TARGINO GONDIM SACODE SÃO PAULO JUNTO COM ZECA BALEIRO

O sanfoneiro Targino Gondim foi destaque no Jornal Folha de São Paulo, um dos mais lidos da América Latina. Aos 45 anos, pernambucano de Salgueiro e criado em Juazeiro, na Bahia, o cantor e sanfoneiro Targino Gondim se apresenta em São Paulo neste domingo (11), no Bar Brahma, na esquina mais famosa do Brasil e traz Zeca Baleiro como convidado. 

O jornalista Thales de Menezes destaca a ousadia e empreendedorismo de Targino Gondim. Com 28 discos gravados, seu melhor cartão de visitas talvez seja a autoria do maior hit de Gilberto Gil nos últimos tempos, "Esperando na Janela". Mas é além de sua música que Targino impressiona. Como empreendedor, é um "poderoso chefão" da sanfona.

Ele é responsável por quatro festivais na Bahia em 2018. Criou, com o parceiro Celso Carvalho, o Festival Internacional da Sanfona. Com a quinta edição programada para novembro, reúne em Juazeiro sanfoneiros do Brasil e de outros países durante uma semana.

"Tem nordestinos, gaúchos e sempre gente de fora. Este ano quero trazer sanfoneiros da Colômbia e da Alemanha, jogar um clima de Oktoberfest na Bahia", diz Targino à Folha. Esse relacionamento com estrangeiros motiva o músico a mais um projeto, ainda embrionário, de um documentário sobre a sanfona no mundo.

Na Semana Santa, no fim deste mês, ele produz o Festival de Forró de Itacaré, cidade vizinha a Ilhéus. "A curadoria é toda minha. Depois, em abril, em Andaraí, é a vez do Conecta Chapada. Será num palco à beira do rio Paraguaçu. Ali vou levar rock, reggae, forró."

Em outubro, ele volta para a Chapada Diamantina para a segunda edição do Festival de Forró da Chapada, que criou no ano passado na cidade de Mucugê, Bahia. 

Targino está no meio do processo de gravação daquele que admite ser seu álbum mais ousado, "Sem Limites". Deve mostrar músicas desse trabalho em São Paulo.

O disco mistura forró com outros elementos. Ele acaba de lançar na rede o clipe de "Refugiados". "É um disco para mostrar meu gosto musical, exercer minha liberdade de transitar por outros gêneros. Convidei o Zeca Baleiro para que cantasse uma parceria nossa no álbum. E estou chamando outros músicos para gravar, por etapas."

Gil, Fagner e Mariene de Castro já gravaram. O disco terá também Leonardo, Bell Marques, Carlinhos Brown e Moraes Moreira. "Estou esperando também o pessoal do BaianaSystem. Vai ser minha sanfona contra a barulheira deles. E aguardo Ivete Sangalo, que deve gravar em maio."

Ele já se prepara para o São João, período de festas juninas no Nordeste que é o Carnaval para os forrozeiros. Nessa época ele faz às vezes quatro shows em locais diferentes no mesmo dia.

Targino toca pela primeira vez no Bar Brahma. Sua ideia é fazer quatro shows ali, todo segundo domingo de cada mês, até julho, sempre com um convidado. Acostumado a tocar no Canto da Ema ou no Remelexo, casas paulistanas de forrozeiros, quis agora um local que não tivesse essa ligação com o gênero."

Targino revela que recentemente durante encontro para gravações de um especial para Programa de Televisão com a participação de Antonio Barros e Ceceu, Jorge de Altinho e Alcymar Monteiro, veio a ideia do sanfoneiro paraibano Flavio José, que pensou em um CD de forró festivo, arrasta-pé. Targino comprou a proposta e reuniu mais de 20 cantores de São João. O disco deve sair em abril.

Fonte: Folha S.Paulo-Thales de Menezes


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NEY VITAL SACODE O FORRÓ, XOTE, XAXADO E BAIÃO COM BOM JORNALISMO

O jornalista Ney Vital foi pioneiro na região do Vale do São Francisco e Norte da Bahia, ao apresentar programa de Rádio valorizando a vida e obra de Luiz Gonzaga,  os cantadores de viola, vaqueiros e aboiadores na FM, no inicio dos anos 2000, um autêntico desbravador. 

