CHICA BARROSA: A VIOLEIRA NEGRA NO SERTÃO QUE SUBVERTEU A ORDEM SOCIAL DE SUA ÉPOCA

Invertendo a ordem social da época, Chica Barrosa, poetisa, repentista, negra, nascida na Paraíba na segunda metade do século 19, foi um ícone no campo das poéticas orais no Nordeste brasileiro. Ficou conhecida como a “Rainha Negra do Repente”. Se vivesse hoje, ela seria uma ativista dos movimentos feministas e/ou do antirracismo. Em suas apresentações, fazia questão de se identificar como mulher negra e atrevida, e dava ênfase à pronúncia do sufixo feminino de seu sobrenome, dizendo-se “Barrosa”, com letra “A”.

“Era mesmo atrevida e foi assim que conquistou o seu lugar na cantoria, um espaço que era predominantemente masculino. Embora fosse respeitada e admirada como grande repentista de sua época, tudo indica que ela também provocou muito incômodo por onde passou. 

Em um contexto bastante adverso, marcado pelo domínio patriarcal e por relações escravistas, mesmo nos anos do pós-abolição, Chica, cujo nome de batismo era Francisca Maria da Conceição, foi brutalmente assassinada durante uma cantoria” conta ao Jornal da USP Mariana do Nascimento Ananias, autora da pesquisa que resultou em uma dissertação de mestrado, defendida em janeiro de 2023, no Instituto de Estudos Brasileiros (IEB) da USP. 

“Os depoimentos encontrados apontam diferentes versões sobre as circunstâncias desse assassinato. Em todas elas, fica evidente a violência cometida contra uma mulher negra, vítima de feminicídio”, diz a pesquisadora.

O estudo dessas histórias biográfico-literárias, permeadas de glórias e dramas, foi realizado por Mariana, que também é musicista e formada em Letras pela Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas (FFLCH) da USP. A pesquisadora fez análise de notas e fragmentos coletados em fontes bibliográficas, realizou entrevistas com autores especialistas em cordel e cantoria, coletou depoimentos de moradores antigos dos lugares onde Chica se apresentava, de descendentes de repentistas que duelavam com ela; além de consultar cartórios, arquivos, acervos privados, incluindo o da Universidade de Poitiers (França) e fontes eclesiásticas. 

Sobre a data exata do nascimento de Chica Barrosa ou de suas apresentações, não foi possível verificar com precisão. Segundo a pesquisadora, a estimativa é que ela tenha nascido por volta de 1867, na Província da Paraíba. Mariana chegou a procurar documentos de batismo em igrejas locais, mas não encontrou nenhum que confirmasse esse dado.

“Meu objetivo foi apresentar um estudo multidisciplinar acerca da poesia e da atuação dessa grande autora negra da Paraíba oitocentista, que produziu a sua arte através da oralidade e é considerada a primeira mulher repentista a se estabelecer na profissão”, diz a pesquisadora ao Jornal da USP.

Segundo o professor Paulo Teixeira Iumatti, orientador da pesquisa, o trabalho de Mariana é muito importante na medida em que se concentra no estudo da trajetória individual de uma cantadora negra que deixou poucos registros, aprofundando-se no levantamento de documentação primária e em depoimentos orais.

“Muita mitologia se construiu em torno de Chica Barrosa e faltava um estudo mais sistemático dos documentos e de rastros deixados na memória social. A pesquisa rompe com o binômio idealização/detração (ataques), fazendo avançar o conhecimento científico. Mariana foi hábil em lidar com os silêncios da documentação, em mapear os circuitos que Chica Barrosa integrava e em fazer uma leitura sensível dos registros dos folcloristas, incorporando uma dimensão literária e de retórica”, diz Iumatti.

Mariana lembra aspectos marcantes na poética de Chica Barrosa: a firmeza em relação às questões sociais e raciais de seu tempo e seu deslocamento por diferentes territórios do Nordeste, desafiando célebres cantadores.

Há registros de duelos com repentistas do Piauí, da Paraíba e do Ceará. Em seus repentes, Barrosa respondia à altura aos ataques e provocações que recebia em uma cantoria.

