 mil fiéis, uma das maiores romarias do país. Tudo em homenagem a alguém muito próximo desse povo, o fundador de Juazeiro do Norte, carinhosamente chamado de Padim Ciço.
  
Quem celebrou a missa foi o bispo do Crato, dom Fernando Panico. Durante a homilia, o religioso destacou a importância de Padre Cícero na região. “Padre Cícero revolucionou o sertão. Foi muito ligado às causas sociais, preocupado com o povo sertanejo, com a pobreza, com a fome. Não aceitava essas coisas”, disse.
 
Cícero Romão Batista foi ordenado padre, mas, posteriormente, condenado pelo Vaticano por estar envolvido em milagres não comprovados e foi acusado  por provocar o fanatismo. Perdeu o direito de exercer a função e chegou a ser excomungado. Virou prefeito e conseguiu a independência de Juazeiro do Norte, que antes era apenas um vilarejo do Crato. E conseguiu fazer mudanças importantes na cidade, no meio do sertão miserável do começo do século 20.

Dona Rosinha do Ortho, aposentada, participou da missa e é uma das poucas pessoas que ainda testemunha os momentos vividos ao lado de Padre Cícero. Aos 93 anos, ela lembra que recebeu a benção do Padim Ciço diversas vezes. E, há exatos 80 anos, acompanhou o funeral do padre. “Era um mar de gente na praça. Normalmente, o pessoal pega o caixão pela alça. Mas o [do] meu Padim não, foi carregado por cima das cabeças. As mulheres choravam muito e perguntavam quem iria cuidar de nós.”

Atualmente, o Vaticano analisa um pedido de reabilitação de Cícero Romão Batista, que significa reconhecê-lo como padre novamente. Em seguida, pode-se entrar com o processo de beatificação e canonização do religioso.

Fonte: Jornal do Commercio/ne10
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Azulão alegria do Forró


Foto: Azulão e Azulinho. Festival Inverno Garanhuns. Texto Fonte Jornal da Besta Furana-Luiz Berto

Caruaru, localizada no agreste Pernambucano, é uma das cidade mais populosas do interior do estado e possui o título  “Capital do Forró“.
  
Outro destaque do município (cantada em verso e prosa) é a sua famosa feira, que hoje é considerada pelo Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (IPHAN) como um patrimônio imaterial do Brasil.
Dentro do forró, um nome merece destaque além de Petrucio Amorim, Onildo Almeida.

 O nome de batismo é Francisco Bezerra de Lima, nome que talvez ninguém consiga identificar a quem estamos nos referindo, porém basta falarmos “Azulão” para muitos daqueles que conhecem um pouco do gênero forró lembrar-se dele. 

Azulão nasceu m 25 de junho de 1942 no Brejo de Taquara, distrito de Caruaru, e por um triz ele não nasce no dia do santo que ele vem homenageando ano após ano desde o início de sua carreira artística. Isso talvez seja a única justificativa plausível para justificar a presença do  forró de maneira tão intensa ao longo de sua vida.
  
Foram a interpretação e os acordes de Luiz Gonzaga que despertaram em Azulão a paixão pela música, e ele nem imaginava que anos depois ia subir ao palco junto do velho Lua. Aos 10 já iniciava a sua carreira artística, nessa época o menino Francisco vendia picolé nas ruas de Caruaru, e eventualmente apresentava-se no auditório da Rádio Difusora, onde foi sendo descoberto pelos radialistas caruaruenses e foi nessas andanças, de auditório em auditório, que veio a ganhar o apelido que adotou como nome artístico, apelido dado pelo radialista Arlindo Silva, pelo fato de Francisco só se apresentar com roupas azuis. Ele dizia: “- Bote esse Azulão pra cantar!” E o povo adotou.
  
Em 1964 Azulão já era sucesso na gravadora Rosemblitz e o grande público já pedia suas músicas nas rádios, era o tempo de “Olhei meu Amor” (primeiro sucesso de um compacto duplo). Veio então o convite do Mestre Camarão para integrar como vocalista a Bandinha do Camarão (primeira banda de forró do Brasil), onde passou vários anos e gravou dois LP’s. No ano de 1975 gravou seu primeiro Long Play solo – “Eu Não Socorro Não” –pelo selo Esquema. 