O rádio continua sendo o principal veículo de comunicação do Brasil. Aliado a rede de computadores o Rádio está cada vez mais dinâmico. Agora numa das principais Emissoras de Rádio do Nordeste, Ney Vital, apresenta e produz o Programa Nas Asas da Asa Branca-Viva Luiz Gonzaga e seus seguidores.

O programa segue uma trilogia amparada na cultura, cidadania e informação. "É a forma, o roteiro concreto para contar a história da música brasileira a partir da voz e sanfona de Luiz Gonzaga e de todos que usam a voz e a sanfona para valorizar a história iniciada pelo sanfoneiro nascido em Exu e seu pai Januário, tocador de oito baixos", explica Ney Vital. 

O programa Nas Asas da Asa Branca-Viva Luiz Gonzaga é um projeto que teve início em 1990, numa rádio localizada em Araruna, Paraíba. "Em agosto de 1989 perdemos o Rei do Baião e então, o   hoje professor doutor em Ciência da literatura, Aderaldo Luciano, na época estudante e amigo me fez o convite para participar de um programa de rádio. Suíte NordestinaE até hoje continuo neste bom combate". 

No programa o sucesso pré-fabricado não toca e o modismo de mau gosto passa longe."Existe uma desordem , a inversão de valores no jornalismo veiculado no rádio e na tv, blogs e tecnologia e na qualidade das músicas apresentadas no rádio", avalia.

Ney Vital recebeu o titulo Amigo Gonzaguiano Orgulho de Caruaru recentemente em evento realizado no Espaço Cultural Asa Branca. 

Ney Vital usa a credibilidade e experiência em mais de 20 anos atuando no rádio e tv. "O programa incentiva o ouvinte a buscar qualidade de vida. É um diálogo danado de arretado. As novas ferramentas da comunicação permitem ficarmos cada vez mais próximo dos ouvintes", finalizou Ney Vital.
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CONGRESSO INTERNACIONAL DO LIVRO, LEITURA E LITERATURA DO SERTÃO VAI ACONTECER ENTRE OS DIAS 07 E 11 DE MAIO

O 4º Congresso Internacional do Livro, da Leitura e da Literatura no Sertão (Clisertão), evento promovido pela Universidade de Pernambuco (UPE)/Campus Petrolina, ocorrerá entre os dias 7 e 11 de maio, e vai abordar o tema ‘As Margens da/na Literatura, Linguagem e Leitura’.

Serão homenageados no Clisertão 2018 o poeta Patativa do Assaré (que receberá-In Memória o título de Doutor Honoris Causa da UPE), Yeda Barros, professora fundadora do Curso de Letras da UPE Campus Petrolina (há 50 anos), e a poeta Zita Alves.

Com a proposta de discutir a produção e circulação do livro em Petrolina e região, o 4º Clisertão será dividido por espaços de vivências e realizado em diversos locais da cidade. Na UPE, vão ser apresentados, entre outras coisas, conferências, minicursos, saraus, teatros e mesas redondas. Também haverá espaço para a ecoleitura, que ocorrerá em vinícolas, ilhas e sítios arqueológicos. O congresso ainda incluirá escolas, praças e barquinhas na programação, com o objetivo de promover troca de saberes.

Este ano o Clisertão, que já se consolidou como um dos principais eventos socioculturais da região, trará para o município personalidades como o linguista e escritor, Marcos Bagno (UnB); o poeta Jessier Quirino; o crítico literário Flavio Kothe (UnB); e o jornalista Eric Nepomuceno. Além deles, estarão presentes os convidados internacionais Elicura Chiuhailaf (um dos mais importantes escritores do Chile); Pablo Montoya (Colômbia, vencedor do Prêmio Casa de las Americas); Alejandro Reyes (México); Abdulbaset Jarour (Síria) e Keto Kebongo (República do Congo).
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PATATIVA DO ASSARÉ, O POETA CIDADÃO E A CULTURA BRASILEIRA

Em 5 de março, Patativa do Assaré completaria 109 anos de vida. Foi um dos maiores poetas do Brasil, além de compositor, cantor e repentista, trazendo uma linguagem simples, porém poética, que retratava a vida sofrida e árida do povo do sertão. Destacou-se em nível nacional com a música "Triste Partida", no ano de 1964, uma toada de retirantes, gravada por Luiz Gonzaga, o rei do baião. Patativa, ainda em vida, teve alguns de seus livros, traduzidos para vários idiomas, sendo tema de estudos na Sorbonne, na cadeira de Literatura Popular Universal.

