Targino Gondim e Anselmo Gomes: na sombra do Juazeiro

Targino Gondim está a caminho dos 25 anos de carreira. São mais 20 anos de festa desse sanfoneiro discípulo fiel de Luiz Gonzaga. A amizade com Targino me proporcionou conhecer o professor e advogado Anselmo Gomes. Anselmo é um dos compositores de Targino.

Targino Gondim possui os segredos e nuances da noite estrelada. Cheio de sabedoria aprendeu com "Seu Targino", Luiz Gonzaga e Dominguinhos e bebeu na fonte dos vaqueiros cantadores de viola e por isto  sabe divisar o Cruzeiro do Sul do Sete Estrelo. Este sentimento poético, revelador encontramos em Zé Marcolino, Humberto Teixeira, Zé Dantas.

Das músicas de Targino Gondim gosto de todas. Principalmente das inéditas, ainda não conhecidas do público. Tenho o privilégio de ser amigo desse sanfoneiro e sei que os próximos anos é de mais sucesso. Muita música boa no matulão.

Mas quero aqui confessar que meu sentimento bate mais forte quando escuto Na Sombra do Juazeiro, composição de Anselmo Gomes que Targino Gondim gravou e que Dominguinhos numa tarde ao pôr do sol lá em Exu, terra de Luiz Gonzaga revelou ser bonita demais.

Na Sombra do Juazeiro, é tema de saudade, amores, é expressão de sonho, desejo e angústia. Na canção a natureza é solidária até no sofrimento.

Vejamos:
"No meu pé de serra na sombra do juazeiro eu passo o dia inteiro pra ver ela passar mas ela não vem e eu fico esperando sozinho, lamentando aguardando por meu bem/.
E toda quinta-feira lá tem arrasta pé, Vixe, como tem mulher e tanta brincadeira vai amanhecendo o dia e eu fico esperando sozinho, matutando mas não vem quem eu queria/.
Oh tanta malvadeza faça isso comigo não se tens tanta certeza que é teu meu coração na próxima quinta-feira passe logo bem cedinho estou louco por teus carinhos e pra dançar um forrozão...

É por isto que Na Sombra do Juazeiro é minha preferida pois embala, encanta, vibra o sentimento. É um mistério que emudece. Targino Gondim e Anselmo Gomes foram contagiados aqui no ritmo, melodia e harmonia e fizeram uma música mais brasileira, tipo exportação, materializando o real sentido da palavra cultura.

Na Sombra do Juazeiro é o desenho cósmico da natureza-homem-mulher, expressão no choro solitário de dor na união dos destinos. É o juazeiro simbolo de resistência.

Que Santa Cecília protetora da música, ilumine Targino Gondim...e eu quero tá junto comemorando os 100 anos desse poeta sanfoneiro.

Felicidades Targino Gondim. Que São Domingos Lua Gonzaga Ilumine tua Inspiração..
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Crato-Ceará: Pedro Lucas, 10 anos cria Museu para homenagear Luiz Gonzaga, o Rei do Baião

No programa Nas Asas da Asa Branca-Viva Luiz Gonzaga de sábado 16 de janeiro através da Rádio Cidade am 870, via internet www.radiocidadeam870.com.br, você vai conhecer Pedro Lucas, 10 anos, morador do Distrito de Dom Quintino, localizado no Crato, Ceará, que criou o "Museu Luiz Gonzaga".

Ele conta que em 2013, então com 8 anos, voltou encantado de uma visita que fizera ao Museu em Exu (PE). Ao voltar para a sua casa deu vazão à admiração que nutre por Luiz Gonzaga: ele cria um museu dedicado ao Rei do Baião, na casa em que sua falecida bisavó morava, vizinha à dele.

O Museu está localizado na rua Rua Alto da Antena, no distrito de Dom Quintino. No acervo cerca de 100 objetos que recriam a época em que Luiz Gonzaga viveu. Pedro Lucas guia as visitas no local, contando a história de cada objeto do museu, função que divide com o primo, Caio Éverton, de 8 anos. Além de discos, rádios, ferramentas de trabalho e utensílios, partes do universo cantado por Luiz Gonzaga.