Todas as músicas foram um grande sucesso. A partir de então não parou mais, ano após ano emplacando sucessos em todo nordeste em gravadoras como Equipe, Madrigaz no Rio e Copacabana em São Paulo. Azulão além de cantor, também é compositor, com mais de 60 músicas gravadas por cantores famosos como Genival Lacerda, Marinalva, Trio Nordestino, Os Três do Nordeste e muitos outros.

Há quem diga “Um São João sem Azulão, não é São João”. Entre suas músicas mais conhecidas estão: “Dona Tereza”, “Nega Buliçosa”, “Mané Gostoso”, “Trupé de Cavalo”, “Tô Invocado”, “Afogando a Minha Dor” e tantas outras, lembradas até hoje e perpetuadas pelas novas gerações. Para Caruaru, Azulão gravou de José Pereira, “Caruaru do passado”. De Juarez Santiago, gravou “Caruaru do Meu Tempo.

Dentro de um corpo medindo 1,45m de altura nem dá pra esperar uma voz com tamanho vigor, mas no palco o pequeno grande – outro apelido que ganhou do locutor Ivan Bulhões – além de contagiar, tem ritmo, carisma e muita malandragem. Por tudo isso Azulão é a grande referência musical da Capital do Forró: Caruaru – cidade cantada por ele em vários de seus LP’s. Sempre esteve ligado a valorização da cultura pernambucana, sendo um dos seus maiores representantes.

Fonte: Foto Ascom Garanhuns PE Jornal da Besta Furana-Luiz Berto
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As mais belas histórias do escritor e educador Ruben Alves


Era uma vez uma menina que tinha um pássaro como seu melhor amigo.
Ele era um pássaro diferente de todos os demais: era encantado.

Os pássaros comuns, se a porta da gaiola ficar aberta, vão-se embora para nunca mais voltar. Mas o pássaro da menina voava livre e vinha quando sentia saudades… As suas penas também eram diferentes. Mudavam de cor. Eram sempre pintadas pelas cores dos lugares estranhos e longínquos por onde voava. Certa vez voltou totalmente branco, cauda enorme de plumas fofas como o algodão…

— Menina, eu venho das montanhas frias e cobertas de neve, tudo maravilhosamente branco e puro, brilhando sob a luz da lua, nada se ouvindo a não ser o barulho do vento que faz estalar o gelo que cobre os galhos das árvores. Trouxe, nas minhas penas, um pouco do encanto que vi, como presente para ti…
E, assim, ele começava a cantar as canções e as histórias daquele mundo que a menina nunca vira. Até que ela adormecia, e sonhava que voava nas asas do pássaro.
Outra vez voltou vermelho como o fogo, penacho dourado na cabeça.

— Venho de uma terra queimada pela seca, terra quente e sem água, onde os grandes, os pequenos e os bichos sofrem a tristeza do sol que não se apaga. As minhas penas ficaram como aquele sol, e eu trago as canções tristes daqueles que gostariam de ouvir o barulho das cachoeiras e ver a beleza dos campos verdes.
E de novo começavam as histórias. A menina amava aquele pássaro e podia ouvi-lo sem parar, dia após dia. E o pássaro amava a menina, e por isto voltava sempre.

Mas chegava a hora da tristeza.
— Tenho de ir — dizia.
— Por favor, não vás. Fico tão triste. Terei saudades. E vou chorar…— E a menina fazia beicinho…

— Eu também terei saudades — dizia o pássaro. — Eu também vou chorar. Mas vou contar-te um segredo: as plantas precisam da água, nós precisamos do ar, os peixes precisam dos rios… E o meu encanto precisa da saudade. É aquela tristeza, na espera do regresso, que faz com que as minhas penas fiquem bonitas. Se eu não for, não haverá saudade. Eu deixarei de ser um pássaro encantado. E tu deixarás de me amar.
Assim, ele partiu. A menina, sozinha, chorava à noite de tristeza, imaginando se o pássaro voltaria. E foi numa dessas noites que ela teve uma ideia malvada: “Se eu o prender numa gaiola, ele nunca mais partirá. Será meu para sempre. Não mais terei saudades. E ficarei feliz…”