A obra de Patativa do Assaré (1909-2002) reinventou a nação semi-árida para os seus próprios viventes. O poeta foi tão necessário nessa empreitada quanto autores como Raquel de Queiroz, José Américo de Almeida ("A Bagaceira") e José Lins do Rego foram para a fundação da imagem do Nordeste na primeira metade do século passado. Aqui deixa-se de fora, de propósito, Graciliano Ramos e sua alma russo-nordestina, nome que carrega outros sóis.

Andarilho de poesia falada, como os trovadores medievais ou beatniks da América, Patativa botou a prosódia do recolhido homem sertanejo, quase oriental nos seus modos, para desavergonhar-se e tocar no rádio. O que era economia da fala vira sangradouro, tempestade, como a cheia que invade agora a terra seca. O semi-árido, corte da geografia que abriga quase 20 milhões de almas, ganharia assim o seu Camões ou Comonge, como se diz por lá, onde o português reencarna, no anedotário, um anti-herói à João Grilo e Pedro Malasartes.

Ele apreciava muito "Os Lusíadas", ao ponto de dizer muitos versos na mesma métrica. Também perdeu uma vista, desde menino. "Dor-dolhos" se chamava a doença que cegava nos sertões mais precários. O seu primeiro livro, "Inspiração Nordestina", recolhido por um amigo que se ofereceu para o exercício da datilografia, agora é reeditado pela Hedra. O bardo não anotava nenhum garrancho do que recitava, mas guardava tudo de memória.

Além do pendor camoniano, Patativa -pássaro miúdo e cantador, daí o apelido-Patativa- era chegado num Castro Alves. As musas do parnaso também lhe mostravam os bordados das anáguas. Eta Bilac para deixar rastros, talvez seja o mais influente poeta brasileiro de todos os tempos, está nas dores do mundo de Cartola, um fã confesso, está nos floreios do poeta mais sertanejo.

Como se vê no livro relançado, cuja primeira edição é de 1956, seja nos sonetos, nas quadras ou motes, o condoreiro e o homem do "ora, direis" se encontram no Assaré (Ceará), que quer dizer atalho na língua tupi, caminho dos jardins que se bifurcam da poesia nordestina. Homem que é homem pode até preferir João Cabral, mas não tem medo de raspar o tacho de mel dos adjetivos.

É com esse mundo meloso que Patativa prensa a sua rapadura -nada representa mais a sua poesia do que esse doce nordestino. Com linguagem aparentemente adocicada, ele fez um tijolo impenetrável para a dentição dos esmorecidos. Como em "A Triste Partida", sua canção gravada por Luiz Gonzaga: "-De pena e saudade, papai, sei que morro!/ Meu pobre cachorro, / Quem dá de comê?/ Já ôto pregunta: -Mãezinha, e meu gato?/ Com fome, sem trato,/ Mimi vai morrê!".

Nas "vidas secas" de Antônio Gonçalves da Silva, que ganharam mundo a partir de programas de rádio do Crato, há o duro protesto contra a cerca de arame do latifúndio, mas com uma verve "romântica" à Castro Alves. Na sua canção de um exílio inevitável, não há o piripaque metafísico ("em cismar sozinho à noite...") de Gonçalves Dias, pois a dor já começa na estrada. Patativa botou o homem do semi-árido, seco e contido por natureza, para derramar-se. Isso é quebra de tabu, sertão sob o sol da psicanálise. 

Nesta segunda-feira 05 de março de 2018 o Poeta completaria 109 anos. Ele continua vivo na Memória do Povo.