A paixão pela música de Luiz Gonzaga, Pedro Lucas conta ter surgido mesmo quando ouviu “Numa Sala de Reboco”, composta por José Marcolino. "Gostei tanto da música que passei a cantá-la frequentemente". Então ganhou um CD de Luiz Gonzaga."Ai eu ouvi várias vezes e fui cada vez mais ficando apaixonado por tudo que Luiz Gonzaga Canta", revela Pedro Lucas.

Com os pés no chão e olhos nas estrelas Pedro Lucas, filho de agricultores,  tem consciência dos desafios que tem pela frente e afirma: "a iniciativa não vai parar. Vou estudar muito e pretendo concluir um curso superior e conciliar a profissão com a sanfona, instrumento que tem o sonho de aprender a tocar".

"O objetivo maior é incentivar que nossa cultura não pode morrer", finaliza Pedro Lucas.
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A música brasileira é muito rica. Mas infelizmente está reduzida a cantores padres, axé e sertanejos, diz Ruy Castro

Autor de Carmen: uma Biografia, sobre Carmen Miranda, e Chega de Saudade, no qual conta a história da bossa nova, Ruy Castro é uma dos principais vozes a resgatar o passado cultural brasileiro. Numa entrevista, concedida por e-mail, o autor fala sobre seu novo livro, A Noite do Meu Bem, que narra a história do gênero samba-canção, e compartilha sua insatisfação com o cenário atual da música do país. Ele cita que a música está reduzida a porcaria do axé, sertanejos e padres cantores.

Confira a entrevista:
*O senhor refuta a hipótese de que o samba-canção seria o bolero brasileiro. Quais foram as principais características e influências do gênero investigado pelo livro?
Não há a menor identidade rítmica entre o bolero e o samba-canção. O samba-canção é o samba. Ah, mas o samba-canção e o bolero falam de amores fracassados. É verdade – mas toda música romântica fala de amores fracassados, inclusive a americana. E há muitos sambas-canção para cima, otimistas – é só ver o repertório do Dick Farney, da Doris Monteiro, da Elizeth Cardoso. Além disso, quando o bolero penetrou no Brasil, no começo dos anos 1940, Ary Barroso e Noel Rosa já tinham criado seus grandes sambas-canção.

*Como o samba-canção foi capaz de desbancar gêneros musicais de fora do país, uma vez que a música francesa e a americana exerciam grande protagonismo nas rádios brasileiras? 
No passado, a música americana já contava com os discos, filmes, revistas, jornais e até com os álbuns de figurinhas para se impor em todos os países. E, como em toda parte, a presença dela no Brasil era enorme. Só que, na época, fazíamos música brasileira, e muita gente a preferia à música americana. O samba-canção atendia a todas as solicitações: era melodicamente sofisticado, harmonicamente complexo, ritmicamente delicioso, bom de dançar com rosto colado, e as letras eram bem escritas e diziam coisas. Não havia cantor estrangeiro que vendesse mais que a Angela Maria ou o Nelson Gonçalves. A partir de 1983 é que a música brasileira passou a macaquear a que se fazia em toda parte e, aí, a música americana tomou conta.

*Qual foi a importância de Lupicínio Rodrigues para o samba-canção?
Total. Lupicínio, assim como Custodio Mesquita, Herivelto Martins, José Maria de Abreu e Dorival Caymmi, foi dos primeiros a perceber a riqueza e a potencialidade do samba-canção. Não por acaso produziu a maioria dos seus primeiros clássicos.
 