Com estes pensamentos, comprou uma linda gaiola, de prata, própria para um pássaro que se ama muito. E ficou à espera. Ele chegou finalmente, maravilhoso nas suas novas cores, com histórias diferentes para contar. Cansado da viagem, adormeceu. Foi então que a menina, cuidadosamente, para que ele não acordasse, o prendeu na gaiola, para que ele nunca mais a abandonasse. E adormeceu feliz.
Acordou de madrugada, com um gemido do pássaro…

— Ah! menina… O que é que fizeste? Quebrou-se o encanto. As minhas penas ficarão feias e eu esquecer-me-ei das histórias… Sem a saudade, o amor ir-se-á embora…

A menina não acreditou. Pensou que ele acabaria por se acostumar. Mas não foi isto que aconteceu. O tempo ia passando, e o pássaro ficando diferente. Caíram as plumas e o penacho. Os vermelhos, os verdes e os azuis das penas transformaram-se num cinzento triste. E veio o silêncio: deixou de cantar.
Também a menina se entristeceu. Não, aquele não era o pássaro que ela amava. E de noite ela chorava, pensando naquilo que havia feito ao seu amigo…

Até que não aguentou mais.
Abriu a porta da gaiola.
— Podes ir, pássaro. Volta quando quiseres…
— Obrigado, menina. Tenho de partir. E preciso de partir para que a saudade chegue e eu tenha vontade de voltar. Longe, na saudade, muitas coisas boas começam a crescer dentro de nós. Sempre que ficares com saudade, eu ficarei mais bonito. Sempre que eu ficar com saudade, tu ficarás mais bonita. E enfeitar-te-ás, para me esperar…

E partiu. Voou que voou, para lugares distantes. A menina contava os dias, e a cada dia que passava a saudade crescia.
— Que bom — pensava ela — o meu pássaro está a ficar encantado de novo…
E ela ia ao guarda-roupa, escolher os vestidos, e penteava os cabelos e colocava uma flor na jarra.
— Nunca se sabe. Pode ser que ele volte hoje…

Sem que ela se apercebesse, o mundo inteiro foi ficando encantado, como o pássaro. Porque ele deveria estar a voar de qualquer lado e de qualquer lado haveria de voltar. Ah!
Mundo maravilhoso, que guarda em algum lugar secreto o pássaro encantado que se ama…
E foi assim que ela, cada noite, ia para a cama, triste de saudade, mas feliz com o pensamento: “Quem sabe se ele voltará amanhã….”
E assim dormia e sonhava com a alegria do reencontro.
* * *
Para o adulto que for ler esta história para uma criança:
Esta é uma história sobre a separação: quando duas pessoas que se amam têm de dizer adeus…
Depois do adeus, fica aquele vazio imenso: a saudade.
Tudo se enche com a presença de uma ausência.
Ah! Como seria bom se não houvesse despedidas…
Alguns chegam a pensar em trancar em gaiolas aqueles a quem amam. Para que sejam deles, para sempre… Para que não haja mais partidas…
Poucos sabem, entretanto, que é a saudade que torna encantadas as pessoas. A saudade faz crescer o desejo. E quando o desejo cresce, preparam-se os abraços.
Esta história, eu não a inventei.
Fiquei triste, vendo a tristeza de uma criança que chorava uma despedida… E a história simplesmente apareceu dentro de mim, quase pronta.
Para quê uma história? Quem não compreende pensa que é para divertir. Mas não é isso.
É que elas têm o poder de transfigurar o quotidiano.
Elas chamam as angústias pelos seus nomes e dizem o medo em canções. Com isto, angústias e medos ficam mais mansos.
Claro que são para crianças.
Especialmente aquelas que moram dentro de nós, e têm medo da solidão…

Fonte: As mais belas histórias de Rubem Alves
Lisboa, Edições Asa, 2003
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