Fonte: Xico Sá-Folha S.Paulo
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O RÁDIO E A VALORIZAÇÃO DA CULTURA, CIDADANIA E QUALIDADE MUSICAL

Um dos grandes problemas enfrentados pelo rádio nos dias de hoje é o desprezo promovido pela sociedade, que não tem tido a preocupação necessária com seus rumos, nem fiscaliza as emissões, nem exercita uma visão crítica do que se passa nas programações. Outro problema é a falta de apoio dos órgãos de publicidade, que não aplicam planos de mídia adequados para conquista de público, nem rediscutem o problema das verbas publicitárias, que muitas vezes vão para o rádio de forma minguada e baseada, não em critérios técnicos, e sim, em discursos do tipo ‘vou fazer esta propaganda para o ajudar’.

Em muitos casos, temos também a falta de preocupação dos jovens com a programação de qualidade – preferem alienadamente uma programação musical, sem teor cultural nem informação, promovida pelo rádio FM. A formação de locutores também é um problema, pois apesar dos programas dos cursos serem baseados nos ideais de uma programação ética e de qualidade não há fiscalização das ações dos novos radialistas que, ao fazerem programas arrendados, dizem o que querem ou o que lhes mandam dizer.

Outro exemplo de descaso são os novos aparelhos de mídia, como Mp4, Ipod, Mp3 e outros equipamentos de som que são desprovidos da faixa AM, o que prova um descompromisso e um desconhecimento da importância do rádio AM na história do nosso país e na reunião da sociedade nos grandes eventos político-culturais de nossas comunidades. A luta pela valorização do Rádio AM tem que ser bandeira dos grupos organizados de nossa sociedade, sejam cursos de jornalismo e publicidade, seja a Associação das Emissoras, Sindicatos de Jornalistas e Radialistas, assim como todos os grupos que precisam defender uma comunicação livre, democrática e, sobretudo, digna e ética.

É urgente criar projetos que procurem formar novos ouvintes que exerçam sempre um uso crítico deste meio de comunicação para que a forma como o rádio vem sendo feito seja questionada e todos os usuários deste meio de comunicação sejam respeitados tanto na mensagem que vem até eles quanto no tipo de programação que lhes é apresentado. É importante que se façam fóruns, debates e discussões sobre o meio rádio em todos os cursos de comunicação e que a formação de locutores seja baseada em conteúdos de ética, solidariedade, respeito ao próximo, cidadania e desenvolvimento de práticas sociais consistentes para melhoria do nível cultural de nosso povo.

É de grande alvitre que se fomentem ações que tenham como missão o fortalecimento do meio rádio no tocante às emissões e ao aparelhamento técnico das rádios para que haja qualidade dos programas tanto nos aspectos operacionais como nos discursos proferidos pelos radialistas, que muitas vezes emitem mensagens preconceituosas, de atrelamento político subserviente e de desrespeito aos que buscam este meio de comunicação.

O rádio é um grande meio de comunicação precisando ser respeitado tanto pelos que nele trabalham quanto pelos que ouvem e esse respeito é traduzido na participação do ouvinte, que deve ser concisa, séria e desatrelada de interesses. Os que hoje se dizem proprietários das emissoras precisam investir na programação buscando modernizar os estúdios e dotá-los de equipamentos que permitam uma emissão qualificada para que as pessoas entendam o que têm nos programas e compreendam o conteúdo de cada programa.

O respeito ao rádio deve ser buscado pela sociedade, pois o rádio sempre foi e será um meio de comunicação dos mais versáteis e dos mais importantes no quesito de chegada ao povo e na certeza de uma comunicação instantânea, rápida e extremamente popular. Precisamos defender o rádio que fala nossa linguagem, que emite nossa cultura e diz os anseios do povo. Devemos rechaçar as emissões importadas e valorizar a programação local no sentido de que os que ouvem rádio precisam saber de sua terra, seus problemas e as possíveis soluções – o rádio precisa ser regional tanto na programação quanto nas iniciativas. O rádio é nosso, precisa ser reconhecido como nosso e merece, sobretudo, atenção, renovação e busca da qualidade para o bem de todos e melhoria de nossa sociedade.