Mariana explica que esse procedimento é conhecido como “insulto poético” e faz parte dos desafios do repente. “Trata-se de um momento do embate em que ambos se atacam através da poesia e procuram demonstrar, diante do público, quem é melhor repentista. No entanto, no caso de Chica Barrosa, por ser uma mulher negra naquele período, verifica-se que foi preciso grande fôlego poético na elaboração de estratégias para responder aos ataques associados ao seu gênero e à sua raça.”

Relações de poder: desafio aos homens que possuíam terra

“Neco, você não se esqueça

De que sou negra atrevida…

Eu no dia em que me estorvo

Só canto é à toda brida

Meus olhos se acacurutam,

Fica a venda retorcida,

Cantadô macho é bobage,

Não pode com a minha vida.”

Fragmento extraído do livro Cantadores (1921), de Leonardo Mota, página 81.

Nos versos acima, há o registro de um fragmento do duelo entre Chica Barrosa e um coronel fazendeiro (Neco Martins) que era poderoso no Ceará. A repentista dizia que ninguém a dominava e que se fosse preciso até em fera, e das mais bravas, ela se transformaria, relata Mariana em sua dissertação.

Em outro momento, esse mesmo Neco Martins entoou o seguinte verso provocando Chica:

“Eu agora, estou ciente, (Neco Martins)

Que negro não é cristão:

Pois a alma dessa gente

Saiu debaixo do chão,

E lá na mansão celeste,

Não entra quem é ladrão!”

“Mas seu Neco, a diferença (Chica Barrosa)

Entre nós, só é na cô,

Eu, também, fui batizada

Sô cristão como o sinhô!

De meter mão no alheio

Nunca ninguém me acusô!

De ir o preto para o céu,

Seja o branco sabedô,

E, lá na Mansão Celeste,

Se quiser Nosso Sinhô;

Vai o branco pra cozinha

E o preto para o andô!”

GRANDES ESCRITORAS NEGRAS: Mariana conta que, ao longo do tempo, “a literatura de mulheres negras existiu e resistiu no Brasil”, e lembra do nome de Maria Firmina dos Reis. Mulher negra nascida e criada no Maranhão, foi reconhecida recentemente como a primeira romancista brasileira. O livro Úrsula, de sua autoria, foi considerado o primeiro romance abolicionista do Brasil.

A pesquisadora lembra ainda da escritora mineira Carolina Maria de Jesus, que migrou para São Paulo e foi morar em uma favela na zona norte paulistana. Ela é autora do livro Quarto de despejo: o diário de uma favelada (1960). É destaque da literatura negra. A obra conta sua lida cotidiana e pesada (era empregada doméstica e catadora de material reciclável) para criar sozinha seus três filhos. Carolina disse certa vez: “Assim como as palavras, as pessoas que as escrevem não podem ser apagadas. Não, senhor. Ninguém vai apagar as palavras que eu escrevi…”

Mariana diz que, além da palavra escrita que está mais bem consolidada na academia, “a poesia brasileira também ecoa através da oralidade na voz de diversas mulheres e homens de várias regiões do País”. E foi neste contexto que Chica Barrosa se situou. “Sua produção se insere no universo da cantoria e do improviso poético, uma rica tradição que teve origem no século 19 na região que hoje chamamos de Nordeste do Brasil”, conclui.

REPENTE: O repente é uma poesia cantada diante do público com acompanhamento de um instrumento, no caso de Chica Barrosa, uma viola, mas podia ser pandeiro, tambor, rabeca ou ganzá.

Segundo Mariana, o nome é repente porque acontece de repente: é uma poesia improvisada a partir de regras e de determinadas formas fixas que estruturam as métricas dos versos que precisam ser dominadas pelos poetas. Realizado como prática coletiva diante de um público, o repente podia assumir também a forma de desafio quando dois poetas se enfrentam por meio de criação poética cantada e improvisada.

Texto: Ivanir Ferreira-Jornal da USP

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PRIMEIRA DOUTORA EM ECOLOGIA HUMANA E GESTÃO SOCIOAMBIENTAL DO BRASIL DEFENDE TESE NO CAMPUS III EM JUAZEIRO BAHIA

Com o título da tese “As Ecologias do Sertão e do (a) Sertanejo (a): um estudo topofóbico-topofílico do semiárido nordestino na representação (de) colonial de personagens do cenário artístico brasileiro”, mestra em Educação – Formação de professores e práticas interdisciplinares pela UPE, Elisangela Campos Damasceno Sarmento, sob a orientação do Prof. Dr. Geraldo Jorge Barbosa de Moura da UFRPE, tornou-se em 01.02.2023, a primeira doutora do Programa de Pós-graduação em Ecologia Humana e Gestão Socioambiental (PPGEcoH), único programa de doutorado em Ecologia Humana do Brasil e da América Latina.