*Seu livro foi festejado por preencher uma lacuna pouco pesquisada da música brasileira. O senhor arrisca algum motivo para que o samba-canção não seja mais conhecido hoje?
O brasileiro é assim mesmo quando se trata do seu próprio passado. Quando lancei Chega de Saudade, em 1990, ninguém na época queria saber de bossa nova – estava morta e sepultada havia mais de 20 anos. Com o livro, ela foi redescoberta e, à sua maneira, discreta e elegante, está no ar até hoje. Vamos ver se acontece o mesmo com o samba-canção. Não há quem ouça obras-primas como Chuvas de Verão, Risque, Dó-ré-mi, Ouça, Não Tem Solução e todas do Lupicínio sem se arrepiar. O samba-canção está esquecido, mas é formidável, é nosso e cabe a nós ressuscitá-lo.

 *Qual é o legado do samba-canção no atual cenário musical brasileiro?
Cenário atual? Legado? Nenhum. Nem do samba-canção, nem do samba propriamente dito, nem da bossa nova, e nem de qualquer ritmo brasileiro. Fomos reduzidos a porcarias como axé, sertanejos e padres cantores. A boa música brasileira hoje não pode contar com as gravadoras, nem com o rádio, nem com a televisão, nem com as casas de shows e nem com ninguém. Os últimos grandes cantores, se quiserem se apresentar, têm de pagar para cantar. Há muita gente fazendo coisa boa, mas escondido, sem a menor chance de penetrar no mercado.

Fonte: Jornal Zero Hora

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Jorge de Altinho: Petrolina, Juazeiro, sertões, brejos e cariri


A gravação do DVD de Flávio Leandro em Petrolina, Pernambuco proporcionou a oportunidade de um grande encontro com o que existe de melhor na Música Universal Brasileira. Encontramos Jorge Assis Assunção, Jorge de Altinho. Compositor de alma cheia e grandeza humana. É de Jorge de Altinho as primeiras composições gravadas pelo Trio Nordestino (Lindu, Cobrinha e Coroné), destaco "Fole de ouro", "Amor demais", "Forró quentão", "Petrolina Juazeiro", Caruaru a Capital do Forró,  "A separação".
 
No início de carreira inspirou-se em Raul Seixas e Jackson do Pandeiro. O seu
primeiro disco LP: "Jorge de Altinho - O príncipe do baião", é hoje considerado pelos pesquisadores e colecionadores uma das raridades no mercado dos especialistas e admiradores da vida e obra de Jorge de Altinho.

Ressalto sempre que Luiz Gonzaga foi pedra angular, referência -mor do forró, mas o Rei do Baião, não trilhava sozinho. Havia por trás de si, uma constelação de compositores, músicos, além de profícuos conhecedores do seu trabalho, amigos talhados de sol, nascidos do barro vermelho, com almas tatuadas por xique-xiques e mandacarus.

Jorge de Altinho é uma dessas estrelas! Tem sua luz! Brilha até hoje inspirado no convívio dos sertões, conhecedor dos segredos e nuances da noite estrelada. Humilde e grande na sabedoria de seguir os ensinamentos e conselhos de Luiz Gonzaga e Dominguinhos.

Uma das mais belas interpretações de Jorge de Altinho é Tamanho de Paixão, onde ouvimos Luiz Gonzaga e Dominguinhos fazendo a sanfona roncar feito trovão em dia de chuva.
No livro Forró de Cabo a Rabo, o jornalista e crítico musical Ricardo Anísio, aponta Jorge de Altinho, como uma das vozes mais bonitas do reduto forrozeiro. Timbre de voz de rara beleza. Compositor de maior sensibilidade, construtor da palavra poética.

E foi usando a construção poética que Jorge ao ser apresentado a Albacelia, Fábia, Keila e Zeneide, amantes da boa música e moradoras da região do cariri nos fez lembrar:
Doido de saudades Cariri
Doce paixão Vejo na saudade
  Tô aqui Meu coração
Cariri  meu Cariri Manda um beijo de recordação
 Eu quero te abraçar nesse meu sonho
Quero te envolver nessa emoção

Quero ver de novo me amor
Teus canaviais e teu luar
Mergulhar na paz do Araripe
E em tuas fontes me banhar
É tanta saudade Cariri

Quero estar pertinho de você
Pra no meu abraço teu sorriso
Nos teus rios meus sonhos correr"

É este  Jorge de Altinho.
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Mossoró: Poeta Antonio Francisco e a conscientização de uma Dose de Amor


Conheci o poeta  Antonio Francisco,  nascido em Mossoró, Rio Grande do Norte, através do pesquisador musical Higino Canuto Neto.