**Fonte: Francisco Djacyr Silva de Souza - Associação dos Ouvintes do Ceará, Fortaleza, CE
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MARÇO 2018: 100 ANOS DO PAI DO CORDEL, LEANDRO GOMES DE BARROS

1. O CORDEL é poesia brasileira e como tal deveria ser estudado. Mas não é tão somente poesia brasileira.: é, também, a única forma poética fixa genuinamente brasileira, nascida em solo nacional, tendo a cidade do Recife como cenário e palco e Leandro Gomes de Barros como seu sistematizador. Em poesia, vale dizer, não existe precursor. A poesia é um fenômeno. Acontece. E a observação vale para o cordel. Os movimentos literários, esses percebem a presença do precursor. A obra literária, não. Ela já nasce como tal. O conto e a novela não podem ser precursores do romance. Assim como as quadrinhas não podem ser precursoras do soneto. Logo, não existe uma forma precursora para o cordel, consequentemente não existe um precursor ou vários precursores. A sextilha preexistiu ao cordel, é óbvio, entretanto um agrupamento de sextilhas não pressupõe a existência do cordel. Convencionou-se, entre poetas e pesquisadores, que o cordel deve apresentar um mínimo de 32 estrofes (sejam sextilhas ou setilhas). Essa convenção, todavia, não foi construída do nada, mas da observação sobre ser esse número de 32 estrofes o necessário para a confecção de um folheto de 8 páginas. Assim nasce a forma fixa do cordel, balizada por sua disposição no papel, no seu aspecto gráfico. Isso traz para o cordel duas marcas: a marca gráfica, escrita e editada, portanto pensada e elaborada no misto homem-máquina; e a marca poética, pensada e elaborada no misto homem-natureza. E precursores, portanto, são todos os poetas que o fizeram anteriormente em toda a literatura universal. Essa a filiação do cordel brasileiro.

2. As tentativas de estudar o CORDEL BRASILEIRO não levaram em conta o seu caráter poético e, quando tentaram considerá-lo, uniram-se ao contraditório por não classificá-lo como se deveria classificar qualquer peça poética, parte do todo literário universal. Isso se daria (e se deu quando destinei-me à observação sistematizada) com o estudo à luz dos gêneros literários, orientando os estudos pela conclusão, a partir da observação, segundo a qual o cordel brasileiro é uma forma poética fixa da poesia universal. A forma fixa do cordel se dá pela exigência do cumprimento de suas regras intrínsecas e definitivas. Essas regras fizeram-no distanciar-se do malogrado conceito de "literatura de cordel", ligado ao que se fazia e se fez em Portugal, aos pliegos sueltos e coplas de Espanha, à colportage francesa, aos chapbooks britânicos. O cordel brasileiro é forma genuinamente brasileira por ter, em primeiro lugar, criado a forma poética fixa (com um mínimo de estrofes, sejam sextilhas, septilhas ou décimas; nunca em quadras, nem em prosa; a utilização majoritária do verso setissilábico; a observação da rima, disposta seguindo os pioneiros) e, para além da forma fixa, ter criado também o sistema literário cordelístico, pautado pela indicação de Antonio Candido (aquela que diz, em seu Formação da Literatura Brasileira - Momentos Decisivos: o sistema literário é formado pela presença de um autor, de um editor, de um leitor. Acrescentei ousadamente, com imenso receio de ser mal-entendido, mas precisava correr o risco: o crítico). Alguns pesquisadores quiseram estudar o cordel e o fizeram, até sistematicamente, mas desconsideraram os tópicos que citei.

3. Por uma questão POLÍTICA e de revisão de termos, abandonei as designações "cultura popular" e "poetas populares" referentes, no primeiro caso, ao arcabouço colorido produzido pelo povo, presente nas suas manifestações artísticas, e, no segundo caso, à poesia escrevívida de poetas que não passaram pela iniciação acadêmica. O que levou-me a esse solilóquio foi a constatação bem observada de que esses setores, os "populares", são os menos agraciados nas ações públicas para a cultura e os menos apreciados pelos dublês de gestores culturais. Observei, e todos podem observar, que um "poeta popular" jamais ganhará um prêmio literário promovido pelo estado oficial tendo as elites culturais como senhoras dos critérios avaliativos. Observei também que os "poetas populares" são usados como adorno em suas festas e ao final são convidados a comer na cozinha e dormir no quartinho. Vi também que esses mesmos poetas quando chamados para se apresentar em escolas, festas públicas e solenidades percebem os menores cachês, quando não são chamados a apenas "divulgar o seu trabalho". O poeta popular e seus pares da cultura popular, a despeito do seu trabalho e labuta, são considerados tão somente como apêndices, desprovidos do rigor técnico e estético requerido pelos editais elitistas. Assim, aqueles dublês aos quais me referi acima, entregam um milhão aos seus pares e apenas um quinhão de migalha ao poeta e ao artista populares. Trago isso para o cordel porque os poetas dessa falange são considerados poetas populares. O povo os ama, é verdade, mas as elites os repugnam. O cheiro do povo, o suor do poeta do povo, do poeta de cordel, constrange a madame e o salão do palácio e o alpendre da casa-grande. Ouvi de um poeta do povo sua vontade: elevar o cordel ao erudito. É um absurdo estético. Não existe elevação nem depressão na poesia. A poesia existe ou não. E acima de tudo não necessita de adjetivos. A poesia é a poesia. Toda e qualquer adjetivação, assim como o próprio termo "popular", é criação das elites para promover a apartação.