A autora da tese, Elisângela Damasceno, é professora do IFPI – Campus Paulistana e ingressou no PPGEcoH no dia 20.12.2020. Participaram da banca examinadora, além de seu orientador, os membros externos: Prof. Dr. Eraldo Medeiros Costa Neto – UEFS; Profa. Dra. Ana Maria dos Anjos Carneiro Leão – UFRPE; e Membros internos: Prof. Dr. Josenilton Nunes Vieira – UNEB; Prof. Dr. Josemar da Silva Martins – UNEB. A Tese multipaper contém 11 artigos (9 publicados, 1 aceito e 1 ainda submetido).

O Programa de Pós-graduação em Ecologia Humana e Gestão Socioambiental (PPGEcoH) da Universidade do Estado da Bahia – Campus III, em Juazeiro, é de natureza interdisciplinar, com os cursos em nível de Pós-Graduação Stricto Sensu Mestrado e Doutorado. Seu objetivo é formar profissionais que pretendam adquirir ou aprofundar conhecimentos na área de Ecologia Humana numa perspectiva multidisciplinar, adquirindo as competências necessárias para desenvolver projetos de investigação no ramo científico da Ecologia Humana.

Com sede no Departamento de Tecnologia e Ciências Sociais, Campus IIII da Universidade do Estado da Bahia – UNEB, em Juazeiro, o PPGEcoH oferta anualmente 20 vagas para o curso de Mestrado e 15 para o curso de Doutorado, além de 50 vagas para aluno de Matrícula Especial, a cada semestre. 

Para informações sobre o Programa, acesse: https://ppgecoh.uneb.br/

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MINISTRA ASSEGURA REAJUSTE DE BOLSAS DE PESQUISAS AINDA NO PRIMEIRO SEMESTRE

A ministra de Ciência, Tecnologia e Inovação, Luciana Santos, garantiu que o reajuste das bolsas de pesquisa científica ocorrerá ainda no primeiro semestre de 2023. Em discurso realizado no Rio de Janeiro, durante a 13º Bienal da União Nacional dos Estudantes (UNE), ela disse que não poderia adiantar quais serão os novos valores.

"Quem vai anunciar será o presidente Lula", justificou. As duas principais instituições responsáveis pelo fomento da pesquisa no país são o Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPQ), vinculado ao Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação (MCTI), e a Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes), atrelado ao Ministério da Educação (MEC). Os valores das bolsas pagas por ambos não são atualizados desde 2013.

O reajuste foi uma promessa de campanha de Lula. Há duas semanas, o ministro da Educação, Camilo Santana, chegou a dizer que o anúncio aconteceria ainda em janeiro, o que não se concretizou.

Segundo Associação Nacional dos Pós-Graduandos (ANPG), passados mais de nove anos da última atualização, houve perda de 75% do poder de compra. Para Luciana Santos, a situação se agravou com o menosprezo à ciência durante o governo de Jair Bolsonaro, cujo mandato se encerrou no ano passado. "Ocorreram drásticos cortes no financiamento da pesquisa do país. Mas o tempo da negação da ciência passou. A ciência voltou a ser uma prioridade nesse país", afirmou.

Considerado o maior festival estudantil da América Latina, a Bienal da UNE conta com uma programação de atividades culturais e debates sobre arte, educação, política e ciência. Luciana Santos, participou de uma mesa conduzida pela ANPG, que é parceira da UNE na organização do evento.

A ministra falou ainda que o governo irá enviar ao Congresso Nacional um projeto de lei para reverter a redução de recursos do Fundo Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (FNDCT). Ela também criticou a Medida Provisória 1.136 de 2022, assinada por Jair Bolsonaro no ano passado, que libera o contingenciamento de verba do FNDCT.

