“Sempre tive relação muito
problemática com gravadoras e produtores”, diz Alceu Valença
em entrevista exclusiva ao UOL. O artista afirma que identidade da
música brasileira está seriamente ameaçada.
“Estão vendendo gato por lebre”,
afirma o artista. “Inventou-se agora o conceito de
multiculturalismo, que é uma forma de enfiar qualquer coisa em
festas populares como São João e Carnaval”.
Ele, entretanto, ressalta Pernambuco como exceção. “O que vejo aqui é preservação, em Olinda, por exemplo, folia é embalada por cancioneiro centenário”.
Ele, entretanto, ressalta Pernambuco como exceção. “O que vejo aqui é preservação, em Olinda, por exemplo, folia é embalada por cancioneiro centenário”.
Mas ele vê o fenômeno ocorrendo em
outras regiões do país. Equivale a colocar numa festa
junina um fado português, diz Alceu. “Tem muito artista de forró,
de brega, de rock, querendo entrar no Carnaval”. A porta para que
entrem são as tais festa multiculturais antes ou durante a folia,
acrescenta.
“Veja a situação a que chegaram
os programas de televisão, nada contra nada, tudo pode existir, há
uma glamourização do lixo cultural”. Alceu diz que apologia à
falta de cultura atende interesses da indústria do
entretenimento. ”Quanto mais burro, melhor para o sistema”,
dispara Alceu. A área da cultura brasileira, na opinião do músico,
carece de curadoria.
Ele também denuncia novo modelo de jabá que assola o mercado de rádios no nordeste, e que começa a chegar a outras regiões do país. “O jabá hoje se transformou numa outra coisa”, diz.
Ele explica que donos de rádio
compram bandas e músicas para tocar nelas, para ganhar também com o
direito autoral. “Tudo que entrar será lucro”, comenta. “Depois
eles fazem um jogo entre eles, donos de rádios, para que um toque a
música do outro”. Desta forma, segundo ele, criou-se um cartel que
domina o mercado com uma ‘música sem alma’, ou ‘fuleirage
music’, como também ficou conhecida, diz Alceu.
Por sua postura crítica e
independente, Alceu há décadas se afastou de gravadoras. O produtor
atual é um músico que toca com Alceu. “Ele não pode me exigir
nada e nem vai querer me manipular”, justifica.
O rompimento com as gravadoras
aconteceu em 1987. O músico acusa a gravadora RCA de cooptar
artistas, na época, só para tirá-los de circulação e abrir
espaço para o ‘brega’, novo gênero que seria lançado.
“Eu, Chico Buarque, Fafá de
Belém, e outros artistas, foram contratados para ir pra gaveta, para
poderem lançar outro tipo de produto que interessava ao diretor
artístico”.
Alceu conta que a gravadora chegou a
sugerir que ele mudasse repertório. “Pediam para cantar músicas
bregas e outras”. O objetivo era trazer para o Brasil
produtos mais semelhantes ao americano.
“Em três anos ganhei apartamento,
hospedagem em hotel cinco estrelas, com tudo pago em minha vida, mas
calaram minha música”. O mesmo aconteceu com todos os artistas
contratados, prossegue o artista. “Por isso rompi com a indústria”,
observa.
Na época, Alceu relembra que começava carreira na Europa, mas conta que resolveu retornar e “ganhar o Brasil, mesmo sem ter empresa por trás”. O caminho para isso ele diz que foi ir para todos os cantos e fazer a cabeça de fãs que vão aos shows. “Um diz ao outro e público vai aumentando”.
“Em Brasília já botei 27 mil
pagantes em show”, diz Alceu, orgulhoso por ter conquistado
público, mesmo aparecendo pouco na mídia. “No ano passado fiz 89
shows, quatro na Europa”.
Fonte: UOl