4. Quando tinha 8 anos, comprei meus dois primeiros folhetos de cordel, na feira, das mãos de seu SEVERINO FOLHETEIRO: Vicente, O Rei Dos Ladrões e O Herói João de Calais. São duas narrativas clássicas do cordel brasileiro. Contam uma história a partir das proezas dos dois protagonistas. Todos nós gostamos de histórias. A humanidade é posta para dormir em sua primeira infância ao som de histórias saídas dos lábios de suas mães. Minha primeira infância cumpriu essa proposta. Minha mãe narrava as histórias de cordel, rimadas e, algumas, cantadas. Adormeci várias noites pensando nas maravilhas contadas nas histórias do cordel e imaginei que todo o produto cordelístico obrigatoriamente contaria uma história, seria uma narrativa. Esse encontro com o cordel, já contei isso várias vezes, oportunizou-me anos depois, aos 13 anos, o caminhar entre Borges, depois Poe, depois Twain, depois Kafka, depois Tchekov, ou seja, autores contadores de histórias. Um dia li, na biblioteca do padre, Jorge Amado. E assim seguiram-se os autores brasileiros até Inácio de Loyola Brandão. Esse ano, o ano treze de minha existência, foi o ano da tomada de consciência literária. E o cordel continuava abastecendo meus dias. Até deparar-me com um folheto cujo título chamou-me muito a atenção: Conselhos Paternais. Fui uma criança que cresceu sem pai e esse título encabulou-me. Quais conselhos um pai daria a um filho? Comprei-o e corri para casa para ler no pé de goiaba. Meu ponto de encontro com a literatura era o auto da goiabeira no quintal. Ao ler o cordel de José Bernardo descobri, imediatamente, que o cordel não contemplava apenas as narrativas, mas, também, a reflexão sobre o mundo, sobre os costumes, sobre as relações sociais. Mais tarde, mais maduro, descobri que o cordel contemplava todo o espectro dos gêneros literários. Ainda há poetas que pensam que o cordel é apenas narrativo, entretanto a observação mostra-nos o contrário. O cordel tem o veio épico, o veio lírico, o veio dramático. Vai além com a crônica e a biografia. Equipara-se, várias vezes ao ensaio. Vejamos quatro exemplos de cordéis que fogem à narrativa, enveredados pelo ensaio. São muito importantes estes títulos porque escritos por mulheres, o que muitos estudiosos e historiadores do cordel, como os que citei em artigos anteriores, não elencam. As mulheres são uma peça fundamental no processo histórico do cordel. E é necessário, urgente, contar essa história.