Também está no horizonte do MCTI uma reformulação do edital da Financiadora de Estudos e Projetos (Finep) voltado para apoiar laboratórios na compra de equipamentos. Segundo Luciana Santos, a pasta irá atuar de forma a contribuir com o desenvolvimento nacional.

"A ciência tem que estar a serviço do combate à fome. Tem que estar a serviço do enfrentamento às mudanças climáticas. Tem que estar a serviço da produção dos insumos para as vacinas, para diminuir nossa dependência de outros países. A política de ciência e tecnologia deve buscar a autonomia brasileira e garantir a soberania nacional", acrescentou.

CAMPANHA VACINA ministra da Saúde, Nísia Trindade, também participou de mesa conduzida pela ANPG. "Queria pedir a todos os estudantes que se unam a nós em um movimento nacional pela vacinação que terá início nesse mês de fevereiro", disse ela aos presentes. Está previsto para 27 de fevereiro o início da aplicação da vacina bivalente contra a covid-19, que protege contra diferentes cepas do vírus que causam a doença.


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BRASIL SE DESPEDE DE UMA VIDA DE GLÓRIAS, NUM PAÍS AINDA MARCADO PELO RACISMO E DIFERENÇAS SOCIAIS, AFIRMA JORNALISTA NILTON LEAL

A jornalista e apresentadora Glória Maria morreu, na manhã desta quinta-feira (2), no Rio de Janeiro por complicações de um câncer no cérebro e o assunto repercute em todo o Brasil.

O jornalista Nilton Leal, doutorando em Ecologia Humana, através das redes sociais, destacou a importância de Gloria Maria, em meio a lutas e conquistas identitárias. " O Brasil se despede de uma vida de Glórias, num país ainda marcado pelo racismo e diferenças sociais. Glória Maria fez história". Confira texto:

A doença ( câncer) é algo mesmo terrível, que nos deixa sem palavras diante dos mistérios da vida. Sem contestação, a nossa trajetória na terra é mesmo dinâmica e implacável, não sabemos ao certo como estaremos amanhā, sendo velhos ou jovens, o bom mesmo é aproveitar os momentos, procurando sempre a harmonia interna e externa, mantendo sempre vivos, o amor, a alegria e o respeito com nós e com os outros. Um dia triste para o jornalismo brasileiro. Glória Maria será lembrada como um ícone do nosso ofício, (jornalismo), mas também como uma mulher, que driblou narrativas racistas, de injustiças e desigualdades políticas e sociais. Não a conheci pessoalmente, mas sua empatia e espírito libertário mediados pela TV, são sem dúvida inspiração para todos nós,  um bom dia  a todos! E que Deus nos abençoe!!

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BRASIL SE DESPEDE DE UMA VIDA DE GLÓRIAS, NUM PAÍS AINDA MARCADO PELO RACISMO E DIFERENÇAS SOCIAIS, AFIRMA JORNALISTA NILTON LEAL

A jornalista e apresentadora Glória Maria morreu, na manhã desta quinta-feira (2), no Rio de Janeiro por complicações de um câncer no cérebro e o assunto repercute em todo o Brasil.

O jornalista Nilton Leal, doutorando em Ecologia Humana, através das redes sociais, destacou a importância de Gloria Maria, em meio a lutas e conquistas identitárias. " O Brasil se despede de uma vida de Glórias, num país ainda marcado pelo racismo e diferenças sociais. Glória Maria fez história". Confira texto:

A doença ( câncer) é algo mesmo terrível, que nos deixa sem palavras diante dos mistérios da vida. Sem contestação, a nossa trajetória na terra é mesmo dinâmica e implacável, não sabemos ao certo como estaremos amanhā, sendo velhos ou jovens, o bom mesmo é aproveitar os momentos, procurando sempre a harmonia interna e externa, mantendo sempre vivos, o amor, a alegria e o respeito com nós e com os outros. Um dia triste para o jornalismo brasileiro. Glória Maria será lembrada como um ícone do nosso ofício, (jornalismo), mas também como uma mulher, que driblou narrativas racistas, de injustiças e desigualdades políticas e sociais. Não a conheci pessoalmente, mas sua empatia e espírito libertário mediados pela TV, são sem dúvida inspiração para todos nós,  um bom dia  a todos! E que Deus nos abençoe!!