Antonio Francisco sabe usar a palavra para dizer com simplicidade as coisas mais difíceis. Antonio Francisco participou do Programa Nas Asas da Asa Branca-Viva Luiz Gonzaga e ali tive observei que estava diante de uma riqueza cultural.


Conversa vai e vem foi revelado que poeta Antonio Francisco nasceu em Mossoró, filho de Francisco Petronilo de Melo e Pedra Teixeira de Melo. Graduado em História pela Universidade do Estado do Rio Grande do Norte (UERN). Poeta, cordelista, xilografo e compositor.

Somente aos 46 anos começou a carreira literária, já que era dedicado ao esporte, fazia muitas viagens de bicicleta pelo Nordeste. Muitos de seus poemas  são alvos de estudos e pesquisas de vários compositores do Rio Grande do Norte e de outros estados brasileiros, interessados na grande musicalidade que possuem. Antonio Francisco é atualmente tema de tese de mestrado e doutorados.

Em 15 de Maio de 2006, tomou posse na Academia Brasileira de Literatura de Cordel, na cadeira de número 15, cujo patrono é o saudoso poeta cearense Patativa do Assaré.

Antonio Francisco teve o livro 'Dez Cordeis num cordel só" indicado para o vestibular da Universidade do Rio Grande do Norte.

Um dos poemas mais comentados é Dose de Amor, que possui o tema da conscientização pela ecologia. Antonio Francisco é o  autor dos poemas, “Meu Sonho”, “O Guarda-Chuva de Prata”, “Os Sete Constituintes” ou “Os Animais têm Razão”,  “A Oitava Maravilha” ou a “Lenda de Cafuné”, “A Cidade dos Cegos” ou “História de Pescador”, “As Seis Moedas de Ouro”, “A Arca de Noé”, “Do Outro Lado do Véu”, “Confusão no Cemitério”, “O Ataque de Mossoró ao Bando de Lampião”, “A Lenda da Ilha Amarela”, “Um Conto bem Contado”, “A Casa que a Fome Mora”, “Um Bairro Chamado Lagoa do Mato”, “O Duelo de Bangala”, “O Feiticeiro do Sal”, “Uma Carrada de Gente”, “No Topo da Vaidade”, “Uma Carta para a Alma de Pero Vaz de Caminha”, “Uma Esmola de Sombra”, “O Rio de Mossoró e as Lágrimas que eu Derramei”, “O Lado Bom da Preguiça”, “A Resposta” e “De Calça Curta e Chinela”, editadas em folhetos ou em seus livros “Dez Cordéis num Cordel Só”, “Por Motivo de Versos” e “Veredas de Sombras”, editados pela Queima Bucha.

É Antonio Francisco  um caboclo com o sentimento universal de sabedoria. Tenho dito!!!
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Iguatu, Ceará: Humberto Teixeira, O doutor do Baião completaria 101 anos



Humberto Teixeira nasceu em Iguatu no Ceará, no dia 5 de janeiro de 1915 e morreu no Rio de Janeiro, em 3 de outubro de 1979.

Nas fotos o registro da visita da única filha do poeta compositor Humberto Teixeira, a atriz e cineasta Denise Dummont que participou ativamente das comemorações centenário do pai considerado o Doutor do Baião.

Humberto Teixeira foi responsável pelo enriquecimento do acervo da Música Popular Brasileira (MPB), com a composição de
clássicos com “Asa Branca”, “No meu pé de serra”, “Baião”,Juazeiro’, “Kalu”, “Assum Preto”, “Eu vou pro Ceará”, “Légua tirana”, e “Respeita Januário”, imortalizada nas vozes de grandes nomes da música brasileira, como Luiz Gonzaga, o rei do baião, que permanece no imaginário de várias gerações de brasileiros.