5. O CANGAÇO sempre esteve presente nas páginas cordelísticas. É um aquífero no qual sempre se encontra uma novidade, um detalhe, um episódio. Em todos os lugares do Brasil e em todos os tempos nos quais fenomenalizar-se um poeta de cordel, o tema cangaceiro se fará rugir. É uma marca, como um ferro de gado em brasa assinando seu emblema no couro susceptível da história. Já pude falar nas diferenças de catalogação do cordel. Criaram-se categorias inesgotáveis de tema, classificaram-na como tudo, menos como poesia. Quando iniciei a cruzada de se trocar o nome de "literatura de cordel" por "cordel brasileiro", quando anunciei a necessidade de se estudar o cordel à luz da teoria dos gêneros literários, fugindo às classificações em ciclos e temas, quando preguei a necessidade de os poetas partirem para uma produção mais cuidada (fugindo à espontaneidade), quando anunciei a chegada de um tempo no qual a agenda político-poética-pedagógica seria a demanda e a revolução, fui combatido pelos pensantes de momento, combatido mesmo a socos como alertava Maiakovsk, entretanto 10 anos depois de minha primeira fala nesse sentido, no Salão do Cordel de Guarulhos, em São Paulo, percebe-se uma certa pacificação. Os antagonistas de antes continuam antagonistas de hoje, mas criam novos rótulos apenas para alinhar-se ao que tentei estabelecer em uma teoria do cordel brasileiro. Alguns passaram a chamar "literatura de cordel brasileira", outros permaneceram com o antigo "literatura de cordel", mais ainda "poesia de cordel produzida no Brasil". O que ficou disso tudo, de todos os embates teóricos, entre poetas e pesquisadores, foi a consciência da necessidade urgente de se plantar definitivamente as diferenças que atestam a originalidade do cordel brasileiro. E o cangaço foi um dos grandes responsáveis por esse movimento. Na história recentíssima do cordel, os poetas continuam na busca da brasilidade navegando ao sol cangacionário.

6. A forma poética criada por Leandro Gomes de Barros, escreve um percurso histórico que se confunde com a República. No final do séc. XIX, Leandro cria o sistema que o definirá como pai do cordel. Todas as modalidades poéticas açambarcadas no cordel saíram do condão poético leandrino, inclusive as marcas gráficas que o definirão: o acróstico, a exortação, a invocação, a intercalação de estrofes, as três formas (epopeia, lírica e drama). A República vai se construindo e Leandro abandona as histórias de reis, donzelas e princesas, passa a criticar os costumes e lança o olhar crítico sobre nossa primeira revolução industrial, sem se afastar da política, defendendo o direito autoral, contaminado com a liberdade de expressão que se inaugura. Hoje, todos que escrevem cordel e se consideram poetas dessa senda, deveriam conhecer sua obra e reverenciar seus feitos, respeitando a tradição e dialogando com seus pares atuais.

Fonte: Professor doutor em Ciencia da Literatura-Aderaldo Luciano
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FLAVIO LEANDRO: MEU PAI FOI UM DESTEMIDO! BRINCOU DE VIVER...BRINCOU DE BRINCAR!

Terminou Tudo...Meu pai foi um destemido! Nunca o vi com medo de nada; nem da morte! Nesta, deu dribles, nos últimos anos, que até a ciência duvidou.

Brincou de viver...Brincou de ser pai, filho, esposo, irmão, trabalhador, empresário, viajante...Brincou de brincar!

Levou muito a sério a bebida, sua fiel companheira de quarenta anos. Com esta, nos tirou um montão de carinho e abraços, mas, ao menos, nos mostrou que caminhos não deveríamos seguir.

Na lucidez nos mostrou o ser humano fantástico que a bebida escondera por muito tempo.

Na lucidez, nos reencontramos, em paz e em definitivo. Desta fase harmoniosa, nasceu a música: MEU PAI, poesia na qual fiz questão de dissecá-lo e mostrar ao mundo quão grandioso era o meu orgulho de tê-lo como genitor.

Em uma de suas brincadeiras de ser isso e aquilo, quis ser fabricante de queijos de manteiga. Apoiamos. Ficamos com a mão-de-obra e ele ficou responsável por gerir a fábrica e efetuar as vendas, bem como, ferrar cada queijo produzido com sua marca, um T maiúsculo, de Teté. Cada queijo um T. Foram muitos tês, e poucos resultados. A coisa desandou. Tivemos que fechar a fábrica. O último queijo que saiu da forma, recebeu dois tês. Minha mãe estranhou e perguntou o motivo da dupla de tê naquele queijo derradeiro, ao que meu pai respondeu sorridente: Terminou Tudo.

Ontem, com o ferro do existir, meu pai carimbou o último suspiro de sua vida com a marca terminal de sua ousadia. Sorriu, e partiu para o silêncio que há de nos unir no porvir.

Foram 66 rodadas, que poderiam ter sido 99, não fosse a intensidade com que quis brincar de viver...

Te amo, meu pai! Deus o tenha!
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