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SÃO PAULO TERÁ MEDICAMENTO À BASE DE CANNABIS NO SISTEMA ÚNICO DE SAÚDE

A lei que garante a inclusão dos medicamentos à base da cannabis no Sistema Único de Saúde (SUS) em São Paulo foi sancionada hoje (31), com vetos parciais. O projeto foi aprovado em 21 de dezembro na Assembleia Legislativa do Estado de São Paulo (Alesp) com proposição do deputado Caio França (PSB). 

Nas redes sociais, o parlamentar disse que esta é uma vitória das famílias “de autistas, pessoas com síndromes raras, Parkinson e outras patologias”. No dia  (30), o deputado entregou um abaixo-assinado com 40 mil assinaturas, além de notas de apoio, ao governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas. A nova lei tinha que ser sancionada ou vetada até esta sexta-feira (3).

Os vetos parciais, segundo o governo, dizem respeito a trechos em desacordo com a Constituição Federal de 1988. O texto será remetido à Alesp para apreciação.

O governo estadual informou que um grupo de trabalho será criado para regulamentar a nova lei. “Os profissionais serão responsáveis pela implementação, atualização e reavaliação da Política Estadual de Medicamentos Formulados à Base de Cannabis”, apontou em nota.

A medida “minimiza os impactos financeiros da judicialização e, sobretudo, garante a segurança dos pacientes, considerando protocolos terapêuticos eficazes e aprovados pelas autoridades de Saúde”. 

A importação de produtos medicinais feitos a partir da cannabis foi liberada em 2015 pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa). Os medicamentos só eram fornecidos pelo governo do estado mediante decisão judicial.

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COMUNIDADES TRADICIONAIS REALIZAM PROTESTO EM SENTO SÉ BAHIA

“Quando chove, atola, quando tá seco é a poeira horrível”. A frase de Dona Maria Rosa Cruz, 59, define bem a situação que a população de comunidades ribeirinhas de Sento Sé (BA) tem vivido. Desde 2020, com o início do funcionamento da Tombador Iron Mineração, os/as moradores/as do território não têm mais um minuto de sossego. Faça sol ou chuva, todos dias, dezenas de carretas que transportam o minério de ferro da empresa passam pelo trecho da BA-210, que liga onze comunidades à sede do município, gerando inúmeros transtornos.

Poeira, buracos, falta de visibilidade na estrada, riscos de acidentes, animais mortos e sem acesso à caatinga e fontes de água. Esses são alguns dos problemas enfrentados pela população local. “Já passei momentos difíceis nessa estrada, de moto, você não vê nada, quem tá vindo ou quem tá indo. Tá insuportável, não estamos aguentando mais”, desabafa Domingos Lima, 55, da comunidade Tombador de Cima.

O grande fluxo de carretas da empresa de mineração já tem até interferido na renda e no jeito de viver das comunidades tradicionais. Seu Raimundo Nonato, 65, do Limoeiro, teve que se desfazer da sua criação de gado. “Minha roça é aqui na beira da estrada, fui obrigado a vender minha criação porque não tinha mais como eles beberem água, e eu fiquei sem nada. Só estamos sendo prejudicados”, comenta.

Cansadas dessa situação e com receio de que os problemas se agravem, as comunidades atingidas pela Tombador Iron Mineração iniciaram um protesto na manhã da última segunda-feira (30). Com dois pontos de ocupação na estrada, carretas e funcionários da empresa não conseguem trafegar pelo local há mais de 36 horas. O objetivo principal da manifestação é conseguir o asfaltamento da via, cerca de 100 quilômetros de extensão.

“Estamos sofrendo, não conseguimos mais fazer um trajeto com tranquilidade daqui pra Sento Sé. A nossa luta é pela nossa melhora, estamos fazendo um protesto digno. Nós somos gente”, afirmou Marismar Vital, 39, pescadora da comunidade Aldeia.

Até o momento, as comunidades não receberam nenhum retorno sobre a reivindicação. Representantes da Prefeitura Municipal e da Secretaria de Infraestrutura do Estado estiveram no local. As Polícias Rodoviária Estadual e Militar também estiveram na ocupação na tarde de ontem. Na ocasião, tentaram intimidar e desmobilizar o protesto. No entanto, as comunidades seguem em manifestação até que a pauta seja atendida.

Texto e fotos: Comunicação CPT Juazeiro

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