 Eleito deputado federal em 1950, Humberto Teixeira destacou-se por sua luta pelos direitos autorais e aprovou em 1958, a chamada Lei Humberto Teixeira, na qual permitiu a realização de caravanas, contribuindo assim com a divulgação da música popular brasileira no exterior.


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Raymundo Mello: Música Brasileira e os 6 anos de ausência do João Ventura

A data  05 de janeiro de 2016, marca os 6 anos de ausência do 'João Ventura', um sergipano pelo coração, cantor, compositor, poeta, que fez sucesso artístico no Brasil e no mundo, e, por opção própria, ao aposentar-se, em 1980, no auge de sua carreira, referenciado pelos melhores nomes da música popular brasileira – ele que lançou artistas como Jorge Ben (hoje Jorge Benjor) e Djavan –, resolve deixar o sucesso por lá e voltar para o Aracaju de sua juventude, para o seu 'Sergipinho' (ai... saudade do meu Sergipinho – ele cantava) e vem para a terrinha, lembrar, cantar e reviver, enquanto pôde, seus carinhos, suas amizades, seus velhos companheiros de farra e história.

Trouxe a sua experiência, o brilho de sua arte, o calor de suas emoções para a alegria de seus amigos e especialmente de seus familiares que o acompanharam Rio de Janeiro – Aracaju (esposa querida, filha, filho, netos), além de juntar-se aos aqui residentes, eu inclusive, seu irmão. Como foi bom ter João conosco. É verdade que, por insistente convite de 'Chico Anysio', ele aceitou mais um ano no Rio de Janeiro, colaborando com o grande mestre na elaboração e direção musical do famoso 'Chico Anysio Show', mas foi só um ano e, graças a Deus, ele resistiu aos insistentes – insistentes mesmo – convites do diretor de novelas 'Herval Rossano', que o queria, a todo custo, na produção da segunda edição da “Escrava Isaura”.

Eles fizeram juntos a edição da Globo, a original, feita quando os recursos técnicos ainda eram poucos, e Herval o queria junto na nova edição da novela para a Rede Record. Mas João resistiu e Herval ficou chateado, embora entendesse suas razões. Diga-se de passagem, a “Escrava Isaura” da Globo, até quando João vivia, rendia-lhe alguns reais, poucos, é verdade, porque no parte e reparte do que vinha da Alemanha, China e demais países do mundo onde a novela foi exibida – e vejam que ela andou sendo dublada no mundo inteiro –, sempre lhe trazia satisfação, não pelos valores que eram pequenos, mas pelas origens – Europa, Ásia, África e Américas.

Tenho umas poucas coisas de João. Poderia ser muito mais, porque, na verdade, estávamos, calmamente, selecionando materiais, correspondências, discos, fotos e tudo mais que julgássemos importante para um 'Memorial João Mello' a ser implementado e aberto ao público, com o próprio João falando, dizendo ao vivo o que significava tal foto, tal documento, tal disco, a exemplo de um pequeno acervo que já existia, devidamente organizado em uma dependência da Rádio Aperipê, aos cuidados do funcionário senhor “Anjo”, que João, carinhosamente, tratava por “Anjinho”, apesar do volume do homem ser mais para “Anjão”; era um quase atleta, mas delicado, com gosto para cuidar das coisas, como ele mesmo dizia.

Infelizmente, fomos pegos de surpresa, e na manhã de 5 de janeiro de 2010, o nosso 'João Mello', o legítimo João Ventura por ele cantado, foi-nos tomado, mas seguiu serenamente para o outro lado da vida, e nesse outro lado ele é eternizado e nos aguarda. Quem sabe, lá no “aeter” já está montando aquele memorial imaginado. Quem sabe? Anjo aqui, anjos lá, tudo é mais fácil.

João, homem simples que nunca pensou em si, como reclamava seu amigo Luiz Antônio Barreto, fez um auto-retrato em uma canção dos anos 40, elogiada em artigo publicado no “Sergipe - Jornal” de 1947 pelo insigne jornalista e homem de letras de Sergipe e do Brasil 'Aluysio Mendonça Sampaio', que, em texto publicado na 'LB-42 – Revista da Literatura Brasileira' (2006), diz: “Destaque-se, ainda, que a canção João Ventura ressalta a personalidade participante do compositor, pois o dito Ventura, cidadão de Aracaju, “não é malandro nem vagabundo”, “é um cabra inteligente, sonha um mundo diferente, pra ele e pra todo mundo”. E, como digo na última página (219) do livro 'João Ventura – Cidadão de Aracaju', “por esse sonho, todo o roteiro de sua vida teve que ser refeito; mas, valeu a pena”. 

Guardo, com muito carinho, a página 'Cultura e Variedades' (que me foi doada por um “Ilustre Desconhecido”) do Jornal Cinform, edição de 26/12 a 01/01/2006 (Ano XXIII – Edição 1185), onde a jornalista e editora 'Flávia Martins' publica excelente entrevista com João Mello, com o título “João Mello e vida passada a limpo”. Trata-se de uma entrevista de alto nível, com excelentes fotos, realizada na então residência de João Mello. Com um sabor diferente, delicado, a editora e jornalista Flávia Martins repassa a seus leitores uma leitura correta sobre seu entrevistado, o porquê do seu livro, com ótimos registros, e cita fatos quase perdidos em minha memória. Penso em registrá-la, e, se interessar ao 'Museu da Gente Sergipana', passar para os arquivos daquela casa, onde estudamos, João e eu, cada um a seu tempo. Será um documento a não se perder. Vou falar com o doutor Ézio sobre o assunto.

Além da manchete acima citada, escreveu Flávia com destaque: “Aos 84 anos, compositor abre o peito e revela preciosas memórias dos primeiros anos do rádio em Sergipe, como produtor das gravadoras Philips e Som Livre e descobridor de talentos como Jorge Benjor e Djavan”.

“Todos cantam sua terra, também vou cantar a minha”, diz um verso popular. Não canto, mas lembro e vou lembrar sempre, já que os órgãos de cultura do estado e do município são omissos quando quem deve ser lembrado não é um subalterno, porque tem (ou teve) dentro de si a sua arte.

João Mello editou para o mundo o seu “Sergipinho” - “ai, saudade, saudade do meu Sergipinho, tão pequenininho, mas tão bonitinho que dá gosto a gente ver. Ai, que saudade, qualquer dia desse eu vou voltar pra lá, vou ver meu bem querer. Etc... etc...”.
E em seu livro, publica poema sobre seu Aracaju e suas pérolas artísticas, e como última estrofe, diz:
            “E as lembranças são tantas meu Aracaju...
            das suas luas de tantas serenatas
            que há de faltar papel pra descrever.
            O que eu quero que saibas é que eu voltei
            desta vez pra ficar, te olhar, te ver,
            e te pedir a terra pra quando eu morrer!”. 
 
    Ninguém foi tão aracajuano e sergipano como ele; por isso, enquanto ainda falo e escrevo, vou continuar lembrando que o 'compositor João Mello' continua a merecer a lembrança e a homenagem de Aracaju e de Sergipe – uma rua ou um logradouro com seu nome, uma passarela ou viaduto onde seu nome seja eternizado e os futuros sergipanos ou visitantes tomem conhecimento da existência desse homem, lembrado e sempre citado na imprensa baiana e carioca, onde suas músicas continuam sendo executadas por antigos e novos intérpretes.
 
    Só pra lembrar: “Sambou... sambou”, que ele compôs com João Donato, supera a casa de 50 gravações, no Brasil e no mundo.

* Raymundo Mello é Memorialista
raymundopmello@yahoo.com.br
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